quinta-feira, 19 de abril de 2018

CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO – Art 502 - Da Coisa Julgada – Vargas, Paulo S. R.



CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO – Art 502 - Da Coisa JulgadaVargas, Paulo S. R.


PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XIII  – DA SENTENÇA E DA COISA JULGADA – Seção V – Da Coisa Julgada - vargasdigitador.blogspot.com

Art 502. Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso.

Correspondência no CPC/1973, art 467, com a seguinte redação:

Art 467. Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário.

1.    COISA JULGADA FORMAL E COISA JULGADA MATERIAL

Em todo processo, independentemente de sua natureza, haverá a prolação de uma sentença (ou acórdão nas ações de competência originária dos tribunais), que em determinado momento torna-se imutável e indiscutível dentro do processo em que foi proferida. Para tanto, basta que não seja interposto o recurso cabível ou ainda que todos os recursos cabíveis já tenham sido interpostos e decididos. Na excepcional hipótese de aplicação do art 496 do CPC, ainda que não seja interposta apelação contra a sentença, haverá o reexame necessário, de forma que o processo só chegará ao seu final, após essa análise obrigatória da decisão pelo tribunal de segundo grau. A partir do momento em que não form mais cabível qualquer recurso ou tendo ocorrido o exaurimento das vias recursais, a sentença transita em julgado.

          Esse impedimento de modificação da decisão por qualquer meio processual, dentro do processo em que foi proferida, é chamado tradicionalmente de coisa julgada formal, ou ainda de preclusão máxima, considerando-se tratar de fenômeno processual endoprocessual. Como se pode notar, qualquer que seja a espécie de sentença – terminativa ou definitiva – proferida em qualquer espécie de processo – conhecimento (jurisdição contenciosa e voluntária), execução, cautelar – haverá num determinado momento processual o trânsito em julgado e, como consequência, a coisa julgada formal.

          Se todas as sentenças produzem coisa julgada formal, o mesmo não pode ser afirmado a respeito da coisa julgada material. No momento do trânsito em julgado e da consequente geração da coisa julgada formal, determinadas sentenças também produzirão, nesse momento procedimental, a coisa julgada material, com projeção para o do processo, tornando a decisão imutável e indiscutível além dos limites do processo em que foi proferida. Pela coisa julgada material, a decisão não mais poderá ser alterada ou desconsiderada em outros processos.

          Essa imutabilidade gerada para fora do processo, resultante da coisa julgada material, atinge tao somente as sentenças de mérito proferidas mediante cognição exauriente, de forma que haverá apenas coisa julgada formal nas sentenças terminativas ou mesmo em sentenças de mérito, desde que proferidas mediante cognição sumaria, como ocorre para a maioria doutrinária na sentença cautelar. Como se nota, a coisa julgada material depende da coisa julgada formal, mas o inverso não acontece. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 836/837. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

2.    COISA JULGADA TOTAL E PARCIAL

Havendo na sentença vários capítulos, a parte sucumbente poderá em seu recurso optar por impugnar todos eles (recurso total) ou somente alguns (recurso parcial). Esses diferentes capítulos poderão ser autônomos e independentes ou apenas autônomos, sendo tal distinção de suma importância para inúmeras consequências processuais, interessando, nesse momento, a formação da coisa julgada.

          Sendo os capítulos tao somente autônomos, ainda que a parte impugne somente parcela deles, não há que falar em coisa julgada do capitulo não impugnado, porque em razão do efeito expansivo objetivo externo do recurso, dependendo do resultado de seu julgamento, o capitulo não impugnado poderá ser reformado. Tome-se, como exemplo, o capítulo não impugnado que condena a parte ao pagamento das verbas de sucumbência; é natural que, sendo essa parte vitoriosa no recurso em que impugna o capítulo principal (por exemplo, sua condenação a pagar), consequentemente o capítulo referente às verbas de sucumbência, ainda que não impugnado, será reformado.

          Para considerável parcela doutrinária, sendo os capítulos autônomos e independentes, a impugnação de somente alguns deles faz com que os capítulos não impugnados transitem em julgado. Sendo capítulos de mérito, com o trânsito em julgado produzirão coisa julgada material, de forma que essa corrente doutrinária entende perfeitamente possível que a coisa julgada material se forme de maneira fragmentada, já tendo a tese tido acolhida pelo Supremo Tribunal Federal (STF, Tribunal Pleno, AP 470 QO/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 13.11.2013, DJe 19.02.2014) inclusive com a indicação de diferentes termos iniciais para o prazo da ação rescisória (STJ, 1ª Turma, RE 666.589/DF, rel Min. Marco Aurélio, j. 05.03.2014, DJe 03.06.2014).

          Registre-se que, apesar do correto raciocínio desenvolvido pelos renomados doutrinadores que defendem a tese da “coisa julgada parcial”, o Superior Tribunal de Justiça rejeita o entendimento, firme no sentido de que o trânsito em julgado (e por consequência a coisa julgada material nas sentenças de mérito proferidas com cognição exauriente) só ocorre após o julgamento do último recurso interposto, independentemente do âmbito de devolução desse recurso ou dos anteriores, para se evitar o inconveniente de vários trânsitos em julgado no mesmo processo (STJ, Corte Especial, Resp 736.650/MT, rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, j. 20.08.2014, DJe 01.09.2014). (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 837. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

3.    CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA

A doutrina é unânime em associar a coisa julgada material à imutabilidade da decisão judicial de mérito que não pode ser mais modificada por recursos ou pelo reexame necessário, na específica hipótese prevista pelo art 496 do CPC. Existe, entretanto, robusta polêmica a respeito do que exatamente se torna imutável em razão do fenômeno da coisa julgada material, sendo possível destacar três correntes doutrinárias.

          Majoritariamente, a doutrina pátria adota o entendimento de Liebman, afirmando que a coisa julgada é uma qualidade da sentença que torna seus efeitos imutáveis e indiscutíveis. Para essa parcela doutrinária, após o trânsito em julgado da sentença – ou acórdão – de mérito, os efeitos projetados no plano prático por essa decisão não mais poderão ser discutidos em outra demanda, ou mesmo pelo legislador, o que seria suficiente para concluir que tais efeitos não poderão ser modificados, estando protegidos pelo “manto” da coisa julgada material. A intangibilidade das situações jurídicas criadas ou declaradas, portanto, seria a principal característica da coisa julgada material.

          Em crítica a essa corrente doutrinária, parcela da doutrina entende que os efeitos da sentença de mérito transitada em julgado não se tornam imutáveis, bastando para chegar a tal conclusão a verificação empírica de que tais efeitos poderão ser modificados por ato ou fato superveniente, mormente pela vontade das partes.

          O efeito principal da sentença condenatória, que é permitir a prática de atos materiais de execução, só pode ser gerado uma vez, sendo inadmissível a existência de sucessivas execuções fundadas numa mesma sentença. Na sentença declaratória, a certeza jurídica pode ser afastada por ato das partes, como na hipótese de dívida declarada e posteriormente quitada pelo devedor ou na ação de investigação de paternidade julgada improcedente com o posterior registro voluntário realizado pelo réu da paternidade do autor. Por fim, da sentença constitutiva, é possível voltar à mesma situação jurídica existente antes da coisa julgada material, servindo de exemplo o novo casamento entre pessoas divorciadas judicialmente.

          Para essa corrente doutrinária, é o conteúdo da decisão, contida em sua parte dispositiva, que se torna imutável e indiscutível em razão da coisa julgada material. Antes da coisa julgada, a sentença era mutável e com o fenômeno jurídico ora analisado passa por uma modificação de sua condição jurídica, tornando-se imutável. A coisa julgada, portanto, não seria uma qualidade da sentença que opera sobre seus efeitos, mas uma situação jurídica que torna uma sentença imutável e indiscutível.

          Para uma terceira parcela doutrinária, firme em lições do direito alemão, toda sentença tem um elemento declaratório, consubstanciado na aplicação da norma abstrata da lei ao caso concreto. Esse elemento declaratório tem como efeito a certeza jurídica de que, diante dos fatos alegados e considerados pelo juiz, o direito material conforme declarado pela sentença existe. Nesse sentido, reconhecendo que outros efeitos da sentença poderão ser modificados por ato e fatos supervenientes, mormente pela vontade das partes, essa corrente doutrinária limita aos efeitos da declaração da norma abstrata ao caso concreto, a imutabilidade própria da coisa julgada.

          É interessante perceber que mesmo os defensores da corrente doutrinária apoiada nas lições de Liebman reconhecem que, tratando-se de direitos disponíveis, as partes poderão dispor de seu direito, mesmo após o seu reconhecimento por meio de sentença de mérito transitada em julgado, ou seja, da coisa julgada material. Ainda assim, esses doutrinadores continuam a entender que a coisa julgada material é uma qualidade da sentença que torna imutáveis os seus efeitos, à luz das condições fáticas e jurídicas de sua prolação, ou seja, quanto a direitos e obrigações existentes ou inexistentes à época da prolação da sentença.

          Apesar da notória discussão doutrinária, uma análise profunda das três principais correntes doutrinárias expostas é suficiente para se notar que existem mais semelhanças do que diferenças entre os doutrinadores. Todos reconhecem que toda sentença tem um elemento declaratório, consubstanciado na subsunção da norma abstrata ao caso concreto, considerado pelo aspecto de elemento que compõe o conteúdo da decisão ou que gera efeitos práticos para fora do processo, torna-se imutável e indiscutível. Parecem também concordar que eventos futuros referentes à vontade das partes, poderão modificar outros efeitos gerados pela sentença, como ocorre no efeito condenatório no caso de pagamento da dívida ou do novo casamento no caso de divórcio.

          O CPC, em seu art 502, que conceitua a coisa julgada, substitui uma palavra e uma expressão do art 467 do CPC/1973. Em vez de prever que a coisa julgada é a eficácia da sentença que a torna imutável e indiscutível, o dispositivo legal sugerido menciona a autoridade da sentença. Acredito que a substituição do termo “eficácia” por “autoridade” busca deixar clara a distinção entre coisa julgada e efeitos da decisão. Substitui também “sentença” (espécie) por “decisão de mérito” (gênero), o que deve ser elogiado, considerando-se que sempre houve outras decisões de mérito aptas a transitar em julgado e produzir coisa julgada material, como as decisões monocráticas finais de relator e acórdãos de tribunal. Por outro lado, o dispositivo implicitamente reconhece a existência de decisões interlocutórias de mérito, com capacidade de geração de coisa julgada material. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 837/839. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

quarta-feira, 18 de abril de 2018

CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO - Art. 497, 498, 499, 500, 501 - IV – Do Julgamento das Ações Relativas às Prestações de Fazer, de Não Fazer e de Entregar Coisa – Vargas, Paulo S. R.



CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO - Art. 497, 498, 499, 500, 501 - IV – Do  Julgamento das Ações Relativas às Prestações de Fazer, de Não Fazer e de Entregar CoisaVargas, Paulo S. R.


PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XIII  – DA SENTENÇA E DA COISA JULGADA – Seção IV – Do  Julgamento das Ações Relativas às Prestações de Fazer, de Não Fazer e de Entregar Coisa - vargasdigitador.blogspot.com

Art 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providencias que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.

Parágrafo único. Para a concessão da tutela específica destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo.

Correspondência no CPC/1973, art 461, somente o caput, com a seguinte redação:

Art 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

1.    AÇÕES QUE TENHAM COMO OBJETO OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER

Na sentença – e por consequência em todos os pronunciamentos decisórios proferidos em ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer -, o art 497, caput, do CPC, substancialmente, repete o art 461, caput, do CPC/1973 ao prever que o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

          A modificação redacional continua a levar a crer que a tutela específica e o resultado equivalente são espécies diferentes de tutela jurisdicional, quando, na realidade, a liberdade concedida ao juiz para a obtenção do resultado prático equivalente é voltada justamente para a obtenção da tutela específica dos direitos materiais. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 830. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

2.    TUTELA INIBITÓRIA

A tutela inibitória é sempre voltada para o futuro, com o porvir, tendo como objetivo impedir a prática de um ato ilícito, o que pode ocorrer de três formas: (a) evitar a prática originária do ato ilícito, ou seja, impedir em absoluto a ocorrência de tal ato, hipótese na qual a tutela preventiva será conhecida como tutela inibitória pura; (b) impedir a continuação do ato ilícito, na hipótese de ato ilícito continuado; (c) impedir a repetição de prática de ato ilícito.

          Importante notar que, mesmo que exista ato ilícito já praticado, a tutela inibitória não é voltada para essa realidade, que já faz parte do passado e, portanto, será objeto da tutela reparatória. Sempre voltada para o futuro, a tutela inibitória não diz respeito, tampouco gera seus efeitos sobre aquilo que já ocorreu.

          A tutela inibitória, apesar de reconhecer o passado, é sempre voltada para o futuro, deixando o já ocorrido a cargo da tutela reparatória. É interessante anotar, inclusive, que a tutela inibitória e a tutela reparatória podem ser objeto de pretensão de um mesmo demandante num mesmo processo. O Ministério Público pode pedir a condenação do réu a parar com a poluição e a reparar o meio ambiente já lesado pela prática do ato ilícito, enquanto uma empresa pode pedir a proibição de veiculação de propaganda ofensiva a seu nome, bem como a condenação pelos danos já suportados pela propaganda já veiculada.

          A tutela inibitória surge historicamente com o objetivo de tutelar direitos materiais que não encontravam na tutela reparatória uma proteção plena, ou, ainda pior, nenhuma proteção. Sendo promessa constitucional, a inafastabilidade da tutela jurisdicional (art 5º, XXXV, da CF), notou-se a imprescindível necessidade de admitir uma tutela ampla e genérica capaz de proteger esses direitos materiais de forma efetiva. Direitos tais como: o da integridade física, personalidade, saúde, meio ambiente, patrimônio histórico, entre outros, não encontram na tutela reparatória concretização da promessa constitucional de que nenhum direito agredido ou afrontado será excluído do Poder Judiciário. A fim de fazer valer a inafastabilidade da jurisdição, é aceita a ideia de uma tutela inibitória geral.

          Fala-se em tutela inibitória geral porque essa espécie de tutela é antiga conhecida de nosso ordenamento jurídico, mas tradicionalmente era tratada de forma específica, prevista somente para tutelar algumas situações determinadas. O mandado de segurança preventivo, o interdito proibitória, a ação cominatória, são exemplos de tradicionais espécies de tutela inibitória específica de nosso sistema. Atualmente, a tutela inibitória geral é uma realidade incontestável de nosso direito processual em virtude das previsões contidas nos arts 84 do CDC e 497 do CPC.

          Ainda que se admita que a tutela inibitória surja para preencher um vácuo deixado pela tutela reparatória, estando voltada para determinados direitos materiais que necessitavam de uma proteção preventiva por meio da jurisdição, logo se notou que, mesmo naqueles casos em que é possível e eficaz a tutela reparatória, pode ser preferível a tutela inibitória. Aplica-se, no âmbito jurídico, um antigo e conhecido brocardo popular: “melhor prevenir do que remediar”. Não é correto falar de preferencia de uma espécie de tutela, mas é indiscutível que mesmo naquelas situações em que cabível a tutela reparatória, pode, a parte, sempre que possível, optar pela tutela inibitória. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 830/831. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

3.    TUTELA DE REMOÇÃO DO ILÍCITO

Cumpre lembrar a tese inteligentemente defendida por Marinoni que diferencia a tutela inibitória da tutela de remoção do ilícito, reconhecendo que ambas são tutelas preventivas, voltadas para o futuro. Para o processualista paranaense, existe uma diferença entre efeitos continuados do ato ilícito e a prática continuada do ilícito. Na hipótese de o ato ser continuado, é possível imaginar uma tutela que impeça sua continuação, sendo o caso de tutela inibitória. Por outro lado, é possível que o ato ilícito faça parte do passado, não mais existindo, o que não se pode afirmar quanto aos seus efeitos, que continuam a ser gerados. Nessa hipótese, não se pode falar em evitar a continuação do ato porque o ato ilícito já foi praticado na sua totalidade, por exemplo, no caso de uma propaganda enganosa que já foi realizada e continua a gerar seus efeitos. Será o caso de tutela de remoção do ilícito. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 831. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

4.    DANO E DOLO/CULPA

A tese da tutela inibitória funda-se na exata definição de ato ilícito, cuja prática se pretende evitar. Durante muito tempo, condicionou-se a prestação de tutela jurisdicional à existência de um dano, o que até se justificava à época em que se imaginava ser a tutela reparatória a única existente. A dificuldade pode ser facilmente percebida pelo art 186 do CC, que ao conceituar o ato ilícito indica a necessidade da presença de três elementos: contrariedade ao direito, culpa ou dolo e dano. A imprecisão do dispositivo é evidente considerando-se que o ato ilícito é tao somente o ato contrário ao direito, sendo alheios ao seu conceito os elementos da culpa ou dolo e do dano. O art 186 do CC não conceitua o ato ilícito, descreve os elementos necessários para a obtenção da tutela reparatória.

          Dessa forma, a tutela reparatória, sempre voltada para o passado, buscando a reparação do prejudicado, demanda ao menos dois elementos: ato contrário ao direito e dano, considerando-se que mesmo na tutela reparatória, a culpa ou o dolo podem ser dispensados na hipótese de responsabilidade objetiva. A tutela inibitória, sempre voltada para o futuro, buscando evitar a prática do ato ilícito, preocupa-se exclusivamente com o ato contrário ao direito, sendo-lhe irrelevante a culpa ou o dolo e o dano.

          Nesse sentido, deve ser saudado o parágrafo único do art 497 do CPC ao prever que para a concessão da tutela específica que serve para inibir a prática, reiteração ou a continuação de um ilícito, é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 831/832. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).


PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XIII  – DA SENTENÇA E DA COISA JULGADA – Seção IV – Do  Julgamento das Ações Relativas às Prestações de Fazer, de Não Fazer e de Entregar Coisa - vargasdigitador.blogspot.com

Art 498. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.

Parágrafo único. Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e pela quantidade, o autor individualiza-la-á na petição inicial, se lhe couber a escolha, ou, se a escolha couber ao réu, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz.

Correspondência no CPC/1973, art 461-A, caput e § 1º, com a seguinte redação:

Art 461-A. na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.

§ 1º. Este referente ao parágrafo único do art 498 do CPC/2015: Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e quantidade, o credor a individualizará na petição inicial, se lhe couber a escolha, cabendo ao devedor escolher, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz.

1.    PRAZO PARA ENTREGA DA COISA

Na ação que tenha como objeto o cumprimento de uma obrigação de entregar coisa, a concessão de tutela específica significa justamente a tutela capaz de entregar a coisa pretendida ao autor. Nesse caso, antes de aplicar as medidas executivas para que sua decisão seja devidamente cumprida, cabe ao juiz fixar um prazo para o cumprimento da obrigação.

          O juiz ao fixar o prazo previsto no caput do art 498 do CPC deve atentar para a complexidade da obrigação a ser cumprida pelo destinatário da decisão judicial. Tratando-se de prazo judicial, na omissão do juiz em fixa-lo no caso concreto, aplica-se o art 218, § 3º, do CPC, ou seja, o prazo será de 5 dias. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 832. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

2.    ENTREGA DE COISA INCERTA

Coisa incerta deve ser considerada coisa indeterminada – mas determinável -, em que a escolha tem a sua importância em razão da diferente qualidade entre os bens que poderão ser escolhidos. Recaindo a obrigação de entregar sobre coisa incerta, é preciso individualizar a coisa que será objeto do cumprimento da obrigação. O art 498, parágrafo único, do CPC, trata justamente dessa hipótese.

          Caso caiba, ao autor, a escolha, por previsão contratual ou legal, a individualização já deve ser realizada na petição inicial. Cabendo a escolha ao réu, ele a individualizará ao entregar a coisa em juízo, no cumprimento da decisão judicial no prazo fixado pelo juiz. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 832/833. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).


PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XIII  – DA SENTENÇA E DA COISA JULGADA – Seção IV – Do  Julgamento das Ações Relativas às Prestações de Fazer, de Não Fazer e de Entregar Coisa - vargasdigitador.blogspot.com

Art 499. A obrigação somente será convertida em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela especifica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.

Correspondência no CPC/1973, art 461. (...) 1º, com a seguinte redação:

Art. 461 (...) § 1º. A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.

1.    TUTELA ESPECÍFICA E PELO EQUIVALENTE PELO DINHEIRO

Tomando-se por base o critério da coincidência de resultados gerados pela prestação da tutela jurisdicional com os resultados que seriam gerados pela satisfação voluntária da obrigação, a tutela jurisdicional pode ser classificada em tutela específica e tutela pelo equivalente em dinheiro. Na primeira, a satisfação gerada pela prestação jurisdicional é exatamente a mesma que seria gerada com o cumprimento voluntário da obrigação, enquanto na segunda, a tutela jurisdicional prestada é diferente da natureza da obrigação e, por consequência, cria um resultado distinto daquele que seria criado com a sua satisfação voluntária.

          A tutela inibitória é sempre tutela específica porque, ao evitar a prática do ato ilícito, obtém-se o status quo ante, conseguindo o demandante a criação de uma situação que será exatamente a mesma que seria criada caso o demandado tivesse voluntariamente deixado de praticar o ato ilícito. O resultado da tutela inibitória sempre será idêntico àquele que seria criado com o voluntário cumprimento da obrigação.

          Já a tutela reparatória pode ser prestada de forma específica (reparação in natura) ou pelo equivalente em dinheiro, dependendo do caso concreto. Tratando-se de obrigação inadimplida de pagar quantia certa, naturalmente a única forma de a tutela ser prestada será mediante a entrega do valor, sendo correto entender que a única forma de tutela possível nesse caso é a específica, porque, se a obrigação já é de pagar dinheiro, não seria correto dizer que a tutela foi prestada pelo equivalente em dinheiro. O dinheiro é dinheiro e não o “equivalente em dinheiro”. Registre-se apenas a atipicidade gerada pela adjudicação de bens, considerando-se que, nesse caso, a obrigação de pagar quantia certa gera a satisfação do credor por meio da entrega do bem penhorado. Nesse caso, como é evidente, não se pode falar em identidade com o cumprimento voluntário da obrigação e, tampouco, em tutela pelo equivalente em dinheiro.

          Tratando-se de obrigação inadimplida de fazer, não fazer e entrega de coisa, passa a ser possível a tutela ser prestada tanto de forma específica como pelo equivalente por dinheiro.

Nas obrigações de fazer e de não fazer, o essencial é verificar a natureza do inadimplemento. Sendo o inadimplemento definitivo, o que significa dizer que não existe mais a possibilidade de cumprimento da obrigação, a única tutela jurisdicional possível será a tutela pelo equivalente em dinheiro. Caso ainda exista a possibilidade de cumprimento, quando haverá somente um retardamento no cumprimento da prestação, a tutela poderá ser prestada de forma específica, desde que esse ainda seja o interesse do credor. Nas obrigações de entregar coisa, deve ser analisada a possibilidade de a coisa, objeto da obrigação, ser entregue por meio do processo ao demandante. Sendo isso materialmente possível, caberá tutela específica, em caso contrário, a única tutela cabível será pelo equivalente em dinheiro. Naturalmente que, tratando-se de coisa fungível, a entrega de qualquer bem de  mesma condição gera tutela específica, porque nessa espécie de obrigação não há preocupação com o bem exatamente individualizado, mas sim como as suas características gerais. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 833/834. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

2.    CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS

Na tutela ressarcitória, a tutela específica é preferível à tutela pelo equivalente em dinheiro, porque essa espécie de tutela é a única que proporciona a efetiva reparação do dano suportado. O processo que entrega ao vitorioso exatamente aquilo que ele obteria se não precisasse do processo, em razão do cumprimento voluntário da obrigação pelo devedor, certamente é o que entrega a tutela jurisdicional mais efetiva. É a consagração do antigo brocardo consagrado por Chiovenda, de que o processo será tanto melhor quanto mais aproximar seus resultados daqueles que seriam gerados pelo cumprimento voluntário da obrigação (princípio da maior coincidência possível).

          Ocorre, entretanto, que a preferência da tutela específica sobre a tutela pelo equivalente em dinheiro está condicionada à vontade do demandante, que poderá optar pela segunda espécie de tutela se assim desejar, bem como diante da impossibilidade material de obtenção da tutela específica. Para parcela da doutrina, ainda que possível, a tutela específica pode ser excluída quando não for justificável ou racional em razão de sua excessiva onerosidade (STJ, 3ª Turma, REsp 1.055.822/RJ, rel. Min. Massami Uyeda, j. 24/05/2011, DJe 26/10/2011).

          Segundo entendimento pacificado no Superior Tribunal de Justiça, a conversão do pedido de obrigação de fazer, não fazer e entregar coisa em indenização por perdas e danos não configura julgamento extra petita, ainda que não haja pedido explícito nesse sentido (STJ, 3ª Turma, AgRg no Ag 1.397.365/SC, rel. Min. Sidnei Beneti, j. 28/08/2012, DJe 18/09/2012; STJ, 3ª Turma, REsp 1.043.813/SC, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 20/09/2011, DJe 27/09/2011). (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 834. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XIII  – DA SENTENÇA E DA COISA JULGADA – Seção IV – Do  Julgamento das Ações Relativas às Prestações de Fazer, de Não Fazer e de Entregar Coisa - vargasdigitador.blogspot.com

Art 500. A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa fixada periodicamente para compelir o réu ao cumprimento específico da obrigação.

Correspondência no CPC/1973, art 461. (...) § 2º, com a seguinte redação:

Art. 461. (...) § 2º. A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da mulga (artigo 287).

1.    CUMULAÇÃO DA INDENIZAÇAO E DA MULTA

O art 500 do CPC é absolutamente correto ao prever que serão cumuláveis os valores referentes à indenização por perdas e danos e os valores gerados pela multa cominatória (astreintes) no caso de descumprimento da obrigação. O dispositivo, corretamente, considera a diferente natureza dessas verbas, já que enquanto a primeira tem natureza reparatória, ressarcindo a parte pelos danos que suportou, a segunda é uma medida executiva, que tem como objetivo pressionar a parte contrária ao cumprimento de uma obrigação.

          Dessa forma, devem ser somados os valores obtidos na conversão em perdas e danos quando a parte abre mão da tutela específica e parte para a tutela por equivalente em dinheiro, com os valores gerados pela multa no caso de descumprimento de tal obrigação, e por obviamente ocorrerá, já que se a obrigação for cumprida não haverá sua conversão em perdas e danos.

          Registre-se que, havendo a conversão da obrigação em perdas e danos, a multa imediatamente deixa de incidir, de forma que o cálculo de seu valor tomará como termo final tal conversão. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 834/835. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).


PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XIII  – DA SENTENÇA E DA COISA JULGADA – Seção IV – Do  Julgamento das Ações Relativas às Prestações de Fazer, de Não Fazer e de Entregar Coisa - vargasdigitador.blogspot.com

Art 501. Na ação que tenha por objeto a emissão de declaração de vontade, a sentença que julgar procedente o pedido, uma vez transitada em julgado, produzirá todos os efeitos da declaração não emitida.

Correspondência no CPC/1973,art 466-A, com a seguinte redação:

Art 466-A. condenado o devedor a emitir declaração de vontade, a sentença, uma vez transitada em julgado, produzirá todos os efeitos da declaração não emitida.

1.    OBRIGAÇÃO JURIDICAMENTE INFUNGÍVEL

Entre as obrigações infungíveis, existem aquelas que são naturalmente infungíveis – decorrência da característica pessoal do devedor – e aquelas em que a fungibilidade é apenas jurídica – decorrente de algum princípio jurídico -, podendo o ordenamento criar mecanismo para a obtenção de resultado prático equivalente ao adimplemento da obrigação.

          A obrigação de emitir declaração de vontade é de natureza infungível, mas essa é uma infungibilidade  meramente jurídica, sendo possível – e até mesmo aconselhável – que o ordenamento disponha de regras que permitam a substituição da declaração de vontade por uma decisão judicial, gerando-se os mesmos efeitos daquela. É justamente isso que faz o ordenamento processual no artigo ora comentado, prevendo que a sentença produz os mesmos efeitos que a declaração teria produzido se emitida pelo executado, o que basta para a satisfação do direito, considerando-se que, nesse caso, o aturo não tem interesse na atividade do réu em si, mas na produção de seus efeitos, o que pode ser obtido por meio de decisão judicial. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 835. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

2.    NATUREZA JURÍDICA DA SENTENÇA

Existe séria divergência a respeito da natureza da sentença prevista no art. 501 do CPC, que produzirá após o trânsito em julgado todos os efeitos da declaração não emitida. Para parcela doutrinária, a sentença tem natureza constitutiva, apta a criar uma nova situação jurídica, justamente aquela que teria sido criada se o devedor tivesse cumprido voluntariamente sua obrigação. Para outra corrente doutrinária, a sentença é condenatória. Há ainda doutrinadores que entendem tratar-se de sentença executiva lato sensu, não sendo necessária a execução para a sua satisfação.

          Observe-se que em razão de expressa previsão legal, e aqui pouco importa a natureza que se acredite ter tal sentença, a mesma somente passará a gerar efeitos após o trânsito em julgado. Nesse caso, portanto, independentemente do efeito em que eventual recurso seja recebido, não será possível em nenhuma hipótese a execução provisória, pois não há no caso eficácia provisória dessa sentença (nesse aspecto, existe semelhança com a sentença penal condenatória). A satisfação do direito reconhecido nessa espécie de sentença dispensa qualquer ato material de execução, considerando-se que o direito do autor estará atendido com o mero trânsito em julgado da sentença de procedência. Não é cabível, por desnecessário, a aplicação de astreintes ou de qualquer outra medida de execução indireta ou por sub-rogação, considerando-se que o ofício expedido pelo juízo para eventual registro no Cartório de Imóveis não é propriamente um ato executivo. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 835/836. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

segunda-feira, 16 de abril de 2018

CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO - Art. 496 - Da Remessa Necessária – Vargas, Paulo S. R.



CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO - Art. 496 - Da Remessa NecessáriaVargas, Paulo S. R.


PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XIII  – DA SENTENÇA E DA COISA JULGADA – Seção III – Da Remessa Necessária - vargasdigitador.blogspot.com

Art 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:

I – proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público;

II – que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal.

§ 1º. Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á.

§ 2º. Em qualquer dos casos referidos no § 1º, o tribunal julgará a remessa necessária.

§ 3º. Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a:

I – 1.000 (mil salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público;

II – 500 (quinhentos) salários-mínimos para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas autarquias e fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados;

III – 100 cem) salários-mínimos para todos os demais Municípios e respectivas autarquias e fundações de direito público.

§ 4º. Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em:

I – súmula de tribunal superior;

II – acórdão proferido pelo Supremo tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

III – entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;

IV – entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa.

Correspondência no CPC 1973, art 475, com a seguinte redação e ordem:

Art 475. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senal depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:

I – proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município e as respectivas autarquias e fundações de direito público;

II – que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art 585, VI).

§ 1º. Nos casos previstos neste artigo, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, haja ou não apelação, não o fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los.

§ 2º. Sem correspondência no CPC/1973.

§ 2º. Este referente ao § 3º do CPC/2015. Não se aplica o disposto neste artigo sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a sessenta salários-mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor.

§ 3º. Este referente ao § 4º e inciso I do CPC/2015. Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário do Superior Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente.

Demais incisos sem correspondência no CPC/1973.

1.     NATUREZA JURÍDICA

É pacífico, na doutrina, o entendimento de que o reexame necessário não tem natureza recursal, não se devendo admitir expressões como “apelação ex offício”, “recurso de ofício” ou “recurso obrigatório”.

          São varias as razões para que o reexame necessário, previsto pelo art 496 do CPC não seja considerado um recurso: (i) ausência de voluntariedade: o recurso é um ônus processual, sendo que a sua existência depende de expressa manifestação de vontade da parte, por meio de sua interposição. A vontade de parte, portanto, é determinante, sendo a voluntariedade um princípio recursal, derivado do princípio dispositivo. O reexame necessário, conforme se depreende do próprio nome, nada tem de voluntário, porque sua existência decorre de expressa manifestação da lei, sendo irrelevante a vontade das partes e mesmo do juiz, que será obrigado a ordenar a remessa dos autos ao Tribunal e, não o fazendo proporcionará a avocação dos autos por seu presidente (art 496, § 1º, do CPC); (ii) o reexame necessário não é dialético, porque não existem reações nem contrarrazões, cabendo ao Tribunal tao somente analisar os atos praticados até a sentença. Como consequência logica, também não haverá contraditório; (iii) a previsão de um prazo de interposição é característica de todo e qualquer recurso, o que não ocorre com o reexame necessário, que deverá existir sempre que as condições assim exigirem, independentemente de eventual demora do processo chegar ao Tribunal; (iv) o reexame necessário, apesar de estar previsto em lei federal (CPC), não se encontra previsto como recurso (princípio da taxatividade); (v) a legitimação recursal regulada pelo art 996 do atual Livro do CPC (partes, terceiro prejudicado e Ministério Público) não se aplica ao reexame necessário, instituto cuja “legitimidade” é do juízo, que determina a remessa do processo ao Tribunal.

          Registre-se que, apesar de não poder ser considerado uma espécie de recurso, aplica-se ao reexame necessário um instituto tipicamente recursal: a proibição da reformatio in pejus. Dessa forma, a Fazenda Pública não poderá ter sua situação no processo piorada em decorrência do julgamento do reexame necessário, sendo que, na pior das hipóteses para a Fazenda Pública, sua situação manter-se-á inalterada (Súmula 45/STJ). Além disso, aplica-se, ao reexame necessário, a regra do art 932, IV e V, do atual CPC, admitindo-se seu julgamento monocrático pelo relator. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 826/827. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

2.    CONCEITO DE REEXAME NECESSÁRIO

Segundo previsão do art 496, I, do CPC, a sentença proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município e suas respectivas autarquias e fundações de direito público, bem como a que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal (havendo acolhimento de exceção e executividade em vez de embargos do devedor, por analogia, aplica-se o dispositivo legal (Informativo 544/STJ: 2ª Turma, REsp 1.415.602/CE, rel. Min. Herman Benjamin, j. 22.05.2014, DJe 20.06.2014), somente produzirá efeitos após sua confirmação pelo Tribunal. Trata-se do instituto do reexame necessário, que pela letra da lei, é confirmação pelo Tribunal. Trata-se do instituto do reexame necessário que pela letra da lei, é condição impeditiva da geração de efeitos da sentença proferida nas condições previstas pelo dispositivo legal mencionado.

          O conceito legal deve ser visto com reservas porque a sentença pode gerar efeitos, ainda que pendente de reexame necessário, conforme demonstra de forma cabal o art 14, §§ 1º e 3º, da Lei 12.016/2009. O reexame necessário, portanto, não impede necessariamente a geração de efeitos da sentença, mas tao somente seu trânsito em julgado, sendo mais adequado afirmar que o reexame necessário é condição impeditiva da geração do trânsito em julgado, e não da eficácia da sentença. Na realidade, o efeito suspensivo do reexame necessário segue os efeitos da apelação: se o recurso tiver tal efeito o reexame necessário também o terá, e se o recurso não tiver o reexame necessário, não impedirá a geração imediata de efeitos da sentença.

          O conceito extraído da interpretação literal do caput do art 496 do CPC é incorreto e isso fica claro quando se analisam os §§ 1º e 3º do art 14 da Lei 12.016/2009. Toda sentença concessiva de ordem no mandado de segurança está sujeita ao reexame necessário, não sendo, inclusive, aplicáveis, nesse caso, as exceções consagradas nos §§ 3º e 4º do art 496 do CPC (STJ, 2ª Turma, REsp 1.274.066?PR, rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 01.12.2011, DJe 09.12.2011; STJ, 1ª Turma, REsp 934.286/MT, rel. Min. Teori Albino Zavaski, j. 17.06.2008, DJe 26.06.2008). por outro lado, de tal sentença cabe execução provisória, salvo quando versar sobre as matérias que não admitem ser concedidas por meio de liminar no mandado de segurança.

          Como se pode notar, uma sentença sujeita ao reexame necessário é imediatamente eficaz, situação incompatível com o conceito legal consagrado no art 496, caput, do CPC. Por isso, insisto que o impedimento gerado pelo reexame necessário não diz respeito aos efeitos da sentença, mas ao seu trânsito em julgado. Quanto aos efeitos, o reexame necessário segue o que estiver determinado em lei para apelação: se tal recurso tiver efeito suspensivo, também terá o reexame necessário, mas, faltando tal previsão, o duplo grau obrigatório não impede a geração de efeitos da sentença. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 827/828. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

3.    CABIMENTO

O § 1º do art 496 do CPC comete um erro primário, em alteração equivocada do § 1º do art 475 do CPC/1973. Segundo o texto vigente, havendo ou não apelação, o juiz remeterá os autos do processo ao tribunal em segundo grau, enquanto no texto projetado essa remessa só ocorrerá se for ultrapassado o prazo de apelação sem sua interposição. Pelo dispositivo legal, portanto, se houver apelação, não haverá necessidade de reexame necessário. Há duas críticas ao dispositivo legal.

          Como o art 496, § 1º, do CPC afirma apenas que a não iinterposição de apelação dentro do prazo leva à remessa necessária, sem especificar de qual das partes é a apelação não interposta, é possível concluir que, havendo sucumbência reciproca e sendo interposta apelação pela parte contrária à Fazenda Pública, não haverá reexame necessário. E se a parcela de sucumbência da Fazenda Pública puder ser tipificada numa das hipóteses dos incisos do art 496 do CPC analisado?

          Com considerável boa vontade pode-se interpretar que a apelação mencionada no dispositivo legal é da Fazenda Pública, só havendo reexame necessário na hipótese de ela não interpor o recurso. Contudo, ainda assim o dispositivo é problemático porque, historicamente, a apelação da Fazenda Pública nunca impedir o reexame necessário por duas razões: o recurso pode ser parcial, enquanto o reexame necessário é sempre total, e o recurso pode não ser admitido por vício formal, enquanto o reexame necessário não corre esse risco, sendo sempre julgado pelo tribunal de segundo grau. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 828. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

4.    EXCEÇÕES AO CABIMENTO

Não basta a sucumbência da Fazenda Pública para que a sentença esteja sujeita ao reexame necessário, já que existem previsões legais que expressamente excepcionam o duplo grau obrigatório mesmo diante da derrota fazendária.

          Segundo o § 3º do dispositivo ora analisado, não haverá duplo grau obrigatório quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a mil salários-mínimos para União, e as respectivas autarquias e fundações de direito público, quinhentos salário-mínimos para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas autarquias e fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados, cem salários-mínimos para todos os demais municípios e respectivas autarquias e fundações de direito público.

          Como se pode notar, o valor mínimo de sucumbência da Fazenda Pública para que a sentença esteja sujeita ao reexame necessário foi alterado substancialmente, passando dos sessenta salários –mínimos previstos no art 475, § 2º do CPC/1973 para até mil salários-mínimos a depender do caso concreto.

          E buscou-se uma gradação de valores a depender da pessoa jurídica de direito público sucumbente. A ideia é boa, mas sua execução deve gerar incongruências lógicas relevantes porque não foi levado em consideração o status econômico do ente público, o que deve mais importar quando se trata de rever obrigatoriamente a sentença que lhe gera uma sucumbência econômica. Há municípios, no Brasil, mais ricos que Estados, e nesse caso há evidente incongruência lógica em dispensar o reexame necessário para o ente mais rico até cem salários-mínimos e em até quinhentos para o mais pobre. Essa situação se intensifica quando comparados municípios que são capitais de Estado e outros que, apesar de não serem capitais, são mais ricos que aqueles. As gradações são sempre difíceis, embora muito mais justas que um valor fixo para toda e qualquer pessoa jurídica de direito público. O problema é fazer gradações que não levam em consideração o elemento essencial que a justifica.

          Sendo a condenação ilíquida, o Superior Tribunal de Justiça entende cabível o reexame necessário, porque é melhor correr o risco de um reexame desnecessário do que afastá-lo quando era cabível (Súmula 490/STJ “A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários-mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas”). Como o valor só será conhecido depois desse momento procedimental, corre-se menos risco em realizar o reexame necessário.

          O § 4º do art 496 do CPC dispensa o reexame necessário em razão de sentença fundamentada em jurisprudência consolidada dos tribunais superiores. A dispensa, nesse caso, fundamenta-se na desnecessidade de um controle obrigatório pelo segundo grau de jurisdição quando o juiz prolator da sentença torna-se um porta-voz avançado dos tribunais superiores e aplica seu consagrado entendimento como fundamento de sua decisão.

          Segundo o dispositivo, não há reexame necessário se a sentença estiver fundada em súmula de tribunal superior (I), acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos (II), entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência (III).

          Interessante novidade implementada pelo Código de Processo Civil quanto à dispensa do reexame necessário é a inclusão, como causa de afastamento do duplo grau obrigatório, de entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa (art 496, § 4º, IV, do CPC). Nesse caso, a Fazenda Pública não apela da sentença porque a decisão será fundada em entendimento interno pacificado, não havendo mesmo qualquer sentido em sujeitá-la ao duplo grau obrigatório.

          Também não será cabível o reexame necessário nos Juizados Especiais em razão do previsto nos arts 13 da Lei 10.259/2001 e 11 da Lei 12.153/2009.

          Nessas circunstâncias, a remessa do processo ao Tribunal dependerá da regular interposição do recurso de apelação pela Fazenda Pública, admitindo-se o trânsito em julgado da sentença já em primeiro grau de jurisdição, no caso de não haver o recurso voluntário. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 828/829. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).