segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 192, 193, 194 Da Prescrição e da Decadência – Disposições Gerais - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 192, 193, 194
Da Prescrição e da Decadência – Disposições Gerais
- VARGAS, Paulo S. R. 

Livro III – Dos Fatos Jurídicos (art. 189 a 211)
Título IV – Da Prescrição e da Decadência –
Capítulo I – Da Prescrição – Seção I - Disposições gerais
- vargasdigitador.blogspot.com

Art 192. Os prazos de prescrição não podem ser alterados por acordo das partes. 1, 2

1.        Prescrição é matéria de ordem pública

Por ser matéria de ordem pública, os prazos de prescrição fixados em lei não podem ser alterados pela vontade das partes. Além disso, são igualmente inalteráveis os motivos de suspensão e interrupção desses prazos de prescrição. Caso se permitisse que as partes alongassem, reduzissem ou tornassem imprescritíveis algumas pretensões é até mesmo intuitiva a falência do instituto da prescrição, cuja finalidade é justamente promover a pacificação social impedindo a eternização dos conflitos. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 02.02.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

A prescrição em curso não cria direito adquirido, podendo o seu prazo ser reduzido ou ampliado por lei superveniente, ou transformado em prazo decadencial. Não se admite, porém, ampliação ou redução de prazo prescricional pela vontade das partes. No primeiro caso, importaria renúncia antecipada da prescrição, vedada pela lei. A possibilidade de se reduzir o prazo, que constituía questão polêmica, foi também afastada pelo aludido art 192. (Direito Civil Comentado – A Parte Geral, Roberto Gonçalves, v. I, p. 518, 2010 Saraiva – São Paulo).

Art 193. A prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, pela parte a quem aproveita. 1, 2

1.        Alegação da prescrição em qualquer grau de jurisdição

Outro efeito que decorre da natureza de matéria de ordem pública do instituto da prescrição é a possibilidade de a prescrição ser alegada a qualquer momento, em qualquer grau de jurisdição. Constituindo exceção à regra geral de que toda a matéria de defesa deve ser alegada na mesma oportunidade, a faculdade de alegar a prescrição não precluiu e pode ser alegada em momento posterior, inclusive em sede de recurso, desde que antes do trânsito em julgado. Ocorrendo o trânsito em julgado sem que o réu tenha alegado a prescrição, não poderá mais fazê-lo para opor-se no cumprimento da condenação.  (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 02.02.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

2.        Dispõe o art 193 que “a prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, pela parte a quem aproveita”

Pode ser arguida em qualquer fase ou estado da causa, em primeira ou em segunda instância. Pode, portanto, ser alegada em qualquer fase do processo de conhecimento, ainda que o réu tenha deixado de invoca-la na contestação, não significando renúncia tácita a falta de invocação na primeira oportunidade em que falar no processo. Considera-se que, se essa defesa não foi, desde o primeiro momento, invocada, é porque o réu, provavelmente, teria confiado nos outros meios da defesa – o que não tolhe o efeito da prescrição. (Prescrição. Arguição em razões finais. Admissibilidade. Conceito de instância tomado como grau de hierarquia judiciária que possibilita a arguição do lapso prescricional em qualquer tempo e juízo” (RT, 766/236), apud, Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – pp. 519 - pdf – parte geral).

a única consequência da serôdia alegação diz respeito aos ônus da sucumbência: são indevidos honorários advocatícios em favor do réu, se este deixou de alegar a prescrição de imediato, na oportunidade da contestação, deixando para fazê-lo somente em grau de apelação, nos termos do art 22 do Código de Processo Civil de 1973, sem correspondência no CPC/2015.

Na fase de liquidação da sentença é inadmissível a invocação de prescrição, que deve ser objeto de deliberação se arguida na fase cognitiva do processo. A que pode ser alegada mesmo na fase de execução é a prescrição superveniente à sentença (CPC/1973, art 741, VI. Este artigo tem correspondência no CPC/2015, art 910, que, contudo omite o inciso VI, Nota VD).

Se a prescrição, entretanto, não foi suscitada na instância ordinária (primeira e segunda instância), é inadmissível a sua arguição no recurso especial, perante o Superior Tribunal Federal, ou no recurso extraordinário, interposto perante o supremo Tribunal Federal, por faltar o prequestionamento exigido nos regimentos internos desses tribunais, que têm força de lei. Dispõe a Súmula 282 do último que “é inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada”. Igualmente, no tocante à ação rescisória. (RTJ, 71/1; rt, 488/145, apud, Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – pp. 519 - pdf – parte geral).

Diz o mencionado art 193 que a prescrição pode ser alegada “pela parte a quem aproveita”. A arguição não se restringe, pois, ao prescribente, mas se estende a terceiros favorecidos por ela. Segundo Câmara Leal, só pode arguir prescrição quem tem legítimo interesse econômico em seus efeitos liberatórios, pelo proveito patrimonial que lhe proporcionam. Podem alega-la não só os interessados direitos como também os indiretos (credores do prescribente insolvente; o responsável pela evicção, relativamente à coisa cuja evicção se extinguiu pela prescrição; qualquer terceiro, relativamente à prescrição da ação, cuja não extinção lhe acarretaria dano ou prejuízo) (Da prescrição, cit., p. 65-66, apud, Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – pp. 520 - pdf – parte geral).

Art.194. O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se favorecer a absolutamente incapaz. (Revogado pela Lei nº 11.280, de 2006) 1

1.        Possibilidade de o juiz pronunciar de ofício a prescrição

Dispunha o artigo 194 do Código Civil que o juiz não podia reconhecer, de ofício, a ocorrência da prescrição, salvo para favorecer a absolutamente incapaz. Tal dispositivo, entretanto, foi revogado pela lei n. 11.280/06, que inclui o § 5º no artigo 219 do CPC/1973, o qual é explícito ao afirmar que “o juiz pronunciará de ofício a prescrição”. Este artigo 219, que encontra correspondência no CPC/2015, art 240, perde o § 5º. Contudo, como bem reconhecido pelo enunciado 295, da IV Jornada de Direito Civil, “a revogação do art 194 do Código Civil pela Lei n. 11.280/2006, que determina ao juiz o reconhecimento de ofício da prescrição, não retira do devedor a possibilidade de renúncia admitida no art 191 do texto codificado”. Por essa razão, ao pronunciar de ofício a prescrição deverá o juiz ter o cuidado de verificar se não houve renúncia à prescrição, algo que nem sempre será de imediata constatação. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 02.02.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Seguindo o raciocínio de Roberto Gonçalves, prescrevia o ar 194 que “o juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se favorecer a absolutamente incapaz”. Não podia, portanto, conhecer da prescrição, se não fosse invocada pelas partes, salvo em benefício de absolutamente incapaz. Essa ressalva, que não favorecia o relativamente incapaz, constituía inovação, pois não constava do código civil de 1916. O aludido dispositivo foi, todavia, expressamente revogado pelo art 11 da Lei n. 11.280, de 16 de fevereiro de 2006, que ainda, como foi dito, introduz o § 5º  ao art 219 do Código de Processo civil, tornando obrigatório o pronunciamento da prescrição, de ofício, pelo juiz.

A prescrição diz respeito, em regra, a direitos patrimoniais. Os direitos não patrimoniais (direitos pessoais, de família) estão sujeitos à decadência ou caducidade. Esta também pode ser declarada de ofício, pelo juiz (CPC/1973, § 4º, com correspondência no CPC/2015, art 240, § 2º). O art 210 do Código Civil diz, imperativamente, que o juiz “deve” (é dever e não faculdade), “de ofício, conhecer da decadência, quando estabelecida por lei”. Ainda que se trate de direitos patrimoniais, a decadência pode ser decretada de ofício, quando estabelecida por lei. O juiz não pode decretar de ofício a prescrição intercorrente. (RTJ, 130/1002; RT. 652/128 e 656/220; “Prescrição. Execução fiscal. Feito paralisado por mais de cinco anos. Impossibilidade do reconhecimento de ofício da prescrição intercorrente, por trata-se de direito patrimonial” (RT, 765/386), apud, Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – p. 520 - pdf – parte geral).

Se a parte, pessoalmente, não invoca a prescrição, poderá fazê-lo o representante do Ministério Público, em qualquer situação, bastando levar o fato ao conhecimento do juiz, que agora deve pronunciá-la de ofício. Também poderá alega-la o curador à lide, em favor do curatelado, bem como o curador especial, nos casos em que lhes caiba intervir. (Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, pdf –parte geral, 2010, v. 1, p. 520 – Saraiva, 2010 – São Paulo).

domingo, 3 de fevereiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 189, 190, 191 Da Prescrição e da Decadência – Disposições Gerais - VARGAS, Paulo S. R.



DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 189, 190, 191
Da Prescrição e da Decadência – Disposições Gerais
- VARGAS, Paulo S. R.

Livro III – Dos Fatos Jurídicos (art. 189 a 211)
Título IV – Da Prescrição e da Decadência –
Capítulo I – Da Prescrição – Seção I - Disposições gerais
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Art.189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a quem aludem os arts 205 e 206 1, 2, 3, 4, 5

Conforme preleciona Roberto Gonçalves, o Código Civil trata das disposições gerais sobre a prescrição extintiva nos arts 189 a 196; e dos prazos prescricionais nos arts 205 (geral) e 206 (prazos especiais). (Direito Civil Comentado – A Parte Geral, Roberto Gonçalves, v. I, p. 510, 2010 Saraiva – São Paulo).

Seguindo com Roberto Gonçalves, desde a concepção do ser humano o tempo influi nas relações jurídicas de que o indivíduo participa. É ele o personagem principal do instituto da prescrição. Nesse campo, a interferência desse elemento é substancial, pois existe interesse da sociedade em atribuir juridicidade àquelas situações que se prolongaram no tempo. (Francisco Amaral, Direito civil, p. 555; Silvio Rodrigues, Direito civil, v. 1, p. 323, apud, Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – p. 510 - pdf – parte geral).

O decurso do tempo tem grande influência na aquisição e na extinção de direitos. Distinguem-se, pois, duas espécies de prescrição: a extintiva e a aquisitiva, também denominada usucapião. Alguns países tratam conjuntamente dessas duas espécies em um único capítulo. O Código Civil brasileiro regulamentou a extintiva na Parte Geral, ênfase à força extintora do direito. No direito das coisas, na parte referente aos modos de aquisição do domínio, tratou da prescrição aquisitiva, em que predomina a força geradora.

Em um e outro caso, no entanto, ocorrem os dois fenômenos: alguém ganha e, em consequência, alguém perde. Como o elemento “tempo” é comum às duas espécies de prescrição, dispõe o art 1.244 do Código Civil que as causas que obstam, suspendem ou interrompem a prescrição também se aplicam à usucapião.

O instituto da prescrição é necessário, para que haja tranquilidade na ordem jurídica, pela consolidação de todos os direitos. Dispensa a infinita conservação de todos os recibos de quitação, bem como o exame dos títulos do alienante e de todos os seus sucessores, sem limite no tempo. Com a prescrição da dívida, basta conservar os recibos até a data em que esta se consuma, ou examinar o título do alienante e os de seus predecessores imediatos, em um período de dez anos apenas.

Segundo Cunha Gonçalves, a prescrição é indispensável à estabilidade e consolidação de todos os direitos; sem ela, nada seria permanente; o proprietário jamais estaria seguro de seus direitos, e o devedor livre de pagar duas vezes a mesma dívida. (Tratado de direito civil, t. 3, p. 633, apud, Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – p. 511 - pdf – parte geral).

Câmara Leal vai buscar na doutrina romana, na pureza cristalina de sua profunda filosofia jurídica, os fundamentos da prescrição: “o interesse público, a estabilização do direito e o castigo à negligência; representado o primeiro motivo inspirador da prescrição; o segundo, a sua finalidade objetiva; o terceiro, o meio repressivo de sua realização. Causa, fim e meio, trilogia fundamental de toda instituição, devem constituir o fundamento jurídico da prescrição” (Da prescrição e da decadência, p. 16, apud, Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – pp. 511 - pdf – parte geral).

Para distinguir prescrição de decadência, o atual Código Civil optou por uma fórmula que espanca qualquer dúvida. Prazos de prescrição são, apenas e exclusivamente, os taxativamente discriminados na Parte Geral, nos arts 205 (regra geral) e 206 (regras especiais), sendo de decadência todos os demais, estabelecidos como complemento de cada artigo que rege a matéria, tanto na Parte Geral como na Especial. Para evitar a discussão sobre se ação prescreve, ou não, adotou-se a tese da prescrição da pretensão, por ser considerada a mais condizente com o Direito Processual contemporâneo. (Direito Civil Comentado – A Parte Geral, Roberto Gonçalves, v. I, pp. 510-511, 2010 Saraiva – São Paulo).

1.        Conceito legal de prescrição

É a extinção da pretensão do titular de um direito violado que se opera pela desídia de seu titular que foi inerte durante o lapso de tempo estipulado pela lei. Acolhendo o critério proposto por Agnelo Amorim, o legislador explicitamente afirmou que o objeto da prescrição é a pretensão. A questão, entretanto, é complexa e ainda hoje gera grande divergência. O Código Civil de 2002, a exemplo do BGB alemão (§§ 194 e 198), por exemplo, afirma que o objeto da prescrição é a pretensão do titular do direito. O Código Civil italiano (art 2.934), no que é acompanhado pelo Código Civil português (art 298), por sua vez, afirma que o objeto da prescrição é o próprio direito. Por fim, o Código Civil de 1916, dizia ser a ação o objeto da prescrição (art 177). Da mesma forma a doutrina diverge quanto ao objeto da prescrição. Havendo quem siga a tradição romana, afirmando que o objeto da prescrição é a ação (Pontes de Miranda, Câmara Leal, Washington de Barros Monteiro), e quem entenda que o objeto da prescrição é o direito (Orlando Gomes, Caio Mário da Silva Pereira e Carvalho Santos).

2.        O critério científico de distinção da prescrição e da decadência de Agnelo Amorim Filho (RT 300/7 e RT 744/723)

Tal critério tem como ponto de partida a classificação dos direitos e a classificação das ações desenvolvida por Chiovenda. Segundo essa classificação, os direitos dividem-se em direitos a uma prestação, cujo elemento essencial é a obtenção de um bem da vida mediante uma ação de outrem (prestação), seja ela de dar, fazer ou não fazer, e direitos potestativos os quais conferem a seu titular o poder de influir na esfera jurídica alheia sem que seja necessária qualquer vontade ou ação do sujeito passivo. Uma vez que os direitos a uma prestação dependem necessariamente da vontade do sujeito passivo, que pode negar-se a realizar a prestação a qual está obrigado, tais direitos soa passiveis de serem lesados. Nas palavras de Chiovenda: “quando o direito a uma prestação deixar de corresponder o estado de fato, por não se haver satisfeito a prestação, diz-se lesado o direito. (...) Ao aludirmos à lesão dos direitos, tivemos presentes exclusivamente os direitos a uma prestação; e isso porque só estes podem ser lesados”. (1) Por outro lado, nos direitos potestativos não existe a obrigação a um determinado comportamento por parte do sujeito passivo. Nessa categoria dos direitos potestativos, o sujeito passivo encontra-se num estado de sujeição em relação ao titular do direito, entendendo-se esse estado de sujeição como sendo a impossibilidade de opor-se à vontade de seu titular ou aos efeitos jurídicos decorrentes dessa vontade. Por sua vez, com o desenvolvimento da ciência processual, as ações passaram a ser classificadas de acordo com a natureza do provimento judicial pleiteado, e não mais de acordo com a natureza do direito nela discutido. De acordo com essa classificação, a doutrina passou a identificar a existência de ações condenatórias, constitutivas e declaratórias. São ações condenatórias aquelas ações cujo objeto é impor ao réu o cumprimento de uma determinada prestação, uma vez que correlativo ao conceito de condenação é o conceito de prestação. As ações constitutivas, por sua vez, são aquelas em que se busca a criação, extinção ou a modificação de um estado jurídico. Tais ações, por consequência, jamais tem o condão de, por si só, impor, coercitivamente, uma obrigação ao réu. Por fim, as ações meramente declaratórias têm por objeto sanar uma crise de certeza. Ou seja, por fim a uma dúvida sobre a existência ou inexistência de um direito. A partir de tais modernas classificações das ações e dos direitos é que Agnelo Amorim construiu seu critério de distinção da prescrição e da decadência, presente no Código Civil de 2002, relacionando os direitos de prestação com as ações condenatórias e os direitos potestativos com as ações constitutivas. Descumprida a obrigação a uma prestação, poderá o titular do direito lesado pedir o adimplemento forçado dessa prestação mediante uma ação condenatória, a qual fica sujeita à prescrição, por sua vez, para a alteração de uma situação jurídico-material que alguém não deseja e pretende eliminar, é necessária a via da ação constitutiva. Nas palavras de Cândido Rangel Dinamarco “é a ordem jurídica substancial que lhe confere o direito subjetivo a modificações dessa ordem, não a lei do processo. Ter direito à dissolução da sociedade conjugal, ou do vínculo material, tê-lo à aquisição do direito de propriedade sobre um imóvel que lhe foi prometido à venda, ou à anulação do contrato por vício do consentimento, ou do ato administrativo por ilegalidade ou incompetência, são puros temas de direito material. A técnica processual representada pelas sentenças constitutivas é somente um instrumental de apoio a esse direitos. (2) Tais ações, por sua vez, ficam todas sujeitas à decadência, e não à prescrição. Por fim, as ações declaratórias nada alteram e nada impõem, voltando-se apenas a sanar uma crise de certeza, não estando sujeito à prescrição, tampouco à decadência. A questão, em tais casos, deverá ser resolvida com base na verificação da existência do interesse de agir. Nesse sentido: “a ação declaratória de nulidade é imprescritível quando seu objeto se limita ao reconhecimento de determinada relação jurídica. Contudo, quando já transcorrido o prazo prescricional, carece de interesse jurídico a obtenção de declaração de nulidade, porque prescrita está a tutela condenatória decorrente da relação jurídica objeto da referida ação. Precedentes” (STJ, AgRg no Ag n. 1064.164-SP, rel. Min. Laurita Vaz, j. 30.03.09). No mesmo sentido é a doutrina: “é preciso distinguir entre o contrato nulo executado e o contrato nulo nunca executado. Se houver a execução, as pretensões dela derivadas prescrevem no prazo que lhes é próprio e, por conseguinte, não é de se admitir a tardia ação declaratória de nulidade, não porque nesta tenha incorrido em prescrição, mas porque faltará interesse á parte, e sem interesse ninguém é admitido a litigar em juízo (CPC/1973 art 3º, com correspondência no CPC/2015, art 17).” (3)

3.        Princípio da actio nata

Segundo o princípio da actio nata, começa a correr o prazo prescricional no momento em que todos os requisitos indispensáveis à propositura da ação estão reunidos. É apenas com a violação do direito que seu titular passa a ter interesse em buscar o Poder Judiciário para obter seu adimplemento forçado. Antes disso, não sendo sequer possível a propositura da ação, desídia ou inércia alguma existem que possibilitem o início do prazo prescricional. Além disso, para que se possa falar em inércia, é necessário ainda que o titular do direito tenha ciência de sua violação, sem a qual “1) O início do prazo prescricional ocorre com o surgimento da pretensão, que decorre da exigibilidade do direito subjetivo; 2) o art 189 diz respeito a casos em que a pretensão nasce imediatamente após a violação do direito absoluto ou da obrigação de não fazer” (I Jornada de Direito Civil, enunciado 14).

4.        Demora do judiciário

É a citação válida que interrompe a prescrição, não a simples propositura da ação, a qual, entretanto, retroagirá à data da propositura da ação (CPC/1973, art 219, § 1º, com correspondência no CPC/2015, art 240, § 1º). Para que a interrupção da prescrição possa retroagir à data da propositura da ação, é necessário que o autor a promova no prazo de dez dias, não podendo, entretanto, ser prejudicado pela demora imputável exclusivamente ao judiciário (CPC/1973, art 219, §, com correspondência no CPC/2015, art 240, § 2º e STJ, súmula 106).  Todavia, concorrendo o autor para essa demora (indicando endereço errado para citação, deixando de recolher as custas etc.), a interrupção da prescrição ocorrerá apenas na data em que efetivamente ocorrer a citação, não retroagindo à data da propositura da ação. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 31.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

5.        Prescrição da execução

Prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação” (STF, súmula 150).

(1)      Instituições de Direito Processual Civil, I, São Paulo, Saraiva, 1.965, pp. 17-20.
(2)      ______________________________, 2ª ed., São Paulo, Malheiros, 2002, p. 249.
(3)      Humberto Theodoro Júnior, coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Comentários ao Código Civil: das pessoas, (arts 138 a 184), Vol. III, Rio de Janeiro, forense, 2010, p. 528.

Art.190. A exceção prescreve no mesmo prazo em que a pretensão. 1

Prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação” (STF, súmula 150).

1.        Prescrição da exceção

Exceção é sinônimo de defesa. A doutrina costuma classificar em exceções materiais e processuais. São exceções processuais as matérias de defesa de natureza processual invocadas pelo réu para opor-se à pretensão do autor. Inversamente, são exceções materiais as matérias de natureza substancial que o réu pode deduzir para opor-se à pretensão do autor. Em muitos casos, a matéria de direito alegada como exceção substancial também poderia ser veiculada por meio de uma pretensão autônoma. Basta imaginar no direito de credito que alguém possua contra um terceiro. Uma vez vencido, esse crédito por ser objeto de uma ação condenatória (pretensão), como pode também ser invocado como compensação em matéria de defesa. É a esse tipo de situação a que alude o presente artigo. Nesse exemplo, já prescrita a possibilidade de cobrar esse crédito, igualmente prescrita estará a possibilidade de alegar tal crédito como exceção. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 01.02.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

A justificativa apresentada pela Comissão Revisora para a manutenção da norma, que constitui inovação, segundo José Carlos Moreira Alves, é que se está suprindo uma lacuna do Código Civil, que tem dado problema na prática: “saber se a exceção prescreve (havendo quem sustente que qualquer exceção é imprescritível, já que o Código é omisso), e, em caso afirmativo, dentro de que prazo. Ambas as questões são solucionadas pelo artigo 190. O que se quer evitar é que, prescrita a pretensão, o direito com pretensão prescrita possa ser utilizado perpetuamente a título de exceção, como defesa. A referida Comissão Revisora menciona, a propósito, a seguinte observação de Hélio Tomaghi: “Quando a exceção se funda em um direito do réu (p. ex.: a compensação se baseia no crédito do réu contra o autor), prescrito este, não há mais como excepcioná-lo. Se a exceção não prescrevesse, perduraria ad infinitum..." (José Carlos Moreira Alves, A Parte Geral, cit., p. 152-153, apud, Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – pp. 517 - pdf – parte geral).

Art.191. A renúncia da prescrição pode ser expressa ou tácita, e só valerá, sendo feita, sem prejuízo de terceiro, depois que a prescrição se consumar; tácita é a renúncia quando se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição.1

O art 191 não admite a renúncia prévia da prescrição, antes que se tenha consumado. Não se admite a renúncia prévia, nem de prescrição em curso, mas só da consumada, porque o referido instituto é de ordem pública e a renúncia tornaria a ação imprescritível por vontade da parte.

Dois são os requisitos para a validade da renúncia: a) que a prescrição já esteja consumada; b) que não prejudique terceiro. Terceiros eventualmente prejudicados são os credores, pois a renúncia à possibilidade de alegar a prescrição pode acarretar a diminuição do patrimônio do devedor. Em se tratando de ato jurídico, requer a capacidade do agente, como nos orienta Roberto Gonçalves.

Observados esses requisitos, a renúncia, i.é, a desistência do direito de arguir a prescrição, pode ser expressa ou tácita. A renúncia expressa decorre de manifestação taxativa, inequívoca, escrita ou verbal, do devedor de que dela não pretende utilizar-se. Tácita, segundo dispõe o art 191, “é a renúncia quando se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição”. Consumada a prescrição, qualquer ato de reconhecimento da dívida por parte do devedor, como o pagamento parcial ou a composição visando à solução futura do débito, será interpretado como renúncia.

Na IV Jornada de Direito Civil realizada em Brasília, em outubro de 2006, foi aprovado o Enunciado 295, com o seguinte teor: “A revogação do art 194 do Código Civil pela Lei n. 11.280/2006, que determinou ao juiz o reconhecimento de ofício da prescrição, não retira do devedor a possibilidade de renúncia admitida no art 191 do texto codificado”.

O referido enunciado tem como objetivo exatamente evitar que os juízes deixem de reconhecer a prescrição de ofício ao examinarem a inicial, postergando tal pronunciamento para fase posterior, após o decurso do prazo para a defesa, sob o argumento de que devem esperar a manifestação do réu sobre o exercício do direito de renunciá-la. (Prescrição: Arguição em razões finais. Admissibilidade. Conceito de instância tomado como grau de hierarquia judiciária que possibilita a arguição do lapso prescricional em qualquer tempo e juízo” RT, 766/236, apud, Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – pp. 518-519 - pdf – parte geral).

1.        Renúncia da prescrição

Renúncia é um ato unilateral de abandono de disposição de um direito subjetivo, do qual a parte seja titular, no caso, o direito de alegar a ocorrência da prescrição em juízo e, com isso, opor-se à pretensão do autor. Diz o artigo 191 que a renúncia da prescrição apenas poderá ser feita depois que a prescrição se consumar. É nula, portanto, a renúncia feita antes de consumada a prescrição. Além disso, a renúncia pode ser expressa ou tácita. Será expressa quando o prescribente explicitamente abrir mão da possibilidade de invocar a prescrição. Será tácita, por sua vez, quando essa sua intenção de não exercer o direito de invocar a prescrição puder ser inferida por meio de outros atos praticados pelo interessado, como, por exemplo, o ato de pagar, transacionar, ou negociar uma dívida. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 01.02.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).