terça-feira, 26 de novembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 627, 628, 629 - Continua - Do Depósito Voluntário- VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 627, 628, 629 - Continua
- Do Depósito Voluntário- VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo IX – Do Depósito -
(art. 627 a 652) Seção I – Do Depósito voluntário –
vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 627. Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto móvel para guardar, até que o depositante o reclame.

Como esclarece Nelson Rosenvald, o depósito é o negócio jurídico bilateral pelo qual uma pessoa (depositante) entrega à outra (depositário) coisa móvel infungível, a fim de que esta possa guarda-la e restituí-la quando solicitado. Destarte, temos uma obrigação de custódia da coisa, de natureza temporária.

O dispositivo em exame retrata o contrato de depósito convencional, ou voluntário. O verbo guardar é a marca dessa relação jurídica. O depositário recebe o bem móvel para satisfazer o interesse precípuo do depositante, na conservação da coisa até o momento da restituição. De modo diverso, nos contratos de locação e comodato, a guarda apenas é pressuposto para que os seus titulares possam usar e fruir o bem contratado, faculdades essas que são vedadas ao depositário, exceto sob autorização do depositante, na forma do CC 640.

Contudo, apesar de certa variação doutrinária, consideramos o depositário como possuidor direto do bem móvel – e não mero detentor -, na medida em que o desdobramento da posse requer uma relação jurídica de direito real ou obrigacional, como no depósito. O depositário não mantém a coisa consigo a título de permissão ou detenção (CC 1.208), tampouco é subordinado do depositante (CC 1.198). O fato de não usar ou fruir a coisa, porém apenas conservá-la, não afasta a prática de atos possessórios, pois, sendo o possuidor aquele que exercita de fato algum dos poderes do proprietário (CC 1.196), a sua condição de possuidor será captada pela possibilidade de manejar ações possessórias na defesa da coisa em face de esbulhos, turbações ou ameaças.

Aliás, o depósito voluntário é relação intuitu personae, pois o dever de guarda é atribuído a alguém, em regra, em razão de uma especial confiança quanto aos atos conservatórios da coisa. Portanto, o possuidor direto poderá determinar que a guarda imediata fique a cargo de detentores (v.g., funcionários), mas não poderá transferir a posse a terceiros, exceto com a autorização do depositante.

O contrato de depósito convencional recai somente em bens móveis corpóreos e infungíveis, que não podem ser substituídos por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade (CC 85). Tratando-se de coisas fungíveis, estaremos diante do depósito irregular, que será disciplinado na forma do mútuo (CC 645). Não se entende a razão pela qual o legislador vedou o depósito de bens imóveis, até mesmo pela prática habitual do juiz de nomear depositário para os bens de raiz que servem de objeto a qualquer execução (CPC/1973, art. 659, § 5º, correspondendo no CPC/2015, ao art. 845), a quem incumbirá a conservação de bens penhorados, arrestados, sequestrados ou arrecadados.

O depósito voluntário é contrato real, eis que só se aperfeiçoa com a entrega da coisa. Cuida-se a tradição de pressuposto de existência, assim como o observado para os contratos de comodato e mútuo. Como consequência, será contrato em regra unilateral, já que a única obrigação será do depositário, qual seja, conservar e restituir. Acidentalmente, converter-se-á em contrato bilateral, ocorrendo as hipóteses do CC 643. Em princípio é contrato gratuito, mas poderá resultar oneroso (CC 628) com a atribuição de contraprestação ao depositante, como se percebe das necessidades do tráfego jurídico (v.g., depósito de pertences em casa noturna). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 657-658 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como explica Ricardo Fiuza em sua doutrina, o depósito pode ser conceituado como o contrato pelo qual uma determinada pessoa, denominada depositário, recebido de uma outra, depositante, um certo objeto móvel para guardar gratuita e temporariamente e, quando reclamado, restituí-lo ao depositante, como deflui da lição de Ad Peneira de Queiroz (Direito civil: direito das obrigações, Goiânia, Editora Jurídica IEPC, 1999, p. 160).

Convém lembrar, ainda, a clássica definição: “É negócio feito no interesse do depositante e, com efeito, surge no campo do direito como um favor prestado a um amigo (um office d’ami), para quem, com zelo, se guarda um objeto por ele entregue” (Silvio Rodrigues, Direito civil: dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, 27. ed., São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3, p. 256).

As suas principais características estão presentes na reportada definição; assim, o depósito é contrato unilateral, gratuito, real, intuitu personae, não solene e temporário. Silvio Rodrigues, Direito civil: dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, 27. ed., São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3; Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro teoria das obrigações contratuais e extracontratuais, 16.e d., São Paulo, Saraiva, 2001; Arnoldo Wald, Curso de direito civil brasileiro; obrigações e contratos, 14. ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de direito civil, 10. ed., Rio de Janeiro, Forense, 1996, v. 3; José Lopes de Oliveira, Contratos, Recife, Livrotécnica, 1978; Ari Peneira de Queiroz, Direito civil; direito das obrigações, Goiânia, Editora Jurídica IEPC, 1999. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 336 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Como especifica Marco Túlio de Carvalho Rocha, o depósito é o contrato mediante o qual uma pessoa (depositário) recebe de outra (depositante) um objeto móvel, e compromete-se a guarda-lo até que esta o reclame.

É contrato real, de duração e intuitu personae. É unilateral quando gratuito e bilateral se oneroso (a gratuidade é presumida: CC 628).

O depositante não precisa ser proprietário da coisa, basta que detenha a posse. O depositário tem que ser capaz. Se se tornar incapaz no curso do contrato, seu representante diligenciará para devolver a coisa (CC 641). (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 26.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 628. O contrato de depósito é gratuito, exceto se houver convenção em contrário, se resultante de atividade negocial ou se o depositário o praticar por profissão.

Parágrafo único. Se o depósito for oneroso e a retribuição do depositário não constar de lei, nem resultar de ajuste, será determinada pelos usos do lugar, e, na falta destes, por arbitramento.

Conforme já observado pelo mestre Nelson Rosenvald, em regra o contrato de depósito será marcado pela gratuidade. O contrato gratuito ou benéfico é aquele em que não há prestações recíprocas, pois, a vantagem do depositante não implica correspondente sacrifício, nada devendo ao depositário. Normalmente, será aquele favor de um amigo a outro, que lhe impõe zelo e cuidado na conservação de um bem, sem que peça nada em retribuição.

Contudo, em duas hipóteses o contato será oneroso. Primeiro, quando houver cláusula contratual fixando retribuição pecuniária para o depósito. Assim, haverá uma imediata conexão entre prestação e contraprestação.

Outrossim, a exigência de uma remuneração resulta da própria natureza do negócio jurídico. Essa inovação do Código Civil nada mais é que um retrato da sociedade contemporânea, na qual frequentemente o depósito aparece associado ao fornecimento de produtos e serviços (v.g., estacionamento em shopping, guarda de objetos em cofres de hotéis), sendo usual que dessas atividades, normalmente desenvolvidas por empresários, possam os depositários extrair vantagens econômicas.

Com a unificação das obrigações civis e empresariais no Código Civil de 2002, o legislador traz para o direito civil a natureza essencialmente remuneratória do depósito mercantil, sendo certo que no comércio qualquer atividade se torne objeto de remuneração, já que as trocas econômicas são a essência das relações contratuais.

O parágrafo único do CC 628 adere à diretriz da operabilidade, que permite que nos negócios jurídicos em que não se tenha determinado a remuneração (v.g., contrato verbal) possa o magistrado buscar os usos do local em que se contratou para definir o pagamento. Assim, no depósito de animais para rodeios no município de Barretos (SP), não será tarefa árdua ao magistrado a investigação dos padrões negociais para os aludidos contratos. Caso os usos do lugar não sejam identificados, ou mesmo não existam, o magistrado poderá arbitrar com base na sua percepção equitativa a respeito do que mais se aproximaria de um “preço justo” para aquela situação. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 658-659 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Seguindo a doutrina de Ricardo Fiuza, como sublinha o dispositivo em comento, o depósito voluntário é naturalmente gratuito, permitindo-se, porém, haja convenção no sentido de se estipular uma gratificação ao depositário, sem que tal ajuste deturpe a natureza do contrato.

A graciosidade é característica própria do contrato de depósito civil. O depósito mercantil, por sua vez, possui natureza essencialmente remuneratória. É o que exalta a doutrina: “No comércio, presume-se, pode o pagamento de comissão ao depositário, ainda quando não estipulada” (Washington de Barros Monteiro, Curso de direito civil; direito das obrigações, 4.ed., São Paulo, Saraiva, 1965, v. 2, p. 229-30). Assim, prevê o CC/2002 que o contrato de depósito é gratuito, exceto (...) se resultava de atividade negocial – como a guarda de dinheiro em banco – ou se o depositário o praticar por profissão – como a guarda de mercadorias em estabelecimentos especializados, ou em caso de convenção expressa em contrário. São as exceções previstas em lei à gratuidade, em regra, do contrato de depósito.

O parágrafo único estabelece, outrossim, que, em caso de depósito onerosa, desde que a retribuição do depositário não conste de lei nem de convenção ajustada entre as partes, essa retribuição será determinada n pelos usos do lugar, que se baseiam “na prática longamente observada determinadas relações (...) a praxe aceita unanimemente” (José ÁWSWéI, Novo dicionário jurídico brasileiro) 1984, p. 390, e, em sua falta, por arbitramento, que é estimativa feita por pessoa escolhida pelas partes para atribuir e fixar o valor pecuniário da retribuição cabível. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 337 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Como mostra os ensinamentos de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o dispositivo estabelece duas presunções relativas a respeito do contrato de depósito. A primeira, genérica, no sentido de presumi-lo gratuito; a segunda, que estabelece exceção à primeira, de que o contrato é oneroso se o depositário realizá-lo como parte de suas profissionais ou se relacionado a atividade negocial.

Uma vez que tais presunções são relativas, se o contrato for expresso quanto ao caráter gratuito ou oneroso do depósito vale o que estiver estipulado. A presunção relativa por desempenho de atividade em caráter profissional é razoavelmente clara: se alguém deixa seu veículo num estacionamento, deve pagar o respectivo preço, ainda que, ao deixar o veículo, não tenha procurado se inteirar do preço cobrado. A presunção de onerosidade quando se tratar de atividade negocial é menos clara. Ocorre, por exemplo, se um fornecedor de bebidas entrega um freezer a um revendedor. A presunção é de onerosidade; a gratuidade deve estar expressa no contrato. Já nos casos em que a onerosidade é presumida, cabe arbitramento judicial do preço, na falta de estipulação expressa. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 26.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 629. O depositário é obrigado a ter na guarda e conservação da coisa depositada o cuidado e diligência que costuma com o que lhe pertence, bem como a restituí-la, com todos os frutos e acrescidos, quando o exija o depositante.

Conforme comentário de Nelson Rosenvald, cuidando-se o depósito de um contrato de duração, no qual a execução jamais será concomitante à contratação, todo o empenho do depositário será dirigido à guarda responsável da coisa. Atuará ele como bônus pater famílias, vale dizer como o protótipo de diligência exigido do cidadão médio, atento e dotado de ordinária inteligência, a fim de restituir a coisa infungível ao depositante.

Apesar de o Código se referir ao cuidado e diligência “que costuma com o que lhe pertence”, devemos perceber que, na hipótese de o depositário ser uma pessoa negligente e desidiosa, não poderá se servir de tais defeitos como padrão de conduta habitual para justificar a deterioração ou perda da coisa. Temos aqui parâmetros objetivos de comportamento leal e correto na custódia e conservação da coisa, conforme induz o princípio da boa-fé objetiva.

A redação do artigo afasta a incidência da regra geral do CC 392. Se em princípio aquele que não é favorecido pelo contrato gratuito só responderá por dolo, o mesmo não ocorre no contrato de depósito. Em outras palavras, mesmo que A faça um favor a B em guardar os seus objetos temporariamente, assumirá total responsabilidade pela sua destruição, mesmo diante de culpa levíssima, sendo a exclusão do dever de indenizar apenas factível em casos de força maior devidamente provados (CC 642).

A segunda parte da norma se refere à obrigação de restituir a coisa móvel quando o exija o depositante. Conforme a lição da Toeira Geral do Direito das Obrigações, “se a obrigação for de restituir coisa certa, e essa, sem culpa do devedor, se perder antes da tradição, sofrerá o credor a perda, e a obrigação se resolverá [...]” (CC 238).

Aliás, não sendo o contrato fixado com termo, aplica-se o princípio da satisfação imediata (CC 331), sendo lícito ao credor exigir imediatamente a coisa, sendo possível a constituição do devedor em mora caso se recuse a restituir o bem após o transcurso de prazo razoável assinalado em interpelação (CC 397, parágrafo único). Não poderá o devedor (depositário) unilateralmente deliberar pela restituição da coisa antes do término do prazo contratual. Aqui se aplica a parte final do CC 133, pela qual o prazo não se presumirá em proveito do devedor, quando as circunstâncias do contrato apontem no sentido de ter ele sido estabelecido em benefício do credor, como é o caso do depósito.

A recusa injustificada à obrigação de restituir enseja ao depositante o ajuizamento de ação de reintegração de posse em razão do esbulho decorrente da conversão da posse justa em precária (CC 1.200). Sendo o contrato escrito e com prova literal, será lícito o manejo da ação de depósito, como forma de o depositante exigir a restituição da coisa, satisfazendo a sua pretensão resultante da violação do direito subjetivo (CPC/1973, art. 901, sem correspondente no CPC/2015). Infere-se do exposto que não é da essência do contrato de depósito que assuma a forma escrita, sendo suficiente a tradição do bem. Porém, a ausência do instrumento subtrai ao credor a via do procedimento especial do depósito (CPC/1973, art. 902, com correspondência no CPC/2015, art. 311 e parágrafo único). Ou seja, o contrato escrito é solenidade ad probationem e não ad substantiam.

Por fim, a norma requer que a restituição da coisa se faça acompanhada de seus frutos e acrescidos. Vale dizer, em sentido amplo: os frutos naturais, industriais e civis, além dos produtos obtidos no período de depósito, serão restituídos ao depositante. Isso decorre da ordem natural de tal negócio jurídico. Se o depositário apenas guarda a coisa, sendo-lhe vedada a sua exploração econômica, todos os acréscimos econômicos que dela resultarem serão devolvidos conjuntamente ao bem principal. Exemplificando: no depósito de uma vaca campeã, já prenhe ao tempo da tradição, serão restituídos os bezerros. Idêntico dispositivo se aplica nos contratos de penhor, nos quais o credor pignoratício apenas detém a custódia da coisa, como depositário (CC 1.435, I e IV). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 659-660 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em sua justificativa, Ricardo Fiuza diz do dispositivo em comento extraírem-se as três obrigações fundamentais do depositário: a) guardar a coisa, o que é inerente e essência do contrato de depósito; b) conservá-la da mesma forma com que atua na preservação das suas coisas próprias; c) restituí-la assim que reclamada pelo depositante.

A lei, tutelando a pessoa do depositante contra eventual depositário infiel, impõe o presente preceito, através do qual sujeita o depositário a proceder na conformidade das expectativas daquele, expressando, afinal, a obrigatoriedade da restituição da coisa depositada e na forma em que se encontrava quando da celebração do contrato ou do seu equivalente. Assim, “se a coisa depositada perece ou se deteriora por dolo ou culpa do depositário, a este cabe a responsabilidade. Na hipótese, entretanto, de a perda ou deterioração advir de força maior ou caso fortuito, não mais lhe cabe o dever de reparar, pois aqui aplica-se a regra res perit domino, já conhecida, e o depositante é o dono da coisa” (Silvio Rodrigues, Direito civil: dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, 22. ed., São Paulo, Saraiva, 1994, v. 3, p. 264).

Jurisprudência: 1. “É vedada a prisão civil do devedor fiduciante em ação de busca e apreensão contra si proposta, porquanto não equiparável a depositário infiel. Precedentes (STJ, 3’ 1., AGREsp 330.207-PR, rel. Mm. Fátima Nancy Andrighi. DJ de 5-11-2001); 2. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 337 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em sua exposição, afirma Marco Túlio de Carvalho Rocha ser ao depositário, imposta diligência ordinária na guarda da coisa depositada. Não é obrigado a realizar diligências especiais. Se o depósito se faz a céu aberto, disto tendo ciência o depositante, não lhe é exigível a guarda da coisa em recinto fechado.

A restituição da coisa deve ser feita tão logo a exija o depositante, mesmo que o contrato tenha sido firmado por prazo determinado, exceto se o depositário tiver o direito de retenção a que se refere o CC 644. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 26.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 25 de novembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 625, 626 - Da Empreitada - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 625, 626
- Da Empreitada - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo VIII – Da Empreitada -
(art. 610 a 626) - vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 625. Poderá o empreiteiro suspender a obra:

I – por culpa do dono, ou por motivo de força maior;

II – quando, no decorrer dos serviços, se manifestarem dificuldades imprevisíveis de execução, resultantes de causas geológicas ou hídricas, ou outras semelhantes, de modo que torne a empreitada excessivamente onerosa, e o dono da obra se opuser ao reajuste do preço inerente ao projeto por ele elaborado, observados os preços;

III – se as modificações exigidas pelo dono da obra, por seu vulto e natureza, forem desproporcionais ao projeto aprovado, ainda que o dono se disponha a arcar com o acréscimo de preço.

Conduzidos por Nelson Rosenvald, aprende-se que nesse momento há uma complementação do dispositivo precedente, agora com menção às hipóteses em que o empreiteiro possui justa causa para suspender a empreitada, sendo exonerado de qualquer pretensão indenizatória por parte do dono da obra.

a)           Culpa do dono ou motivo de força maior – a culpa do proprietário é aferida em várias circunstâncias que demonstram a sua desídia na cooperação com o empreiteiro. Basta pensar na recusa de fornecimento de materiais ao empreiteiro, na empreitada de labor (CC 610), ou então na recusa injustificada ao pagamento, na empreitada por medição (CC 614), neste último caso aplicando aplicando-se a exceção de contrato não cumprido (CC 476). Força maior ou fortuito são termos utilizados de forma indiscriminada pelo CC 393, parágrafo único, ambos representando situações em que um fato externo à conduta das partes, de caráter inevitável, inviabiliza o cumprimento da obrigação. Seria o caso de uma enchente que causa o rompimento de parte do terreno ou uma epidemia que coloca em isolamento o local em que se realiza a obra.

b)        Também é justificável a suspensão das atividades quando dificuldades técnicas de caráter imprevisível tornam a obra extremamente onerosa para o seu executor. Aqui a prova pericial será decisiva em juízo.

c)            Por fim, se o dono da obra sugerir modificações excessivas no projeto aprovado, mesmo que exista autorização do projetista e disposição do proprietário em arcar com o sobrepreço, não se submeterá a tanto o empreiteiro, pois a sua manifestação de vontade se restringe à execução do projeto originário, sendo defeso a qualquer um a imposição unilateral de modificações que eliminem a própria causa do negócio jurídico.

As causas suspensivas alinhavadas no CC 625 não são numerus clausus, nada impedindo que outros sérios e ponderados motivos justifiquem a paralisação. Outrossim, caso o fato que gerou a suspensão seja incontornável e não se afigure possibilidade de prosseguimento da obra, caberá a resolução do contrato por inadimplemento, com possibilidade de imposição de perdas e danos em algumas hipóteses (v.g., culpa do dono, exigência de modificações desproporcionais). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 655-656 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 25/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na visão de Ricardo Fiuza, o dispositivo envolve os casos da rescisão motivada ou justa do contrato de empreitada, por parte do empreiteiro, que nas situações nele previstas isenta-se da responsabilidade de responder por perdas e danos. O empreiteiro poderá dar por findo o contrato pelas razões enumeradas nos incisos, não incidindo em qualquer culpa pela frustração da empreitada.

Assim ocorrerá: a) por culpa exclusiva do comitente; b) por motivo de força maior; c) pelo advento da onerosidade excessiva, decorrente de dificuldades imprevisíveis de execução da empreitada que resultem de causas geológicas, hídricas ou outras a elas assemelhadas, quando o dono da obra resistir ao reequilíbrio contratual, não aceitando, nesse, fim, o reajuste pactuado; d) quando as alterações ao plano original da obra, exigidas pelo comitente, por seu vulto e natureza, forem àquele desproporcionais, ainda que com a exigência pretenda o dono da obra arcar com o acréscimo de preço. * Pelas mesmas razões anteditas (CC 623 e 624), aqui não se trata de suspender, mas de rescindir. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 335 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 25/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Para o entendimento de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o dispositivo especifica circunstâncias que permitem ao empreiteiro resilir ou resolver o contrato. A resolução contratual por descumprimento de uma das partes, como prevê o inciso I, é típica de todo contrato bilateral.

A rescisão contratual é sempre possível, em negócios bilaterais, por superveniência de caso fortuito ou força maior que impossibilite ou torne excessivamente onerosa a execução. Desta hipótese cuidam os incisos I e II, com a ressalva de que o dono da obra pode evitar a resolução por onerosidade excessiva mediante o reajuste do preço.

Finalmente, a hipótese do inciso III é, igualmente, de descumprimento contratual, configurado pelo intuito do dono da obra de pretender a alteração do objeto do contrato. Ainda que o dono da obra ofereça aumento do preço, o empreiteiro não estará obrigado a aceitar, salvo nas hipóteses legais previstas no CC 621. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 25.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 626. Não se extingue o contrato de empreitada pela morte de qualquer das partes, salvo se ajustado em consideração às qualidades pessoais do empreiteiro.

O derradeiro artigo deste capítulo, na visão de Nelson Rosenvald, trata de algo que está na origem do contrato de empreitada. A fungibilidade desse negócio jurídico, afastando-se em regra o seu cunho intuitu personae.

O dono da obra deseja o resultado da atividade, quer que a obrigação de fazer seja alcançada com a maior qualidade. Para alcançar o desiderato do contrato, será possível a substituição do empreiteiro por um terceiro (subempreitada ou cessão do contrato) e, em caso de óbito, através dos sucessores ou de um cessionário de direitos hereditários. A outro giro, a morte do dono da obra não prejudicará a realização do negócio jurídico, assumindo o espólio a posição jurídico-econômica do de cujus, devendo remunerar o empreiteiro nas bases fixadas, dentro das forças da herança.

Mas a parte final do dispositivo ressalta que em certos contratos de empreitada é possível inferir a natureza personalíssima, o que acarretará a extinção da relação jurídica por resolução em caso de morte – ou incapacidade – de qualquer das partes. Seria o caso da encomenda de uma obra a um famoso escritor ou da confecção de um vestido a um renomado estilista.

Sendo o empreiteiro pessoa jurídica, naturalmente não se aplica o artigo lembre-se de que a sua falência não implica necessariamente o término da relação contratual, pois o administrador judicial avaliará o interesse da massa da manutenção da empreitada (art. 21 da Lei n. 11.101/2005). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 656 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 25/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Visando a finalização da obra, Ricardo Fiuza esclarece que, sabido que a lei dispõe acerca dos casos de extinção do contrato, figurando como ordinário e comum o que decorre da conclusão da obra, a norma acentua não ocorrer a extinção da empreitada pelo evento morte de qualquer das partes, quando não for o contrato celebrado intuitu personae. Assim, se na formação do contrato não se levou em conta as qualidades pessoais do empreiteiro, os seus sucessores darão continuidade à execução da obra. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 335 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 25/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 Concluindo com Marco Túlio de Carvalho Rocha, por ser, em regra, impessoal, a empreitada não exige a capacidade das partes e não se extingue pela morte ou pela incapacidade superveniente dos contratantes, podendo prosseguir em relação aos sucessores, salvo quando contrata tendo-se em vista as qualidades pessoais do empreiteiro. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 25.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 22 de novembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 622, 623, 624 - continua - Da Empreitada - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 622, 623, 624 - continua
- Da Empreitada - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo VIII – Da Empreitada -
(art. 610 a 626) - vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 622. Se a execução da obra for confiada a terceiros, a responsabilidade do autor do projeto respectivo, desde que não assuma a direção ou fiscalização daquela, ficará limitada aos danos resultantes de defeitos previstos no art. 618 e seu parágrafo único.

Tomando a lição do mestre Nelson Rosenvald, o artigo se refere à subempreitada. Ao contrário da prestação de serviço, a empreitada em regra não é intuitu personae, consoante se extrai do CC 626. Portanto, é aceitável a conduta do empreiteiro que transfere a um terceiro as suas obrigações, chamado de subempreiteiro.

Apenas não se poderá confiar a obra a terceiro quando expressamente houver cláusula proibitiva, o que realça a natureza personalíssima da empreitada. Mesmo diante de tal cláusula, nada impedirá a subempreitada parcial, que é algo normal e corriqueiro em tais relações jurídicas. Basta atentar para a situação do empreiteiro engenheiro que transfere a execução dos serviços hidráulico e elétrico para técnicos ou empresa especializadas.

Quando se forma esse subcontrato, surge uma segunda relação contratual derivada da primitiva, na qual o subempreiteiro (terceiro) se obriga perante o empreiteiro e este mantém a empreitada com o dono da obra.

O terceiro que recebe a empreitada será o responsável pelo prazo de garantia noticiado no CC 618 e seu parágrafo único, como todas as consequências já mencionadas. Porém, se também assumir a direção e fiscalização da obra, terá idêntica responsabilidade que o empreiteiro. Apesar de não haver relação material entre o dono da obra e o subempreiteiro, poderá aquele lhe responsabilizar pelos danos causados em sede de responsabilidade extracontratual, sem se olvidar de que, em se tratando de relação de consumo, todos os fornecedores respondem solidariamente ao consumidor em razão de defeitos do produto ou serviço que lhe acarretem prejuízos (CDC, 7º, parágrafo único).

Por fim, não se confunda a subempreitada com a cessão do contrato. Aqui, o cedente transfere a sua posição contratual completa (ativa e passiva) para o cessionário (terceiro), com o consentimento do cedido (dono da obra), sendo certo que o cedente se retira por completo da relação jurídica a partir desse momento, não mais respondendo ao dono da obra. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 654 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, a norma regula e distingue as responsabilidades de cada interveniente no plano e execução da obra: o projetista, o empreiteiro de materiais e o de execução, tendo consonância com o disposto no CC 610, § 2º. A responsabilidade do autor do projeto, no que lhe compete, limita-se aos danos resultantes dos defeitos previstos no CC 618, pois responde pela qualidade, solidez e segurança do trabalho elaborado. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 334 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Marco Túlio de Carvalho Rocha a execução da obra depende da preexistência de um projeto que deve obedecer. Projeto e execução correspondem a trabalhos distintos que, comumente, são confiados a profissionais distintos. O responsável pelo projeto responde pelos vícios derivados do projeto e o executor pelos vícios resultantes da execução. Quem se obriga a fiscalizar a execução responde pelos defeitos relativos à execução. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 22.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 623. Mesmo após iniciada a construção, pode o dono da obra suspendê-la, desde que pague ao empreiteiro as despesas e lucros relativos aos serviços já feitos, mais indenização razoável, calculada em função do que ele teria ganho, se concluída a obra.

Vemos com Nelson Rosenvald, que, caso o dono da obra decida desconstituir o negócio jurídico mediante a resilição unilateral do contrato (CC 473), deverá o empreiteiro se submeter ao exercício do direito potestativo. Nada obstante, em razão dos investimentos realizados na obra e daquilo que razoavelmente auferiria com o seu trabalho, será indenizado pelos danos emergentes e lucros cessantes, na dicção do CC 402.

Note-se que os lucros cessantes não poderão aqui abranger as oportunidades perdidas pelo empreiteiro no sentido de realizar outros contratos naquele período, pois a norma restringe os lucros frustrados “em função do que teria ganho, se concluída a obra”.

O legislador se equivocou ao se referir à suspensão da obra como fato gerador da indenização, pois a mera paralisação temporária não induziria à ressalva do final do texto, “se concluída a obra”. Isso significa que a paralisação foi definitiva e o negócio jurídico não pode alcançar o seu término. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 654 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Veremos na doutrina apresentada por Ricardo Fiuza que, a execução da obra, frustrada pelo dono da obra, assegura ao empreiteiro haver as despesas e a remuneração proporcional aos serviços realizados. Acresce ao fato o dever de indenizar. O mestre Clóvis Beviláqua acentua: “A rescisão da empreitada pelo dono da obra lhe acarreta, em regra, a obrigação de indenizar o empreiteiro das despesas, do trabalho feito e dos lucros que poderia ter, se concluída a obra” (Código Civil dos Estados Unidos do Brasil comentado, Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1917, p. 431).

Não mais são referidas as justas causas do rol do art. 1.229 do CC de 1916, que, em geral, não guardam identidade com a empreitada e pareciam indicar uma adequação ao sistema ali indicado. A ratio legis preponderante é clara, demonstrando depender a rescisão unilateral do contrato, pelo dono da obra, do pagamento das despesas e do serviço, além da indenização compatível ao que o empreiteiro deixou, razoavelmente, de receber, se prosseguisse com a empreitada avençada.

Pondera observar o emprego incorreto do vocábulo “suspensão”, inserido na norma, a sugerir paralisação episódica da obra, como se esta pudesse ter seguimento futuro. O seu sentido dúbio merece correção. Suspensão é um adiamento da execução, ou execução protraída no tempo, diferindo o término da obra, por retardo ditado na iniciativa do comitente. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 334 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

De acordo com o princípio da obrigatoriedade do contrato, como ensina Marco Túlio de Carvalho Rocha, o dono da obra deveria ficar obrigado custear sua execução até que viesse a ser concluída, salvo disposição contratual em sentido contrário. O dispositivo, no entanto, levando em consideração as dificuldades inerentes a obras de grande porte, permite ao dono da obra resilir o contrato a qualquer tempo. Se exercer o direito de resilição, o dono da obra fica obrigado a pagar ao empreiteiro todas as despesas já realizadas mais o lucro total que este perceberia se a obra tivesse sido concluída. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 22.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 624. Suspensa a execução da empreitada sem justa causa, responde o empreiteiro por perdas e danos.

Em comentário otimista, Nelson Rosenvald ratifica, já nesse comentário, parece-nos que a suspensão da execução da empreitada é a situação apropriada e condiz com a conclusão do texto. Em outras palavras, a simples paralisação temporária das obras, sem justa causa por parte do empreiteiro, pode propiciar prejuízos efetivos ao dono da obra.

Caso os danos emergentes e lucros cessantes derivados da suspensão dos trabalhos sejam demonstrados, surge o dever de indenizar, pois em sede de responsabilidade civil a simples culpa não é bastante para a produção do dever de indenizar, sendo fundamental a perquirição da extensão do dano (CC 944).

É evidente que, quanto maior o tempo de injustificada paralisação, maiores serão os prejuízos do dono da obra. Imagine a construção de uma casa: elevam-se os preços dos materiais; nascem despesas de conservação; perdem-se materiais estocados, sem se olvidar dos negócios jurídicos que o proprietário deixa de praticar em razão da impossibilidade de oferecer a mercadoria acabada a um cliente. Ao contrário do artigo precedente, aqui não se limita a pretensão às perdas e danos, podendo o dono da obra pleitear com amplitude tudo aquilo que esteja no desdobramento razoável e provável dos fatos caso não houvesse a suspensão da obra. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 655 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Dando voz a Ricardo Fiuza, o presente dispositivo também trata da rescisão unilateral da empreitada, agora por parte do empreiteiro. Pressupõe os casos de rescisão injusta. Desse modo, o desfazimento do vínculo obrigacional impõe ao empreiteiro desistente a obrigação de responder por perdas e danos decorrentes da rescisão. Necessário observar, contudo, o que esclarece, com precisão o Prof. Agostinho Alvim: “o primeiro requisito do dever de indenizar é o dano. (...) Ainda mesmo que haja violação de um dever jurídico e que tenha existido culpa e até mesmo dolo por parte do infrator, nenhuma indenização será devida, uma vez que não se tenha verificado prejuízo. Esta regra decorre dos princípios, pois a responsabilidade independentemente de dano redundaria em mera punição do devedor, com invasão da esfera do direito penal” (lia inexecução das obrigações e suas consequências. São Paulo. Saraiva, 1949, p. 162). Com efeito, o título indenizatório, abrangendo o dano emergente e os lucros cessantes, haverá de ser constituído pelo pressuposto necessário e imprescindível da demonstração do dano (RT. 557/133).

Repetem-se as considerações feitas ao artigo anterior quanto à impropriedade de “suspensão”, na hipótese aqui cogitada, pois representa, a rigor, rescisão unilateral da empreitada por parte do empreiteiro. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 335 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entendimento de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o empreiteiro é obrigado a executar o serviço para o qual foi contratado. Se descumprir essa obrigação, fica obrigado a indenizar o dono da obra por todos os prejuízos que este vier a sofrer com a inexecução. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 22.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quinta-feira, 21 de novembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 619, 620, 621 - continua - Da Empreitada - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 619, 620, 621 - continua
- Da Empreitada - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo VIII – Da Empreitada -
(art. 610 a 626) - vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 619. Salvo estipulação em contrário, o empreiteiro que se incumbir de executar uma obra, segundo plano aceito por quem a encomendou, não terá direito a exigir acréscimo no preço, ainda que sejam introduzidas modificações no projeto, a não ser que estas resultem de instruções escritas do dono da obra.

Parágrafo único. Ainda que não tenha havido autorização escrita, o dono da obra é obrigado a pagar ao empreiteiro os aumentos e acréscimos, segundo o que for arbitrado, se, sempre presente à obra, por continuadas visitas, não podia ignorar o que se estava passando, e nunca protestou.

Na visão de Rosenvald, essa norma se aplica tão somente à empreitada por preço certo para a totalidade da obra, sem previsão de reajustamento, mesmo que incida acréscimo nos materiais ou na mão de obra. Aqui a regra é não se admitir a variação do preço, ao contrário do que ocorre nos contratos que contêm cláusula permissiva de reajustamento.

O ajuste do preço fixo pode ser interessante para ambas as partes em tempos de estabilidade monetária. Para o dono da obra, é garantia de que não será surpreendido pela má-fé ou por equívocos do empreiteiro; para este, não haverá surpresa, pois como especialista na matéria poderá calcular um preço satisfatório dentro dos acontecimentos ordinários. Mesmo na empreitada por preço certo é possível convencionar cláusula de escala móvel, sem descaracterizar a modalidade do negócio, à medida que se estabeleça o aumento progressivo das prestações como proteção diante da atualização monetária (CC 316).

A norma em comento apenas admite acréscimo de preço mediante instruções escritas de outro contratante, ou seja, autorização expressa do dono da obra. Admite-se, contudo, a autorização tácita quando este não contesta o aumento do valor que lhe é sugerido pelo empreiteiro, nos casos em que presumidamente o proprietário não ignorava a real situação da expansão da obra, na letra do parágrafo único.

A nosso sentir, nos tempos atuais de intenso tráfego jurídico, exigir a autorização por escrito para reajuste, quando as condições objetivas demonstram que o proprietário não teria razão para lhe obstaculizar, seria uma injusta sanção ao empreiteiro e um fator de imobilismo em tais atividades. Aplica-se aqui o que os modernos chamam de “conduta social típica”, ou “comportamento concludente”, segundo os quais determinadas condutas produzem negócios jurídicos ou lhe inovam, sem a necessidade de uma expressa manifestação de vontade.

Ademais, a aplicação do princípio da boa-fé objetiva na formação e na execução de contratos tem por escopo identificar, na conduta das partes obrigadas, o nascimento de deveres secundários ou acessórios, independentes da vontade das partes, excedentes ao dever de prestação, impondo limites aos direitos preestabelecidos a evitar abuso do direito (CC 187 e 422).

No âmbito dessa função limitadora, inclui-se a proibição de venire contra factum proprium, quando há assunção de posição jurídica em contradição com o comportamento assumido no instrumento contratual, que cria uma expectativa legítima de determinada conduta futura pela contraparte obrigada.

É o que se verifica na parte final do caput, quando, Exemplificadamente, o dono da obra tolera a execução de serviços extras, o que enseja a confiança da empreiteira na aprovação de aditivos e na futura contraprestação do serviço realizado. Evita-se, ainda, a consagração do locupletamento indevido do dono da obra.

A outro giro, a expressão “salvo estipulação em contrário”, inserida no início da norma, realça seu caráter dispositivo, pois a remuneração poderá ser livremente pactuada pelos contratantes, por meio da estipulação de um preço variável.

Não obstante a omissão do legislador, é evidente que aqui, como em qualquer outro contrato de duração, pode ser manejada a teoria da imprevisão pelas partes (CC 478), diante do surgimento de fatos extraordinários e imprevisíveis que coloquem um dos contratantes em evidente situação de desequilíbrio econômico ao curso da execução contratual, com quebra do sinalagma. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 652 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 21/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo o histórico adito à doutrina de Ricardo Fiuza, o presente dispositivo não foi alterado por qualquer emenda, seja da parte do Senado Federal, seja da parte da Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto. O texto sofrer apenas pequeno ajuste de cunho estritamente redacional, durante a revisão ortográfica, por parte da consultoria legislativa da Câmara dos Deputados. Corresponde ao art. 1.246 do CC de 1916. Em relação ao texto do Código Civil de 1916, acrescentou-se ao capta o parágrafo único, o qual confere maior esclarecimento ao texto legal, além de prevenir com destreza mais uma situação da qual poderia resultar uma lide.

Acrescido à doutrina, tem-se na empreitada a preço fixo, estabelecido o seu valor para a totalidade da obra, não poderá o empreiteiro exigir a alteração do preço, ainda que arrimado em modificações nela introduzidas. O preço vincula-se definitivo e confortado ao projeto original, ficando o executante da obra a ele obrigado. Entretanto, se as alterações resultaram de instruções escritas do dono da obra, o acréscimo no preço poderá ser reclamado, porquanto representarem aquelas uma estipulação adicional a permitir o congruente reajuste.

A jurisprudência tem flexibilizado a norma, ao admitir a emenda do preço, aplicando ao contrato de empreitada a teoria da imprevisão, pela superveniência de fato extraordinário ou imprevisível, sobrecarregando o custo do material e dos encargos da obra. A reconciliação do preço, baseada na cláusula rebus sic stantibus tem sido aclamada, bastando lembrar julgado do STF, de 1964, onde se afirma: “Cláusula rebus sic stantibus. A cláusula aplica-se aos contratos de empreitada. A cláusula só ampara o contratante contra alterações fundamentais, extraordinárias das condições objetivas, em que o contrato se realizou” STF, 2’ 1., RE 56.960-SP, rel. Mm Hermes Lima, DI de 8-12-1964).

A introdução do parágrafo único é saudável, preceituando, expressamente e, a possibilidade da correção do preço por modificações assentidas tacitamente pelo comitente e dono da obra. Tem ânimo em julgados pioneiros, e a propósito, vale referir o discernimento de julgado da I’ Câm. Cível do IIDE (Ap. Cível 31.306, de 10-8-1955, RF 164/217-219), bem lembrado por Renato José de Moraes: “Destarte, em face dessa solução jurisprudencial, se há por ter por enunciado o princípio geral segundo o qual o empreiteiro tem direito de ação para haver o custo das obras acrescidas, mesmo que a sua realização não haja sido autorizada por escrito, se o vulto, a espécie e as condições da mão de obra e do fornecimento dos materiais são de tal natureza que permitem a conclusão de que não poderiam ter sido realizadas sem pleno conhecimento do dono da obra. Do contrário, o demasiado apego ao rigor arcaico da disposição contida no art. 1.246 do Código Civil iria peru-tiro enriquecimento ilícito do dono da obra” (Cláusula awbus sic stantibus”, São Paulo, Saraiva, 2001, p. 222).

Jurisprudência: “Exigir, rigorosamente, autorização escrita do dono da obra em todos os casos de acréscimo, importaria locupletamento com a jactura alheia” (51$, 1ff 11.442, rel. Mm. Luís Gallotti, 26-12-1949; IW, 569/93-4). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 332 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Marco Túlio de Carvalho Rocha, a regra deste dispositivo concretiza o princípio da obrigatoriedade dos contratos: as partes vinculam-se pelo conteúdo do contrato. Empreiteiro contratado para executar a não pode executar a + b. Se o faz, o dono da obra somente estará obrigado a pagar por a, conforme o contrato, a menos que alteração tenha sido realizada para incluir b no objeto contratado. A alteração pode decorrer de autorização expressa e escrita ou tácita, se na avaliação da obra o acréscimo tiver sido conhecido sem que o dono da obra tenha protestado quanto a ele. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 21.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 620. Se ocorrer diminuição no preço do material ou da mão de obra superior a um décimo do preço global convencionado, poderá este ser revisto, a pedido do dono da obra, para que se lhe assegure a diferença apurada.

Na pauta de Nelson Rosenvald, para quem vivencia a nossa realidade e cultura, temos ai uma norma de rara efetividade. Cogitar da redução do preço do material da empreitada já é algo remoto, quanto mais de uma queda de valores que represente mais de um décimo do preço global convencionado. Quando à mão de obra, é impensável a redução salarial (CF, 7º, VI); poderíamos apenas supor uma redução na necessidade de trabalhos especializados, com substituição por operários menos qualificados, sem quebra na qualidade do serviço.

Todavia, acontecendo o referido evento superveniente e extraordinário, o legislador concebeu uma particular hipótese de aplicação do princípio da onerosidade excessiva, impedindo que ocorra o injustificado enriquecimento do empreiteiro.

Aliás, ao contrário do estatuído para a teoria da imprevisão (CC 478), a solução para a restauração do sinalagma será a revisão contratual, em homenagem ao princípio da conservação do negócio jurídico. Não é necessário que exista cláusula nesse sentido, a norma opera de pleno direito. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 652 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 21/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Existe aqui, também, um histórico, acompanhando a Doutrina de Ricardo Fiuza em que, da observação do texto original do projeto proposto pela Câmara, tal era a redação do artigo em comento: “Art. 620. Se ocorrer diminuição no preço do material ou da mão de obra, superior a um décimo do preço global convencionado, poderá este ser revisto, a pedido do dono da obra, mas apenas quanto ao que exceder aquela parcela, feita a atualização dos valores monetários”. Com as alterações empreendidas pelo Senado, através do eminente Senador Gabriel Hermes, houve uma substituição de expressões a fim de permitir a permanência do dispositivo no corpo do projeto. A justificativa senatorial foi a seguinte: “Não se deve considerar apenas a ‘desvalorização da moeda’, para admitir a revisão de valores convencionados.

Outros fatores, e imprevisíveis, poderão ocorrer, gerando o desequilíbrio das prestações e justificando o reajustamento delas. Cumpre, porém, alterá-lo mais. Prevendo que ocorra ‘diminuição no preço do material ou mão de obra superior a um décimo do preço global convencionado’, admite que ‘este poderá ser revisto, a pedido do dono da obra, mas apenas quanto ao que exceder aquela parcela’. Não é clara a alusão ‘ao que exceder aquela parcela’, até porque se prevê ‘diminuição no preço do material ou da mão de obra’, e a revisão deve beneficiar o ‘dono da obra’. Diante disso, dá-se nova redação ao artigo, para evitar, seguramente, que haja enriquecimento indevido por quem executa a empreitada. Não há artigo correspondente no CC de 1916.

Quanto à Doutrina, aponta que, de fato, consiste este artigo na aplicação do princípio da eticidade que regula o Código, obstando o enriquecimento sem causa. Não se pode negar a necessidade de se estabelecer meios para a realização de um reequilíbrio econômico do contrato, no referente ao quantum do preço, se eventual mudança substancial do valor ensejar excessiva vantagem para o empreiteiro, com consequente prejuízo ao dono da obra. A revisão contratual se impõe para corrigir o preço, assegurando-se ao empreitante a diferença apurada em seu favor, no que compreende o abatimento do valor do preço. Nesses casos, não prevalecerão o preço fixo ou o preço fixo absoluto, em homenagem ao princípio da harmonia econômica do contrato.

Por outro lado, escusado dizer, em todos os casos, a exigibilidade da correção monetária decorrerá, sempre, da razão de não se poder comprometer a base econômica do contrato, em face do desequilíbrio econômico financeiro superveniente, como o resultante de plano econômico de governo, haja ou não cláusula de reajustamento. Neste sentido: STJ, 2~I., REsp 52.696-DE, rel. Mm. Ari Pargendler, DI de 3-2-1997. Assim, se houver aumento excessivo no preço do material ou da mão de obra, ter-se-á incidente a teoria da imprevisão, conforme referido em anotação ao artigo anterior. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 333 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o dispositivo reflete a incidência do princípio do equilíbrio contratual. Há dois tipos de empreitada: a por administração e a por preço fixo (por preço global). Na empreitada por administração a remuneração do empreiteiro já é, necessariamente, proporcional ao custo do material e da mão de obra. A regra do CC 620 refere-se, pois, à empreitada por preço fixo. Nesse tipo de obra, o empreiteiro precifica seu serviço segundo o valor da mão de obra ou da mão de obra e do material, conforme seja empreitada de lavor ou mista, mais o lucro. Se o lucro do material ou da mão de obra decrescem, o lucro do empreiteiro aumenta. A fim de manter o equilíbrio do contrato e de evitar ganho acima do que reputa razoável, a lei permite ao dono da obra a redução do preço se a diminuição do preço do material ou da mão de obra for superior a um décimo do valor global contratado.

Assim: se o preço estimado para o material e para a mão de obra for de $10 e o preço global $12, o dono da obra poderá requerer a redução do preço global para $10 se o preço do material e da mão de obra reduzir-se a $ 8. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 21.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 621. Sem anuência de seu autor, não pode o proprietário da obra introduzir modificações no projeto por ele aprovado, ainda que a execução seja confiada a terceiros, a não ser que, por motivos supervenientes ou razões de ordem técnica, fique comprovada a inconveniência ou a excessiva onerosidade de execução do projeto em sua forma originária.

Parágrafo único. A proibição deste artigo não abrange alterações de pouca monta, ressalvada sempre a unidade estética da obra projetada.

Lecionando, Rosenvald confirma que em regra, é imodificável o projeto da obra pelo seu proprietário, tratando-se de propriedade autoral do seu criador e assim só passível de alteração com o seu consentimento, sob pena de risco à integridade do trabalho e da própria segurança de seus destinatários. Nesse sentido, o art. 26 da Lei n. 9.610/98 diz que “o autor poderá repudiar a autoria de projeto arquitetônico alterado sem o seu consentimento durante a sua execução ou após a conclusão da construção”, inclusive com a possibilidade de responsabilizar civilmente o dono da obra por manter a sua autoria, mesmo após o repúdio (art. 26, parágrafo único).

O empreiteiro também não poderá unilateralmente introduzir modificações, sob pena de a obra ser justificadamente rejeitada ao final, conforme se depreende do já comentado CC 615. Contudo, tratando-se de pequenas e necessárias correções de rumo, que não comprometam a unidade estética da obra, viabilizam-se as alterações.

Novamente preocupado com as alterações na economia contratual, o legislador inovou substancialmente sobre a norma da lei autoral, permitindo a excepcional alteração do projeto – a despeito da autorização de seu autor – em duas hipóteses: inconveniência do projeto originário por motivos supervenientes, ou por razões de ordem técnica.

Exemplificando: se uma nova técnica de edificação for implantada em larga escala e com custos menores, poderá o dono da obra substituir a original, sem o consentimento do projetista; da mesma maneira, se a aquisição de determinado produto exigido pelo projetista tornar-se por demais custosa em razão de desabastecimento, nada obsta a substituição por outro mais acessível.

A norma é vantajosa para o empreiteiro e para o dono da obra, na medida em que a excessiva onerosidade será caracterizada independentemente da imprevisibilidade do evento, sendo suficiente a demonstração da quebra da base objetiva do negócio jurídico. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 653 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 21/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na esteira de Ricardo Fiuza, a lei reconhece a autoridade técnica do autor do projeto para não tolerar venha a sua criação ser alterada, pelo dono da obra, afetando-lhe o conteúdo. As modificações introduzidas podem, inclusive, comprometer a segurança da obra. De sorte que somente autorizado o comitente, pela anuência daquele, o projeto obterá nova caracterização. Duas exceções são reconhecidas, todavia, na dicção legal: a) a inconveniência da execução do projeto original, por motivos supervenientes ou por razões técnicas; b) a excessiva onerosidade que se revele para a execução do referido projeto.

Na ressalva da lei, prescinde o dono da obra de autorização prévia do projetista. Em todo caso, tais fatos haverão de ser rigorosamente provados. Diz-se-á como inconveniência de sua execução aos fins propostos, diante do projeto original. Por razões técnicas, serão as reconhecidas por técnico de igual qualificação do autor do projeto. Por outro lado, quando a execução acarretar excessiva onerosidade, o projeto poderá ser adaptado a impedi-la, sem que para isso o seu autor precise oferecer o seu assentimento. O parágrafo único afasta a incidência da norma, toda vez que as alterações procedidas forem de pequena ou nenhuma importância, preservando-se, ainda assim, a unidade estética da obra projetada. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 333 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo Marco Túlio de Carvalho Rocha, o princípio da obrigatoriedade do contrato impede que as partes alterem unilateralmente o conteúdo do contrato. O dono da obra não pode exigir que o empreiteiro realize obra diversa daquela para a qual foi contratado. A regra é amenizada em razão da boa-fé objetiva, no sentido de se tolerar alterações de pequena monta, que não onerem a execução do projeto ou que se façam necessárias por motivo de ordem técnica, inconveniência ou excessiva onerosidade do projeto original. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 21.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).