sexta-feira, 5 de setembro de 2014

A INTERPRETAÇÃO - A CRÍTICA - A PROBLEMATIZAÇÃO - TEMAS DE FILOSOFIA – VARGAS DIGITADOR – POSTADO NO BLOG


A INTERPRETAÇÃO

TEMAS DE FILOSOFIA – VARGAS DIGITADOR – POSTADO NO BLOG

          É o segundo nível de leitura racional. Procura os significados não explícitos, escondidos, ou seja, os significados conotativos ou figurados. Perguntamos o que o autor quer mostrar ou demonstrar com este texto? Quais os valores que aparecem? Como as ideias apresentadas, o ponto de vista assumido, se ligam-se à época da produção do texto? Qual a relação do texto com o atual contexto histórico e social?

          Enfim, é nesse nível que vamos analisar mais a fundo os diversos elementos que compõem o texto, examinando as relações que eles mantêm entre si e como cada um influencia o outro. É nesse nível, também, que cruzamos ideias e valores presentes no texto com a situação histórica e social da época em que foi escrito e, às vezes, até com a biografia do autor. Ao fazer isso, podemos, inclusive, avaliar o significado das ideias apresentadas no texto na época de sua criação. Avaliamos o grau de novidade que ele apresentou então.

A CRÍTICA

        O terceiro nível de leitura racional é o momento da crítica. Não a crítica gratuita, baseada no gosto e na opinião individual, subjetiva, mas aquela que surge do nosso entendimento da proposta do próprio texto. Podemos verificar se o autor atinge ou não os objetivos a que se propõe; se é claro, coerente; se sua abordagem é original e se traz alguma contribuição para o assunto tratado.

          Trata-se da crítica objetiva, que não depende do nosso gosto: feio ou bonito? Depende do gosto?, e que está fundamentada em aspectos do próprio texto. Não é necessariamente uma crítica negativa, pois permite apontar, também os pontos positivos do texto.
          Ao chegar a esse ponto da leitura, teremos completado a análise do texto. Saberemos dizer do que ele trata, quais os pontos enfocados, com que ponto de vista o assunto foi tratado, se o autor foi coerente ao expor suas ideias e qual a sua contribuição dentro da área. A partir desse momento, podemos dizer se o texto é bom, ruim ou médio, independente de termos gostado dele ou não. É importante frisar que as críticas feitas por pessoas diferentes podem ser divergentes. Esse fato é positivo, pois a diversidade aguça a nossa curiosidade e nos permite perceber aspectos do texto que não tinham sido notados.

                                             A PROBLEMATIZAÇÃO

          É o quarto e último nível de leitura racional. Nesse nível nos distanciamos do texto e pensamos em assuntos ou problemas que, embora levantados a partir de sua leitura cuidadosa, vão além dele. É quando nos perguntamos: naquela época, ou sociedade, era assim; e hoje, como é? Tal coisa é válida para X; e para Y, como é?

          Ao problematizar, estamos indagando sobre outras possibilidades e exercitamos a imaginação, a coerência, o raciocínio. Abrimos nossos olhos para novos significados, para novas leituras do mundo.

          Concluindo, a necessidade de aprender a ler é muito mais ampla e profunda do que normalmente se coloca, pois envolve a prática de dar significados ao mundo que nos cerca e à nossa própria vida. É tarefa que pode ser conseguida através dos sentimentos e também da razão.

A leitura racional, como vimos, apresenta uma série de etapas que correspondem ao aprofundamento gradual dos significados presentes no texto, aprofundamento este que pode nos levar, para além do próprio texto, até os valores implícitos, escondidos, que presidiram a sua criação. Este é o caminho crítico que nos permite chegar à problematização da nossa realidade e que nos leva, portanto, ao filosofar.


(Revivendo Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins em Temas de FILOSOFIA) – Editora Moderna – São Paulo, 1992.

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

A DENOTAÇÃO - TEMAS DE FILOSOFIA – VARGAS DIGITADOR – POSTADO NO BLOG

A DENOTAÇÃO

 TEMAS DE FILOSOFIA – VARGAS DIGITADOR – POSTADO NO BLOG

          É o primeiro nível de leitura racional de um texto. Visa a compreensão do sentido mais literal, direto e superficial do texto e envolve as seguintes etapas:
1º) Levantamento de aspectos diversos, como:
a)    Vocabulário: grifar e procurar no dicionário as palavras desconhecidas ou cujo sentido não tenha ficado claro;
b)    Dados sobre o autor, situação histórica e finalidade para a qual foi escrito o texto (para uma aula? Uma conferência? Artigo de jornal? Capítulo de um livro? Carta? Resposta a alguém?);
c)     Autores, teorias, obras, eventos, comentados no texto e que nos são desconhecidos.
2º) procura da ideia central do texto, respondendo-se às perguntas: do que trata o texto? Qual o assunto discutido?
3º) análise do desenvolvimento do raciocínio do autor: como o autor trata essa ideia central: se é um ensaio sobre determinado assunto, de onde ele começa e quais as ideias, argumentos e fatos que usa para sustentar seu raciocínio? A que conclusão chega?
          No momento em que conseguimos perceber como o autor montou seu texto, nós entramos na posse de sua estrutura lógica, revelada pelo encadeamento das ideias que devem desembocar na conclusão.
          Embora a compreensão de um texto literário (ficcional), por exemplo um conto ou um romance, seja diferente da compreensão de um ensaio – de um texto teórico (não-ficcional) -, é possível observar essas mesmas etapas. O texto literário também apresenta uma ideia central e um encadeamento lógico detectado através das situações apresentadas que levam a um final (não necessariamente a uma conclusão). As perguntas que nos orientam permanecem as mesmas: como foi montada a história? quais os aspectos importantes que foram demonstrados? Respondendo a essas questões, encontramos o enredo, que corresponde ao nível denotativo do texto ensaístico. O mesmo se aplica a um filme ou a uma novela de televisão.



(Revivendo Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins em Temas de FILOSOFIA) – Editora Moderna – São Paulo, 1992.

LEITURA RACIONAL - TEMAS DE FILOSOFIA - VARGAS DIGITADOR - POSTADO NO BLOG


LEITURA RACIONAL 


Esse tipo de leitura exige uma compreensão mais abrangente do texto e mobiliza, além do sentimento, as capacidades racionais do leitor, como, por exemplo, a capacidade de analisar o texto, separar suas partes, estabelecer relações entre elas e outros textos, sintetizar as ideias do autor etc.
          Nesse nível, estabelecemos um diálogo com o texto, fazendo perguntas que nos levem a compreender sua forma de construção e seus significados mais profundos. Os textos, em geral, não são construções transparentes, não nos entregam totalmente os seus significados logo numa primeira leitura. Temos, na verdade, de conquistar o texto, respeitando suas características próprias que o fazem diferente dos demais.
          Façamos algumas perguntas ao texto sobre sua forma de construção. Em que tempo de verbo está escrito? Em que pessoa? Há um narrador? É uma descrição, uma narração, um diálogo dramático? É prosa ou poesia?
          Vemos que é um texto em prosa, escrito na primeira pessoa do singular, no presente e no qual um narrador conta várias coisas.
          E que coisas são essas? A vontade de escrever um livro e as dificuldades que encontra, entre afazeres profissionais e domésticos, para sentar e concretizar seu desejo.
          Podemos nos dar por satisfeitos com essa leitura. Mas será que o texto não nos conta mais nada? Quem é o narrador?  Vamos ao texto, propriamente dito, para buscar tais respostas?
Os instrumentos de filosofar
          Hoje é o primeiro dia em que me sinto realmente em férias. E já é janeiro. Passou a correria da entrega de notas, reuniões de conselhos de classe, recuperação, fechamento dos diários de classe, seguida da outra correria, a preparação das festas de fim de ano. As compras, as visitas, a comida, o trânsito, o calor, a árvore a ser arrumada... Mas, hoje, finalmente em férias, posso começar a escrever outra vez.
          Hummm, estou sentindo um cheiro estranho. O que poderá ser? Nossa! Esqueci o feijão no fogo! Queimou. Lá se foi o meu almoço.
          Ó ilusão! Agora ouço um barulho. Será a campainha? Sempre posso fingir que não há ninguém em casa. Mas não é a campainha. O barulho continua, sempre igual e nos mesmos intervalos de tempo. Ah! É o telefone. Já tocou umas dez vezes. Talvez seja algo importante. Será que aconteceu alguma coisa com as crianças e estão querendo me avisar? É melhor atender logo.
          - Alô! Bom dia, mãe... O quê? Tenho de ir aí para ver o que está acontecendo? (Suspiro) Tá bom, mãe. Já estou indo...
          Pois é, acho que vou deixar para escrever amanhã.

          Captaram  o assunto? O narrador? É uma professora, pois tem de dar conta de notas, reuniões, recuperação, além da preparação das festas de Natal. E que situação o narrador está vivendo no momento? Está em férias, sem ter mais nenhuma daquelas obrigações profissionais. E, em férias, está escrevendo. Não é estranho que as férias signifiquem um outro momento de trabalho? Escrever também é um trabalho, prazeroso, realizador, mas, mesmo assim, um trabalho. Só que, ao lado deste, aparecem outros trabalhos, indispensáveis: fazer a comida, tomar conta dos filhos. Assim, começamos a perceber as dificuldades da mulher que trabalha fora de casa: na verdade, ela tem dupla jornada de trabalho, uma em casa, outra no emprego. Começamos a perceber as dificuldades das professoras: além de profissionais, são também mulheres, esposas, mães, donas de casa, filhas. O nosso olhar se modifica, pois passamos a encará-las não mais solidificadas em um papel, mas como pessoas humanas, com várias dimensões, várias dificuldades e várias formas de realização.
          Vemos, portanto, que essa historinha, aparentemente tão simples, tem outros significados mais escondidos. Podemos, então, dizer que a leitura racional de um texto é uma forma de (re) criar esse texto, visando a sua compreensão mais profunda. A (re) criação é feita a partir das perguntas que fazemos ao texto. E, como as perguntas são nossas, estamos, nós, leitores, tendo um papel ativo nessa recriação, nessa leitura, nessa atribuição de significados que estão latentes no texto mas não totalmente à mostra.
          A leitura racional comporta, assim, uma subdivisão em níveis, que constituem etapas de aprofundamento da interpretação: denotação, interpretação, crítica e problematização. É como se entrássemos num rodamoinho e fôssemos dando voltas, cada vez mais profundas.



(Revivendo Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins em Temas de FILOSOFIA) – Editora Moderna – São Paulo, 1992.

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

LEITURA EMOCIONAL - TEMAS DE FILOSOFIA - VARGAS DIGITADOR

LEITURA EMOCIONAL - VARGAS DIGITADOR

          É a leitura subjetiva, que nos empolga, liberando emoções e dando asas à nossa fantasia. Entregamo-nos de corpo e alma ao universo criado pelo autor, seja ele imaginário ou real, viajando no tempo e no espaço, experimentando prazer ou angústia. Nós nos colocamos no lugar do narrador ou de alguma personagem, na situação em que esta se encontra, e nos solidarizamos com seus sentimentos e atitudes. Durante esse processo de identificação, participamos da vida afetiva alheia e liberamos emoções que, muitas vezes, não nos permitimos ter na vida real. É o que acontece quando lemos um romance interessante ou assistimos a uma novela na TV.
          Nesse tipo de leitura, o único critério de avaliação usado é o do gosto: gostamos ou não de um texto, dependendo de motivos pessoais ou de características do texto que não são definidas.
          Durante o processo da leitura emocional, algo acontece ao leitor, que sofre, se angustia e se alegra com as situações apresentadas no texto. Tudo isso faz com que o leitor possa se distrair. Mas distrair-se, escapar da realidade imediata, não significa, necessariamente, fugir, alienar-se, ou seja, negar-se a viver os problemas do dia-a-dia e a solucioná-los. Mesmo o texto no qual nos jogamos emocionalmente pode nos intervalos da leitura ou ao seu final, facilitar o estabelecimento de relações entre a nossa vivência, o nosso mundo e aquele mostrado no texto.. ao fazer isso, estaremos não só atribuindo significados ao texto lido, mas, também, à nossa vida e à nossa realidade. Estaremos, então, fazendo uma dupla leitura: a do texto e a da nossa própria realidade.


(Revivendo Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins em Temas de FILOSOFIA – Editora Moderna – São Paulo, 1992.

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

RESENHA CRÍTICA - DOS EFEITOS SUCESSÓRIOS DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA - VARGAS, Paulo S.R. - DIREITO FAMESC - 7º PERÍODO - PROFESSOR FELIPE - DIREITO CIVIL VI - VARGAS DIGITADOR EM 29-08-2014

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Skype paulovargas61 ee.paulovargas@hotmail.com
Rua   Gonçalves  da  Silva   279  sala 201   Centro
Bom Jesus do Itabapoana – RJ – CEP 28360 000
Tel. (22) 3833-0130  (22)3831-1774  (22) 8829-9130


DOS EFEITOS SUCESSÓRIOS
DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA

RESENHA CRÍTICA


VARGAS, Paulo S.R.

1 – VALMÔR SCOTT JR, e mail: jr.3000@hotmail.com pós-graduando em Direito Civil pela Universidade Federal de Santa Maria (RS), apresenta-nos um belo e útil trabalho, publicado em: Revista Sociais & Humanas, Santa Maria, v. 23, m. 2, jul/dez, 2010, pp 35-46, com o título em epígrafe.

2 – Abrange o Autor, assunto atual e polêmico junto à sociedade e de âmbito jurídico, alcançando o Direito Cível,  repercutindo no Direito de Família e no Direito das Sucessões. Remete-se às mudanças sociais do Século XX através da Revolução Industrial e da presença marcante da mulher no conceito patriarcal, ajustando o afeto como principal elemento de formação da família.

3 – Traz a menção à Carta Magna de 1988 e ao Código Civil de 2002, que não trouxeram positivadas a norma reguladora da posse do estado de filho como elo para definir a paternidade. Lembra aqui, a elaboração de construção e fundamentação pela doutrina e jurisprudência  na busca de considerar o sentimento paternofilial contínuo, como determinante de paternidade, inclusive por terceiro, denominado pai socioafetivo e, ainda que não possua vínculo biológico e/ou jurídico  surgem os direitos sucessórios.

4 – Ante o exposto, SCOTT JR aponta a ramificação da família tradicional para tipos de arranjos familiares com várias vertentes de afetividade-comum entre seus membros. Essa diversidade familiar, diz o autor, é constitucionalmente protegida em várias partes das normas jurídicas brasileiras, a começar pelo art. 226 §6º da Constituição Federal de 1988, quando apresenta um conceito aberto de família, sem delimitações.

5. Na segunda parte da sua apresentação, o Autor estuda a paternidade e filiação socioafetiva e a importância da posse do estado de filho como elo caracterizador da relação paternofilial, apontando a lacuna deixada pelo Sistema de Normas Brasileiro, mas, ainda assim, escrita pela doutrina e jurisprudência como fruto de convivência, acima da biológica, dando ênfase como elemento primordial de aceitação ao parentesco civil.

6 – Estudados, então, o afeto, como ponto de convergência aos três títulos fundamentais no Direito de Família, sejam: “família, paternidade e sucessão hereditária”, concentrou-se o Autor nas análises e discussões encontradas pela doutrina e jurisprudência, como fito garantidor dos efeitos sucessórios ao filho fruto do amor, do afeto e da compreensão. Senão, vejamos:
7 – Analisando a identidade paterna, subdividindo-a em três partes: “biológica, jurídica e socioafetiva”, SCOTT JR lamenta o fato da impossibilidade da ocorrência constante, devido à própria realidade social, ainda que seja óbvia a constância da paternidade em todo vínculo de relacionamento, diuturnamente.

8 – Sucede, afirma ele, as diferenças entre pai e filho, muita vez, tornarem-se problema jurídico, surgindo uma terceira pessoa no relacionamento, que não o pai genético. Nesse diapasão, sempre pensando a criança enquanto sujeito de direito, apoia-se, inicialmente, na Lei 8.069/90, o ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (Brasil, 2000), seguindo a citação de BRAUNER (1992, p. 66): “[...] referido diploma legal veio reconhecer a criança como sujeito de direitos, garantindo-lhe proteção integral, reafirmando a igualdade entre os filhos, sejam eles resultantes de uniões matrimoniais ou não, proibindo qualquer tipo de discriminação”.

9 – A paternidade socioafetiva, não é assunto novo. Hoje é difundido o reconhecimento de fato sempiterno e buscado somente agora na evolução legislativa e doutrina especializada brasileira. Legalmente recepcionada pela Carta Maior de 1988, considerada uma das mais avançadas do mundo, em matéria de família, já absorvida pelo Código Civil de 2002, tem como ponto principal de ligação o fator não biológico, mas a socioafetividade.

10 – No conceito de pai, aponta VELOSO, 1977, p. 215: “Quem acolhe, protege, cuida, emenda, repreende, veste, alimenta, ama e cria uma criança é pai. Pai de fato, mas, sem dúvida, pai. ‘Pai de Criação’, tem posse de estado com relação ao ‘filho de criação’. Havendo na relação, realidade sociológica e afetiva que o Direito tem de enxergar, socorrer. O que cria, o que fica no lugar do pai, tem direitos e deveres para com a criança, observado o que for melhor para os interesses desta.”

11 – Cabe ao pai assumir, na afetividade do vínculo, os deveres de realização dos direitos fundamentais da pessoa em formação, apontados na Constituição Federal de 1988, em seu artigo nº 227, o qual reza “o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar”.

12 – Afirma SCOTT JR., constatar-se a paternidade, definitivamente, através da afetividade, buscando, também, esta certeza, no princípio jurídico com força normativa, impondo deveres e obrigações aos membros da família, alçando o dever de afetividade, além do afeto psicológico.

13 – Por sobre a supremacia da paternidade presumida do Século XX e ainda em vigor no Código Civil de 2002, e além do teste de DNA, que possui vínculo biológico, prevalece sobre qualquer outro tipo de paternidade, a identidade paterna que a criança possui, seja a do terceiro que ela adota como pai em seus sentimentos e que prevalece sobre qualquer outro que o Estado queira impor.

14 – O Direito, na função de regular os fatos sociais, deve acompanhar a evolução da sociedade. O legislador em sua percepção, opta pela paternidade socioafetiva, trazendo no art. 227 §6º da CF/88, o conceito aberto e inclusivo de paternidade, ao assegurar igualdade plena a todos os filhos, indiscriminadamente, havidos ou não dentro do casamento. Trazendo  a fundamentação no Princípio da Proteção Integral da Criança no convívio familiar.

15 – Desconsidera-se, assim, o descabimento de uma ação de investigação de paternidade, já que o objetivo da ação é estabelecer vínculo, e não desfazê-lo. A evolução legislativa trazida pela Lei Maior, passando a estabelecer a relação filial legítima e a biológica isonômicas, como consta no artigo nº 1.596 do Código Civil de 2002, expandindo e abrigando os filhos de qualquer origem em igualdade de direitos, sejam eles adotivos, de inseminação artificial heteróloga e até os oriundos da posse do estado de filho.

16 – Vários dispositivos do Código Civil, como já vimos, optam pela paternidade socioafetiva. Como é o caso do artigo número 1593, v.g, que considera “parentesco natural e civil, resultante de consanguinidade ou de outra origem”. Constata-se aqui, ideia de inclusão, perdendo assim a biológica sua primazia, considerando a paternidade de qualquer origem, preservando dessa forma a Dignidade da Pessoa Humana. Trazendo em benefício da sociedade a expurgação da ilegitimidade de filhos espúrios, adulterinos, ilegais ou incestuosos, sob a pena de inconstitucionalidade.

17 – O artigo 1605, do Código Civil de 2002, ascende à posse do estado de filho, quando alude ao fato de haver um começo de prova proveniente dos pais ou presunções verificadas em cada caso, dispensando outras provas da situação de fato. Abre-se, aqui, um leque de opções, isentando-se o Código Civil, sequer de exemplificar espécie de presunção, o que nos deixa a conclusão e faculdade de incluir-se na experiência brasileira como a posse do estado de filiação, o filho de criação e a adoção de fato.

18 – Face a todo o exposto, podemos concluir ser a paternidade, mais que um dado genético, um complexo de direitos e deveres cabíveis a uma pessoa, em razão do estado de filiação.

19 – Cabe ressaltar não ser a paternidade socioafetiva uma regra. Caberá ao juiz avaliar o caso concreto e observar a relação de afeto entre pai e filho e optar pela permanência ou não deste vínculo afetivo. É responsabilidade do juiz os efeitos irreversíveis de sua decisão na vida de um infante e na construção desses laços afetivos.

20 – Segundo BOEIRA (2001, p.54),

“a posse do estado de filho revela a constância social da relação paterno filial, caracterizando uma paternidade que existe, não pelo simples fator biológico ou por força de presunção legal, mas em decorrência de elementos que somente estão presentes, juntos de uma convivência afetiva. Cresce, pois, a relevância da noção de posse do estado de filho em todas as legislações modernas, o que demonstra a inviabilidade de uma aberração total pelo princípio da verdade biológica.”


21 – Concluindo a crítica, porém, não dando por encerrada a discussão, ressalta-se que tanto a Constituição Federal, como o Estatuto da Criança e do adolescente, apontaram para a valorização da paternidade socioafetiva e, portanto, da posse do estado de filho, primeiramente na determinação da paternidade através do vínculo de afeto, e, depois, pela realidade biológica e/ou legal. É importante considerar que dessa forma, acabou por surgir vários questionamentos em relação aos fatos que estão a caminho, por exemplo, quanto à situação, no direito das sucessões, daquela criança que foi criada por terceiro como seu filho.

22 – A resposta a esta pergunta vem a ser o ponto alto deste trabalho, visto que o direito não apresenta de maneira clara uma solução, contudo, é possível construir um posicionamento que satisfaça a esta indagação, em função de considerar o filho socioafetivo como herdeiro necessário, nas mesmas condições dos demais filhos.

23 – Ora, a relação paternofilial, decorrente do vínculo socioafetivo é entendida pelo ordenamento jurídico pátrio, como paternidade e filiação. Como visto até o momento, o princípio da afetividade e a posse do estado de filho, com seus elementos constitutivos e diante o disposto no artigo 227, §6º da CF, que traz em seu bojo o princípio da igualdade entre os filhos, proibindo, como citado alhures, designações discriminatórias relativas à filiação.



sexta-feira, 22 de agosto de 2014

CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO – PROFESSOR EMERSON – DIREITO FAMESC 7º PERÍODO – APOSTILA 2 – VARGAS DIGITADOR – 18.08.2014

CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO – PROFESSOR EMERSON – DIREITO FAMESC 7º PERÍODO –
APOSTILA 2 – VARGAS DIGITADOR – 18.08.2014

A Administração Pública só pode atuar visando a proteção dos interesses da coletividade. Por isso, a legislação atribui competências aos agentes públicos e, ao mesmo tempo, define claramente os limites para o exercício de tais atribuições. A própria noção de competência implica a existência de limites dentro dos quais quem recebe determinada atribuição de atuar.

O tema controle da Administração estuda os instrumentos jurídicos de fiscalização sobre a atuação dos agentes, órgãos e entidades componentes da Administração Pública.

OBJETIVOS

De acordo com José dos Santos Carvalho Filho, os mecanismos de controle sobre a Administração Pública têm como objetivos fundamentais garantir o respeito aos direitos subjetivos dos usuários e assegurar a observância das diretrizes constitucionais de administração.

NATUREZA JURÍDICA

Os mecanismos de controle têm natureza jurídica de princípio fundamental da Administração Pública.

É o que se extrai da norma contida no art. 6º, V, do Decreto-Lei n. 200/67: “As atividades da Administração Federal obedecerão aos seguintes princípios fundamentais: a) planejamento; b) coordenação; c) descentralização; d) delegação de competência; e) controle”.

CLASSIFICAÇÃO

A doutrina procura dividir as formas de controle da Administração em diversas categorias, partindo dos mais variados critérios:
1)     Quanto ao órgão controlador:
a)     Controle legislativo: é aquele realizado pelo parlamento com auxílio dos Tribunais de Contas. Ex: comissões parlamentares de inquérito;
b)     Controle judicial: promovido por meio das ações constitucionais perante o Poder Judiciário. O controle judicial pode ser exercido a priori ou a posteriori, conforme se realize antes ou depois do ato controlado, respectivamente. O controle judicial sobre a atividade administrativa é sempre realizado mediante provocação da parte interessada. Ex: mandado de segurança e ação civil pública;
c)     Controle administrativo: é o controle interno no âmbito da própria administração. Pode ser realizado de ofício ou por provocação da parte interessada. Ex: recurso hierárquico.
2)     Quanto à extensão:
a)     Controle interno: realizado por um Poder sobre seus próprios órgãos e agentes. Exemplo: controle exercido pelas chefias sobre seus subordinados;
b)     Controle externo: quando o órgão fiscalizador se situa fora do âmbito do Poder controlado. Ex: anulação judicial de ato da administração.
3)     Quanto à natureza:
a)     Controle de legalidade: analisa a compatibilidade da atuação administrativa com o ordenamento jurídico. O controle de legalidade pode ser exercido pela própria Administração ou pelo Poder Judiciário. Ex: anulação de contrato administrativo por violação da Lei n. 8.666/93;
b)     Controle de mérito: é exercido somente pela própria Administração quanto aos juízos de conveniência e oportunidade de seus atos. Ex: revogação de ato administrativo. Não se admite controle do mérito de atos administrativos pelo Poder Judiciário, exceto quanto aos atos praticados pelo próprio judiciário no exercício de função atípica.
4)     Quanto ao âmbito:
a)     Controle de subordinação: é aquele realizado por autoridade hierarquicamente superior àquele que praticou o ato controlado. (Ex: anulação, pelo Presidente da República, de ato praticado por Ministro de Estado). Importante relembrar que as entidades descentralizadas não estão submetidas à sujeição hierárquica em relação ao Poder Central, inexistindo controle por subordinação da administração direta sobre a indireta;
b)     Controle por vinculação: é o poder de influência exercido pela Administração direta sobre as entidades descentralizadas, não se caracterizando como subordinação hierárquica. Ex: poder de fiscalização de Ministro de Estado sobre autarquia vinculada à sua pasta.
5)     Quanto ao momento do exercício:
a)     Controle prévio: também chamado de controle a priori, é aquele realizado antes do ato controlado. Ex: mandado de segurança impetrado para impedir a prática de ato legal;
b)     Controle concomitante: promovida concomitantemente à execução da atividade controlada. Ex:fiscalização durante a execução de obra pública;
c)     Controle posterior: conhecido também como controle a posteriori, é realizado após a prática do ato controlado. Ex: ação popular proposta visando anular ato lesivo ao patrimônio público.
6)     Quanto à iniciativa:
a)     Controle de ofício: é realizado sem necessidade de provocação da parte interessada. Ex: instauração de processo disciplinar para apurar falta funcional praticada por servidor público;
b)     Controle provocado: aquele que depende da iniciativa da parte interessada. Ex: ações constitucionais para controle judicial da Administração Pública.

CONTROLE ADMINISTRATIVO

O controle administrativo é fundamentado no poder de autotutela que a administração exerce sobre os seus próprios atos. Tem como objetivos a confirmação, correção ou alteração de comportamentos administrativos.

Os meios de controle administrativo são a supervisão ministerial sobre as entidades descentralizadas e o controle hierárquico típico dos órgãos da Administração direta.

ATENÇÃO: No direito brasileiro, não existe necessidade de esgotamento da via administrativa para ser possível recorrer ao Poder Judiciário (art. 5º, XXXV da CF). A exceção diz respeito às questões envolvendo Direito Desportivo (art. 217, §1º, da CF).

RECURSO HIERÁRQUICO PRÓPRIO E IMPRÓPRIO

a)     Recurso hierárquico próprio: é aquele endereçado à autoridade superior à que praticou o ato recorrido. Como tal recurso é inerente à organização escalonada da Administração, pode ser interposto sem necessidade de previsão legal. Ex: recurso contra autuação dirigido à chefia do setor de fiscalização.
b)     Recurso hierárquico impróprio: dirigido à autoridade que não ocupa posição de superioridade hierárquica em relação a quem praticou o ato recorrido. Tal modalidade de recurso só pode ser interposta mediante expressa previsão legal. Ex: recurso contra decisão tomada por autarquia, endereçado ao Ministério da pasta à qual a entidade recorrida está vinculada.

CONTROLE LEGISLATIVO

O controle legislativo é realizado no âmbito dos parlamentos e dos órgãos auxiliares do Poder Legislativo. Sua abrangência inclui o controle político sobre o próprio exercício da função administrativa e o controle financeiro sobre a gestão dos gastos públicos dos Três Poderes.

Os mais importantes instrumentos de controle legislativo estão previstos nos seguintes dispositivos constitucionais:

a)     Art. 48, X: “Cabe ao Congresso Nacional legislar sobre criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública”;
b)     Art. 48, V: “É da competência exclusiva do Congresso Nacional sustar os atos normativos  do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa”;
c)     Art. 50: “A Câmara dos Deputados e o Senado Federal, ou qualquer de suas Comissões, poderão convocar Ministro de Estado ou quaisquer titulares de órgãos diretamente subordinados à Presidência da República para prestarem, pessoalmente, informações sobre assunto previamente determinado, importando crime de responsabilidade a ausência sem justificação adequada”;
d)     Art. 58, §3º: “As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores”;
e)     Art. 71, §1º: sustar a execução de contrato administrativo objeto de impugnação perante o Tribunal de Contas da União, como forma de controle financeiro sobre a Administração Pública;
f)       Art. 52, I: o julgamento do Chefe do Poder Executivo, no Senado, por crime de responsabilidade.

Convém relembrar que o controle legislativo sobre as atividades da administração somente pode ser realizado nas hipóteses taxativamente previstas na Constituição Federal, sob pena de violação da Tripartição de Poderes.

TRIBUNAIS DE CONTAS

Importantes auxiliares do Poder Legislativo no controle externo das atuações administrativas são os Tribunais de Contas.

Os Tribunais de contas têm competência para fiscalização de quaisquer entidades públicas ou privadas que utilizem dinheiro público, incluindo as contas do Ministério Público, do Poder Legislativo e do Poder Judiciário.
Atualmente existem no Brasil:
a)     Tribunal de Contas da União (TCU), órgão auxiliar do Congresso Nacional;
b)     Tribunais de Contas dos Estados (TCEs), órgãos auxiliares das Assembleias Legislativas;
c)     Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCMs), órgão auxiliar da Câmara Legislativa Distrital;
d)     Tribunais de Contas dos Municípios (TCMs), órgãos auxiliares das Câmaras Municipais. A Constituição reconheceu apenas a existência de TCMs em dois municípios brasileiros: São Paulo (TCMSP) e Rio de Janeiro (TCMRJ), sendo vedada a criação de novos tribunais, conselhos ou órgãos de contas municipais, além dos dois já existentes (art. 31, §4º,d a CF).

De acordo com o art. 71 da Constituição Federal, compete ao Tribunal de Contas da União:

1)     Apreciar as contas prestadas anualmente pelo Presidente da República, mediante parecer prévio que deverá ser elaborado em sessenta dias a contar de seu recebimento;
2)     Julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da Administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas, pelo Poder Público Federal e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público;
3)     Apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na Administração direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, excetuadas as nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório.

Segundo precedentes do STF, os atos de aposentadoria são atos complexos que somente se aperfeiçoam com o registro na Corte de Contas respectiva. Submetido à condição resolutiva, não se operam os efeitos da decadência antes da vontade final da Administração (STF: MS 24.997);

4)     Realizar, por iniciativa própria, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Comissão técnica ou de inquérito, inspeções e auditorias de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, nas unidades administrativas dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, e demais entidades governamentais;
5)     Fiscalizar as contas nacionais das empresas supranacionais de cujo capital social a União participe de forma direta ou indireta, nos termos do tratado constitutivo;
6)     Fiscalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados pela União mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres, ao Estado, ao Distrito Federal ou ao Município;
7)     Prestar as informações solicitadas pelo Congresso Nacional, por qualquer de suas casas, ou por quaisquer das respectivas Comissões, sobre a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial e sobre resultados de auditorias e inspeções realizadas;
8)     Aplicar aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas em lei, que estabelecerá entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário;
9)     Assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se verificada ilegalidade;
10)  Sustar, se não atendido, a execução do ato impugnado, comunicando a decisão à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal;
11)  Representar ao Poder competente sobre irregularidades ou abusos operados.

Os Tribunais de Contas podem sustar atos administrativos impugnados, mas tal poder não se estende a eventuais contratos administrativos submetidos à sua apreciação. No caso de contrato administrativo, o ato de sustação será adotado diretamente pelo Congresso Nacional, que solicitará de imediato ao Poder Executivo, as medidas cabíveis (art. 71, §1º, da CF).

Se o Congresso Nacional ou o Executivo, após noventa dias, não deliberarem sobre o tema, então o Tribunal de Contas decidirá a respeito (art. 71, §2º, da CF).

Por fim, deve-se destacar o conteúdo da Súmula n. 347 do STF: o Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do poder público.

NATUREZA JURÍDICA DOS TRIBUNAIS DE CONTAS

Os Tribunais de Contas têm natureza jurídica de órgãos públicos primários despersonalizados. São chamados de órgãos “primários” ou “independentes” porque seu fundamento e estrutura encontram-se na própria Constituição Federal, não se sujeitando a qualquer tipo de subordinação hierárquica ou funcional a outras autoridades estatais.

De acordo com Ayres Britto, são órgãos de natureza político-administrativa. Nesse sentido, não integram a estrutura do Legislativo, Executivo ou Judiciário. São órgãos diretamente ligados à entidade federativa sem pertencer a nenhum dos três Poderes.

SIMETRIA DE REGIME ENTRE OS TRIBUNAIS DE CONTAS E O PODER JURIDICIÁRIO

Embora não pertençam a nenhum dos três Poderes, os Tribunais de Contas tiveram aspectos do seu regime jurídico, constitucionalmente aproximados a órgãos do Poder Judiciário. É o que se pode constatar da leitura dos dispositivos abaixo transcritos.

Art.73. o Tribunal de Contas da União, integrado por nove Ministros, tem sede no Distrito Federal, quadro próprio de pessoal e jurisdição em todo o território nacional, exercendo, no que couber, as atribuições previstas no art. 96” (competência dos tribunais judiciários).

“Art. 73, §3º. Os Ministros dos Tribunais de Contas da União terão as mesmas garantias, prerrogativas, impedimentos, vencimentos e vantagens dos Ministros do Superior Tribunal de Justiça, aplicando-se-lhes, quanto à aposentadoria e pensão, as normas constantes do art. 40”.

De acordo com o Ministro Ayres Britto, “a função de controle externo, exercida pelo Tribunal de Contas é marcada pelo atributo da indispensabilidade ou rigorosa essencialidade a luz da Constituição de 1988”.

CARACTERÍSTICAS DO PROCESSO DE CONTROLE

Os processos que tramitam perante os Tribunais de Contas possuem as seguintes características:

a)     Podem ser instaurados de oficio;
b)     O julgamento deve obedecer a critérios objetivos de ordem técnico-jurídica, e não parâmetros políticos;
c)     Não é obrigatória a participação de advogados;
d)     Inexiste a figura de “litigantes”;
e)     Cabem medidas cautelares para determinar o afastamento temporário do responsável, se existirem indícios suficientes, de que prosseguindo no exercício de suas funções possa retardar ou dificultar a realização de auditoria ou inspeção, causar novos danos ao erário ou inviabilizar o seu ressarcimento (art. 273 do Regimento Interno do TCU).
f)       As decisões definitivas têm natureza administrativa e são irretratáveis quanto ao mérito, cabendo, porém, recurso ao Judiciário no caso de lesão ou ameaça a direito;
g)     O processo é independente, em relação às demais instâncias de responsabilização, (penal, civil, administrativa, política e por improbidade);
h)     A decisão de que resulta imputação de débito ou multa tem força de título executivo extrajudicial (art. 71, §3º, da CF).

ALCANCE DA IMPUTAÇÃO DO DÉBITO

A decisão do Tribunal de Contas que resulta na imputação de débito pode atingir órgãos públicos e pessoas, físicas ou jurídicas (públicas ou privadas), que utilizem, gerenciem ou administrem bens, valores ou dinheiro público (art. 70, parágrafo único, da Constituição Federal).

COMPETÊNCIA FISCALIZADORA E CORRETIVA EM PROCEDIMENTOS LICITATÓRIOS

O art. 113, §2º, da Lei n. 8666/93 confere aos Tribunais de Contas e demais órgãos integrantes do sistema de controle interno competência para solicitar cópia de edital de licitação já publicado com o objetivo de realizar seu exame, podendo também determinar a adoção de medidas corretivas de cumprimento obrigatório para todos os órgãos e entidades da administração Pública, desde que a solicitação seja motivada e casuística (Supremo Tribunal Federal).

CONTROLE JUDICIAL

O controle judicial das atividades administrativas é realizado sempre mediante provocação, podendo ser prévio  ou posterior. Como o Brasil adota o modelo inglês da Jurisdição una, e não o modelo francês do contencioso administrativo, todas as causas são decididas pelo Poder Judiciário, mesmo aquelas que envolvam interesse à Administração.

Segundo a doutrina, os únicos limites importantes ao controle judicial das atividades administrativas dizem respeito aos atos políticos e aos atos interna corporis.

As mais importantes ações judiciais do controle da Administração Pública são:

a)     Mandado de Segurança (art. 5º, LXIX da CF e Lei n. 12016/2009): impetrado para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. O mandado de segurança tem a peculiaridade de somente admitir a produção de prova documental pré-constituída, sendo nele inviável a dilação probatória, isto é, a produção de outros meios de prova para fundamentar a pretensão do impetrante.

Quanto ao uso do mandado de segurança, merecem destaque os seguintes entendimentos jurisprudenciais do STF:

1)     Não cabe mandado de segurança contra lei em tese (Súmula n. 266);
2)     Não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição (Súmula n. 267);
3)     Não cabe mandado de segurança contra a decisão judicial com trânsito em julgado (Súmula n. 268);
4)     Mandado de Segurança não é substitutivo de ação de cobrança (Súmula n. 269).
5)     Habeas corpus (art. 5º, LXVIII, da CF): cabível sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;
6)     Ação popular (art. 5º, LXXIII proposta por qualquer cidadão, visando a anular ato lesivo ao patrimônio público ou a entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má fé, isento de custas judiciais e do onus da sucumbência.
7)     Mandado de injunção (art. 5º, LXXI, da Constituição Federal): a ser impetrado sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Julgado procedente, o mandado de injunção ordenará a expedição da lei regulamentadora ou de qualquer outro ato administrativo indispensável para viabilizar o exercício dos direitos e garantias constitucionais.
8)     Habeas data (art. 5º, LXXII, da CF): visando assegurar o conhecimento, retificação ou contestação de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público.
9)     Ação civil pública (art. 129, III, da CF e Lei n. 7.347/85): proposta para proteção de direitos difusos ou coletivos, como meio ambiente defesa do consumidor, ordem urbanística, bens e direitos de valor artístico, infração à ordem econômica e à ordem urbanística.

São legitimados para a propositura de ação civil pública: 1) o Ministério Público; 2) a Defensoria Pública; 3) a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; 4) a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista; 5) a associação que atenda aos requisitos estabelecidos na Lei n. 7347/85; 6) o Conselho Federal da OAB (art. 54, XIV, da Lei n. 8906/94).

10)  Ação de improbidade (art. 37, §4º, da CF e Lei n. 8429/92): os agentes públicos que praticarem condutas tipificadas na Lei n. 8429/92 estarão sujeitos à aplicação das sanções de suspensão dos direitos políticos dos bens, proibição de contratar com o Estado e ressarcimento integral do dano.

As ações judiciais de controle sobre a Administração podem ser utilizadas tanto em caso de lesão efetiva quanto na hipótese de ameaça a direito ou interesse particular.

11)  Processo de responsabilidade administrativa, civil e penal por abuso de autoridade: regulado pela Lei n. 4898/65, o direito de representação será exercido nas hipóteses previstas na lei, por meio de petição. 1) dirigida à autoridade superior que tiver competência legal para aplicar, à autoridade civil ou militar, culpada, a respectiva sanção; 2) dirigida ao órgão do Ministério Público que tiver competência para iniciar processo-crime contra a autoridade culpada.

PRESCRIÇÃO NO DIREITO ADMINISTRATIVO

O instituto da prescrição, entendida como a perda do direito de ação devido à inércia de seu titular, também é reconhecido pela legislação pertinente ao Direito Administrativo.

Como regra, o prazo para interposição de recursos administrativos é de cinco dias.

Já o prazo para propositura de ações judiciais, tanto pela Administração quanto pelo administrado, em regra é de cinco anos. Importante destacar que as hipóteses de suspensão e interrupção do prazo prescricional previstas na legislação civil também são aplicáveis às ações judiciais pertinentes ao Direito Administrativo.

COISA JULGADA ADMINISTRATIVA

É comum encontrar na doutrina e na jurisprudência referências à denominada “coisa julgada administrativa”, característica atribuída a determinada decisão tida como imutável após o escoamento de todos os prazos para interposição de recursos administrativos. Assim, por exemplo, costuma-se falar em “trânsito em julgado” do auto de infração fiscal quando não puder mais ser impugnado administrativamente pelo contribuinte devido ao esgotamento das vias recursais.

Entretanto, convém esclarecer que, tecnicamente, decisões administrativas não transitam em julgado, na medida em que sempre podem ser objeto de revisão perante o Poder Judiciário. O que pode haver é uma preclusão administrativa impeditiva de revisão da decisão por parte da Administração. Porém, mesmo no caso de ocorrer tal preclusão, a decisão será passível de controle judicial, não sendo correto considerá-la como imutável ou transitada em julgado.

No Estado de Direito, somente o Poder Judiciário pode emitir decisões que produzem coisa julgada material.

Referência:

MAZZA, Alexandre. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2014.