terça-feira, 21 de julho de 2015

IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS - ISENÇÕES - Direitos fundamentais e tributação: os limites constitucionais ao poder estatal de tributar e o princípio do não-confisco - VARGAS DIGITADOR



Direitos fundamentais e tributação: os limites constitucionais ao poder estatal de tributar e o princípio do não-confisco – IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS - VARGAS DIGITADOR – FONTE: PROFESSOR EMERSON – 8º PERÍODO DIREITO FAMESC – 1º SEMESTRE 2015.


INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como escopo a análise do instituto da imunidade tributária, um dos principais institutos da ciência tributária e autêntico instrumento de limitação ao poder de tributar.

A abordagem do assunto será iniciada com breves considerações acerca da competência tributária e a conceituação de imunidade tributária. Após a conceituação, apontaremos os pontos em que se difere do instituto da isenção e faremos uma breve análise das principais situações de imunidade plasmadas no texto constitucional.

O objetivo do presente artigo não é esgotar o estudo da imunidade, mas convidar o leitor a caminhar por um dos institutos mais importantes do direito, lançando um convite despretensioso para o seu aprofundamento em outras obras e julgados, dada infinidade de assuntos e discussões que este instituto nos oferece.

COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA

Ao tratar da imunidade tributária, primeiramente devemos traçar considerações acerca da competência tributária, pois, como iremos analisar, a imunidade tributária é um instrumento limitador do poder de tributar, excluindo da esfera de competência de determinado ente federativo situações previamente disciplinadas no texto constitucional.

Inicialmente cabe apontar a distinção entre competência legislativa e competência tributária. A competência legislativa está disposta no art. 24 da Constituição Federal onde estabelece a competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar sobre direito tributário, estabelecendo normas gerais acerca do exercício do poder de tributar.

Por sua vez, a atribuição dada aos entes políticos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) para instituir tributos chama-se competência tributária. A Carta Magna tratou de delimitar a competência de cada ente para instituir tributos, estas normas não são apenas formalmente constitucionais (previsão na Constituição, mas que poderiam ter sido tratadas por leis complementares ou ordinárias), mas, acima de tudo, têm caráter materialmente constitucional.

Ao falar de competência não estamos dizendo, apenas, do poder de tributar, mas também da limitação a este poder. Outro não poderia ser o diploma legislativo a tratar de competência dos entes tributários senão a Constituição Federal, pois são normas que definem o modo de aquisição e limitação do poder Estatal.

Esta atribuição de instituir tributos, à qual damos o nome de competência tributária, se dá por meio de  lei, único mecanismo para o seu exercício, razão pela qual apenas os entes estatais dotados de poder legislativo (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) é quem podem exercê-la.

A competência tributária é indelegável, não podem os entes políticos delegar a sua competência de instituir tributos para outro ente, assim, por exemplo, não pode a União delegar a sua competência de instituir o Imposto sobre Grandes Fortunas para o Estado ou o Município. O artigo 7° do Código Tributário Nacional dispõe expressamente acerca da impossibilidade de delegação da competência tributária.

“Art. 7°. A competência tributária é indelegável, salvo atribuição das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária, conferida por uma pessoa jurídica de direito público a outra, nos termos do § 3° do art. 18 da Constituição.”

A ressalva prevista neste dispositivo não diz respeito precisamente à competência tributária, mas sim à capacidade tributária, esta sim, delegável.  A capacidade tributária deve ser entendida como a capacidade de determinado ente ser sujeito ativo tributário, realizando atos de arrecadação, fiscalização e execução de leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária.

Observe que a capacidade tributária em nada se confunde com a competência tributária, pois enquanto a primeira pode ser atribuída pela Constituição ou pela lei, é passível de delegação, exercida mediante atos administrativos e pode ser revogada a qualquer tempo por ato unilateral da pessoa jurídica que a tenha conferido; a segunda, só pode ser atribuída pela Constituição, não é passível de delegação, é exercida por lei e só pode ser modificada por Emenda Constitucional.

A competência tributária e a capacidade tributária em princípio andam juntas, mas a lei pode delegar a capacidade tributária a outro ente. Assim, teremos um ente com a competência de instituir o tributo, dispor sobre seu aspecto temporal, pessoal, material e espacial; e outro ente responsável pela arrecadação, fiscalização e execução de leis, serviços, atos ou decisões administrativas.

A Emenda Constitucional n° 42/2003, dando nova redação ao artigo 153, §4°, III da Carta Magna, nos traz um típico exemplo de delegação administrativa ao possibilitar a fiscalização e cobrança pelos Municípios do Imposto Territorial Rural, o qual é de competência tributária da União.

A lei 11.250/2005 ao regular o dispositivo constitucional nuper, consignou em seu artigo 1°, §1° que deverá ser observada a legislação de regência do Imposto de Propriedade Territorial Rural. Observe que dado texto normativo só vem a alertar que no que pese a delegação administrativa ao Município, este deverá obedecer à lei federal de regência do Imposto Territorial Rural, pois a competência tributária é indelegável e, neste caso, continua com a União, por força do artigo 153, VI da Constituição Federal.

Ainda no tocante à delegação administrativa a pessoa jurídica de direito público ao receber a atribuição delegada, a reboque também recebe as garantias e os privilégios processuais que competem à pessoa jurídica delegante. Assim, por expressa previsão do § 1° do art. 7° do CTN, os prazos em dobro para recorrer e em quádruplo para contestar são estendidos a estas pessoas jurídicas.

Mesmo tacitamente a competência tributária é indelegável, tal afirmativa se extrai do art. 8° do CTN ao dispor que o não exercício da competência tributária não a defere a pessoa jurídica diversa daquela a que a Carta Magna tenha disposto. Assim, ainda aproveitando o exemplo do Imposto Sobre Grandes Fortunas, o fato de a União não ter instituído o imposto previsto em sua competência tributária não defere ao Estado ou ao Município o exercício desta competência. Contudo, o não exercício desta competência pelo ente político pode ocasionar sanções, conforme previsão na Lei de Responsabilidade Fiscal.

Dessa forma, o texto constitucional delimita a esfera de competência de cada ente federativo, a imunidade tributária, como veremos, pincela determinadas situações, retirando-as de dentro dessa esfera de competência, de tal forma a impedir a sua tributação. 

CONCEITO DE IMUNIDADE TRIBUTÁRIA

O Professor Paulo de Barros Carvalho traz o seguinte conceito de imunidade:

“A classe finita e imediatamente determinável de normas jurídicas, contidas no texto da Constituição Federal, que estabelecem de modo expresso a incompetência das pessoas políticas de direito interno, para expedir regras instituidoras de tributos que alcancem situações específicas e suficientemente caracterizadas.” (Curso de direito tributário. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 178)

Em termos simples quando falamos que uma determinada pessoa está imune àquela doença, estamos dizendo que ela está protegida contra essa moléstia, não corre o risco de vir a contraí-la. Fazendo um paralelo com a imunidade tributária, quando falamos que determinada situação está imune, estamos explicitando que está protegida contra o poder de tributar do Estado, que não corre o risco de ser tributada.

Na conceituação deste instituto encontramos muitos doutrinadores que definem a imunidade como não-incidência constitucionalmente qualificada.

 Explicamos: Não-incidência, pois coloca uma determinada situação fora da incidência de uma regra de tributação.  Constitucionalmente, pois as hipóteses de imunidade estão previstas no texto constitucional e, por fim, qualificada, pois, ao contrário de uma circunstância simples de não-incidência, quando determinada situação deixa de ser definida como hipótese de incidência ou o ente político deixar de exercer a competência atribuída pela Constituição Federal (negativa), na imunidade temos uma previsão expressa (positiva) de hipótese de não-incidência.

IMUNIDADE X ISENÇÃO

Conceituada a imunidade, cabe-nos aqui diferenciá-la de outro instituto que é o da isenção. Esta diferenciação é constantemente cobrada em provas de concurso e exame da Ordem.

A imunidade atua no plano da definição da competência tributária, tem previsão constitucional e é uma hipótese de não-incidência qualificada; enquanto que a isenção atua no plano do exercício da competência tributária, é definida por lei infraconstitucional e é uma hipótese de exclusão do crédito tributário.

Definição da competência (imunidade) x exercício da competência (isenção).

A primeira e principal diferença a ser apontada entre a imunidade e a isenção é no tocante ao fato de que a primeira interfere na definição da competência e a isenção no seu exercício.  Assim, quando falamos que os papéis e revistas estão imunes ao ICMS, estamos dizendo que esta situação está fora da esfera de competência do Estado.

Por outro lado, se não existisse esta hipótese de imunidade, mas estivesse isenta por previsão legal, diríamos que o Estado tem a competência para cobrar o ICMS de revistas e papéis, mas resolveu não exercê-la, ao prever em lei Estadual que esta hipótese estaria isenta.

Previsão constitucional x previsão infraconstitucional

A imunidade está prevista no texto constitucional, mesmo naquelas situações em que a Constituição fala em isenção, está tratando de imunidade, pois todas as situações previstas na Constituição são imunidades e não isenção. Podemos grifar como exemplo o art. 195, § 7° da Constituição Federal que dispõe: “são isentas de contribuição para a seguridade social entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei”.

No caso deste artigo a expressão correta a ser empregada seria imunidade, a hipótese tem previsão constitucional. A primeira turma do Supremo Tribunal Federal assim se manifestou sobre o assunto ao decidir em sede de RMS 22.192/DF, Rel. Min. Celso de Mello, 28.11.1985, que a cláusula inscrita no art. 195 § 7° da Constituição Federal traduz-se em típica garantia de imunidade e não de simples isenção.

As isenções, por sua vez, se materializam nas leis infraconstitucionais, e nada mais são do que a dispensa no pagamento de um tributo. As isenções, ao lado da anistia, são consideradas hipóteses de exclusão do crédito tributário.

A diferenciação de tratamento da imunidade, em sede constitucional, e a isenção, em lei, têm uma razão de ser. Ocorre que cabe à Constituição Federal definir a competência de cada ente, razão pela qual apenas a Constituição pode excepcionar esta competência (imunidade). A isenção, como está a interferir apenas no exercício, este pode e deve ser disciplinado em lei.

Não incidência qualificada x exclusão do crédito tributário

Como já afirmado a imunidade interfere na própria definição de competência de determinado ente, enquanto a isenção pressupõe a competência de determinado ente para dispor acerca de determinada situação, e este ente o faz para excluir o crédito tributário.

SITUAÇÕES DE IMUNIDADE

Como já visto a Constituição Federal alberga as hipóteses de imunidade tributária presentes em nosso sistema jurídico pátrio. A maior concentração de imunidades está no art. 150 da Constituição Federal, mas outros dispositivos esparsos também trazem situações de imunidade.

IMUNIDADE RECÍPROCA (ART. 150 VI, “A” CF)

A imunidade recíproca está prevista no art. 150, VI, “a” da Constituição Federal ao vedar “à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir impostos sobre o patrimônio, a renda ou serviços, uns dos outros”.

Inicialmente cabe grifar que o texto constitucional ao tratar da imunidade recíproca falou em impostos, e não em tributos. Assim, apenas os impostos estão abrangidos por esta imunidade, podendo a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios cobrarem as demais espécies tributárias uns dos outros, dentre as quais podemos grifar como exemplo as taxas.

A presente limitação ao poder de tributar traduz-se em cláusula pétrea e protege o pacto federativo, na medida em que evita que um ente político esteja sujeito ao poder de tributar de outro. O Supremo Tribunal Federal assim já se manifestou em sede de ADIN. n.° 939.

O § 2° do art. 150 estende esta imunidade “às autarquias e às fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, no que se refere ao patrimônio, à renda e aos serviços, vinculados a suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes”. Assim, além da vedação de se cobrar impostos de um ente político em relação a outro, como proteção do pacto federativo, o Poder Constituinte também estende a mesma vedação em relação às autarquias e fundações públicas.

Cumpre grifar que a imunidade das autarquias e fundações públicas seria igual ao dos entes políticos, se não fosse a parte final deste parágrafo que restringe a imunidade para as finalidades essenciais ou às decorrentes desta finalidade. No caso dos entes políticos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) não há esta restrição, sendo que em qualquer circunstância um ente não poderá cobrar impostos do outro.

A título de exemplo consideremos que o Estado de Alagoas compre um terreno para a construção de um campo de futebol, neste caso ainda assim não poderá o Município cobrar IPTU ou ITBI daquela área. Por outro lado, se uma autarquia estadual (ex: DETRAN) vier a comprar uma área para a construção de um campo de futebol, neste caso estará sujeita ao pagamento do IPTU e ITBI.

O parágrafo 3° do art. 150 retira da hipótese de imunidade aquelas situações relacionadas à exploração de atividades econômicas, ao dispor que a imunidade recíproca, bem como a sua extensão às autarquias e fundações públicas “não se aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário...”.

A finalidade deste parágrafo é homenagear o princípio da isonomia, pois se a imunidade também fosse estendida para estas situações os entes políticos, bem como as autarquias e fundações públicas, iriam concorrer de forma desigual com as demais empresas privadas exploradoras daquela atividade econômica, podendo oferecer seus produtos e serviços em um preço mais baixo, pois não onerados com os impostos pagos pelas empresas daquele setor.

Igualmente, também naqueles casos em que haja a contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário a imunidade não alcança. Ocorre que nestes casos quem está arcando com a carga tributária não é o ente político, a autarquia ou a fundação, mas sim o usuário daquele produto ou serviço, razão pela qual não se há de falar em ofensa ao princípio do pacto federativo.

Na parte final do parágrafo em comento também fez consignar que a imunidade recíproca não exonera o promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel. Neste sentido o Supremo Tribunal Federal já havia editado a súmula 583 “promitente comprador de imóvel residencial transcrito em nome de autarquia é contribuinte do imposto predial territorial urbano.”

O presente dispositivo tem como finalidade evitar que particulares se esquivem de pagar impostos devidos com a compra de imóveis de entes cobertos sob o manto da imunidade. Ocorre que quando o particular firma compromisso irretratável de compra e venda com o Estado, por exemplo, o imóvel continua sendo do Estado, sendo que na ausência de dada disposição legal o particular estaria a salvo do pagamento de qualquer imposto até o cumprimento do compromisso, se valendo de imunidade que não lhe pertence.

 A presente imunidade está a indicar, expressamente, apenas os entes políticos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios, bem como as autarquias e fundações públicas, o que está a demonstrar, a princípio, que a presente imunidade não se estende às sociedades de economia mista e empresas públicas). Contudo, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a presente imunidade também se estende à sociedade de economia mista e empresas públicas na qualidade de prestadoras de serviços públicos de prestação obrigatória e exclusiva do Estado.

O presente entendimento da Corte Superior com relação às empresas públicas está consubstanciado no RE 407.099/RS, ao analisar a imunidade tributária em relação à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT, relator o Ministro Carlos Velloso, e consignada no informativo n° 353:

“INFORMATIVO Nº 353 TÍTULO  ECT e Imunidade Tributária Recíproca PROCESSO RE 407099 ARTIGO. A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT está abrangida pela imunidade tributária recíproca prevista no art. 150, VI, “a”, da CF, haja vista tratar-se de prestadora de serviço público de prestação obrigatória e exclusiva do Estado: ("Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: ...VI - instituir impostos sobre: a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;").Com base nesse entendimento, a Turma reformou acórdão do TRF da 4ª Região que, em sede de embargos à execução opostos por Município, entendera que a atual Constituição não concedera tal privilégio às empresas públicas, tendo em conta não ser possível o reconhecimento de que o art. 12 do Decreto-Lei 509/69 garanta o citado benefício à ECT. Afastou-se, ainda, a invocação ao art. 102, III, “b”, da CF, porquanto o tribunal a quo decidira que o art. 12 do mencionado Decreto-Lei não fora, no ponto, recebido pela CF/88. Salientou-se, ademais, a distinção entre empresa pública como instrumento de participação do Estado na economia e empresa pública prestadora de serviço público. Leia o inteiro teor do voto do relator na seção de Transcrições deste Informativo. Precedente citado: RE 230072/RJ (DJU de 19.12.2002). RE 407099/RS, rel. Min. Carlos Velloso, 22.6.2004.(RE-407099)”. Fonte:

http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(407099.PROC.)&base=baseInformativo

Com relação às Sociedades de Economia Mista prestadoras de serviço público, a imunidade recíproca também foi a esta reconhecida pela Corte Suprema em AC 1550, Rel. Min. Gilmar Mendes, consignada em informativo de n° 456, trazemos à colação parte do voto do Ministro Relator:

“...Conforme atestam os documentos juntados aos autos, a Companhia de Águas e Esgotos do Estado de Rondônia – CAERD é sociedade de economia mista prestadora do serviço público obrigatório de saneamento básico (abastecimento de água e esgotos sanitários) e, portanto, de acordo com a jurisprudência deste Tribunal, está abrangida pela imunidade tributária prevista no art. 150, inciso VI, “a”, da Constituição. Outro não foi o entendimento esposado pelo voto vencido no acórdão impugnado pelo recurso extraordinário (fls. 131-140): “Nitidamente, constata-se que de atividade econômica, estrito sensu, nada possui a CAERD, porquanto está a cargo de cumprir, como acentua sua lei de instituição, as metas das políticas de saneamento do Poder Público (...) Inegavelmente se trata de um manus público-estatal para cumprimento de mais uma atividade-obrigação do Estado, qual seja, o saneamento básico. (...)É de observar que a apelante, efetivamente, é prestadora de serviço público obrigatório, não podendo ser comparada às empresas privadas, devendo, portanto, ser beneficiada pela imunidade tributária.” (fls. 137-138)...”  Fonte:

(http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(1550.PROC.)&base=baseInformativo)  

A discussão do presente assunto passa pelo art. 173, § 1°, II que ao permitir ao Estado a exploração direta da atividade econômica, condicionando aos imperativos da segurança nacional ou relevante interesse coletivo, dispôs que as empresas públicas e sociedades de economia mista estarão sujeitas ao regime próprio das empresas privadas.

O entendimento da Suprema Corte é o de ressalvar desta regra aquelas empresas públicas e sociedades de economia mista que prestem serviços públicos que cabem ao Estado obrigatoriamente prestar. Assim, o Supremo Tribunal Federal não se ateve a uma interpretação literal do § 2° do art. 150 da Constituição Federal, mas buscou o fundamento da regra imunizante, estendendo a imunidade recíproca para as sociedades de economia mista e empresas públicas prestadoras de serviços públicos, pois são prestadoras de serviços obrigatórios, não devendo receber o mesmo tratamento das demais empresas privadas.

Em resumo, a imunidade recíproca alcança os entes políticos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), as autarquias e fundações públicas, bem como as sociedades de economia mista e empresas públicas, quando prestadoras de serviços públicos de prestação obrigatória pelo Estado.

IMUNIDADE DOS TEMPLOS DE QUALQUER CULTO (ART. 150 VI, “B” CF)

A imunidade dos templos de qualquer culto está prevista no art. 150 VI, “b” da Constituição Federal ao vedar à União, Estados, Distrito Federal e Municípios instituir impostos sobre templos de qualquer culto. A presente imunidade tem como escopo a proteção da liberdade religiosa prescrita no art. 5°, inciso VI da Carta Magna.

A presente norma imunizante não faz distinção de religiões, sendo que qualquer religião é alcançada pela imunidade, ressalvada aquelas que atentem contra os direitos humanos, tais como mutilações, prática de racismo etc. Não poderia ser diferente, o nosso Estado é laico, acredita em Deus, o que se comprova com a sua menção no preâmbulo da Constituição Federal, mas não temos uma religião oficial, razão pela qual os templos de todas as religiões estão imunes.

 Assim como para as autarquias e fundações públicas, nos termos do § 4° do art. 150, a imunidade para os templos de qualquer culto só abrange o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as suas finalidades essenciais. As considerações feitas acima para as autarquias e fundações públicas se aplicam aos templos de qualquer culto.

Contudo, chamamos a atenção do leitor para o entendimento do Supremo Tribunal Federal, consubstanciado no RE 325.822-SP, e publicado no informativo n° 295:

“INFORMATIVO Nº 295 TÍTULO Imunidade Tributária de Templos PROCESSO RE - 325822 ARTIGO A imunidade tributária concedida aos templos de qualquer culto prevista no art. 150, VI, b e § 4º, da CF, abrange o patrimônio, a renda e os serviços relacionados com as finalidades essenciais das instituições religiosas (CF, art. 150: "Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: ... VI - instituir impostos sobre: ... b) templos de qualquer culto. ... § 4º As vedações expressas no incisos VI, alíneas b e c, compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas"). Com esse entendimento, o Tribunal, por maioria, conheceu de recurso extraordinário e o proveu para, assentando a imunidade, reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, à exceção dos templos em que são realizadas as celebrações religiosas e das dependências que servem diretamente a estes fins, entendera legítima a cobrança de IPTU relativamente a lotes vagos e prédios comerciais de entidade religiosa. Vencidos os Ministros Ilmar Galvão, relator, Ellen Gracie, Carlos Velloso e Sepúlveda Pertence, que, numa interpretação sistemática da CF à vista de seu art. 19, que veda ao Estado a subvenção a cultos religiosos ou igrejas, mantinham o acórdão recorrido que restringia a imunidade tributária das instituições religiosas, por conciliar o valor constitucional que se busca proteger, que é a liberdade de culto, com o princípio da neutralidade confessional do Estado laico. RE 325.822-SP, rel. orig. Min. Ilmar Galvão, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, 18.12.2002. (RE-325822)” Fonte:

(http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(325822.PROC.)&base=baseInformativo).


A Corte Suprema decidiu que a imunidade se estende a lotes vagos e prédios comerciais de entidades religiosas, quando alugados e a renda é destinada às finalidades essenciais do ente. Assim, é vedada a cobrança de IPTU, por exemplo, de propriedades de entidades religiosas alugadas para particular, desde que os recursos sejam destinados às suas finalidades essenciais, pois abarcada está pela imunidade do art. 150, VI “b”.


IMUNIDADE DO PATRIMÔNIO, RENDA OU SERVIÇOS DOS PARTIDOS POLÍTICOS, INCLUSIVE SUAS FUNDAÇÕES, DAS ENTIDADES SINDICAIS DOS TRABALHADORES, DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO E DE ASSISTÊNCIA SOCIAL, SEM FINS LUCRATIVOS (ART. 150 VI, “C” CF) – VARGAS DIGITADOR – COMPLEMENTO DA AULA DO PROFESSOR EMERSON – DIREITO FAMESC – MAI/2015

O art. 150 VI, “a” da Constituição Federal veda à União, Estados, Distrito Federal e Municípios a instituição de impostos sobre o “patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei.”. A presente vedação em tributar tem seu fundamento na necessidade de se preservar os instrumentos asseguradores da Democracia (art. 1°, V da CF), na liberdade de associação sindical (art. 8° da CF) e no fomento de iniciativas de caráter social (art. 6° da CF).

Na leitura do presente dispositivo, verificamos a concessão de imunidade para três destinatários:

1. Partidos políticos e suas fundações;

2. Entidades sindicais dos trabalhadores;

3. Instituições de educação e assistência social, sem fins lucrativos.

No que pertine aos partidos políticos é imprescindível o seu registro no Tribunal Superior Eleitoral - TSE.  É com o registro no Tribunal Superior Eleitoral que o partido político adquire personalidade jurídica e passa a ser beneficiário desta proteção ao poder de tributar.

Quanto às entidades sindicais dos trabalhadores, cumpre grifar que a regra exclui os sindicatos patronais.  Assim, apenas as entidades sindicais dos empregados é que são beneficiárias desta imunidade, não se estendendo às dos empregadores.

A imunidade tributária também é dirigida às instituições de educação e assistência social, condicionando a que estas sejam sem fins lucrativos. Este condicionamento se dirige apenas ao item três, pois as Entidades Sindicais dos Trabalhadores e os Partidos Políticos e suas fundações são, por essência, sem fins lucrativos.

Ainda quanto ao condicionamento de atuação sem fins lucrativos, o inciso em exame dispôs ao final a expressão “atendidos os limites da lei”. A presente lei que se está a exigir é a complementar, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 146, II, pois se está a versar sobre limitação constitucional ao poder de tributar.

No presente caso, o texto normativo a tratar dos requisitos para a concessão da imunidade é o Código Tributário Nacional, que com o fenômeno da recepção recebeu status de lei complementar. O seu artigo 14 elenca os seguintes requisitos a serem observados pelas instituições de educação e assistência social: (...)

“I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título”;

“II – aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais”;

“III – manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.”

O parágrafo primeiro do artigo em comento dispõe que o não cumprimento de um destes requisitos possibilita a autoridade competente a suspender a aplicação do benefício. No que pese o parágrafo consignar a expressão “pode”,  esta deve ser entendida como deve, pois a autoridade neste caso está vinculada à lei que dispôs expressamente os requisitos a serem preenchidos para a concessão da imunidade, por se tratar de limitação ao poder de tributar.

Por sua vez, a imunidade não é irrestrita, e só abrange o patrimônio, renda e serviços vinculados às suas finalidades essenciais, nos termos do § 4° do artigo 150. Contudo, neste ponto o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento que mesmo que o imóvel esteja alugado para terceiros, ainda assim permanece imune, desde que a renda seja revertida para as suas finalidades essenciais.

Neste sentido colacionamos a súmula 724 do Supremo Tribunal Federal:

“Súmula 724 - Ainda quando alugado a terceiros, permanece imune ao IPTU o imóvel pertencente a qualquer das entidades referidas pelo art. 150, VI, “c”, da Constituição Federal, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades principais de tais entidades”.

O presente posicionamento é o mesmo aplicado para a imunidade dos templos de qualquer culto, consubstanciado na ideia de que ainda que o patrimônio não seja diretamente explorado para finalidade essencial do ente, se os recursos de sua exploração forem revertidos integralmente para esta finalidade, considera-se cumprida a exigência constitucional.

CONCLUSÃO

A imunidade tributária tem raiz constitucional, pois interfere na própria competência do ente tributante. Este instituto tem o poder de retirar do âmbito de competência de um ente determinadas situações jurídicas, blindando-as da possibilidade de serem tributadas.

A imunidade se diferencia da isenção, pois atua no plano da competência tributária, tendo previsão constitucional; enquanto que a isenção atua no plano do exercício da competência tributária e tem sede infraconstitucional, excluindo o crédito tributário.

Por atuar no plano da competência tributária, revelando-se autêntica limitação ao poder de tributar, as suas situações têm que vir expressamente consignadas no texto constitucional. Neste diapasão, observamos que as imunidades tributárias estão espalhadas por toda a Constituição Federal, mas a sua maior concentração é no art. 150, situado topologicamente na seção “das limitações ao poder de tributar”.

Para tratar minudentemente de cada uma das situações de imunidade tributária seria preciso escrever um livro, dada a riqueza de discussões acerca do tema, não só pela doutrina pátria, mas, sobretudo, pelos Tribunais Superiores.  O estudo do tema à luz das decisões do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça é imprescindível para uma melhor compreensão do instituto, seu alcance e sua aplicabilidade prática.

Assim, o estudo da imunidade tributária não se esgota com a leitura isolada de artigos ou livros, estes são apenas pequenas peças de um grande quebra-cabeça de um dos mais intrigantes institutos do universo jurídico, tendo este artigo uma participação mínima na compreensão do todo.

Referências

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COELHO, Sacha Calmon Navarro. Imunidades tributárias. Coordenador Ives Gandra da Silva Martins, São Paulo: Revista dos Tribunais, Pesquisas Tributárias, Nova Série - 4, 2001.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional esquematizado. 11ª ed. São Paulo: Editora Método, 2007.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário – 30ª ed. Malheiros Editores – São Paulo - 2009.

MACHADO, Hugo de Brito. Imunidades tributárias. Coordenador Ives Gandra da Silva Martins, São Paulo: Revista dos Tribunais, Pesquisas Tributárias, Nova Série - 4, 2001.

MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional – 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 2008.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional – 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2007.

NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de direito tributário. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.

PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 11ª ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado; EMAFE, 2009.



Informações Sobre o Autor Alexandre Machado de Oliveira


Juiz de Direito Substituto do Estado de Alagoas. Procurador do Estado de Roraima 2004-2008. Chefe da Procuradoria Fiscal 2004. Membro do Conselho Superior da Procuradoria Geral do Estado de Roraima 2004-2006. Professor Contratado da Universidade Federal de Roraima 2004-2005 (Direito Tributário e Comercial). Professor do Alagoas Cursos 2009 (Tributário). Professor do Centro de Ensino Superior de Maceió – CESMAC (Administrativo). Juiz Membro da Turma Recursal da Segunda Região – Arapiraca. Especialista em Direito Processual Civil

segunda-feira, 20 de julho de 2015

COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA. SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL- VARGAS DIGITADOR



COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA. SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL- VARGAS DIGITADOR – FONTE: PROFESSOR EMERSON – 8º PERÍODO DIREITO FAMESC – 1º SEMESTRE 2015.

1.     COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA

A competência tributária é a habilidade privativa e constitucionalmente atribuída ao ente político para que este, com base na lei, proceda à instituição de exação tributária.
Em outras palavras “competência tributária é a aptidão para criar tributos (...). o poder de criar tributos é repartido entre os vários entes políticos, de modo que dada um tem competência para impor prestações tributárias, dentro da esfera que lhe é assinada pela Constituição”.
A Constituição Federal consagrou o princípio do federalismo (art. 60, §4º, I, da CF), delimitando entre as pessoas políticas (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios) o poder de tributar.

Kiyoshi Harada, discorrendo sobre o convívio das entidades impositoras, ensina que “a ausência de hierarquia entre elas fez que o Texto Magno estabelecesse a repartição da competência legislativa de cada uma, delimitando o campo de atuação de cada pessoa jurídica de direito público interno, notadamente em matéria tributária, que mereceu um tratamento específico em atenção à tipicidade da Federação Brasileira, onde o contribuinte é súdito, ao mesmo tempo de três governos distintos. (...) A essa atribuição de impostos a cada uma das entidades políticas, de forma privativa estabelecida na Carta Política, denomina-se discriminação constitucional de rendas tributárias.

A atribuição de competência tributária às pessoas jurídicas de Direito Público está prevista nos arts. 153 a 156 da Constituição Federal, dividindo-se entre elas o poder de instituir e cobrar tributos. Desse modo, cada entidade impositora está obrigada a comportar-se nos limites da parcela de poder impositivo ou potestade tributária que lhe foi atribuída pela Constituição.
A atribuição constitucional de competência tributária compreende a competência legislativa plena (art. 6º, CTN). Nesse contexto, diz-se que há, em nossa ordem constitucional, coincidência da competência legislativa com a competência tributária. Todavia, deve-se notar que a competência tributária, como poder de instituição de tributo, não se confunde com a competência para legislar sobre Direito Tributário. Esta é genérica; aquela, específica. Tal competência para legislar é denominada competência concorrente, conforme o art. 24 da CF.
Insta mencionar que todos os entes tributantes estão obrigados a observar as normas gerais de Direito Tributário, as quais estarão estabelecidas em leis complementares, conforme determina o art. 146, III, da CF.

1.1  Competência tributária e capacidade tributária ativa
Competência tributária é indelegável, intransferível, inalterável e irrenunciável, uma vez que admitir a delegação de competência para instituir um tributo é admitir que seja a Constituição alterada por norma infraconstitucional.

Art. 8º do CTN. O não exercício da competência tributária não a defere a pessoa jurídica de direito público diversa daquela a que a Constituição a tenha atribuído.

A competência tributária é política e indelegável (art. 7º, caput, CTN), não se confundindo com a capacidade tributária ativa, que é “administrativa e delegável”.

No entanto, a delegação de atribuições administrativas, por exemplo, a transferência das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos a outra pessoa jurídica de Direito Público, o que não se confunde com a imprópria “a delegação de competência tributária”, consoante o disposto no art. 7º,  § 3º, CTN.

Art. 7º. (...)
§3º. Não constitui delegação de competência o cometimento, a pessoa de direito privado, do encargo ou da função de arrecadar tributos.

Tal transferência tem sido chamada na doutrina de atribuição de capacidade tributária ativa. No Brasil, o presente episódio é comum a certas autarquias (entidades corporativas, como o CREA, CRC, CRM, CRECI etc.), que recebem da União a atribuição de exigir um tributo – a contribuição profissional ou corporativa (art. 149, caput, CF) – dos profissionais vinculados àquelas entidades profissionais.

Art. 7º, CTN. A competência tributária, salvo atribuição das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária, conferida por uma pessoa jurídica de direito público a outra (...)

Frise-se que, na esteira da delegação das atribuições administrativas, seguem, também, aas garantias e privilégios processuais da fazenda pública, como por exemplo, a capacidade processual para o ajuizamento de execução fiscal, conforme a dicção do art. 7º, § 1º, CTN:

Art. 7º (...).
§1º. A atribuição compreende as garantias e os privilégios processuais que competem à pessoa jurídica de direito público que a conferir.

Com efeito, a pessoa jurídica que detém capacidade tributária ativa poderá ocupar o polo ativo da relação juridicotribrutária, na condição de “sujeito ativo”, pois é titular do poder de exigir o tributo, conforme o art. 119 do CTN:

Art. 119. Sujeito ativo da obrigação é a pessoa jurídica de direito público, titular da competência para exigir o seu cumprimento.

Por fim, impende mencionar que a atribuição das funções administrativas, no bojo da delegação de capacidade tributária ativa, pode indicar, por determinação legal, que os recursos arrecadados serão de livre disponibilidade da entidade delegatária, para fins de sustentação das finalidades precipuamente institucionais. Quando tal circunstância ocorre, exsurge o fenômeno conhecido como parafiscalidade, o que impõe, em certos casos, a denominação das contribuições especiais, previstas no art. 149, caput, da CF, de contribuições parafiscais.

Entretanto, não se pode confundir a parafiscalidade com a chamada sujeição ativa  auxiliar”, quando ocorre a arrecadação do tributo pelo ente delegatário, mas em nome do ente político competente para instituir o tributo. Vale dizer que o “sujeito ativo auxiliar”, diferentemente da  entidade parafiscal, é um mero agente que tem a função de recolher e repassar o tributo ao ente público. Assim, é dado relevante nessa sistemática saber para quem se dirige o produto da arrecadação. Exemplo: quando pagamos a conta de luz ou de telefone à concessionária respectiva, ali seguirá o ICMS recolhido. A entidade arrecadadora deverá repassá-lo ao Estado-membro, na condição de mera intermediária no processo arrecadatório dessa exação estadual.

1.2  Classificação da competência tributária

1.2.1     Competência privativa
É o poder que têm os entes federativos para instituir impostos que são enumerados exaustivamente na Constituição Federal. Nesse passo, “designa-se privativa a competência para criar impostos atribuída com exclusividade a  este ou àquele ente político.”

Trata-se, pois, de competência privativa, no sentido de que a própria Constituição já determina o rol dos impostos relativos a cada ente tributante. O art. 153 da CF enumera os impostos estaduais, de competência privativa dos Estados e Distrito Federal, e os arts. 156 e 147, parte final, ambos da CF, enumeram os impostos municipais, de competência privativa dos Municípios e Distrito Federal. Isso porque “a Constituição não cria tributos; ela outorga competência tributária, ou seja, atribui aptidão para criar tributos”.

Incluem-se, ademais, na competência privativa o poder para a criação de outros tributos, diversos dos impostos.

No plano de instituição da União, destacam-se (I) o Empréstimo Compulsório (art. 148, CF) e (II) as Contribuições Especiais (art. 149, caput, CF).

Já o plano de instituição pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, à luz da competência privativa, teremos: (I) as contribuições sociais para custeio do Sistema de Previdência e Assistência Social de seus próprios servidores (art. 149, § 1º, CF), de competência dos Estados, Distrito Federal e Municípios, e (II) a Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP ou COSIP – art. 149-A, CF – EC n. 39/2002), de competência dos Municípios e Distrito Federal.

Portanto, a competência privativa é o poder legiferante das entidades tributantes (União, Estados, Municípios e Distrito Federal), quanto à criação de tributos que lhes são genuína e exclusivamente peculiares.

2.2.2. Competência comum

A competência tributária comum, está relacionada aos tributos chamados vinculados, isto é, às taxas e às contribuições de melhoria. Para estes, não se estipularam “listas” enumeradas na Constituição Federal, indicando com exclusivismo, a entidade tributante correspondente ao plano de instituição do tributo vinculado respectivo. Com efeito, se pensamos no IPI, logo detectamos a pessoa política detentora de competência tributária – a União.  O mesmo raciocínio estende-se aos demais impostos. Todavia, não é possível fazê-lo com os tributos vinculados. Assim, a competência comum, indica que, “de modo comum”, União, Estados, Municípios ou Distrito Federal, poderão ser sujeitos ativos das taxas ou contribuições de melhoria, desde que realizem os fatos geradores de tais gravames contraprestacionais.

Para Ricardo Lobo Torres, “competência comum é a atribuída a cada ente político para impor os tributos, guardado, entretanto, o vínculo entre o tributo e o serviço prestado ou a atividade exercida. A competência comum se restringe aos tributos contraprestacionais (taxas, contribuições de melhoria e contribuições previdenciárias dos servidores públicos), donde se segue que é devido ao ente que houver entregue a prestação. Aparece nos arts. 145, II e III, e 149, parágrafo único”.

Exemplos: se um Estado-membro prestar um serviço público específico e divisível – um fato gerador de taxa (art.79, II e III, CTN), despontará uma taxa estadual; se um Município realizar uma obra pública da qual decorra valorização imobiliária – o fato gerador de contribuição de melhoria (art. 81, CTN), despontará uma contribuição de melhoria.

2.2.3     Competência cumulativa

A competência cumulativa ou múltipla, prevista no  art. 147 da CF, prende-se ao poder legiferante de instituição de impostos pela União, nos Territórios Federais, e pelo Distrito Federal em sua base territorial.

O dispositivo faz menção tão somente a impostos, porém é comando plenamente aplicável às demais espécies tributárias, por exemplo, às taxas e às contribuições de melhoria.

Art. 147. Competem à União, em Território Federal, os impostos estaduais e, se o território não for dividido em Municípios, cumulativamente, os impostos municipais, ao Distrito Federal cabem os impostos municipais.

Compete à União, nos Territórios, os impostos federais, estaduais e os municipais, desde que, com relação a estes últimos, os Territórios não sejam divididos em municípios. (ex.: o caso antigo do arquipélago de Fernando de Noronha).

Desse modo, a União deve instituir os impostos federais e estaduais, nos Territórios, em qualquer caso. Os impostos municipais, por sua vez, serão de competência da União, respeitada a condição anunciada, isto é, a inexistência de municípios no Território. A contrario sensu, se houver municípios nos Territórios, competirão aos próprios municípios os impostos municipais respectivos. Assim, caso o Território seja dividido em Municípios, a competência destes, com relação aos impostos municipais, permanecerá incólume.

Curiosamente, tal competência cumulativa impõe efeitos no plano da isenção dos impostos, uma vez que o poder de instituir o gravame é correlato ao poder de isentá-lo. Nessa medida, dir-se-ia que compete à União, nos Territórios, ipso facto, isentar os impostos federais, estaduais e municipais, respeitada, quanto a estes, a condição já anunciada, sem que se macule o princípio constitucional constante do art. 151, III, CF.

Art. 5-A. É vedado à União: (...)

III – Instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios.

Exemplo: seria constitucional uma lei federal, isentante de IPTU, para município localizado em Território, cuja base territorial não venha dividida em circunscrições administrativas autônomas municipais. Tratar-se-ia da intitulada “isenção autonômica ou autônoma”.

No tocante ao Distrito Federal, a parte final do art. 147 da CF sinaliza que a ele competem os impostos municipais. Aliás, como é cediço, o Distrito Federal não pode ser dividido em municípios (art. 32,CF).

Em interpretação sistemática com o caput do art. 155 da CF, conclui-se que, cumulativamente, competem ao Distrito federal, os impostos municipais e os estaduais, isto é, seis impostos (IPTU, ISS, ITBI, ICMS, IPVA, ITCMD).

2.2.4     Competência especial

A competência especial traduz-se no poder de instituir os empréstimos compulsórios (art. 148, CF) e as contribuições especiais (art. 149, CF), justificando-se tal classificação pelo fato de terem subsistido, durante largo período, inúmeras polêmicas acerca da natureza tributária desses dois tributos.

Os empréstimos compulsórios são tributos autônomos, com cláusula de restituição, instituídos pela União, por lei complementar, em face de três pressupostos fáticos: (I) calamidade pública, (II) guerra extrema, (III) investimento público de caráter urgente e relevante interesse nacional (art. 148, I e II,CF c/c art. 15, I e II, CTN). Nesse passo, entende-se superada, de modo incontroverso, antiga Súmula n. 418 do STF (“O empréstimo compulsório não é tributo, e sua arrecadação não está sujeita à exigência constitucional da prévia autorização orçamentária”).

Da mesma forma, é inafastável a natureza tributária das contribuições especiais, isto é, tributos finalísticos à semelhança dos já mencionados empréstimos compulsórios, não se lhes aplicando – a ambos! – o art. 4º, I e II, CTN.

Tais contribuições especiais, de âmbito federal, constam do art. 149, caput da CF. Podem ser assim denominadas: contribuições profissionais ou corporativas; contribuições interventivas ou CIDEs; e contribuições social-previdenciárias (art. 195, CF). No art. 149, §1º da CF, exsurgem as contribuições sociais estaduais ou municipais, para os servidores públicos dos Estados, Distrito Federal e Municípios. Ademais, desponta no art. 149-A da CF, uma contribuição municipal, de competência dos Municípios e do Distrito Federal – a Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP ou COSIP).

2.2.5     Competência residual

A competência residual ou remanescente encontra guarida em dois dispositivos do texto condicional: o art. 154, I, e o art. 195, §4º. A temática alia-se ao poder de instituir o tributo diverso daqueles já existentes. Daí se falar em competência residual, na acepção “daquilo que resta, de algo genuinamente restante ou residuário”.

Para Luciano Amaro, “diz-se residual a competência (atribuída à União) atinente aos outros impostos que podem ser instituídos sobre situações não previstas”.

O art. 154, I, CF trata da competência residual para os impostos, o art. 195, §4º, CF dispõe acerca da competência remanescente das contribuições para a seguridade social.

I – mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição: (...) trata-se do dispositivo que hospeda a competência residual para os impostos.

No campo dos impostos, a competência residual indica que o imposto novo deverá ser instituído, por lei complementar, pela União, obedecendo-se a duas limitações: (I) respeito ao princípio da não cumulatividade; e (II) proibição de coincidência entre o seu fato gerador ou a sua base de cálculo de outros impostos.

Assim, o imposto novo, não poderá incidir em cascata, gerando uma sobreposição de incidências, à semelhança do ICMS e do IPI (Ver art. 155, §2º, I, CF e art. 153, §3º, II, CF, respectivamente). Além disse, deverá haver uma inovação estrutural, no cotejo com os demais impostos, o que torna a sua instituição bastante dificultosa.

Quanto às contribuições para a seguridade social, o raciocínio é parcialmente idêntico, haja vista a imposição constante do art. 195, §4º, CF, que atrela a matéria ao comando inserto no art. 154, I, CF.

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta ou indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: (...)

§4º. A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I.

Sendo assim, dir-se-ia que as contribuições para a seguridade social residuais devem respeitar os seguintes parâmetros:

     a)    Instituição, por lei complementar, pela União;
     b)    Respeito ao princípio da não cumulatividade;
    c)     Proibição de coincidência entre o seu fato gerador ou a sua base de cálculo de outras contribuições (e não de impostos!).
Desse modo, a competência residual ou remanescente pode estar associada a impostos ou a contribuições para a seguridade social, sempre no bojo de lei complementar, o que veda, de pronto, seu exercício por medida provisória (art. 62, §1º,  III, CF).

2.2.6     Competência extraordinária


A competência extraordinária é o poder de instituição, pela União, por lei ordinária federal, do imposto extraordinário de guerra (IEG), conforme se depreende do art. 154, II, da CF c/c o art. 76 do CTN. A instituição por lei ordinária não inviabiliza a possível criação por medida provisória, uma vez que esta, como se sabe, é vedada tão só para os casos adstritos à lei complementar (ver art. 62, §1º, III, CF).

Na CF:

Art.154. A União poderá instituir (...)

II – na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários compreendidos ou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos gradativamente, cessadas as causas de sua criação.

No CTN:

Art. 76. Na iminência ou no caso de guerra externa, a União pode instituir, temporariamente, impostos extraordinários compreendidos ou não entre os referidos nesta Lei, suprimidos, gradativamente, no prazo máximo de cinco anos, contados da celebração da paz.

O IEG poderá ser criado na situação de beligerância, na qual se vir inserido o Brasil com o intuito de gerar receitas extras à manutenção de nossas forças armadas. Assim, o contexto é restritivo: guerra externa, iminente ou eclodida, e não uma mera “guerra civil”.

Um ponto de extremo relevo deve ser enfatizado: o fato gerador da indigitada exação não será a guerra! Também não pode conter ele a materialidade de tributo diverso de imposto, como por exemplo, a taxa. A parte final do inciso II do art. 14, sinalizou que o IGE poderá, estando ou não compreendido no campo da competência da União, conter fato gerado de qualquer imposto ou até de um fato gerador novo, não havendo limitação quanto à sua estrutura de incidência. Trata-se de uma permissão expressa na Constituição Federal para a bitributação e para o  bis in idem, uma vez ampla a liberdade de escolha do fato imponível para o IEG.

Tal imposto, sendo criado, terá exigência imediata, pois se trata de exceção às anterioridades anual e nonagesimal (art. 150, §1º, CF).

O gravame do IEG tem índole provisória, uma vez que cessadas as causas de sua criação, deve desaparecer. Conforme o texto constitucional, o imposto pode até perdurar após a celebração da paz, desde que seja gradativamente extinto. A esse respeito, tentou o CTN (art. 76) ser mais preciso, dispondo que a cobrança do imposto será suspensa, no prazo máximo de 5 anos, a contar da data da celebração da paz. Portanto, é vedado o interregno temporal superior a um quinquênio entre a celebração da paz e a extinção do imposto.

O referido imposto é uma receita pública que se enquadra como “extraordinária”, ou seja, um ingresso que ocorre em situação de excepcionalidade, com forte caráter temporário.

SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva 2015.

TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 14.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007.