quinta-feira, 17 de outubro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 577, 578 - Da Locação de Coisas – VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 577, 578
- Da Locação de Coisas – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo V – Da Locação de Coisas
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 577. Morrendo o locador ou o locatário, transfere-se aos seus herdeiros a locação por tempo determinado.

Utilizando os conhecimentos de Nelson Rosenvald, em princípio, o contrato de locação não é intuitu personae, sendo passível de transmissão aos herdeiros do locador e do locatário até que se alcance o prazo estipulado (CC 1.784). Trata-se de uma sub-rogação contratual, pela qual os herdeiros assumem a posição econômica do de cujus. Mas, caso as forças da herança não suportem a locação, não poderá o locador exigir débitos vencidos do locatário (CC 1.792).

Outrossim, se eventualmente o contrato assumir conotação personalíssima, poderão os sucessores imediatamente desconstituir a relação, sem que tenham de assumir as cláusulas penais previstas para as partes originárias (v.g., locação de automóvel para anúncio de espetáculo musical, quando o artista-locatário falece). Se o contrato não possuir prazo, os herdeiros poderão denunciá-lo da mesma forma que as partes originárias, mediante interpelação. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 622- Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 17/10/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Correspondendo ao art. 1.198 do CC de 1916, a doutrina de Ricardo Fiuza aponta que a alteração das partes contratantes por sub-rogação objetiva, decorre desta previsão legal. As partes ao substituídas por seus sucessores enquanto em vigor o contrato de locação (REsp 167.978). A regra versa sobre efeito obrigacional, e por não ser a obrigação personalíssima, cabível é a transferência da relação jurídica, com todas as suas implicações, direitos e deveres, aos herdeiros do locador ou do locatário, falecendo estes. O evento morte de um dos contratantes acarreta a sucessão contratual da parte em um dos polos da relação ex locato, mantendo-se-lhe a incolumidade da locação. Para esse efeito, obrigam-se ambas as partes, a saber do contrato de prazo determinado. Entenda-se a referida sucessão operada automaticamente ar lege, assim se aperfeiçoando sem dependência de qualquer procedimento ou formalidade. A matéria está, por igual, regulada pelos arts. 11 e 12 da Lei n. 8.245/91. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 307 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 17/10/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Resumindo a intenção do artigo diz Marco Túlio de Carvalho Rocha que, por ser a locação um contrato impessoal, os herdeiros do locador ou do locatário assumem a posição contratual do sucedido e devem respeitar o prazo avençado caso a locação tenha sido contratada por prazo determinado. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 17.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 578. Salvo disposição em contrário, o locatário goza do direito de retenção, no caso de benfeitorias necessárias, ou no de benfeitorias uteis, se estas houverem sido feitas com expresso consentimento do locador.

Como explica Nelson Rosenvald, no silêncio do contrato, o locatário será indenizado pelas benfeitorias necessárias e também pelas úteis, com a ressalva quanto às últimas, desde que haja o consentimento expresso do locador.

As benfeitorias necessárias são aquelas que propiciam a conservação física da coisa (CC 96), daí se prescinde de prévia autorização para a atuação do locatário, pois sua necessidade é patente e o locador certamente a assumiria caso estivesse com o poder imediato sobre a coisa. Já as benfeitorias úteis aumentam ou facilitam o uso do bem. Portanto, só serão indenizadas se o referido acréscimo qualitativo foi objeto de permissão pelo locador. No particular, altera-se a regra geral do CC 1.219, na qual as benfeitorias úteis são sempre indenizáveis, sendo bastante a boa-fé do possuidor.

A norma permite que o locatário exercite o direito de retenção sobre o bem, até que seja indenizado pelas aludidas benfeitorias que se incorporam ao patrimônio do locador. A retenção é forma pela qual o locatário exercita a pretensão decorrente da violação do direito subjetivo ao pagamento e, ainda, meio coercitivo capaz de coibir o locador ao adimplemento, sob pena de não ingressar na coisa, mesmo após o êxito da demanda de desocupação em juízo. Em princípio, o direito de retenção não só é dirigido ao proprietário como também é oponível perante eventuais adquirentes. Todavia, o adquirente do imóvel locado não está obrigado pelas benfeitorias realizadas pelo locatário (Súmula n. 158 do STF).

Seguindo a linha da Lei do Inquilinato (Art. 35 da Lei n. 8.245/91), o Código Civil de 2002 inovou substancialmente em relação ao seu predecessor, permitindo que a autonomia privada dos contratantes excepcione a regra geral, a ponto de o locatário renunciar ao direito de indenização sobre qualquer forma de benfeitoria, mesmo as necessárias. Poder-se-ia cogitar da igualdade dos contratantes em uma relação estritamente privada, porém algumas ponderações merecem reflexão.

Primeiro, mesmo nas relações puramente civil, normalmente os contratos de locação se realizam sob a forma da adesão, pela qual o locatário apenas subscreve o contrato sem prévia discussão de conteúdo. Nesse ponto, é claro o art. 424, ao dispor que: “Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio”. Tratando-se eventualmente de uma relação de consumo, como a locação de apartamentos em apart-hotéis, haverá a proteção própria das relações de consumo (CDC, 51, XVI).

Segundo, a inserção da cláusula desnatura o próprio dever de cooperação das partes, derivado do princípio da boa-fé objetiva, pois o locatário se furtará a realizar as benfeitorias necessárias – sabendo que não será indenizado -, permitindo que o bem seja desvalorizado e mesmo que venha a perecer. Isso impede ao locatário o cumprimento da obrigação de restituir a coisa no estado em que a recebeu, conforme impõe o CC 569, IV, e, mais importante, elide a possibilidade de tratar a coisa como se sua fosse (CC, 569, I). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 623- Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 17/10/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Seguindo o diapasão de Ricardo Fiuza em sua doutrina, na sua clássica obra Direito de retenção, Arnoldo Medeiros da Fonseca afirma categórico: “Sob a denominação específica de direito de retenção, e como figura jurídica autônoma, o que se compreende é a faculdade assegurada ao credor, independente de qualquer convenção, de continuar a deter a coisa a outrem devida até ser satisfeita, ou ficar extinta, uma obrigação existente com ele”. Nesse passo, conforme assevera Carvalho de Mendonça, o direito de retenção é “um meio de obrigar o devedor a executar a obrigação contraída, i.é, um remédio defensivo, um meio de vincular a coisa alheia ao cumprimento da obrigação relativa a essa mesma coisa; é um favor ao crédito, uma proteção a boa-fé e um expediente econômico, poupando as despesas e evitando as lentidões de um duplo processo”.

Benfeitorias necessárias (impensae necessariae) são as indispensáveis, que se destinam a conservar a coisa ou a impedir o seu perecimento. Obriga-se o locador a indenizá-las, sob pena de enriquecimento sem causa. Benfeitorias úteis (impensae utiles) são as proveitosas, que prestam à coisa o seu melhor uso, dando-lhe comodidade e acrescentando-lhe valor, ou, no particular, aquelas essenciais à própria utilização da coisa ao uso a que se destina. A pretensão de ser indenizado pelas benfeitorias necessárias e úteis não obriga o locatário a outro aluguel que não o avençado, não se aplicando à hipótese o disposto no art. 575. Cláusula contratual pode ser incluída em que o locatário renuncie ao respectivo direito de retenção ou de indenização.

Jurisprudência: 1. “A doutrina e a jurisprudência exigem a existência de cláusula específica prevendo a obrigação do locador ressarcir ao locatário pelas despesas com benfeitorias feitas. 2. Inexistindo cláusula nesse sentido, não há direito a indenização, motivo pelo qual não há de se falar em direito de retenção do imóvel” (STJ, 6~ T., REsp 36.584-BA, rel. Min. Anselmo Santiago, DJ de 10-11-1997). 2. “Locação. Benfeitorias. Lícito convencionarem as partes não ser devida indenização por benfeitorias, ainda que necessárias” (STJ, 3 ~ 1., REsp 9.0067-SE rel. mm. Eduardo Ribeiro, DJ de 9-9-1991). (J. X. Carvalho de Mendonça, Tratado de direito comercial, Rio de Janeiro, Tip. Bernard Frêres, 1917, v. 8 (p. 172); Arnoldo Medeiros da Fonseca, Direito de retenção, 2, ed., Forense. 1944 (p. 100) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 308 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 17/10/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo ensinamento de Marco Túlio de Carvalho Rocha, direito de retenção é o de manter a coisa consigo, enquanto não sobrevier o pagamento devido. No caso, a lei somente defere direito de retenção ao locatário que tiver realizado benfeitorias necessárias ou úteis que tiverem sido autorizadas pelo locador. Vale dizer: não há direito de retenção por benfeitorias voluptuárias; as benfeitorias úteis somente conferem esse direito se o locador as houver autorizado.

Durante o período em que o locatário continuar na posse da coisa com base no direito de retenção, o contrato continua em vigor, persistindo a obrigação do locatário de arcar com o aluguel e demais encargos da locação. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 17.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 16 de outubro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 575, 576, - continua - Da Locação de Coisas – VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 575, 576, - continua
- Da Locação de Coisas – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo V – Da Locação de Coisas
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 575. Se, notificado o locatário, não restituir a coisa, pagará, enquanto a tiver em seu poder, o aluguel que o locador arbitrar, e responderá pelo dano que ela venha a sofrer, embora proveniente de caso fortuito.

Parágrafo único. Se o aluguel arbitrado for manifestamente excessivo, poderá o juiz reduzi-lo, mas tendo sempre em conta o seu caráter de penalidade.

Seguindo os ensinamentos de Nelson Rosenvald, como sanção pelo inadimplemento da obrigação de restituir a coisa após a notificação, o locatário será atingido de duas maneiras preconizadas nesse dispositivo.

Primeiramente, o locador arbitrará uma espécie de aluguel-pena, que se estenderá até a devolução do bem. Cuida-se de uma cláusula penal cuja finalidade é inibir a inexecução do dever de restituição pelo constrangimento financeiro e, ao mesmo tempo, ajustar um valor indenizatório independente da realidade dos danos que o locador tenha sofrido. Aliás, inexiste dispositivo semelhante a esse no que se refere a locação urbana (Lei n. 8.245/91).

Aqui houve uma inovação por parte do legislador, eis que o parágrafo único permite a redução judicial da cláusula penal pelo seu caráter manifestamente excessivo, tendo em vista a natureza e a finalidade do negócio jurídico. Mas, além de seguir a letra do CC 413, a norma acresce a necessidade de o magistrado observar a natureza de penalidade do aluguel. Vale dizer: aplicar a redução de valores descomunais, mas mantendo um acréscimo razoável sobre o valor normal de locação, sem retirar o caráter coercitivo do aluguel, sob pena de estimular a inadimplência do locatário no sentido de desconsiderar o dever de restituição.

A recusa à restituição da coisa, findo o prazo da interpelação, também implica agravamento dos riscos do locatário. Aqui não há novidade, pois, pelo fato de incorrer em mora, assumirá até mesmo a responsabilidade patrimonial pelos danos decorrentes do fortuito que acarretem a perda do bem. O CC 399 adverte que a única possibilidade de isenção de riscos pelo locatário decorre da demonstração de que o evento extraordinário acarretaria a perda da coisa mesmo se restituída no prazo correto. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 620-621 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 16/10/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

A forma como é diluído pelo nobre Ricardo Fiuza, em face da sistemática introduzida pela lei inquilinária, reguladora da locação predial urbana, restou revogado o art. 1.196 do Código Civil de 1916. Neste sentido: REsp’s 2.900-SP; 17.068-5?: 16.982-SP, 13.781-SI’, 13.453-SP; entre outros. Assim sendo, a norma ali referida, ensejando ao locador arbitrar novo aluguel, não mais se compatibiliza com a sistemática legal daquelas locações. Contudo, trazendo o  CC/2002 idêntica norma, o arbitramento unilateral resulta cabível na espécie de locação regida por este, assumido o aluguel no período da retenção ilícita, pela resistência do locatário ao recobramento da coisa, caráter de penalização, a par da verba indenizatória pelos danos que a coisa venha a sofrer, inclusive os sucedidos de caso fortuito.

Acresce considerar que o arbitramento não pode se ressentir de sua razoabilidade, sob pena de constituir enriquecimento sem causa do locador. O controle da moderação é cometido ao juiz, autorizado pelo parágrafo único do presente dispositivo, verificando este se a imposição conforta-se em patamar justo e adequado às circunstâncias do caso. Impõe-se a redução do valor estipulado quando, em contrário, importar excessiva onerosidade ao locatário renitente em devolver a coisa, sem perda, todavia, de o aluguel representar sanção pela infringência contratual. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 306 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 16/10/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na batida de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o locatário que, notificado, não devolver o bem ao locador, sujeita-se a dois ônus: arcar com a responsabilidade pela perda ou deterioração por caso fortuito ou força maior, que ao primeiro se equipara para efeitos civis, e ao pagamento do aluguel que for arbitrado pelo locador. A liberdade do locador é ampla, mas o valor pode ser reduzido pelo juiz se o julgar excessivo. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 16.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 576. Se a coisa for alienada durante a locação, o adquirente não ficará obrigado a respeitar o contrato, se nele não for consignada a cláusula da sua vigência no caso de alienação, e não constar de registro.

§ 1º. O registro a que se refere este artigo será o de Títulos e Documentos do domicilio do locador, quando a coisa for móvel; e será o Registro de Imóveis da respectiva circunscrição, quando imóvel.

§ 2º. Em se tratando de imóvel, e ainda no caso em que o locador não esteja obrigado a respeitar o contrato, não poderá ele despedir o locatário, senão observado o prazo de noventa dias após a notificação.

Seguindo no diapasão de Nelson Rosenvald, temos aqui uma das mais tradicionais maneiras de distinguir os direitos obrigacionais dos direitos reais. Aqueles se caracterizam pela relatividade, produzindo efeitos entre as partes, não sendo extensíveis os deveres especiais a terceiros estranhos à relação jurídica. Já os direitos reais são absolutos no sentido da oponibilidade erga omnes dos deveres de abstenção perante toda a coletividade.

Portanto, no contrato de locação – como em qualquer relação obrigacional -, a venda do bem móvel ou imóvel propicia ao novo proprietário o imediato acesso à posse do bem, já que a transferência da titularidade é acompanhada da ampla possibilidade de exploração econômica da coisa. Daí que o novo proprietário exercitará a denúncia vazia contra aquele com quem não contratou locação.

Todavia, se o locatário cuidou de ajustar cláusula de vigência do contrato para o caso de alienação do bem, sendo esta registrada no Cartório de Títulos e Documentos (bem móvel) ou no RGI (bem imóvel), o contrato de locação adquire eficácia real perante eventuais adquirentes, submetendo-se estes ao aguardo do término do prazo estipulado para o negócio jurídico. Não se cuida de uma conversão em direito real, apenas do acréscimo a um direito obrigacional de oponibilidade coletiva em razão da publicidade do registro e inserção de cláusula contratual.

Mesmo que o locatário não tenha se acautelado com o registro da cláusula de vigência – submetendo-se ao direito potestativo de resilição por parte do novo proprietário -, cuidando-se de bens imóveis, impõe-se a notificação do prazo de noventa dias para a desocupação.

Assim, o brocardo “venda rompe a locação” tem a sua eficácia condicionada ao exercício da interpelação pelo novo proprietário, sob pena de prosseguimento da relação locatícia. O Código Civil não trata da matéria, mas é imperativo que o locatário não fique eternamente à mercê do exercício da denúncia pelo novo proprietário.

Por último, não obstante o silencio do Código, o locatário deverá ser convocado para exercitar o direito de preferencia para a aquisição do imóvel locado em condições de igualdade com a proposta do terceiro. não se trata de aplicar analogicamente o art. 27 da Lei n. 8.245/91 – pois aqui não se adota a norma especial -, mas de resguardar o exato cumprimento do negócio jurídico de locação sem que tal medida acarrete prejuízos ao locador, já que receberá do locatário idêntico valor que auferiria do terceiro. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 622- Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 16/10/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na linha de raciocínio de Ricardo Fiuza, o proprietário apesar de não ter a posse direita, não perde a disponibilidade dominial da coisa locada, podendo aliená-la, no curso do contrato, conforme o seu interesse. Entretanto, para que a locação não prossiga até o seu término, a ela não se rendendo o terceiro adquirente, forçoso é a falta de cláusula de vigência no caso de alienação ou em sua presença, não esteja o contrato registrado. O registro, no cartório competente (conforme a natureza da coisa, móvel ou imóvel), obriga o adquirente a respeita r o contrato de prazo determinado. Não havendo a cláusula vigorativa de permanência ou em se achando o contrato por prazo indeterminado, situa o § 2º do artigo em comento, a respeito da alienação de coisa imóvel, casos em que o adquirente obriga-se à notificação de retomada, concedido o prazo lega de trinta dias a contar do aviso.

Outro silêncio da lei aqui se faz detectado. Mais uma vez, o Código não aborda situações típicas da relação locacional, merecedoras de fomento ou proteção legal, como é o caso do direito de preferência do locatário ~ aquisição do bem, embora trate do direito de retenção de benfeitorias (Art. 518), quando a ele o CC de 1916 não se refere. A Lei n. 8.245 no seu Art. 27 dispõe assim: “No caso de venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de direitos ou dação em pagamento o locatário terá preferência para adquirir o imóvel locado, em igualdade de condições com terceiros, devendo o locador dar-lhe conhecimento do negócio mediante notificação judicial, extrajudicial ou outro meio de ciência inequívoca. Loco adiante, estabelece a caducidade de tal direito, se não manifestada pelo locatário, de modo incontroverso, sua aceitação integral à proposta, no prazo de trina dias. Diante disso, é ponderável pensar que a preferência se opera, como direito do locatário inerente à natureza da relação locacional, no mesmo feitio do Art. 515, e somente quando não a exercida, estará o locador permitido à alienação livre. Dúvida não resta da necessária ciência das condições do negócio ao locatária como dever do locador para aquele preferir o bem em igualdade de condições com terceiros. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 307 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 16/10/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No diapasão de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o contrato de locação, ordinariamente, somente vincula as partes contratantes e, por isso, aquele que adquire a coisa por ato inter vivos não está obrigado a respeitar o contrato, podendo requerer a posse da coisa imediatamente. Se isso ocorre, o locador fica obrigado a indenizar ao locatário os prejuízos sofridos uma vez que se obrigou por prazo certo, que não terá sido atingido por ato de sua responsabilidade.

A lei prevê, no entanto, a possibilidade de se dar eficácia ao contrato contra terceiros mediante o registro do contrato no registro de títulos e documentos do domicílio do locador, se se tratar de bem móvel, ou no registro de imóveis respectivo, no caso de bem imóvel.

O dispositivo prevê, ainda, em consonância com a legislação especial, que o locatário somente possa ser despejado 90 dias após ser notificado pelo adquirente, no caso de bem imóvel. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 16.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 15 de outubro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 572, 573, 574 - continua - Da Locação de Coisas – VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 572, 573, 574 - continua
- Da Locação de Coisas – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo V – Da Locação de Coisas
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 572. Se a obrigação de pagar o aluguel pelo tempo que faltar constituir indenização excessiva, será facultado ao juiz fixa-la em bases razoáveis.

Na visão de Nelson Rosenvald, o legislador deve ser aplaudido pela inovação, segundo ele, uma expressa previsão da função social do contrato (CC 421), do abuso do direito (CC 187) e da vedação ao enriquecimento injustificado (CC 884).

Em princípio, não há ilegalidade no fato de as partes ajustarem que a obrigação de pagar o aluguel alcançará o período restante do contrato desfeito. De fato, o CC 412 adverte que a cláusula penal compensatória não excederá o valor da obrigação principal. Portanto, o locatário não pagará um centavo a mais do que arcaria, caso a locação prosseguisse.

Nada obstante, cláusulas de tal teor praticamente inviabilizam a autonomia privada e, por via oblíqua, esvaziam o próprio exercício do direito potestativo à resilição. Afinal, quem desejará se subtrair a um negócio jurídico sabendo que terá de arcar com as prestações sucessivas, mesmo sem a fruição do bem?

Ora, cláusulas de tal jaez representam violações ao espirito do direito, pois ultrapassam os limites éticos do ordenamento. O sistema jurídico, em boa hora, intervém nos referidos contratos para aplicar o princípio constitucional da proporcionalidade e reduzir a cláusula penal para valores que efetivamente representem a realidade do negócio jurídico e preservem sua função social, impedindo que a liberdade de uma das partes seja sacrificada pela opressão do outro contratante. A expressão “bases razoáveis” é um conceito jurídico indeterminado, que será preenchido em vista à ética da situação às evidências reais da natureza do contrato e à consecução de seus objetivos. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 619 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 15/10/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na pauta de Ricardo Fiuza, o dispositivo resultou mantido, não obstante a alteração feita ao artigo anterior, por emenda que ofereceu fórmula mais justa, afastando do desmedido rigor do pagamento do aluguel pelo tempo restante do contrato dissipado. O referido CC 571 teve a sua redação final em harmonia com o art. 42 da Lei n. 8.245, de 18-10-1991, onde a consequência da devolução prévia do bem locado impõe apenas ao locatário o dever de pagar a multa pactuada, de forma proporcional. Logo, não há mais cogitar de pagamento do aluguel pelo tempo que faltar, devendo a norma ater-se unicamente ao problema do valor da cominação imposta, tendo em conta a mens legistoris, o que, em verdade, repete a inteligência do CC 413. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 304 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 15/10/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Como lembra Marco Túlio de Carvalho Rocha, ao contratar por prazo determinado, o locatário obriga-se ao pagamento ao locador de alugueis por todo o prazo contratado. Cuida-se de obrigação líquida e certa, passível de execução, se o contrato contiver os demais requisitos de um título executivo extrajudicial. O dispositivo atribui ao juiz a faculdade de mitigar o rigor da regra, se a indenização for julgada excessiva. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 15.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 573. A locação por tempo determinado cessa de pleno direito vindo o prazo estipulado, independentemente de notificação ou aviso.

Para o magistério de Nelson Rosenvald, o artigo alude à cessação de pleno direito dos efeitos do contrato de locação com prazo. Alcançado o termo contratual, dispensa-se interpelação do locatário, pois haverá uma espécie de cláusula resolutiva expressa (CC 474), que impõe ao locatário a obrigação imediata de restituir a coisa, sob pena de sofrer ação de reintegração de posse, pelo fato de a posse se tornar injusta pelo vício da precariedade (CC 1.200).

Contudo, tratando-se de contrato sem prazo, deverá o locador interpelar o locatário, a fim de constituí-lo em mora ex persona (CC 397, parágrafo único), assinalando um tempo razoável para devolução da coisa. Naturalmente, parece-nos que o poder do locador de submeter o locatário a um prazo de restituição da coisa é sujeito ao transcurso de um período razoável para que o locatário tenha obtido considerável retorno da finalidade almejada com o contrato de locação. A título ilustrativo, a locação de uma vaga de garagem sem prazo não poderá ser desconstituída no mês seguinte à contratação, caso em que se instalaria o abuso do direito à interpelação. Aplica-se aqui o disposto no parágrafo único do CC 473.

Deve ser lembrado que, na locação de imóveis urbanos, a legislação especial enfatiza que a extinção do contrato se sujeita ao ajuste por escrito de um prazo não inferior a trinta meses de locação (art. 46 da Lei n. 8.245/91), caso em que a resistência à devolução permitirá que a pretensão restituitória seja resguardada pela denúncia vazia. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 619 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 15/10/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como cientifica Ricardo Fiuza, a extinção da locação pelo seu termo final é fenômeno do tempo do contrato. Ele surgiu por vontade das partes e o decurso do prazo nele demarcado põe fim à relação jurídico-contratual. Encerrado o prazo, está finda a locação, obrigando-se o locatário a restituir a coisa (CC 569, IV) e a razão pela qual cessa a avença locatícia de pleno direito, torna prescindível notificação ou aviso. A devolução não se resume, porém a uma obrigação do locatário, certo que ilícito retê-la, salvo sob os reclamos de benfeitorias (CC 578) ou do ressarcimento (CC 571, parágrafo único). O locatário tem, por igual, direito a devolver o bem locado, ao término do prazo, não prevalecendo exigência do locador em recebe-lo somente após a realização de qualquer reparo, o que caracterizaria condição potestativa. Eventual prejuízo deverá ser discutido em ação própria. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 305 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 15/10/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na mesma esteira Marco Túlio de Carvalho Rocha. Nos contratos por prazo determinado o término do prazo extingue a locação, de pleno direito, independentemente de notificação, salvo se houver prorrogação tácita (CC 574).

Parte da doutrina entende que a notificação é necessária para que o silêncio não seja interpretado como prorrogação tácita, por prazo indeterminado (por todos: Silvio Rodrigues. Direito Civil, v. 3, p. 234). Se o locador age de imediato, a notificação não é necessária. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 15.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 574. Se, findo o prazo, o locatário continuar na posse da coisa alugada, sem oposição do locador, presumir-se-á prorrogada a locação pelo mesmo aluguel, mas sem prazo determinado.

Seguindo na esteira de Nelson Rosenvald o vertente dispositivo prossegue a leitura do artigo precedente. Caso o contato alcance o seu termo, e o locador não se manifeste acerca da devolução do bem, haverá uma presunção de prorrogação da locação, mas doravante sem prazo.

Na prática, o artigo inviabiliza a parte final da norma pregressa. Com efeito, o locador está dispensado de interpelar o locatário para a restituição do bem nos contratos com termo, mas se não agir será penalizada pela manutenção da locação, agora sem novo prazo. Em síntese, a interpelação acaba se tornando um ônus para o locador, sob pena de suportar um prejuízo para si: submeter-se à prorrogação indefinida do contrato.

Em verdade, o legislador enunciou uma espécie de aplicação da teoria da supressio, pois a omissão do locador por um prazo razoável gera no locatário a legítima expectativa de confiança na manutenção da locação, impedindo que tardiamente possa aquele reaver a coisa para si. Melhor seria se o legislador tivesse adotado regra semelhante à Lei do Inquilinato (art. 46. § 1º, da Lei n. 8.245/91) e fixasse em trinta dias o prazo de exercício de oposição por parte do locador, como condição de prorrogação contratual. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 620 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 15/10/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

No estender da lei apontada por Ricardo Fiuza, presume-se prorrogada a locação, por tempo indeterminado, ante a falta de declaração contrária do locador, dentro dos trinta dias imediatos ao término do prazo contratual, permanecendo o locatário de posse da coisa por mais de um mês, sem dita oposição do locador. Diante da relação jurídica de trato sucessivo, continuada a cada mês, uma atitude expressiva de oposição, obstáculo de continuidade contratual, por parte do locador, é pressuposto necessário a afastar a presunção de prorrogação. Dar-se-á, em princípio, pela notificação para a entrega do bem e ao denunciar o término, no exercício de direito material que o locador obtém, mediante o comunicado de conhecimento, a efetiva extinção da locação.

Mas é preciso seja o aviso premonitório, que guarda forma livre, expedido em tempo hábil no sentido de produzir os seus efeitos jurídicos a elidir a presunção. O posicionamento jurisprudencial é exato, a conferir eficácia no plano do direito material decorrente da vontade contida na notificação. O aviso basta em si mesmo; a sentença que vier declarar o direito de o locador reaver a coisa, apenas o pronuncia, pois locação já não mais existe. Outro obstáculo de oposição, inequívoco a evidenciar não prorrogada a relação ex locato, é o manejo imediato da ação cabível para o locador reaver a coisa (cf. RT 530/288: “a propositura da ação de despejo por término do prazo contratual é a mais expressiva oposição do locador à prorrogação tácita da locação...”);

Insta observar que o Código Civil não situa a prorrogação presumida no tempo. A presunção exige prova manifesta do desinteresse do locador, admitindo a manutenção continuativa da locação por permanecer o locatário na posse do bem. Entretanto, há de observar quando se tornará ilesa a locação por falta de oposição do autor, como afirma a norma. Lembre-se as locações residenciais, onde findo o prazo estipulado, a presunção ocorre, “se o locatário permanecer por mais de trinta dias, sem oposição do locador” Lei n. 8.245/91, 56, parágrafo único). O decurso de tempo certo faz presumir ipso legis a prorrogação da locação. Tal ocorrerá, sem dúvida alguma, na locação que aqui se trata, embora o dispositivo em comento omita o prazo. A inserção do lapso temporal é recomendável, para aclarar a norma.

Saliente-se, porém, uma vez prorrogada a locação por tempo indeterminado, permanecendo as condições antes pactuadas, esta vencerá mês a mês, cabendo, a qualquer tempo, a notificação, para cessar a indeterminação temporal e, de consequência, romper a locação ampliada. Cumpre assinalar, nesse aspecto, não cogitar a norma codificada prazo para a desocupação do bem objeto da locação posta sob tempo indeterminado. A afastar a concordância na manutenção, a parte locadora há de conceder, logicamente, prazo de aviso prévio, mediando o período entre a denúncia e a efetiva restituição da coisa. O parágrafo 2º do art. 46 da Lei n. 8.245/91, com propriedade, refere à concessão do prazo de trinta dias, o que se compatibiliza com o sistema. No mesmo sentido, tratou o art. 1.209 do CC/1916, sem mais correspondente. De qualquer sorte, apesar da antedita disposição análoga, é indispensável menção ao prazo, contado da notificação, para a locação de coisa regida pelo novo Código. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 306 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 15/10/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Corroborando com ambos os comentários acima Marco Túlio de Carvalho Rocha, a permanência da coisa na posse do locatário, sem oposição do locador, firma presunção de que as partes anuíram com a prorrogação do contrato. Prorrogam-se todas as cláusulas que não forem incompatíveis com a continuidade do contrato. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 15.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 569, 570, 571 - continua - Da Locação de Coisas – VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 569, 570, 571 - continua
- Da Locação de Coisas – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo V – Da Locação de Coisas
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 569. O locatário é obrigado:

I – a servir-se da coisa alugada para os usos convencionados ou presumidos, conforme a natureza dala e as circunstâncias, bem como trata-la com o mesmo cuidado como se sua fosse;

II – a pagar pontualmente o aluguel nos prazos ajustados, e, em falta de ajuste, segundo o costume do lugar;

III – a levar ao conhecimento do locador as turbações de terceiros, que se pretendam fundadas em direito;

IV – a restituir a coisa, finda a locação, no estado em que a recebeu, salvas as deteriorações naturais ao uso regular.

Trocado em miúdos pelo mestre Nelson Rosenvald, o inciso I guarda simetria com o disposto no CC 561, I. sendo o locador obrigado a entregar ao locatário a coisa em estado de servir ao uso a que se destina, naturalmente incumbirá ao locatário usar e fruir do bem em atenção ao uso convencionado pelas partes ou, na falta de disposição expressa, presumido pela natureza do imóvel e atividade a ser exercitada pelo locatário. Destarte, ele atuará como bônus pater familiae, conservando a coisa como se fosse sua, a fim de que possa cumprir a derradeira obrigação de restituir a coisa como se fosse sua, a fim de que possa cumprir a derradeira obrigação de restituir a coisa no estado em que a recebeu (inciso IV).

Prosseguindo, o inciso II remete à obrigação que caracteriza o próprio modelo da locação: o pagamento do preço. O aluguel se traduz em uma obrigação de dar quantia certa, em prestações sucessivas, na época convencionada no contrato. Todavia, no silêncio da convenção, o legislador remete ao costume do lugar do pagamento. Mais ponderada nesse sentido, parece-nos a Lei do Inquilinato (art. 23 da Lei n. 8.245/91), que estabelece o prazo legal supletivo do sexto dia útil do mês seguinte ao aluguel vencido. Mas, nas locações regidas pelo Código Civil, será necessário buscar os usos e práticas do local do pagamento, que será o do local do imóvel (CC 328) ou, tratando-se de bem móvel, o domicílio do inquilino, salvo se as partes convencionarem o contrário – dívida portável (CC 327).

O inadimplemento conduz à ação de despejo na Lei n. 8.245/91. No Código Civil, a inexecução do pagamento de prestações relativas a bens móveis gera a pretensão à resolução contratual cumulada com pedido sucessivo de reintegração de posse. A pretensão de cobrança é sujeita a três prazos: a) três anos – prédios urbanos e rurais (Lei n. 8.245/91 e CC 206, § 3º, I); b) cinco anos – dívidas líquidas, constantes de instrumento público ou particular (CC 205, § 5º, I); e c) dez anos – dívidas ilíquidas ou não tituladas, conforme o prazo geral do caput do CC 205.

O inciso III traz nova hipótese de aplicação de regra de simetria. De acordo com o CC 566, II, incumbe ao locador garantir ao locatário o uso pacífico da coisa. Ora, essa tutela só será plenamente satisfeita se o locatário levar ao conhecimento do locador as agressões praticadas por terceiros contra a posse, sejam elas de direito, sejam fáticas (apesar de o dispositivo só se referir àquelas). Caso o locatário se olvide de atender à referida obrigação e houver prejuízo decorrente da agressão possessória, será lícito ao locador o pleito de desconstituição da relação jurídica, acompanhado de indenização. Em suma, não obstante possa o possuidor de direito manejar de forma autônoma os interditos possessórios, isso não exclui o dever de informação – aqui não apenas ligado ao princípio da boa-fé, mas inserido como obrigação acessória.

Por fim, o inciso IV caracteriza a obrigação última do locatário: restituir a coisa locada no estado em que a recebeu. Caso não se devolva a coisa, a posse se converte de justa a injusta pelo vício da precariedade (CC 1.200), legitimando o ajuizamento de ação de reintegração de posse. Outrossim, não basta a restituição em si, mas que a coisa mantenha dentro do possível as suas características, caso contrário o locatário será indenizado pelos prejuízos decorrentes da conduta negligente ou dolosa do locatário, excetuando-se os prejuízos provenientes do próprio desgaste normal da coisa. Em vez de perquirir perdas e danos, podem as partes ajustá-los previamente por cláusula penal (CC 411), dispensando a quantificação dos prejuízos. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 617 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 14/10/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em sua doutrina, Ricardo Fiuza cita as 5 obrigações estatuídas por lei ao locatário impostas: a) a fiel observância ao uso convencionado ou presumido da coisa locada, restrito aos fins colimados no contrato; b) a guarda da coisa com responsabilidade e diligência idênticas às que teria o seu proprietário, ou seja, como se lhe pertencesse; c) o dever de pontualidade, no implemento da obrigação em prazo acordado ou, este não ajustado conforme o costume locar; d) o dever de fazer ciente o locador sobre as turbações de direitos por pretensão de terceiros, perante as quais obriga-se aquele resguardar o locatário e e) a restituição da posse da coisa ao locador por término da locação, apresentado o bem as condições, eximindo-se, porém, o locatário, das deteriorações decorrentes de sua utilização normal. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 303 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 14/10/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em sua análise, Marco Túlio de Carvalho Rocha reitera obrigações por força de contrato. A prestação assumida pelo locatário no contrato é a de pagar o aluguel. Além deste dever, a lei o obriga a empregar a coisa conforme o uso ajustado, a conservá-la, a reparar os danos anormais que causar a ela, a dar conhecimento ao locador das turbações e a restituir a coisa, finda a locação, no estado em que a recebeu, salvo deterioração advinda do uso normal, sob pena de sofrer ação possessória. Se a turbação da posse por terceiros materializar-se  por meio de ação judicial, é obrigado o locatário denunciar a lide ao locador, sob penas de responder por eventuais danos que este vier a sofrer em virtude da ação. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 14.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 570. Se o locatário empregar a coisa em uso diverso do ajustado, ou do a que se destina, ou se ela se danificar por abuso do locatário, poderá o locador, além de rescindir o contrato, exigir perdas e danos.

O artigo alerta sobre o óbvio, como aponta Nelson Rosenvald. A norma é desnecessária, haja vista que apenas reitera a obrigação do locatário já assinalada no CC 569, I. Se ele não conceder ao bem a destinação que lhe é inerente em ração do ajuste contratual ou da própria finalidade para a qual foi concebido, permitir-se-á o exercício da ação de resolução contratual pelo locador. A norma equivocadamente utiliza o termo “rescisão”, apenas cabível aos casos em que o contrato é desfeito por um vício no objeto, já existente na origem do negócio jurídico (v.g., vício redibitório ou evicção).

De qualquer modo, a norma é uma boa amostragem da teoria do abuso do direito, na medida em que a ilicitude da conduta do locatário não deriva do exercício de uma atividade ilegal, mas da desconformidade do exercício de seu direito subjetivo com a finalidade (resultado) para a qual ele deveria ser orientado. A ilegitimidade da destinação econômica do bem revela o abuso do direito a teor do CC 187). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 617 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 14/10/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Correspondendo ao caput do art. 1.193 do CC de 1916, como aduz Ricardo Fiuza, o desvio de uso da coisa locada implica modificar a destinação compatível que lhe seria dada em razão da avença e configura infração legal e contratual a permitir a rescisão do contrato, autorizando, ainda, indenização por perdas e danos. O mesmo ocorrerá por abuso de gozo ~p locatário que provoque danos à coisa, que se obriga restituir no estado em que foi recebida. Trata-se de deterioração culposa, respondendo o locatário por infringência ao disposto no CC 569, IV. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 303 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 14/10/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Ratificando os comentários até aqui expostos, Marco Túlio de Carvalho Rocha repete que, utilizar a coisa de modo diverso daquele que consta no ajuste configura descumprimento contatual. Todo e qualquer descumprimento grave dá à parte prejudicada o direito de rescindir o contrato. Mesmo que não seja grave o descumprimento dá ao prejudicado o direito de cobrar indenização ao infrator. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 14.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 571. Havendo prazo estipulado à duração do contrato, antes do vencimento não poderá o locador reaver a coisa alugada, senão ressarcindo ao locatário as perdas e danos resultantes, nem o locatário devolvê-la ao locador, senão pagando, proporcionalmente a multa prevista no contrato.

Parágrafo único. O locatário gozará do direito de retenção, enquanto não for ressarcido.

Como expõe Nelson Rosenvald, aqui o legislador permite a resilição unilateral do contrato (CC 473) – tanto pelo locador como pelo locatário – que será exercitada mediante a denúncia notificada à outra parte. Note-se que o direito potestativo será exercitado mesmo na vigência de contrato com termo. Porém será o denunciante sancionado com a imposição de perdas e danos decorrentes da antecipação do prazo originário da relação jurídica.

Certamente, as partes determinam a cláusula penal compensatória, prefixando as perdas e danos para o caso de eventual exercício do direito extintivo de resilição. Dispensa-se a prova do dano, pois ele será o valor formalizado pelos contratantes. Todavia, o CC 413 atende à diretriz da concretude e dispõe que a penalidade será reduzida equitativamente (não mais (proporcionalmente”) pelo magistrado se a obrigação principal tiver sido cumprida parcialmente. Vale dizer que, se a denúncia unilateral for praticada em data mais próxima ao termo contratual, o juiz observará as condições econômicas das partes e as peculiaridades do contrato para encontrar um valor adequado para a multa compensatória. Exemplificando: na locação de um bem móvel por vinte meses, a resilição concretizada no segundo mês será apurada de forma diversa daquela ocorrida apenas no décimo quinto mês. Aqui o prejuízo do locador será menor, pois praticamente alcançou a vantagem econômica do contrato, sendo reduzido o prejuízo diante da denúncia produzida pelo locatário. Todo esse raciocínio é válido para a resilição unilateral por parte do locador.

Lembre-se de que nas locações de imóveis urbanos é vedada ao locador a possibilidade de reaver o imóvel antes do prazo convencionado pelas partes ou pela lei – trinta meses -, pois o direito à resilição unilateral é exclusivo do locatário (Lei n. 8.245/91 art. 4º). Note-se que a vedação só se aplica à lei especial locatícia e não ao Código Civil por uma singela razão: o Código Civil é a lei dos iguais e a Lei do Inquilinato é o estatuto dos desiguais, pois pretende conceder maior tutela ao vulnerável, que, em nossa ordem econômica, é aquele que procura pela residência urbana diante da carência de meios de obtenção da “casa própria”, sem se omitir do direito fundamental social à moradia (CF, 6º).

Por fim, o parágrafo único concerne à faculdade do locatário de exercitar o direito de retenção sobre a coisa enquanto não for indenizado. Vale dizer: o locatário poderá manter o bem consigo – mesmo se o locador quiser exercitar o direito potestativo extintivo – como garantia de indenização pelos prejuízos resultantes da prematura extinção do contrato. O não exercício do direito de retenção e a imediata devolução da coisa não impedem que o locatário ajuíze a ação de cobrança pelos aludidos prejuízos. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 618 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 14/10/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como entende Ricardo Fiuza, a finalidade buscada e efetivamente alcançada foi a de adequar o texto do projeto à Lei do Inquilinato que lhe foi posterior e contém fórmula mais justa. A emenda compatibilizou o dispositivo codificado com o art. 4º da Lei do Inquilinato (Lei n. 8.245/91), sancionada posteriormente à elaboração do projeto, tendo sido fruto de sugestão do Prof. Miguel Reale. Tem razão o Relator no Senado quando afirma que “a nova fórmula, mais justa, exige, no caso de devolução antecipada do imóvel, o pagamento proporcional da multa prevista no contrato, e não o excessivo rigor de pagamento do aluguel pelo tempo que faltar, do contrato desfeito, como no regime anterior”. Corresponde ao art. 1.193, parágrafo único do CC de 1916, com a modificação referida. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 303 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 14/10/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Marco Túlio de Carvalho Rocha estendida, não há prazo máximo para a locação. Na locação por prazo determinado nenhuma das partes pode desvincular-se antes do prazo, sob pena de multa proporcional.

A redação do dispositivo é ambígua e levou parte da doutrina a ver nela uma autorização às partes para a rescisão antecipada do contrato. Neste sentido: Clóvis Bevilaqua, Costa Loures, Sylvio Capanema de Souza (este, embora veja nesta faculdade violação da boa-fé objetiva). De outro lado, entendem que o CC 571 somente fixa sanção para o descumprimento do dever estabelecido no CC 566, II: J. M. Carvalho Santos, Caio Mario e Orlando Gomes. Em comparação aos dois comentários anteriores, Rosenvald e Fiuza, na observação de VG, inexiste a discrepância aqui aduzida.

Razão assiste aos que entendem que o CC 571 não autoriza a rescisão antecipada. O princípio da obrigatoriedade dos contratos estabelece que os pactos devem ser obedecidos. O credor tem a faculdade de exigir que o devedor cumpra o avençado e, diante de resistência, pode força-lo a tanto, se a natureza da obrigação o permitir. Em regra, o direito à indenização é alternativa ao contratante lesado pela violação cometida pela contraparte. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 14.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).