quinta-feira, 14 de março de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 243, 244, 245 – Das Obrigações de Dar Coisa Incerta – VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 243, 244, 245
– Das Obrigações de Dar Coisa Incerta
 – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título I – Das Modalidades das Obrigações (art. 233 a 285)
Capítulo I – Das Obrigações de Dar – Seção II – Das Obrigações
De Dar Coisa Incerta - vargasdigitador.blogspot.com

Art. 243. A coisa incerta será indicada, ao menos, pelo gênero e pela quantidade.

Conforme leciona Gustavo Bierambaum, a obrigação de dar coisa incerta só é possível se o credor e o devedor tiverem condições mínimas de identificar o bem a ser entregue. Essa identificação mínima reside na indicação do gênero e da quantidade. Verifique-se que tanto um quanto outro devem ser indicados, pois não se trata de requisitos alternativos, na medida em que a presença de apenas um deles não permitirá a escolha ou concentração – ato pelo qual se identifica a coisa incerta, que, neste momento, se torna certa e passa a ser regida pelas regras aplicáveis à obrigação de dar coisa certa. Basta imaginar que a obrigação de entregar cem sacas de café é obrigação de dar coisa incerta, pois não há especificação do tipo de café a ser entregue, de modo que diversos deles poderão representar o atendimento da prestação. Não é suficiente afirmar que o objeto da prestação é cem sacas (quantidade), sem especificar o gênero do produto, pois a obrigação será inexequível. Do mesmo modo, não basta dizer que deverão ser entregues sacas de café colombiano (gênero), sem a indicação da quantidade delas. Não sendo a prestação determinável – pelo gênero e pela quantidade -, ao menos haverá que reconhecer a invalidade do negócio nos termos do disposto nos arts. 166, II, c/c 104, II do Código Civil. A obrigação de dar coisa incerta não se confunde com as obrigações alternativas (arts. 252 e 256 do CC), nas quais as prestações são especificadas e não se identificam apenas pelo gênero e pela quantidade. Essencialmente, nas alternativas, as prestações colocadas á escolha de um dos contratantes são, em si, certas e determinadas, não sendo, necessariamente, do mesmo gênero (BIERAMBAUM, Gustavo, “Classificacão: obrigações de dar, fazer e não fazer”. Obrigações: estudos na perspectiva civil-constitucional, coord. Gustavo Tepedino. Rio de Janeiro. Renovar, 2005, p. 133).

No entender de Caio Mário da Silva Pereira, para que as obrigações de dar coisa incerta sejam possíveis, deverão estar, cumulativamente, indicados, no título correspondente, o gênero e a quantidade do bem objeto da obrigação. Sem a presença de qualquer um deles, impossibilita-se o ato de escolha ou concentração, por meio do qual é identificada a coisa incerta, a qual, nesse momento, torna-se certa. Nesse aspecto, Pereira preleciona que “o estado de indeterminação é transitório, sob pena de faltar objeto à obrigação. O devedor não pode ser compelido à prestação genérica. Até o momento da execução, a obrigação de gênero deverá converter-se em entrega de coisa certa”. Assim, nos casos em que não for possível proceder-se com a escolha, deverá ser decretada invalidade do negócio (CC, arts. 104, II e 166, II). (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, p. 56.)

Art. 244. Nas coisas determinadas pelo gênero e pela quantidade, a escolha pertence ao devedor, se o contrário não resultar do título da obrigação; mas não poderá dar a coisa pior, nem será obrigado a prestar o melhor.

Segundo Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, faculta-se às partes a escolha tanto de quem deverá escolher, como do momento em que a escolha será realizada. Na falta de indicação precisa, a escolha caberá ao devedor e quedar-se-á concretizada no momento da entrega do bem. E estendem-se que na individuação dos bens a serem entregues, inexistindo qualquer indicação precisa, deve-se escolher os bens que guardem as qualidades médias das coisas de seu gênero. Por questão de boa-fé (CC, arts. 113 e 422), não poderá o devedor optar pelas piores, nem o credor exigir as melhores. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 13.03.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Hamid Charaf Bdine Jr, ilustrando artigo onde cita Caio Mário da Silva Pereira, esse dispositivo se aplica aos casos em que a coisa a ser entregue é determinada apenas pelo gênero e pela quantidade. Assegura que a escolha deverá ser feita pelo devedor, se o título não dispuser de modo diverso. Trata-se de norma de natureza dispositiva, uma vez que nada impede que as partes decidam atribuir a escolha ao credor ou à terceira pessoa. Nos casos em que o devedor é quem escolhe o bem a ser entregue, isto e, quem decide qual a coisa certa dentre as várias alternativas fixadas pelo gênero e pela quantidade, o dispositivo em exame estabelece que ele deverá optar pelo bem de qualidade intermediária, pois não poderá dar bem da pior qualidade, nem estará obrigado a dar da melhor. No tratamento do legado, no direito das sucessões, o Código Civil, em seu art. 1.929, estabelece que, se o legado foi determinado pelo gênero, a escolha será feita pelo herdeiro, que também deverá optar por bem de qualidade intermediária. O art. 1.930 determina que se aplique a mesma regra quando a escolha do legado for deixada ao arbítrio de terceiro ou, quando esse não quiser ou não puder exercer a escolha, do juiz. O art. 244 deve ser interpretado segundo o princípio de que o devedor deve escolher entre as várias alternativas possíveis, um bem de qualidade intermediária (Pereira, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, 20, ed., atualizada por Luiz Roldão de Freitas Gomes. Rio de Janeiro: Forense, 2003, v. II, p. 56). O fato de o artigo indicar que o devedor não pode escolher a coisa pior poderá dar ao intérprete a impressão de que ele está autorizado a entregar o penúltimo bem na ordem de gradação. Ou seja, havendo dez bens, o devedor pode escolher o que estiver em nono lugar em uma hipotética tabela de classificação. A interpretação que melhor atende à finalidade do dispositivo, contudo, é a que considera que ele estará sempre obrigado a entregar um bem de qualidade intermediária. Essa conclusão está adequada à boa-fé objetiva – o dever de agir como homem reto, leal e solidário, atento aos interesses do outro contratante (art. 422 do CC). Nada impede, porém, adverte Caio Mário, que as partes convencionem que será entregue o pior ou o melhor dentre as coisas do gênero (op cit., p. 56). Gustavo Bierambaum, a nosso ver com razão, discorda de Sílvio Rodrigues e sustenta que também o credor que tiver a opção de escolha não poderá eleger o melhor dos bens disponíveis (“Classificação: obrigações de dar, fazer e não fazer”. Obrigações: estudos na perspectiva civil-constitucional, coord. Gustavo Tepedino. Rio de Janeiro. Renovar, 2005, p. 130). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p 195 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11.03.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 245. Cientificado da escolha o credor, vigorará o disposto na Seção antecedente.

Seguindo na esteira do Hamid Charaf Bdine Jr, após a escolha do bem a ser entregue, ele estará individualizado e deixará de ser incerto. Em consequência, as regras que se aplicam à solução do cumprimento da obrigação são aquelas da seção antecedente destinadas às obrigações de dar coisa certa. O dispositivo deixa assentado que somente após a cientificação do credor tornar-se-á a coisa objeto da obrigação. O art. 876 do Código civil de 1916 estabelecia a própria escolha como momento a partir do qual incidiam as regras da seção anterior, o que permitia a interpretação de que o devedor podia fazer a escolha e aplicar as regras da obrigação de dar coisa certa antes mesmo de o credor saber qual bem especificamente lhe seria entregue. Outra questão que o dispositivo pode suscitar é o fato de ele cuidar apenas da identificação da escolha ao credor, sem disciplinar os casos em que a faculdade de escolher é dele, e não do devedor. É certo, porém, que nesse caso a escolha do credor tornará certa a obrigação apenas a partir do momento em que for cientificado o devedor. Até essa oportunidade, a escolha feita pelo credor não pode ser oponível ao devedor. Do mesmo modo, acrescenta Renan Lotufo, “se a concentração for da competência do credor ou de terceiro, aplicar-se-á outra regra, qual seja, ela somente obterá eficácia no instante em que for comunicada ao devedor ou a ambos, quando a escolha for de terceiro. Do contrário, conforme Antunes Varela (Das obrigações em geral, p. 850), o devedor não saberia que coisas lhe podiam ser exigidas, nem o credor com que coisas poderia contar” (Código Civil comentado. São Paulo, Saraiva, 2003, v. II, p. 44). Não se diga, porém, que a cientificação da escolha referida no presente dispositivo seja suficiente para caracterizar a mora. É possível que o momento da escolha não coincida com o do cumprimento efetivo, de maneira que, a despeito de a escolha ter sido cientificada ao interessado, ele ainda não fará jus à entrega. Assim, se um criador de cães é obrigado a entregar um animal ao adquirente no prazo de noventa dias, o fato de lhe comunicar qual o cão que lhe será entregue não implica que não possa aguardar o decurso do prazo estipulado para fazer a entrega. Nessa hipótese, é válida a escolha e a obrigação passa a ser de entrega de coisa certa. As regras a respeito da mora e do inadimplemento absoluto passam a ser as relativas à obrigação de dar coisa certa (arts. 233 e ss, do CC). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p 195 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13.03.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na comunhão de Caio Mário da Silva Pereira, o ato de escolha é, conforme determinado no art. 246, o divisor de águas nas obrigações de entregar coisa incerta. Antes da individuação, o devedor continua obrigado a cumprir a obrigação, independentemente de qualquer dano que se abata à coisa; após a escolha, havendo a perda da coisa sem que haja culpa ou dolo de sua parte, a obrigação resolve-se. Desse modo, faz-se imperioso que o ato da escolha seja positivado de maneira inequívoca. Não basta que o devedor separe o bem a ser entregue ao credor, mas que, efetivamente, venha a coloca-lo à disposição do credor. Inexistindo indicação diversa em contrato, o credor deverá ser notificado da escolha, por via judicial ou extrajudicial.

E conclui, com a escolha, a relação obrigacional passa a ser regida pelas normas atinentes às obrigações de dar coisa certa (CC, arts. 233 a 242). Nesse sentido, Pereira destaca que o estado de indeterminação “cessará, pois, com a escolha, a qual se verifica e se reputa consumada, tanto no momento em que o devedor efetiva a entrega real da coisa, como ainda quando diligencia praticar o necessário á prestação”. (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, p. 56.)

De forma mais abrangente, Hamid Charaf Bdine Jr, afirma que até o momento da escolha – ou, mais especificamente, como assegura o artigo antecedente, até a cientificação da escolha -, não há individualização do bem a ser entregue pelo devedor, de modo que não é possível admitir o perecimento ou a deterioração para a resolução da obrigação. Com efeito, até a escolha, o bem indicado pelo gênero e pela quantidade pode ser encontrado para a satisfação da obrigação devida, sendo irrelevante que o bem separado pelo devedor, com o objetivo de dar cumprimento à obrigação, venha a se perder ou deteriorar. É essencial para que a escolha produza efeitos em relação ao credor que ela seja exteriorizada, permitindo que se possa saber exatamente qual o bem que será entregue ao credor (art. 245 do CC). Adverte Caio Mário da Silva Pereira que somente por exceção se poderá dizer que determinado gênero desapareceu completamente (Instituições de direito civil, 20, ed., atualizada por Luiz Roldão de Freitas Gomes. Rio de Janeiro: Forense, 2003, v. II, p. 57). Enquanto houver possibilidade de encontrar quantidade suficiente do gênero da coisa indicada para cumprimento da prestação, o adimplemento será possível. Talvez a regra não possa ser aplicada com extremo rigor em hipóteses específicas, em que, a despeito de a obrigação recair sobre a entrega de coisa incerta e de o ajuste ser celebrado entre as partes, seja possível extrair que a universalidade sobre a qual recairá a escolha integra gênero restrito (MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado, Campinas, Bookseller, 2003, t. XXII, p. 134-5). Nesse caso, se todos os bens perecerem ou se deteriorarem sem culpa do devedor, será aplicável à hipótese a solução própria das obrigações de dar coisa certa (arts. 234 e 235 do CC) (PEREIRA, Caio Mário. Op cit., p. 57). Caso o perecimento ou a deterioração resultarem de culpa do devedor, as soluções serão as que se estabelecem nos arts 234, segunda parte, e 236. Basta imaginar que determinada viúva de um marceneiro se obriga a entregar ao credor uma das várias mesas confeccionadas por ele. No entanto, antes da data da entrega, os móveis são furtados, de maneira que a infungibilidade da obrigação irá impedi-la de cumprir tal obrigação, sendo irrelevante que se tratasse de obrigação de coisa incerta, determinada apenas pelo gênero e pela quantidade (CRUZ, Gisela Sampaio da. “Obrigações alternativas e com faculdade alternativa. Obrigações de meio e de resultado”. Obrigações: estudos na perspectiva civil-constitucional, coord. Gustavo Tepedino, Rio de Janeiro. Renovar, 2005, p. 150-I). O tema também foi enfrentado por Gustavo Bierambaum que aponta outra exceção à regra em exame: mercadoria que deixa de ser fabricada entre o momento da celebração do negócio e o da concentração – momento da identificação da coisa, que passa a ser certa – (“Classificacão: obrigações de dar, fazer e não fazer”. Obrigações: estudos na perspectiva civil-constitucional, coord. Gustavo Tepedino. Rio de Janeiro. Renovar, 2005, p. 132). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p 195 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13.03.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

quarta-feira, 13 de março de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 241, 242 – Das Benfeitorias – Obrigação de Dar - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 241, 242
– Das Benfeitorias – Obrigação de Dar -  VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título I – Das Modalidades das Obrigações (art. 233 a 285)
Capítulo I – Das Obrigações de Dar – Seção I – Das Obrigações
De Dar Coisa Certa - vargasdigitador.blogspot.com

Art. 241. Se, no caso do art. 238, sobrevier melhoramento ou acréscimo à coisa, sem despesa ou trabalho do devedor, lucrará o credor, desobrigado de indenização.
No entendimento de Hamid Charaf Bdine Jr, a menção refere-se aos casos mencionados no art. 238, i.é, à obrigação de restituir. O bem encontra-se em poder do devedor, mas é de propriedade do credor, de modo que tudo o que a ele for acrescido a este pertencerá, pois, o acessório segue o principal. No entanto, para que não haja enriquecimento sem causa do credor à custa do devedor, se os melhoramentos ou acréscimos resultarem de despesa ou trabalho do devedor, estará aquele obrigado a indenizá-lo – o que se extrai da norma a contrario sensu – e está disciplinado no artigo seguinte. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p 193 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11.03.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Sob o enfoque de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, nas obrigações de restituir, diversamente do que se dá na obrigação de dar coisa certa (CC, art. 237), as melhorias acrescem ao patrimônio do credor da obrigação (dono), sem que nada possa ser cobrado pelo devedor. Para maiores esclarecimentos, vide comentários ao artigo 237 supracitado. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 11.03.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 242. Se para o melhoramento, ou aumento, empregou o devedor trabalho ou dispêndio, o caso se regulará pelas normas deste Código atinentes às benfeitorias realizadas pelo possuidor de boa-fé ou de má-fé.
Parágrafo único. Quanto aos frutos percebidos, observar-se-á, do mesmo modo, o disposto neste Código, acerca do possuidor de boa-fé ou de má-fé.
Nas palavras de Hamid Charaf Bdine Jr cuida-se de disciplinar o modo pelo qual se vai apurar o valor da indenização que o credor pagará ao devedor por melhoramentos ou acréscimos decorrentes de seu trabalho ou com despesas suportadas por este. As normas escolhidas pelo legislador são as atinentes às benfeitorias realizadas pelo possuidor, que se encontram disciplinadas nos arts. 1.219 a 1.222 do Código Civil. Do mesmo modo, no que tange aos frutos do bem a restituir, adotar-se-ão as regras dos arts. 1.214 a 1.216 do mesmo Livro. Segundo Roberto Gonçalves, “citando o devedor de boa-fé, tem direito à indenização dos melhoramentos ou aumentos necessários e úteis, quanto aos voluptuários, se não for pago o respectivo valor, [o devedor] pode levantá-los (jus tollendi) quando o puder sem detrimento da coisa e se o credor não preferir ficar com eles, indenizando o seu valor” (Direito civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2004, v. II, p. 50). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p 194 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11.03.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Verbagracie Jurisprudência: Comodato de imóvel. Realização de melhorias pelo comodatário. Pleito de ressarcimento de valores. Retomada do bem. Comodatário que, na condição de possuidor de boa-fé, tem direito à indenização pelas benfeitorias úteis e necessárias empregadas no imóvel, sob pena de enriquecimento indevido do proprietário. Aplicação dos arts. 242 e 1.219 do CC. Recurso provido para o fim de julgar procedente o pedido. (Turmas Recursais – RS, Rec. Cível n. 71.001.121.979, 3ª T. Recursal Cível, rel. Eugênio Facchini Neto, j. 27.02.2007, DJ 14.03.2007).

Aplicam-se as regras atinentes à distribuição de frutos aos possuidores, variando conforme esteja o devedor de boa ou de má-fé (CC, arts. 1214 a 1.216).

No diapasão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, o devedor da obrigação de restituir coisa certa poderá pleitear ressarcimento por melhoramentos e acrescido ao bem somente na hipótese de haver concorrido para eles com seu trabalho ou dispêndios. Tal regra é lógica da vedação do sistema ao enriquecimento sem causa (CC. Art. 884). Aplicam-se à hipótese as regras atinentes às benfeitorias realizadas por possuidor (CC, arts. 1.219 a 1.222). (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 13.03.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 12 de março de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 238, 239, 240 – Das Obrigações de Dar – VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 238, 239, 240
– Das Obrigações de Dar – VARGAS, Paulo S. R. 

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título I – Das Modalidades das Obrigações (art. 233 a 285)
Capítulo I – Das Obrigações de Dar – Seção I – Das Obrigações
De Dar Coisa Certa - vargasdigitador.blogspot.com

Art. 238. Se a obrigação for de restituir coisa certa, e esta, sem culpa do devedor, se perder antes da tradição, sofrerá o credor a perda, e a obrigação se resolverá, ressalvados os seus direitos até o dia da perda.
Tem-se com Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina que, na obrigação de restituir coisa certa, a perda ou deterioração do bem extingue o vínculo entre devedor e credor. Assim, nessa hipótese, a lei determina que é o credor da obrigação quem arcará com os prejuízos decorrentes do dano superveniente, caso o devedor não tenha concorrido para sua ocorrência. Na perda, o vínculo obrigacional, simplesmente, resolve-se. Na deterioração, além da extinção do liame entre as partes, percebe-se que também na obrigação de restituir é o dono da coisa (o credor da obrigação a restituir) quem deve arcar com os riscos a quem a coisa está sujeita (res perit domino).

E ainda, no contrato estimatório, há exceção à regra do artigo 238. Nesse tipo contratual, o consignatário fica responsável pelo ressarcimento do valor equivalente à coisa, ainda que esta tenha se perdido sem sua culpa. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 11.03.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

E seguindo na esteira de Hamid Charaf Bdine Jr a obrigação de dar coisa certa compreende a de restituir. Nesta também há obrigação de dar coisa certa, com a diferença de que aquilo que se deve entregar ao credor já lhe pertencia – é o que ocorre com o comodato de bem móvel. Nesse caso, o devedor não é o proprietário do bem, de maneira que, se a coisa perece em suas mãos, antes da tradição, a perda será do credor – valendo o princípio de que a coisa perece para o dono, na medida em que a coisa lhe pertence e está em mãos do devedor obrigado a restituí-la. Contudo, se até o dia da perda o devedor estava obrigado a pagar pelo bem ao credor, ou se outros direitos lhe eram assegurados, este fará jus ao seu recebimento. Este artigo se aplica, como já se disse, ao comodato, de maneira que o comodatário não está obrigado a indenizar o proprietário se o trator que tomou emprestado para arar a terra for roubado de sua propriedade, ou mesmo furtado de local seguro em que se encontrava, uma vez que nesses casos não haverá culpa do comodatário – devedor da obrigação de restituir. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p 191 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11.03.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 239. Se a coisa se perder por culpa do devedor, responderá este pelo equivalente, mais perdas e danos.

Como não poderia deixar de ser, tendo havido comportamento malicioso ou culposo por parte do devedor na perda da coisa a ser restituída, aquele deverá responder pelo equivalente, bem como arcar com as perdas e danos que causou ao credor. “DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. AUTORA DECLARA EM JUÍZO QUE ERA SUA A RESPONSABILIDADE EM CASO DE SUBSTRAÇÃO DAS JÓIAS QUE PERTENCIAM À RÉ. OBRIGAÇÃO DE DAR COISA CERTA NA MODALIDADE DE RESTITUIR. Na obrigação de restituir, a coisa pertence ao credor, mas se encontra temporariamente com o devedor e perecendo a coisa por culpa deste último, ou assumindo ele o dever de ressarcir os prejuízos ocorridos, inclusive em caso de subtração, compete ao mesmo devedor repor o valor equivalente à coisa parecida. Art. 239 do CC, Sentença de improcedência mantida. Recurso não provido” (TJSP, 37ª Câmara, Dir. Privado, Apelação n. 991090387334, Rel. Roberto MacCraken, j. 28.04.2010). (Apelação apresentada em Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 11.03.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No raciocínio de Hamid Charaf Bdine Jr, diversamente do que consta do art. 238, nesse dispositivo há previsão de perdas e danos, que serão devidos pelo devedor da obrigação de restituir coisa certa se ela se perder por sua culpa. Na obrigação de restituir coisa pertencente ao credor, o devedor será responsabilizado pelo pagamento do equivalente em dinheiro, mas perdas e danos, se agir com negligência, imprudência ou imperícia. A solução prevista nesse dispositivo corresponde à prevista no art. 236 para o caso de deterioração da coisa. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p 192 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11.03.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em jurisprudência apresentada, ainda às páginas 192, entende-se: “Portanto, sendo do locatário a obrigação de restituir a coisa certa (imóvel locado), a sua responsabilidade está disciplinada nos arts. 868 e 865 do CCBB. Se a coisa se perder por culpa do devedor, responderá ele pelo equivalente, mais perdas e danos (CCB, arts. 870 e 865, segunda alínea), pois cessa, no momento em que o locador é imitido na posse do imóvel, a obrigação de restituir. Em consequência, até a imissão, responderá o locatário pelo pagamento dos alugueres e eventuais danos. (II TAC, AI, n. 460.180, rel. Juiz Clóvis Castelo, j. 27.05.1996). 

A pretensão inicial refere-se à consignação de ambas as espécies, pois objetiva a devolução de bombas de gasolina, poste com emblema da marca da apelada, em princípio infungíveis, além do dinheiro pelos tanques de combustível, que se encontram enterrados no estabelecimento da apelante, pelo menos na origem são fungíveis. Ademais, basta que o custo de desenterrar os tanques supere o valor destes para que seja cogitável a hipótese prevista no art. 239 do CC/2002, aplicável à espécie por força do art. 2.035 deste mesmo diploma. Aliás, existe até jurisprudência deste Tribunal que acolhe a pretensão inicial, conforme se infere da apelação n. 1.168.006-5, da relatoria do Juiz Antonio Ribeiro, da 1ª Câmara, bem como da Apelação n. 908.040-4 da relatoria de Matheus Fontes, da 12ª Câmara, também deste Tribunal. Enfim, não se pode, de plano, afastar a pretensão, que, em princípio, se mostra viável de ser examinada, pelo que se afasta a extinção do processo. Diante do exposto, dá-se provimento ao recurso. Presidiu o julgamento, com voto, o Juiz Márcio Franklin Nogueira (3º Juiz) e dele participou o Juiz Luiz Burza Neto (revisor). São Paulo, 18 de agosto de 2004. (TJSP, Ap. com revisão n. 1.251.044.600, 8ª Câmara de Férias de julho de 2004, rel. Rui. Cascaldi, j. 18.08.2004). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p 192 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11.03.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 240. Se a coisa restituível se deteriorar sem culpa do devedor, recebê-la-á o credor, tal qual se ache, sem direito a indenização; se por culpa do devedor, observar-se-á o disposto no art. 239.

Conforme comentário de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, ao artigo 238, não havendo do devedor na deterioração do bem, a obrigação de restituir resolve-se, com a obrigação do credor a receber o bem no estado em que se encontra.

E, em caso de ato culposo ou doloso por parte do devedor, o credor terá a opção de aceitar o bem no estado em que se encontra ou rejeitá-lo, com pedido para recebimento do equivalente, na mesma linha do que dispõe o artigo 236 do Código (Enunciado 15 do CEJ: “As disposições do art. 236 do novo Código Civil também são aplicáveis à hipótese do art. 240, in fine”). Em ambos os casos, confere-se ao credor a prerrogativa de ser indenizado pelas eventuais perdas e danos decorrentes da deterioração do bem. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 11.03.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Hamid Charaf Bdine Jr, esse dispositivo tem relação com os arts. 238 e 239, mas, ao contrário destes, não se refere à perda do bem que se está obrigado a restituir, mas sim ao bem danificado – i.é, estragado, mas não integralmente destruído. As soluções são as mesmas dos mencionados dispositivos: se não houver culpa do devedor, o credor recebe o bem deteriorado e não tem direito a perdas e danos. Se houver culpa, pode postular o valor equivalente à desvalorização pela deterioração – ou ao necessário para os reparos -, além da indenização por perdas e danos (pois a segunda parte do dispositivo em exame remete ao art. 239 do código Civil). O tratamento do tema coincide com o que é dado no art. 235, que se refere à coisa deteriorada. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p 193 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11.03.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Clareia-se com a Jurisprudência a seguir: Obrigação de restituir. Fogão entregue para conserto cuja devolução é solicitada após largo período de o. aquele que recebe determinado bem para conserto, mesmo decorrido largo período de tempo, não pode recusar-se a devolvê-lo, notadamente quando admite, por ocasião de seu depoimento pessoal, que embora desmontado, ainda o possui. Eventual deterioração da coisa, questão que não foi objeto da lide, deverá ser solvida por ocasião do cumprimento da obrigação consagrada na sentença, na forma do art. 240 do Código Civil. Recurso improvido. Sentença mantida por seus próprios fundamentos. (Turmas recursais – RS. Rec. Cível n. 71.000.602.292, 2ª T. Recursal Cível, rel. Luiz Antonio Alves Capra, j. 23.02.2005, DJ 14.03.2005).

segunda-feira, 11 de março de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 235, 236, 237 – Das Modalidades das Obrigações – VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 235, 236, 237
– Das Modalidades das Obrigações – VARGAS, Paulo S. R. 

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título I – Das Modalidades das Obrigações (art. 233 a 285)
Capítulo I – Das Obrigações de Dar – Seção I – Das Obrigações
De Dar Coisa Certa - vargasdigitador.blogspot.com

Art. 235. Deteriorado a coisa, 1 não sendo o devedor culpado, poderá o credor resolver a obrigação, ou aceitar a coisa, abatido de seu preço o valor que perdeu. 2, 3

1.       No diapasão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Sam Mezzalina, a deterioração do
bem há de ser ponderável, não sendo adequado enjeitar-se o bem (conforme técnica a ser abordada a seguir), por danificação insignificante.

2.        No caso de mera deterioração do bem,  a lei confere  ao credor  as  alternativas  entre
receber o bem com o abatimento proporcional do preço acordado ou, simplesmente, deixar de recebê-lo, com a restituição de eventual preço pago.

3.     Quanto  à  execução  de  sentença.    Entrega  de  coisa certa,  os  mestres  Luís  Paulo
 Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina apontam que, “havendo deterioração da coisa, dever-se-á, em liquidação, apurar o valor dos danos a serem reparados. Desnecessidade de instauração de outros processos” (STJ, 3ª Turma, REsp n. 38.478, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 15.3.1994). (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 10.03.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Já seguindo no diapasão de Hamid Charaf Bdine Jr, cientifica-se que, neste dispositivo, o legislador já não cuida do perecimento do bem, objeto do dispositivo anterior, mas de sua deterioração – ou seja, danificação sem destruição total -, facultando ao credor resolver a obrigação ou aceita r a coisa, mas exigir abatimento do preço correspondente à desvalorização proveniente da deterioração. Assegura-se ao prejudicado a possibilidade de optar pela solução que preferir. Para a hipótese de a deterioração ter resultado de conduta culposa do devedor, a solução da questão está estabelecida no artigo seguinte. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p 190 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 10.03.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 236. Sendo culpado o devedor, poderá o credor exigir o equivalente, ou aceita a coisa no estado em que se acha, com direito a reclamar, em um ou em outro caso, indenização das perdas e danos. 1

Na experiência de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, o artigo 236, ora comentado, complementa a hipótese do artigo 235, para conferir ao credor a hipótese de requerer o equivalente pecuniário pela coisa perdida e, em qualquer caso, reclamar perdas e danos decorrentes da deterioração do bem, caso esta tenha se dado em razão de malícia ou ato culposo do devedor. A respeito do recebimento do equivalente pecuniário à coisa, vide comentários ao artigo 234 supra. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 10.03.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Hamid Charaf Bdine Jr, se a deterioração da coisa resultar de culpa do   devedor, assegura-se ao credor a possibilidade de optar entre exigir o equivalente ou aceitar a coisa com a deterioração que apresentar. Em qualquer caso, fará jus à indenização por perdas e danos. Caso o credor não receba o produto que lhe é devido em perfeitas condições, poderá exigir abatimento do preço, deduzindo-se a quantia decorrente da desvalorização (vide artigo anterior – 235/CC), e indenização por perdas e danos. Poderá, ainda, desistir do negócio e receber a devolução do valor equivalente ao do bem em perfeito estado. Vale observar que o credor é autorizado a exigir o valor do bem, mesmo que ele seja superior ao que foi pago, pois o objetivo é imputar a perda proveniente da deterioração ao proprietário do bem – que, no caso, é o devedor da obrigação de entrega de coisa certa. E o conceito de equivalência, verifiquem-se os comentários ao art. 234. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p 190 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 10.03.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 237. Até a tradição pertence ao devedor a coisa, com os seus melhoramentos e acrescidos, 1 pelos quais poderá exigir aumento no preço; se o credor não anuir, poderá o devedor resolver a obrigação. 2

Parágrafo único. Os frutos percebidos são do devedor, cabendo ao credor os pendentes. 3

1.         Usando   os   conhecimentos   de   Carlos  Roberto  Gonçalves,  melhoramento é tudo
aquilo que contribuir para uma alteração na coisa principal, de sorte a melhorá-la. Já o acrescido, como bem indica a própria expressão, seria simplesmente o que se acrescenta ao bem. (Gonçalves, Carlos Roberto. Direito Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2004, v. II, p. 49).

2.         Caio  Mário  da  Silva  Pereira,  nos  ensina  que,  se  de  um lado, a lei impõe ao
devedor a responsabilidade pela perda ou deterioração do bem até a efetiva execução da obrigação de dar, de outro, confere-lhe vantagem de, até o ato da tradição, beneficiar-se de melhoramentos e acréscimos que se adicionem à coisa. Assim, nos casos de superveniência de melhoria da coisa em obrigação de dar, faculta-se ao devedor a elevação do preço da coisa, em proporção ao valor do beneficiamento que se acresceu. Caso o credor recuse-se a arcar com esta alteração, o devedor fica com a faculdade de resolver a obrigação. Nada obstante, a boa doutrina recomenda parcimônia na aplicação da regra. Isso porque, levadas ás últimas consequências, a faculdade concedida ao devedor poderia servir de estímulo ao comportamento malicioso deste, eis que sempre haveria a possibilidade de se furtar ao contrato. Pereira, ainda afirma fazer-se necessário, então, que o julgado examine, atentamente, o caso concreto, a fim de que se possa discernir, com acuidade, a boa ou a má-fé do devedor e, por conseguinte, decidir se há ou não o direito ao ressarcimento. Nesse sentido, Caio menciona que o Código Argentino andou bem ao haver intercalado, em regra análoga, o requisito de que a melhoria não seja arbitrária ao devedor ou, se for, que as despesas tenham sido necessárias ou de conservação da coisa. (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, p. 54).

3.        Na  esteira  de  Clóvis  Beviláqua,  confere-se  ao  devedor  da  obrigação  de dar a
prerrogativa de apropriar-se de eventuais frutos da coisa que venha a perceber até o ato da tradição. Porém, mesma sorte não se confere aos frutos pendentes: estes, caso não sejam percebidos até o momento da tradição, integram o patrimônio do credor da obrigação. Esta regra, segundo Beviláqua, é decorrência natural do princípio acolhido por nosso Código de que o direito real constitui-se com a tradição do bem móvel o a transcrição do bem imóvel. Afinal, até o momento da tradição, o bem pertence ao devedor e dele se pode usar livremente, apropriando-se dos frutos percebidos, ainda que nenhum valor tenha sido despendido para tanto. Diversamente, não poderá se valer dos frutos pendentes para opor ao credor majoração do preço, eis que aqueles são incrementos normais, previstos e esperados da coisa. Afinal, em geral, quando as partes se obrigaram, já tinham ciência da existência de frutos em formação. (Beviláqua, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil Comentado, Rio Estácio de Sá: Rio de Janeiro, 1984, pp. 13-14).

Sob a análise de Hamid Charaf Bdine Jr, se, até a tradição, a coisa principal receber melhoramentos e acrescidos, pertencerão eles ao devedor, que poderá exigir aumento de preço. Ensina Carlos Roberto Gonçalves que melhoramento é tudo o que opera mudança para melhor na coisa principal; acrescido é o que se acrescenta a ela (Direito civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2004, v. II, 49). Caso o credor não concorde com o aumento do preço que dos melhoramentos e acrescidos resultar, o devedor poderá resolver a obrigação e cada qual das partes retornará à situações anterior sem direito a indenização, pois tratar-se-á de exercício de direito do devedor. Esse artigo parece estar em conflito com o art. 233, pois melhoramentos e acrescidos são acessórios do bem principal, de modo que, nos termos deste último dispositivo, haviam de estar abrangidos pelo principal. A conciliação de ambos é possível se se admitir que os acessórios de que trata o art. 233 são os que já existiam ao tempo da realização do negócio, enquanto os melhoramentos e acrescidos referidos no dispositivo de que ora se trata são os que surgem após a realização do negócio. Identifica-se a aplicação dessa regra na hipótese em que um criador adquire uma vaca em um leilão. De acordo com as regras do estabelecimento, ela lhe será entregue em quinze dias. No entanto, nesta oportunidade, ficou prenha, de modo que o arrematante receberá, além da vaca, a cria que a acompanha. A incidência do art. 237 à hipótese autoriza o alienante a exigir remuneração pela cria, que lhe pertence, pois foi acrescida ao bem principal após a efetivação do negócio. Ruy Rosado de Aguiar Júnior pondera que o devedor não tem direito de acionar o credor pelo aumento, mas lhe é conferida a possibilidade de postular a extinção do contrato diante da recusa ao pagamento (Extinção dos contratos por incumprimento do devedor, Aide, 2003, p. 164). Registre-se, porém, que a solução não deve ser aplicada se ficar evidenciada má-fé do devedor que pode acrescer melhoramentos na coisa para inviabilizar o negócio ou obrigar o devedor a pagar mais pelo bem. Nessa hipótese, a solução poderá ser o reconhecimento culposo do devedor, o que implica mora ou inadimplemento apto a obriga-lo a indenizar (Arts. 389 e 395 desse Código). Somente no caso de acréscimos feitos de boa-fé a disposição poderá incidir. Arnaldo Rizzardo, porém, opina no sentido de que não se incluem nesse dispositivo acessões e obras produzidas pelo homem (Obrigações, Forense, 2004, p. 90). Em relação aos frutos, o parágrafo único estabelece que serão do devedor os percebidos e do credor os pendentes. Vale dizer: aqueles que o devedor colher antes de entregar o bem ao credor lhe pertencerão. Mas os que ainda estiverem ligados ao bem principal quando ocorrer a tradição serão do credor. Reserva de domínio ou venda a contento. Segundo Gustavo Bierambaum, nos casos de venda a contento ou com reserva de domínio, a tradição em favor do adquirente se aperfeiçoa antes da efetiva transmissão do domínio, de maneira que o risco da coisa já lhe é transferido desde logo e ele não ficará livre do dever de pagar o preço estipulado (“Classificação: obrigações de dar, fazer e não fazer”. Obrigações: estudos na perspectiva civil-constitucional, coord. Gustavo Tepedino, Rio de Janeiro, Renovar, 2005, p. 127). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p 190-191 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 10.03.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

domingo, 10 de março de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 234 – Das Obrigações de Dar Coisa Certa – VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 234
– Das Obrigações de Dar Coisa Certa – VARGAS, Paulo S. R. 

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título I – Das Modalidades das Obrigações (art. 233 a 285)
Capítulo I – Das Obrigações de Dar – Seção I – Das Obrigações
De Dar Coisa Certa - vargasdigitador.blogspot.com

Art. 234. Se, no caso do artigo antecedente, a coisa se perder, 1 sem culpa do devedor, antes da tradição, ou pendente a condição suspensiva, fica resolvida a obrigação para ambas as partes; 2 se a perda resultar de culpa do devedor, responderá este pelo equivalente e mais perdas e danos. 3
Seguindo a esteira de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, (1) os dispositivos relativos à obrigação de dar coisa certa aventam acerca de duas hipóteses no que se refere aos riscos a que a coisa está sujeita: perda (periculum interitus) ou deterioração (periculum deteriorationis) da coisa, enquanto que a deterioração representa uma perda de parte das faculdades, substância ou capacidade de utilização da coisa. Na deterioração, não há o desaparecimento do bem, o qual subsiste ainda que imperfeito. [1] Justamente, por essa razão, Azevedo preleciona que melhor seria falar-se em perda total ou perda parcial do bem. [2] Contudo, não foram essas as expressões que se consagraram na prática forense. Especificamente, no tocante à perda da coisa, é de relevo esclarecer que este conceito deve ser compreendido de maneira ampla. A ideia de perda abrange tanto o desaparecimento total da coisa (interitus rei), quanto a extinção de suas qualidades essenciais, indisponibilidade, sua inatingibilidade ou, ainda, a confusão da coisa a ser entregue com uma outra. Atenta às distinções entre perda e deterioração, a lei dita desenlace diverso para cada uma dessas situações (CC, arts. 234 e 235, respectivamente). (2) O artigo 234 trata especificamente da Teoria dos Riscos. Ao explanar a matéria, Silva bem salienta que “o que maior atenção merece nesse tipo obrigacional é a teoria dos riscos”. [3] Segundo o autor, “chama-se ‘risco’ aquilo a que a coisa se acha exposta de deterioração ou perda” [4]. Nesse sentido, uma vez concretizado o risco – e, por conseguinte, o prejuízo material -, sem que qualquer das partes tenha concorrido para sua efetivação, há que se averiguar a qual das partes caberá arcar com as perdas financeiras decorrentes do dano efetivado. Afinal, mantendo-se incólume a obrigação de dar, sem que houvesse alteração na relação jurídica, seria o credor quem, ao final, receberia bem defeituoso, amargando as consequências do evento negativo que se abateu sobre a coisa entregue. Por outro lado, permitindo-se que a obrigação firmada seja resolvida ou haja o abatimento de eventual preço que se haja acordado em contrapartida à obrigação de dar, seria o devedor desta quem arcaria com as perdas – dessa forma, seria ele quem ficaria com um bem defeituoso ou receberia um valor inferior ao originalmente pactuado. Veja-se, portanto, que, de uma forma ou de outra, haverá uma redução no valor geral da transação econômica, fazendo-se necessário que se estabeleça de que forma essa perda será distribuída. (3) Perdendo-se a coisa antes da tradição ou na pendência de condição suspensiva, a execução da obrigação em espécie torna-se impossível. Por esse motivo, não havendo culpa por parte do devedor, a obrigação resolve-se para ambas as partes e retorna-se ao status quo ante (i.é, o devedor fica com o bem e o credor com o preço, se houver). Havendo o devedor contribuído para o resultado danoso, permite-se ao credor que cobre o equivalente ao que se perdeu cumulado com eventuais perdas e danos, à exceção das obrigações facultativas. Exemplificadamente, se determinado veículo objeto de contrato de compra e venda é roubado antes da transferência do domínio ou pendente alguma condição suspensiva, sem que haja culpa do devedor, o negócio deve ser desfeito e eventuais valores pagos pelo comprador ao vendedor devem ser devolvidos. Diversamente, caso o vendedor acidente-se, culposamente, com o veículo antes da transferência do domínio, ele estará obrigado não só a restituir o valor recebido, como também a indenizar o comprador por eventuais perdas e danos.

Percebia-se que, na hipótese de perda da coisa com dolo ou culpa do devedor, em se tratando de obrigação de dar coisa certa, a perda do bem impossibilita o cumprimento em espécie da obrigação, dado que as coisas certas não podem ser substituídas, com precisão, por outras semelhantes. Desse modo, a prestação de dar é substituída por uma prestação pecuniária (moeda universal das sub-rogações) que deve ter valor de coisa similar à perdida, ainda que tal importe seja superior a preço, originalmente acordado entre as partes. A esse respeito, é válido destacar que, assim como o credor não é obrigado a aceitar bem diverso, ainda que mais valioso, também o devedor não pode ser obrigado a entregar coisa diversa, ainda que de menor valor. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 08.03.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo na esteira de Hamid Charaf Bdine Jr, este artigo cuida das hipóteses de obrigação de coisa certa que perece antes da tradição, i.é, daqueles casos em que a obrigação de entregar ou restituir ainda não foi cumprida, mas o seu objeto, que é certo, se perde – por ato ilícito ou deterioração de qualquer origem. Segundo Caio Mário da Silva Pereira, “o conceito de perda para o direito é lato, e tanto abrange o seu desaparecimento total (interitus rei) quando ainda o deixar de ter as suas qualidades essenciais, ou tornar-se indisponível, ou situar-se em lugar que se tornou inatingível, ou ainda de confundir-se com outra. Logo, as regras devem ter em vista a deterioração ponderável, não sendo curial a rejeição da coisa por danificação insignificante. A apreciação da ressalva é de se fazer em face das circunstâncias” (Instituições de direito civil, 20. ed., atualizada por Luiz Roldão de Freitas Gomes. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. II, p. 51). O credor da obrigação não receberá o bem que lhe é devido, cumprindo verificar quais as consequências deste fato. Em sua primeira parte, o artigo estabelece que cada qual dos obrigados (credor e devedor) deve ser restituído à situação em que se encontrava antes de a obrigação ser assumida, se não houver culpa do devedor ou se o bem se perdeu enquanto ainda pendia condição suspensiva (art. 125 do CC). Assim, se o veículo pelo qual o credor ojá pagou for roubado, sem que nenhuma culpa possa ser imputada ao devedor da obrigação de entregar – i.é, o alienante -, o negócio estará resolvido e, em consequência, o valor pago será restituído ao comprador. O legislador opta por considerar que, até o momento da entrega da coisa, os riscos correm por conta do proprietário, que suportará o prejuízo. E acrescenta que essa mesma solução será adotada se o negócio tiver seus efeitos suspensos por uma condição suspensiva, é dizer, se o carro não houver sido entregue ao adquirente em razão de o contrato estabelecer que isso só ocorreria se o adquirente recebesse uma promoção em seu trabalho (fato futuro e incerto caracterizador da condição). Solução diversa, porém, será adotada se o devedor da obrigação tiver culpa pelo perecimento do bem – v.g., quando deixa de entregar o veículo ao comprador porque, culposamente, o envolveu em acidente que o inutilizou. Nessa hipótese, além de restituir ao adquirente o valor já recebido, estará sujeito à obrigação de indenizá-lo por perdas e danos (art. 402 do CC). Não se deve concluir que o bem seja de propriedade do devedor até o momento da entrega. Em primeiro lugar, porque o bem pode ser imóvel, de modo que a transferência do domínio pode ocorrer antes da entrega da posse, se o registro do negócio a preceder, em face do disposto no art. 1.245 deste Código. Em segundo, porque o proprietário do bem, na obrigação de restituir, é o credor, e não o devedor. Dessa forma, a conclusão extraída do presente dispositivo é que o legislador impõe ao proprietário – credor o devedor – o prejuízo decorrente da perda do bem (“a coisa perece para o dono”), se não houver culpa do devedor. E, se ele for culpado, a segunda parte do dispositivo o obriga a indenizar o credor. Nessa hipótese, se o proprietário do bem for o credor – em um contrato de comodato, por exemplo -, poderá postular indenização do devedor e entre as perdas e danos estará o valor do próprio bem que pereceu. Verifique-se que o valor do bem é o montante pecuniário correspondente a seu equivalente, sentido que se deve conferir a essa expressão, adotada no presente dispositivo. O devedor deve entregar ao credor, se agiu com culpa, não outro bem, mas sim o valor de um outro bem parecido ao que pereceu (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2004, v. II, p. 54). Segundo Everaldo Augusto Cambler, a perda referida nesse artigo ocorrerá quando “o objeto perde as qualidades essenciais, ou o valor econômico; se confunde com outro, de modo que se não possa distinguir; fica em lugar de onde não pode ser retirado (art. 74 do CC/1916). Carvalho Santos acrescenta a esse rol, ainda, o desaparecimento natural da coisa, ou o perecimento jurídico, quando a coisa é fora do comércio” (Comentários ao Código Civil brasileiro. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. III, p. 65). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p 188-189 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 07.03.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).