quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 688, 689, 690, 691 - Da Extinção do Mandato - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 688, 689, 690, 691
- Da Extinção do Mandato - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo X – Do Mandato -
(art. 682 a 691) Seção IV – Da Extinção do Mandato –
vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 688. A renúncia do mandato será comunicada ao mandante, que, se for prejudicado pela sua inoportunidade, ou pela falta de tempo, a fim de prover à substituição do procurador, será indenizado pelo mandatário, salvo se este provar que não poderia continuar no mandato sem prejuízo considerável, e que não lhe era dado substabelecer.

Da mesma forma que o contrato de mandato pode ser unilateralmente resilido por vontade do mandante, poderá sê-lo por iniciativa do mandatário, o que se dá mediante a renúncia, terminologia criticada, por mais se referir à abdicação dos poderes outorgados, quando, por meio dela, no caso dá-se a rigor, a extinção do contrato de mandato (ver, por todos: Renan Lotufo. Questões relativas a mandato, representação e procuração. São Paulo, Saraiva, 2001, p. 117).

De toda sorte, porém, a opção terminológica foi sempre coerente com a adstrição, em que laborou o Código Civil, do mandato à representação (ver comentário ao CC 653). Trata-se, tanto quanto a revogação, de declaração de vontade receptícia, portanto que exige comunicação ao mandante, a partir de cuja ciência passa a produzir efeitos e antes do que permanece o mandatário obrigado pelos encargos resultantes do ajuste.

Se se cuidar de mandato judicial, o efeito da renúncia dá-se, ademais do pressuposto da cientificação, a termo, porquanto somente depois do transcurso de dez dias, durante os quais, se necessário para evitar prejuízo ao mandante, o mandatário continuará a representá-lo (CPC 112 e 5º, § 3º, da Lei n. 8.906/94), Estatuto da Advocacia).

A cientificação da renúncia pode se dar por qualquer forma que seja eficaz ao fim a que se destina. Excepcionalmente, nas mesmas hipóteses em que for irrevogável, bem assim quando se o pactuar, poderá o mandato ser irrenunciável. Não é, decerto, a regra, que permite a renúncia, inclusive imotivada. Mas, apesar disso, explicita o Código Civil, na mesma esteira da Legislação anterior, que a renúncia não pode ser inoportuna ou abrupta, i.é, sem tempo de substituição do mandatário. Malgrado se considere inoportuna a renúncia sempre que não haja tempo suficiente para a substituição do mandatário, revelando-se, assim, ex abrupto, como indica o significado semântico do termo, juridicamente a inoportunidade vai além e pode se revelar mesmo com tempo razoável de aviso prévio, mas porque, por exemplo, já iniciada a execução do ajuste de modo a inviabilizar, de forma igualmente proveitosa, a ultimação pelo próprio mandante ou por outro mandatário.

Pois desde que se tenha evidenciado o que se deve considerar uma abusiva renúncia, a exemplo do que se viu a propósito da revogação (ver comentário ao CC 682), impõe-se a consequência indenizatória. Ressalva o Código Civil, todavia, que esse corolário reparatório não se verificará se a despeito da inoportunidade, até, demonstrar o mandatário que não poderia continuar na execução do ajuste sem considerável prejuízo e, o que representa inovação da nova legislação, se demonstrar ainda que não lhe era dado substabelecer. Ou seja, deve o mandatário, para se furtar à consequência indenizatória de sua renúncia, comprovar, a uma, que lhe era inviável continuar na execução do mandato sem grave prejuízo, de qualquer natureza, para si, para pessoas próximas ou mesmo para o objeto do mandato, a duas impondo-se-lhe a demonstração de que não lhe era possível, por qualquer motivo razoável, portanto não só a vedação contratual, substabelecer.

Veja—se, enfim, que toda essa sistemática, à semelhança do que se dá quanto à revogação do mandato, é típica revelação, de novo aqui, do princípio da boa-fé objetiva, vale dizer, de um padrão de comportamento leal e solidário com que devem as partes obrar em sus relações, assim permeadas pela eticidade que dá sustento, de maneira muito especial, à nova legislação. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 713 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo a doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, da mesma forma que a lei faculta ao mandante revogar unilateralmente os poderes confiados ao mandatário, sem a necessidade de qualquer justificativa plausível, a este último se permite, outrossim, a renúncia do mandato a si conferido. Daí infere-se que a revogação e a renúncia são institutos similares, cujas características se identificam sobremaneira.

Dessa assertiva preambular, enaltecendo a simetria dos institutos, percebe-se que o mandatário, a exemplo do mandante, pode exercer essa faculdade, livremente e a qualquer tempo, sem precisar motivar a renúncia, ou melhor, sem indicar quais os motivos que o levaram a abrir mão do negócio.

É exato dizer que a renúncia não se sujeita a nenhum tipo de restrição, exceto o limite temporal, ou seja, deverá ser comunicada ao mandante, a tempo de permitir a sua substituição. Deve, pois, ser dirigida ao mandante, oportunamente e à custa do renunciante, a fim de que o primeiro providencie a substituição do segundo, de modo a não acarretar maiores prejuízos ao constituinte.

Se o mandante vier a sofrer prejuízos com a apresentação tardia, extemporânea, da renúncia, ao mandatário competirá compô-los, mediante o pagamento de indenização, salvo se se comprovar a impossibilidade de este último continuar o encargo sem danos razoáveis para si, porque justo não seria alguém suportar quaisquer ônus, apenas em benefício de outrem, ou se não lhe era dado substabelecer.

Situação pontual nos oferece o mestre Silvio rodrigues, quando, com precisão, leciona que: “a regra de livre resilição do contrato deixa de se aplicar quando o mandato visa assegurar, simultaneamente, tanto um interesse do mandante quanto um do mandatário, porque nesta hipótese o negócio adquire um aspecto sinalagmático, que desvirtua sua feição ordinária”. E arremata, ao final: “enquanto a regra da indenização é verdadeira para o gratuito, não pode sê-lo para a do mandato oneroso. O caráter especulativo do mandato oneroso impõe ao mandatário a responsabilidade pelos prejuízos que sua deserção provocar, ainda que prove ter renunciado o mandato para evitar prejuízo considerável” (Direito civil, 27.ed. São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3 – Dos contratos e das declarações unilaterais de vontade, p. 289). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 369 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na toada de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a renúncia é manifestação de vontade receptícia originada pelo mandatário, por ser receptícia, a renúncia somente torna-se eficaz ao chegar ao conhecimento do mandante. Embora seja um direito potestativo do mandatário, deve ser exercido segundo o princípio da boa-fé objetiva, i.é, de modo a não causar prejuízos ao mandante. Caso o mandatário aja culposamente ao renunciar, fica obrigado a indenizar o mandante pelos prejuízos que este vier a sofrer em razão desse ato. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 26.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 689. São válidos, a respeito dos contratantes de boa-fé, os atos com estes ajustados em nome do mandante pelo mandatário, enquanto este ignorar a morte daquele ou a extinção do mandato, por qualquer outra causa.

Na cartilha de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o mesmo princípio que se contém nos dispositivos dos CC 686 e 688, acerca de atos praticados após a revogação ou renúncia do mandato, não comunicadas, inspira a edição da regra vertente, haurida já da previsão do CC/1916. Com efeito, aqui, de maneira geral, assenta-se a orientação segundo a qual as causas extintivas do mandato, a rigor, produzem o respectivo efeito, de forma exauriente, desde que delas cientes mandatário e terceiros que com ele negociem. Ou seja, enquanto o mandatário ignorar a ocorrência de qualquer das causas de extinção do mandato, mesmo as legais ou naturais, não se extrairá daí qualquer efeito diante de terceiro de boa-fé, vale dizer, terceiro que também ignora a cessação do ajuste.

Apenas que, em se tratando de revogação ou renúncia, também hipóteses extintivas, posto que voluntárias, previu-se regra específica, todavia não de diverso princípio que anima a disposição do artigo em comento, atinente à morte ou às demais causas extintivas elencadas do CC 682. Veja-se que mesmo causas que induzem a extinção legal e automática, ignoradas pelo mandatário, não podem ser opostas a terceiros de boa-fé. Ou seja, tem-se regra que visa a preservar a confiança de terceiros, inscientes da causa extintiva do mandato, portanto perante quem elas não poderão ser opostas, se tiverem negociado com o mandatário igualmente de boa-fé.

Quanto ao fato de, aqui, exigir-se a insciência também do mandatário, o que se dispensa no CC 686, importa acentuar que, lá, pressupôs-se incúria do mandante, que não cuidou de comunicar a revogação também a terceiros. Em diversos termos, perante terceiros ostentou-se mandato aparente, mas com concorrência culposa do mandante (ver comentário ao CC 662). Não é este o caso das hipóteses extintivas outras, subjacentes ao artigo em tela. Por isso é que, pelo seu preceito, serão ineficazes os atos praticados pelo mandatário, mas ciente da extinção do mandato, mesmo perante terceiros de boa-fé (v.g., Pontes de Miranda. Tratado de direito privado, 3. ed. São Paulo, RT, 1984, t. XLIII, § 4.690, n. 4, p. 93). Ter-se-á, afinal, nesta situação, mandatário já despido de poderes, mas que atua sem qualquer participação culposa do mandante, que possa criar quadro de justificada aparência, perante terceiros, de poderes ainda vigentes.

Por fim, assente-se que embora persista o Código atual, destarte tal como estava na redação do art. 1.321 do Código Civil anterior, a mencionar a validade dos atos do mandatário insciente da extinção, a bem dizer o caso é de eficácia destes mesmos atos. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 714 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na toada de Ricardo Fiuza, sabemos que o mandato, por possuir índole personalíssima, extingue-se com a morte ou incapacidade de qualquer das partes, sem a faculdade de transferência das obrigações ou dos direitos aos herdeiros, exceto se houver estipulação em contrário nesse sentido. Cuida este dispositivo de excepcionalizar o cunho personalíssimo do mandato, quando, pretendendo mitigar o rigorismo desse axioma, dispõe que os negócios celebrados com terceiros de boa-fé pelo mandatário, insciente da morte do mandante, reputam-se válidos e eficazes, a ponto de obrigarem os herdeiros deste último.

Confira-se, a propósito, a jurisprudência a respeito: “se o mandante falecer, o mandato só cessará quando o procurador tiver ciência do ocorrido, sendo válidos os negócios que praticar enquanto ignorar o fato. O mesmo se diga se outra fora causa extintiva do mandato” (RT 277/251 e 210/184). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 370 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No lecionar de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o Código civil de 2002 prestigiou, em matéria de declarações de vontade, a teoria da confiança, que determina o prevalecimento da declaração de vontade sobre a vontade íntima do declarante sempre que a disjunção entre ambas não seja perceptível para o declaratário. Este dispositivo prestigia a confiança do mandatário e de terceiros com quem este venha a contratar em nome do mandante, ao assegurar a validade dos atos praticados após evento que determine a extinção do mandato, desde que a causa de extinção não seja do conhecimento de nenhum destes. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 26.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 690. Se falecer o mandatário, pendente o negócio a ele cometido, os herdeiros, tendo ciência do mandato, avisarão o mandante, e providenciarão a bem dele, como as circunstâncias exigirem.

No discorrer de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a morte de qualquer das partes, como se viu, extingue o mandato (CC 682, II). Tem-se assim que, falecido o mandatário, estará cessado o contrato. Porém, igualmente tal qual já ressaltado no comentário ao artigo mencionado, mesmo post mortem o mandato pode ainda produzir efeitos, malgrado de forma excepcional.

Pois uma destas exceções, e no caso instituída no próprio interesse do mandante, está na disposição do artigo em comento. Por ela, impõe-se aos herdeiros do mandatário, desde que cientes do mandato, ainda pendente, e do paradeiro do mandante, dar aviso a este da morte daquele. Mais, impõe-se-lhe ainda a prática de atos conservatórios ou ultimação mesmo de negócios pendentes, sempre que houver perigo de demora (ver comentário ao artigo seguinte). O preceito não se aplica aos herdeiros de mandatário que o fosse em causa própria, transmitida, a rigor, com a morte, a própria titularidade do objeto do mandato, mercê da verdadeira cessão que esta espécie de mandato encerra (CC 685).

De outra parte, e ao revés, sustentam alguns autores que a interpretação da providência aqui estabelecida deva se dar de forma extensiva, para abarcar outras hipóteses de cessação do mandato, mas por causa atribuível, atinente ao mandatário. Assim, por exemplo, nas hipóteses de interdição ou falência do mandatário, caberia aos respectivos representantes dar aviso ao mandante e tomar as providências previstas no artigo seguinte (ver, por todos: J. M. Carvalho Santos, Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1952, v. XVIII, p. 335). A omissão dos herdeiros em dar aviso e tomar as medidas devidas a bem do mandante, como e quando o exige o artigo em tela e o subsequente, submete-os à composição dos danos daí advindos. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 714 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

No aponte de Fiuza, o mandato se extingue com a morte do mandatário, ainda que seus herdeiros tenham habilitação para executá-lo. De fato, o óbito do mandatário acarreta idêntico resultado extintivo, exatamente pelo caráter intuitu personae do negócio a que se vincula, fundado em características inerentes, peculiares à sua pessoa, as quais, aliás, servem para justificar a escolha do mandante.

Desaparecidas tais características com a morte do constituído, não subsistem os motivos para a permanência do contrato, sem se cogitar, daí, da possibilidade de sua transmissão hereditária, mas presente, ainda, a obrigação de prestar contas por parte dos herdeiros do mandatário (RF 142/235).

Diante disso, falecendo o mandatário e pendente o negócio a ele cometido, hão de se tomar algumas providências, sempre no intuito de resguardar os interesses do mandante. Assim, os herdeiros terão a obrigação de avisar ao constituinte o óbito e providenciarão a bem dele, de acordo com o que as circunstâncias exigirem no caso. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 370 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Como complementam Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a morte do mandatário determina a extinção do mandato, pois este é contrato personalíssimo, que implica, ordinariamente, a confiança do mandante no mandatário. Embora a qualidade de represente não se transmita ao herdeiro do mandatário, este tendo conhecimento do óbito e do mandato, tem o dever de comunica-lo ao mandante e de tomar providências eventualmente necessárias para evitar prejuízos ao mandante, sob pena de ser responsabilizado civilmente. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 26.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 691. Os herdeiros, no caso do artigo antecedente, devem limitar-se às medidas conservatórias, ou continuar os negócios pendentes que se não possam demorar sem perigo, regulando-se os seus serviços dentro desse limite, pelas mesmas normas a que os do mandatário estão sujeitos.

No arremate de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o artigo complementa a regra da disposição precedente, esclarecendo quais são os atos que devem os herdeiros do mandatário falecido praticar, quando pendente o negócio que a este se cometera. Isto, reitere-se, sempre que os herdeiros tenham ciência do mandato, por ocasião do falecimento do mandatário. Pois sendo assim, impõe-se-lhe, primeiro, a tomada de medidas conservatórias, ou seja, que tendam apenas a acautelar o negócio cometido ao mandatário falecido, enquanto o mandante, avisado, não nomeia substituto. São, enfim, providências de mera custódia do objeto do mandato, a fim de evitar seu perecimento.

Compreende-se a limitação erigida pela lei na exata medida em que os herdeiros do mandatário não assumem, propriamente, sua posição contratual. Não são ou não se tornam mandatários. Tanto assim que, mesmo sejam necessárias mais que medidas simplesmente acautelatórias, portanto quando prevê a lei devam os herdeiros praticar verdadeiros atos de execução do mandato, também são impostos limites. Na realidade, somente praticarão atos de execução do ajuste quando houver perigo de demora, vale dizer, quando a interrupção do cumprimento do mandato puder comprometer o proveito ou interesse do mandante. Tal como, de resto, já se acentuou nos comentários – a que se remete – ao CC 674, que guarda o mesmo princípio. E, por fim, se assim for necessário, pela urgência verificada, os herdeiros agirão conforme as regras contratuais e legais que seriam aplicáveis à própria atuação do mandatário falecido. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 715 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Concluindo com Ricardo Fiuza, todas as precauções elencadas no artigo anterior não podem ser concebidas, de forma absoluta, sem qualquer margem de limitação: com a morte do mandatário e pendente ainda o negócio a ele incumbido, deverão os herdeiros tomar providências no escopo de resguardar os interesses do mandante, só que limitadas ou às medidas conservatórias ou à continuidade dos negócios ainda pendentes, ou seja, apenas daqueles cujo sobrestamento importaria perigo, regulando-se os seus serviços, dentro desse limite, pelas mesmas normas a que os do mandatário estavam submetidos, antes de falecer. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 371 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Finalizando com Direito.com, a morte do mandatário extingue o mandato. O CC 690 determina, no entanto, que os herdeiros do mandatário realizem atos necessários a evitar prejuízos ao mandante. O CC 691 esclarece que entre os atos que os herdeiros devam praticar inclui-se a realização de negócios jurídicos pendentes, desde eu estejam incluídos nos poderes do mandato extinto. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 26.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 24 de dezembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 685, 686, 687 - continua - Da Extinção do Mandato - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 685, 686, 687 - continua
- Da Extinção do Mandato - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo X – Do Mandato -
(art. 682 a 691) Seção IV – Da Extinção do Mandato –
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Art. 685. Conferindo o mandato com a cláusula “em causa própria”, a sua revogação não terá eficácia, nem se extinguirá pela morte de qualquer das partes, ficando o mandatário dispensado de prestar contas, e podendo transferir para si os bens móveis ou imóveis objeto do mandato, obedecidas as formalidades legais.

Elucida o mestre Claudio Luiz Bueno de Godoy, já estabelecer, no Código anterior, que, dentre outras hipóteses, inclusive examinadas nos comentários aos artigos antecedentes, a chamada procuração em causa própria era irrevogável (art. 1.317, I). Explicita, agora, o Código Civil de 2002, que o mandato que contenha a cláusula em causa própria é irrevogável e, mais, que a sua revogação, assim, não terá eficácia, mesma consequência disposta no CC 684, mas não no CC 683, atrás enfrentados.

O mandato com a cláusula referida (in rem propriam ou in rem suam), na realidade, é instituído no interesse do mandatário. Em diversos termos, por meio desse ajuste o mandatário é nomeado para agir no seu próprio interesse, por isso que ficando dispensado de qualquer prestação de contas. Pelo mesmo motivo é que esta espécie de mandato é irrevogável e não se extingue com a morte do mandante ou do mandatário.

Sempre houve, porém, grande discussão sobre se a cláusula in rem suam chegava a implicar transferência do direito incidente sobre o objeto do negócio principal ao mandatário. Pontes de Miranda, por exemplo, sustentava que nesta espécie de mandato não se transfere, em concreto, qualquer direito de crédito e, menos ainda, a propriedade, a seu ver transmitindo-se em abstrato, um poder de disposição de direitos no interesse do mandatário, como se fosse seu o direito a transmitir, porque seu o respectivo proveito (Pontes de Miranda. Tratado de direito privado, 3. ed. São Paulo, RT, 1984, t. XLIII, § 4.700, n. I, p. 157).

Contudo, e ao revés, sempre houve posição menos restrita, a defender que o mandato em causa própria induz verdadeira transferência, cessão indireta de direitos, portanto assim sustentando-se que, a rigor, nem bem mandato é, eis que descaracterizado na sua essência e, por isso, inclusive, interpretado à luz de negócio traslativo de direitos, i.é, uma cessão, uma alienação, onerosa ou gratuita (para uma exemplificação dos defensores de uma ou outra teoria, e de seus respectivos argumentos, de forma mais detalhada, conferir: Marmitt, Arnaldo. Mandato. Rio de Janeiro, Aide, 1992, p. 45-6).

Bem de ver, porém, que o debate não é meramente acadêmico. Se se admitir que a cláusula in rem suam implica transferência de direitos, então forçoso será concluir que o instrumento deste mandato, quando obedeça aos requisitos do contrato traslativo a que se volta, vale por ele, e não só como ajuste preliminar ou preparatório, portanto sem necessidade de negócio posterior, inclusive contratado consigo mesmo, i.é, o mandatário contratando pelo mandante e por si. Assim, por exemplo, admitir-se-á, como a jurisprudência já aceitava, o registro do instrumento do mandato em causa própria, lavrado por escritura pública, para alienação de direito real imobiliário.

E, com efeito, entende-se que a própria origem dessa espécie de negócio, vindo do Direito romano, em que instituído para possibilitar, justamente, a cessão de obrigação, então contemplativa de um vínculo pessoal, por isso impassível de cessão a qual, pelo mandato em exame, se fazia de forma indireta, pois, a um procurator in rem suam, indique cuidar-se de verdadeira transferência de direitos. Ou seja, um mandato que, impropriamente, produz mais que efeitos de gestão de interesse alheio, operando, antes, efeitos mesmo traslativos de direitos, de que acaba realmente titular o mandatário.

Mais, a prática denota a utilização desta espécie negocial precisamente para transferir direitos. Certo que a redação do artigo em comento não é de todo esclarecedora quando alude à possibilidade de que o mandatário in rem suam possa transferir para si os bens móveis ou imóveis objeto do mandato, obedecidas as formalidades legais, como se sempre houvesse a necessidade de um negócio principal e posterior. Deve-se entender, porém, que, se atendidas as exigências de forma e conteúdo do negócio contratual principal, o mandato em causa própria já valha por ele, destarte mais que mero negócio preliminar. Isso sempre à consideração, enfim, de que o mandato em causa própria vai além da mera concessão de poderes ilimitados a mandatário dispensado de prestar contas, dado que, por seu intermédio – sendo essa função fundamental e seu efeito principal -, atribui-se ao mandatário a qualidade de dono da coisa ou do negócio sobre o qual incide o ajuste (De Plácido e Silva. Tratado do mandato e prática das procurações. Rio de Janeiro, Forense, 1989, v. I, p. 504). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 709-710 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 24/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na balada de Ricardo Fiuza, segundo se sabe, a procuração em causa própria (in rem proprium ou in rem suam), originária do direito romano, faz-se outorgada em exclusivo. Por ela, o mandante transfere direitos ao mandatário, para que este possa, legitimamente, alienar bens do primeiro, sem a necessidade, inclusive, de prestação de contas sobre o ocorrido, acarretando, em última análise, uma espécie de cessão indireta de direitos.

Não obstante algumas respeitáveis opiniões em contrário, acreditamos ser esta espécie de procuração irrevogável, permanecendo em vigor, mesmo após a morte do mandante ou do mandatário, eis que constituiu obrigação transmissível aos competentes herdeiros.

Avulta tórrido entendimento jurisprudencial segundo o qual “a procuração em causa própria, pela sua própria natureza, dispensa o procurador de prestar contas, pois encerra uma cessão de direitos em proveito dele. E, por isto mesmo, irrevogável e presta-se à transmissão do domínio mediante transcrição no Registro Imobiliário, desde que reúna os requisitos fundamentais e sejam satisfeitas as formalidades exigidas para a compra e venda” (RT 577/214). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 367-368 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 24/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, uma espécie de mandato no interesse do próprio mandatário é a procuração “em causa própria”, sendo esta a que permite o negocio consigo mesmo, previsto no CC 117. A cláusula “em causa própria” dispensa o mandatário da prestação de contas e equivale ao negócio de alienação para fins fiscais. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 24.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 686. A revogação do mandato, notificada somente ao mandatário, não se pode opor aos terceiros que, ignorando-a, de boa-fé com ele trataram; mas ficam salvas ao constituinte as ações que no caso lhe possam caber contra o procurador.

Parágrafo único. É irrevogável o mandato que contenha poderes de cumprimento ou confirmação de negócios encetados, aos quais se ache vinculado.

No diapasão de Claudio Luiz Bueno de Godoy, como se disse por ocasião do exame do CC 682, a revogação, uma das formas de extinção do mandato, resultante de iniciativa do mandante, que destitui o mandatário do encargo conferido, deve ser a este, e a terceiros que com ele negociem, devidamente comunicada.

Com efeito, cuidando-se de unilateral resilição de contrato, dela insta tenha ciência o outro contratante, que é o mandatário, bem assim os terceiros que com ele estejam tratando. Daí afirmar-se que a revogação dimana de declaração de vontade receptícia, ou seja, que somente produz efeitos depois de conhecida pelo declaratário e por terceiros que com ele negociem. Na verdade, com a regra procura-se não só preservar a confiança de terceiros no tráfico negocial como, assegurar-se mantenha o mandatário devidamente informado das circunstâncias da outorga de poderes, cuja revogação se pretenda, corolário do solidarismo que deve permear as relações jurídicas.

Inexistente a comunicação da revogação, tem-se hipótese de verdadeiro mandato aparente, em que justificadamente há a crença, por terceiros, na condição de mandatário de alguém que assim atua, e por concorrência da conduta do mandante, que se omite na comunicação da revogação (ver comentário do CC.662, sobre o mandato aparente, seus requisitos e eventuais efeitos). O resultado, então, ausente a devida comunicação da revogação, é a vinculação do mandante por obrigações assumidas pelo mandatário diante de terceiros inscientes daquela mesma revogação. Se, porém, o mandatário tinha conhecimento da revogação, malgrado não os terceiros, embora perante estes o mandante se obrigue, pode voltar-se contra o mandatário pelos prejuízos que tenha sofrido.

A comunicação da revogação não exige forma especial, malgrado se utilize a lei da expressão notificação, a rigor uma cientificação a que se agrega uma cominação, impondo-se, isso sim, meio eficaz de conhecimento do mandatário e de terceiros. Se os terceiros são indeterminados, tem-se entendido que, ainda assim, se deva proceder à cientificação para conhecimento geral, por meio de publicações, editais, ou meio idôneo a atingir o universo de pessoas potencialmente em contato com o mandatário.

Já no parágrafo único do artigo em comento, complementa-se o princípio que se contém no CC 684, antes examinado, hipóteses, ambas, que davam redação ao inciso II do art. 1.317 do CC/1916. Ou seja, deve-se ter por ineficaz, consequência aqui omitida, mas expressa no referido CC 684, repita-se, o que consubstanciava um só preceito no Código anterior, eis que o princípio é o mesmo, a revogação de mandato que contenha poderes de cumprimento ou confirmação de negócios entabulados e aos quais se vincule. É, por exemplo, o mandato conferido para pagamento de débitos, enfim para execução de contratos, inclusive preliminares. São, no dizer de Caio Mário, mandatos acessórios de outro contrato, ou mesmo cláusula dele constante (Instituições de direito civil, 10.ed. Rio de Janeiro, Forense, 1999, v. III, p. 265), apenas valendo não olvidar a abusividade de previsões, desse jaez, que imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico de consumo em nome do consumidor (art. 51, VIII, da Lei n. 8.078/90 e Súmula n. 60 do STJ). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 710-711 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 24/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Considerando Ricardo Fiuza segundo já amplamente analisado, o mandatário se manifesta em nome e no exclusivo interesse do mandante, ante, inclusive, a própria essência do mandato, razão por que permanece este último como titular de direitos e obrigações oriundos desta espécie contratual. A par dessa regra, deverá o mandante responder, com seu patrimônio, perante terceiros eventualmente prejudicados em razão da vontade emitida pelo mandatário, desde que dentro do rol de poderes a este outorgados.

Conquanto não se exija formalidade alguma para a revogação, o mandante tem a obrigação de comunica-la não só ao mandatário, avisando que o destituiu dos poderes para agir em seu nome, como também aos terceiros com quem este Ultimo contratava. José Paulo Cavalcanti, em sua obra intitulada A representação voluntária no direito civil (Recife, 1965, p. 101), averba que “a revogação deve ser comunicada aos terceiros, sendo eficazmente realizada, qualquer que tenha sido o meio pelo qual lhes tenha sido efetuada a respectiva comunicação”.

Dessa maneira, impõe-se a efetiva publicização da revogação, com os meios a tanto necessários, com o fito de dar ciência a todos os possíveis interessados, e, via obliqua, não induzir ninguém em erro. Caso não se proceda a essa comunicação, o mandante responderá, perante terceiros, pelos negócios empreendidos pelo mandatário em seu nome, ressalvando-se ao primeiro o direito de regresso contra este último, nas situações previstas.

E assente o posicionamento jurisprudencial de que “para ficar livre e isento de qualquer responsabilidade, incumbe ao mandante tornar pública a revogação, apelando para todos os meios ao seu alcance, quer avisando as pessoas com as quais mantinha negócios, quer por intermédio de editais pela imprensa” (RT 240/465 e 399/33 I). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 368 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 24/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a revogação do mandato é declaração receptícia, i.é, que somente produz efeitos no momento em que chega ao conhecimento do destinatário. Se o mandatário, ciente de da revogação utiliza o mandato para vincular o mandante em negócio com terceiros, sem dar conhecimento a este da revogação, o terceiro, ao contratar, age de boa-fé e, por isso, o negócio jurídico vincula-o reciprocamente ao mandante.

Ao utilizar procuração revogada, o mandatário age de má-fé e comete ato ilícito, ficando obrigado a indenizar o mandante pelos prejuízos que este vier a sofrer.

O mandato que contenha poderes para cumprimento ou confirmação de negócios já realizados é irrevogável. Assim, por exemplo, é ineficaz a revogação do mandato conferido para a realização de negócio definitivo que tenha sido objeto de contrato preliminar. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 24.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 687. Tanto que for comunicada ao mandatário a nomeação de outro, para o mesmo negócio, considerar-se-á revogado o mandato anterior.

Da forma como instrui Claudio Luiz Bueno de Godoy, já se disse no comentário ao CC 682, a revogação do mandato não se efetiva sempre de maneira expressa, podendo ostentar-se tácita quando, tal qual dispõe o dispositivo em comento, o mandante nomeia outro mandatário, com isso denotando quebra da confiança que o fez nomear o anterior. Daí que não haverá revogação pela outorga de poderes gerais que suceda uma outorga de poderes especiais.

Portanto, insta que se revele situação de incompatibilidade na execução de um mesmo encargo, não se podendo presumir que o segundo mandatário tenha sido constituído para atuação conjunta com o primeiro, o que deve dimanar de disposição textual. Em compensação, como adverte Carvalho Santos, mesmo se a segunda nomeação for invalida ou não aceita já se terá operado a revogação do antecedente mandato porque evidenciada, de toda sorte, a quebra da confiança (Carvalho Santos, Código Civil brasileiro interpretado, 5.ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1952, v. XVIII, p. 328).

Ademais, tal revogação tácita, para produzir efeitos, deve ser comunicada ao mandatário, na mesma senda da disposição do artigo anterior, a cujos comentários se remete, igualmente, como lá se disse, sem forma especial e, mais, por iniciativa não só do mandante como do nomo mandatário, ou mesmo, no exemplo do mandato judicial, ou pela juntada da nova procuração aos autos. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 712 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 24/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na esteira de Ricardo Fiuza, embora presente o cunho unilateral que norteia a hipótese de revogação do mandato, ao sabor da vontade de um dos contratantes, é certo que tal manifestação não pode prejudicar terceiros de boa-fé, cujos interesses devem ser resguardados, máxime quando o mandatário desconhecia a revogação, de modo a validar todos os efeitos dessa contratação.

No entanto, se, mesmo ciente da revogação, o mandatário permanece exercendo os poderes já anteriormente revogados, este é que responderá pela falta, já que decorrente de sua própria culpa.

Clóvis Beviláqua, interpretando este preceito, ponderou com a sagacidade de sempre: “A nomeação do novo procurador, para ter o efeito de revogar o anterior, deve ser para o mesmo negócio. A procuração geral para todos os negócios não revoga a especial anterior se a ela, expressamente, se não referir, e a especial posterior só revoga a geral anterior no que concerne ao seu objeto peculiar” (Código Civil dos Estados Unidos do Brasil comentado, Rio de Janeiro, Livraria Francisco Alves, 1919, v. 5, p. 67). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 369 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 24/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entendimento de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, se o mandante constitui outro mandatário para a prática dos mesmos atos que foram objeto de mandato anterior, este será revogado tão logo o conhecimento do segundo mandato chegue ao conhecimento do primeiro mandatário.

A regra é de caráter supletivo. É válida a ressalva de ratificação do primeiro mandato aposta no segundo mandato de modo a permitir que ambos vigorem simultaneamente. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 24.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 682, 683, 684 - continua - Da Extinção do Mandato - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 682, 683, 684 - continua
- Da Extinção do Mandato - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo X – Do Mandato -
(art. 682 a 691) Seção IV – Da Extinção do Mandato –
vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 682. Cessa o mandato:

I – pela revogação ou pela renúncia;
II – pela morte ou interdição de uma das partes;
III – pela mudança de estado que inabilite o mandante a conferir os poderes, ou o mandatário para os exercer;
IV – pelo término do prazo ou pela conclusão do negócio.

Conforme leciona Claudio Luiz Bueno de Godoy, o Código, no artigo presente, tal como disposto pelo CC/1916 no art. 1.316, e mercê de idêntica redação, dispõe sobre as causas de extinção do contrato de mandato, a começar por duas que se podem dizer voluntárias: a revogação e a renúncia.

A revogação é ato unilateral por meio do qual o mandante exerce faculdade potestativa de destituir o mandatário do encargo que lhe havia cometido. Essa potestade é da essência do mandato, ressalvadas as hipóteses excepcionais a seguir examinadas (CC 683 a 685), se, afinal, o contrato é daqueles fiduciários, portanto baseados em confiança, a qual pode desaparecer, ademais instituído no interesse do mandante, também passível de cessação. Não há forma especial, nem mesmo aquela por que consumado o mandato, para a revogação, que pode ser total ou parcial, bem assim expressa ou tácita, como quando o mandante nomeia outro mandatário para cumprir o mesmo encargo (CC 687), ou quando ele próprio pratica o ato para o que havia outorgado poderes. A revogação deve ser comunicada ao mandatário e a terceiros (CC 686). Se existente mandato com procuração lavrada por escritura pública, a revogação deve ser averbada no mesmo instrumento e, se lavada a efeito em outras notas, deve haver comunicação ao tabelionato em que consumado o ato revogado, para a referida averbação (no Estado de São Paulo há determinação administrativa a respeito, consubstanciada nas Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça – Provimento CG n. 58/89, nesta parte com redação dada pelos Provimentos n. 13/94 e 21/994 -, Capítulo XIV, itens 22.1 a 22.3). os efeitos da revogação são ex nunc e, portanto, não afetam os negócios já entabulados pelo mandatário.

Havendo mais de um mandante, a revogação por um só não desfaz a relação existente com os demais, salvo se o negócio cometido ao mandatário for indivisível. Se o negócio principal não for de interesse comum dos mandantes, a revogação por um deles, da mesma forma, não afeta os demais, a rigor tratando-se de relações individualizadas, ainda que instrumentalizadas por ato único.

O mandante que revoga o mandato sujeita-se ao ressarcimento das despesas adiantadas pelo mandatário, sem prejuízo, na advertência de Caio Mário da Silva Pereira, mesmo que o mandato seja por prazo indeterminado, de indenização se, malgrado discricionária (ad nutum), sua conduta for abusiva (Instituições de direito civil, 10. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1999, v. III, p. 263), lembrando-se que, hoje, a teoria do abuso não se liga apenas aos atos dolosos, deliberados ou propositadamente voltados a causar danos (CC 187). Destarte, ao caso, entende-se, deve ser aplicado o mesmo princípio de solidarismo, de boa-fé objetiva que anima a previsão do CC 473, parágrafo único.

Já se o mandato for oneroso, tem-se entendido que o mandante submete-se à composição dos prejuízos causados pelo exercício da revogação, quando não se justificar por conduta culposa do mandatário (ver, por todos: De Plácido e Silva. Tratado do mandato e prática das procurações. Rio de Janeiro, Forense, 1989, v. II, p. 837), de resto como sucede no Direito italiano, em que, textualmente, se estatui obrigação indenizatória afeta ao mandante que revoga, sem justa causa, mandato oneroso, conferido por tempo determinado ou para determinado negócio, estabelecendo, mais, igual indenização quando o ajusto seja por prazo indeterminado, porém revogado sem razoável aviso prévio (CC 1.725). Tudo sem prejuízo de, ainda no mandato oneroso, se pagar a remuneração proporcional ao quanto já cumprido do ajuste, quando revogado depois de iniciada a sua execução. E sem prejuízo, ainda, da indenização que, em caso de revogação de mandato irrevogável, se prevê no artigo seguinte.

Outra causa voluntária de extinção do mandato é a renúncia, ato unilateral praticado pelo mandatário, cuja possibilidade se funda nos mesmos pressupostos que fazem da revogabilidade a regra no mandato. Mas, também aqui, excepcionalmente, pode haver a irrenunciabilidade, que se considera ocorrer nos mesmos casos em que o mandato for irrevogável (cf. De Plácido e Silva. Op. cit., p. 870-1). A renúncia não guarda exigência de forma especial, podendo-se mesmo inferir a respectiva intenção do mandatário a partir de sua conduta, como a de devolver a procuração ao mandante, todavia devendo, em qualquer hipótese, haver sempre comunicação ao outorgante, e a tempo de haver proveitosa substituição, pena de indenização, que adiante se examinará (ver CC 688). A renúncia em mandato conjunto, por um dos mandatários, extingue o contrato, eis que necessária, ao seu cumprimento, a interferência de todos os mandatários.

Já uma causa legal de extinção do mandato é a morte, e de qualquer dos contratantes, afinal não se olvidando cuidar-se de ajuste fiduciário e intuitu personae. Não só a morte natural, como também a presumida, em sentido amplo, abrangendo a ausência, deve-se entender extintiva do mandato. Da mesma forma se subsume à espécie a dissolução e liquidação da pessoa jurídica. A despeito de se tratar de causa extintiva que opera de pleno direito, portanto independentemente de qualquer notificação, se falecer o mandatário, seus herdeiros, cientes do ajuste, darão aviso ao mandante, pendente ainda o negócio principal (CC 690), certo que, ao revés, morto o mandante, serão validados os atos posteriores praticados pelo mandatário insciente do falecimento, diante de terceiros de boa-fé (CC 689, infra). Mais, e como já se examinou (CC 674), mesmo havida a morte do mandante, ou mesmo mudança de seu estado, deve o mandatário concluir negócios já iniciados, se houver perigo de demora na sua interrupção.

De modo excepcional, não se extinguirá pela morte do mandante o mandato em causa própria (CC 685) e aquele estabelecido no interesse comum, portanto também do mandatário. Outra hipótese é a de o mandante já ter quitado o mandatário de todas as suas obrigações antes do falecimento. Havendo mais de um mandatário, extingue-se com a morte de um deles o mandato conjunto. Tudo afora as hipóteses dos CC 674, 689 e 691.

Outra causa legal de cessação do mandato é a interdição do mandante ou mandatário, dada a limitação de capacidade que ela induz, mas desde quando haja sido judicialmente declarada, de resto aplicando-se lhe as mesmas regras e ressalvas válidas para a morte.

A terceira causa legal extintiva do mandato é a mudança do estado de qualquer das partes, que as inabilitem a conferir poderes ou a exercer os poderes recebidos. Aqui devem ser compreendidos não só os casos que afetem a capacidade da parte, muito mais ligados à interdição, como outros que digam com a legitimação para a prática de determinado ato. Por exemplo o casamento, que não seja no regime da separação (CC 1.647), afeta o mandato outorgado para venda, por alguém então solteiro. Da mesma forma, o mandato ad judicia cessa se o mandatário ingressa em concurso incompatível com a advocacia.

A falência do mandatário será também causa extintiva da espécie em exame, excetuada a outorga para atos estranhos ao comércio; já a falência do mandante, que antes não extinguia o mandato conferido para prática de negócios que interessassem à massa, salvo revogação pelo síndico, na forma do disposto no art. 49 do Decreto-lei n. 7.661/45, agora, nos termos do art. 120 da Lei n. 11.101/2005, faz cessar seus efeitos, ressalvado o mandato conferido para representação judicial do devedor, que continua em vigor até que seja expressamente revogado pelo administrador judicial.

Por fim, são causas naturais de extinção do mandato o término de seu prazo e a conclusão do negócio para o qual foi outorgado. O que pressupõe, no primeiro caso, tenha sido estabelecido termo ad quem, o que não é obrigatório, podendo-se pactuar o mandato por prazo indeterminado, e no segundo que o mandato tenha sido outorgado para negócio ou negócios específicos, assim esgotando-se o ajuste pela ultimação do encargo conferido. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 705-706 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 23/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

No lecionar de Ricardo Fiuza, os autores costumam ainda lembrar outras extintivas, que são de caráter geral, como a impossibilidade do objeto, a nulidade do contrato, a resolução por inadimplemento, a verificação de condição resolutiva (Instituições de direito civil, 10. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1996, p. 262-3).

Desta valiosa lição doutrinária dessume-se que a extinção do mandato compreende, a rigor, três ordens de fatores: natural (quando decorre do seu integral cumprimento, pela expiração do prazo para que se perfez ou pela feitura do negócio sobre que versava seu objeto), voluntária (por manifestação ou acordo das partes para ultimá-lo) e legal (quando a própria lei indica algum(uns) fato(s), cuja(s) ocorrência(s) invalida(m) o contrato).

Via de regra, o mandato pode, a qualquer tempo, ser revogado simplesmente porque, além de se fundar na confiança do mandante para com o mandatário, é sempre constituído no interesse do primeiro, que, exatamente por isso, pode revoga-lo a seu livre alvedrio, quando bem lhe aprouver. Deveras trata-se de faculdade que lhe assiste, a ser exercitada a qualquer momento, ensejando, sem embargo, uma espécie de resilição unilateral, prescindindo de qualquer justificativa para tanto, desde que não mais lhe convenha o negócio (revogação ad nutum). Diz-se “via de regra”, porquanto as partes podem estipular cláusula de irrevogabilidade, prevista no CC 683, a seguir.

A revogação não produz efeitos retroativos, atingindo, apenas, os atos futuros (ex nunc), em respeito aos já praticados.

Se a manifestação de vontade provier do mandatário, haverá renúncia ao mandato, a qual, a exemplo da revogação, também detém cunho unilateral, mas há de ser comunicada a tempo, embora prescinda de sua justificação, a fim de que o mandante providencie a sua substituição.

A morte do mandante, como a do mandatário, configura outra causa extintiva do mandato, haja vista se tratar de contrato intuitu personae. A interdição de mandante ou de mandatário, por seu turno, também tem o condão de aniquilar o mandato, à medida que incapacita o agente de exercê-lo, desalijando-o dos poderes necessários para continuar o contrato a si confiado. O interdito, como sabido, não pode atingir os atos da vida civil, já que declarada judicialmente a sua incapacidade.

A hipótese trazida pelo inciso III – convém salientar – atina, em verdade, aos casos de estado de pessoa, precisamente no seu aspecto civil, e não à perda de capacidade propriamente dita.

Se o mandato foi outorgado por prazo determinado, quando o próprio instrumento assim estipular, cessará o contrato de pleno direito no momento em que expirar tal período. De igual modo, conferido o mandato somente para algum ato específico, ocorrendo este ato também extinguir-se-á. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 365-366 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 23/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na ilustração de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a) revogação e renúncia são os negócios jurídicos unilaterais que cabe, respectivamente, ao mandante e ao mandatário, para resilir o mandato. O andante extingue o mandato mediante a revogação dos poderes que concedeu ao mandatário; o mandatário pode, igualmente, extinguir o mandato mediante a renúncia dos poderes que recebeu. São atos unilaterais e, portanto, dependem da manifestação de vontade de apenas uma das partes. São, no entanto, negócios receptícios: para tornarem-se eficazes é necessário que deles tenham conhecimento os respectivos destinatários; b) Morte ou interdição de uma das partes. A morte do mandante ou do mandatário extingue o contrato imediatamente, mesmo antes de chegar ao conhecimento da outra parte. No caso de morte do mandante, no entanto, são válidos os atos que o mandatário praticar em seu nome, de boa-fé, antes de tomar conhecimento do óbito (CC 689); c) Mudança de estado. Incapazes podem ser mandantes uma vez que se façam representar ou sejam assistidos por seu representante legal. Se, no entanto, o mandante capa vier a se tornar incapaz, essa mudança de estado determina a extinção do mandato. Do mesmo modo, se o mandatário capaz tornar-se incapaz, cessa o mandato. Os negócios eventualmente praticados após a mudança de estado do mandante e do mandatário, mediante o uso do mandato, são nulos. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 23.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 683. Quando o mandato contiver a cláusula de irrevogabilidade e o mandato o revogar, pagará perdas e danos.

No diapasão de Claudio Luiz Bueno de Godoy, como se vem de examinar nos comentários ao artigo precedente, o mandato, por encerrar ajuste fiduciário, assim intuitu personae, é, em essência, revogável pelo mandante. Mas, disse-se também que há hipóteses excepcionais de irrevogabilidade, que começam a ser tratadas, pelo Código, no artigo presente. Com efeito, e tal como já constava do art. 1.317, I, do CC/1916, prevê a lei, antes de tudo, que as próprias partes possam, corolário de sua autonomia privada, convencionar a irrevogabilidade.

A diferença, porém, está em que, no anterior Código, expressava-se no artigo mencionado, sem mais, sem qualquer ressalva, a irrevogabilidade de mandato ajustado com cláusula dessa jaez, destarte abrindo-se a discussão sobre se haveria um direito de o mandatário executar o ajuste, ainda que de forma coativa, negando-se qualquer efeito à revogação que, a despeito de cláusula vedatória, viesse a ser externada pelo mandante (de resto tal qual é a solução, de ineficácia, para a hipótese de revogação alvitrada no artigo seguinte, infra, a cujos comentários se remete).

Na verdade, contudo, já avultava o entendimento de que, malgrado a irrevogabilidade convencionada, poderia, ainda assim, o mandante revogar os poderes conferidos, ante a natureza do contrato de mandato, só que, nesse caso, obrigando-se a compor perdas e danos, se não houvesse justa causa para a revogação.

Por outra, já se defendia que a cláusula de irrevogabilidade impunha uma obrigação de não fazer, mas sem consequência outra, resultante de seu descumprimento, que não fosse a composição de perdas e danos (v.g., Washington de Barros Monteiro. Curso de direito civil – direito das obrigações. São Paulo, Saraiva, 1956, v. II, p. 301; Mário Caio da Silva Pereira. Instituições de direito civil, 10. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1999, p. 265).

Pois agora, com a redação dada ao CC 683, do Código Civil de 2002, positiva-se esta orientação, ou seja, no sentido de que, quando convencionada a irrevogabilidade, a revogação, mesmo assim opera efeito, por ser da essência do mandato, mas sujeitando o mandante, e aí a consequência, a compor perdas e danos como qualquer contratante inadimplente.

Por fim, vale a ressalva de que a leitura a contrário do preceito não deve levar à conclusão de que, se não pactuada a irrevogabilidade, a revogação exima o mandante, sempre, de qualquer consequência indenizatória. Consoante se advertiu nos comentários ao artigo antecedente, a que ora se remete, a revogação do mandato, mesmo se não vedada pelo ajuste, e ainda que a entabulação tenha sido por prazo indeterminado, pode também suscitar composição de perdas e danos, mas mercê de diferente cognição, que envolve a verificação de abuso, segundo o paradigma da boa-fé objetiva, vale dizer, de padrão de comportamento leal que se espera dos contratantes. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 706-707 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 23/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Lecionando Fiuza, sendo a regra a possibilidade de revogação do mandato, pela sua própria natureza jurídica, a cláusula de irrevogabilidade, eventual e explicitamente inserta no contrato, deverá ser observada em toda a sua plenitude, justamente por estar presente, tão-somente, em caráter excepcional, a que, sponte sua, anuíram os interessados. Vale dizer, se acordada pelas partes interessadas a sua previsão no contrato, há ela de ser rigorosamente cumprida, sob pena de o mandante responder pelas perdas e danos desta inobservância advindos.

O percuciente Caio Mário, já antevendo uma eventual problemática que poderia surgir nesse particular, asseverou que, “tendo as partes em vista a natureza do negócio ou seus recíprocos interesses, podem convencionar que o mandante não tem a faculdade de cassar os poderes. Em tal caso, adquire o mandatário o direito de exercer o mandato, sem ser molestado. Mas, sendo a cassação da própria essência do mandato, tem-se entendido que, se o constituinte o revogar, não obstante a proibição convencionada, estará sujeito a pagar ao procurador a remuneração total, ou indenizá-lo dos prejuízos resultantes da revogação inoportuna ou injusta, como qualquer outro contratante inadimplente” (Instituições de direito civil, 10. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1996, p. 265). Em outras palavras, “com essa estipulação, ele assume obrigação de não fazer, que, violada, dá lugar à composição dos prejuízos” (RT 150/525 e 178/168). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 367 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 23/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o mandato é, em regra, revogável. A lei admite que seja outorgado com a cláusula de irrevogabilidade. Presente a cláusula, duas situações podem se apresentar, segundo a natureza do negócio a que se destina o mandato: a irrevogabilidade pode tornar ou não eficaz eventual ato revocatório.

A revogação será ineficaz somente se a cláusula de irrevogabilidade for condição de um negócio jurídico bilateral ou se tiver sido estipulada no exclusivo interesse do mandatário, conforme determina o CC 684, a seguir.

A compreensão da norma exige ter em mente que, apesar de o mandato ser exercido em nome do mandante, a outorga pode visar a atender ao interesse concreto de qualquer pessoa: do próprio mandante, do mandatário ou de terceiros. Assim, p. ex., se A promete vender a B um imóvel e, paralelamente, outorga a B poderes para representar A na escritura de compra e venda, esse mandato terá sido outorgado no interesse do próprio mandatário.

Desse modo, uma vez que cláusula de irrevogabilidade não estabelecida em mandato estipulado em benefício do próprio mandatário, ela somente implicará a responsabilidade do mandante por indenizar os prejuízos causados ao mandatário pela revogação; não impedirá a eficácia dela. Assim, p. ex., se A outorga poderes a B para defende-lo em juízo, tal mandato será no interesse do mandante. Se dele constar a cláusula de irrevogabilidade, ela não retirará a eficácia de eventual revogação; obrigará o mandante a indenizar o mandatário pelos danos que tiver sofrido com a revogação. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 23.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 684. Quando a cláusula de irrevogabilidade for condição de um negócio bilateral, ou tiver sido estipulada no exclusivo interesse do mandatário, a revogação do mandato será ineficaz.

No diapasão de Claudio Luiz Bueno de Godoy, segue o Código, no dispositivo presente, e como já se disse no comentário ao artigo anterior, tratando de excepcionais hipóteses de irrevogabilidade do mandato. Só que, agora, diversamente do que se previu no preceito antecedente, e reforçando a conclusão lá externada, a propósito da consequência da revogação de que cuida, estabelece o Código a sanção de ineficácia para a revogação que se venha a externar quando a irrevogabilidade, no dizer do artigo ora em comento, for condição de um negócio bilateral ou tiver sido estipulada no exclusivo interesse do mandatário. Vale dizer, se se cuida de revogação de mandato pactuado, sem mais, com cláusula de irrevogabilidade, a consequência é indenizatória, mas operando efeitos o ato revocatório (CC 683). Já se a irrevogabilidade é condição de negócio bilateral ou interessa só ao mandatário, então a revogação será, antes, ineficaz (CC 684).

Essa é a diversidade de tratamento que o novo Código reservou às hipóteses descritas, genericamente, sob a única rubrica da irrevogabilidade, no art. 1.317 do CC/1915. O mandato que seja condição de um negócio jurídico bilateral não se revoga como decorrência da própria irrevogabilidade deste negócio principal.

Na explicação de Pontes de Miranda, a hipótese se refere à contratação, em um ajuste bilateral, de um mandato que sirva ao cumprimento de prestações convencionadas (Pontes de Miranda. Tratado de direito privado, 3. ed. São Paulo, RT, 1984, t. XLIII, § 4.690, n. 2, p. 86). Da mesma forma, se o mandato é estabelecido no interesse exclusivo do mandatário, como quando contém a cláusula in rem suam (v. artigo seguinte) ou quando já se lhe tenha dado integral quitação de suas obrigações (ver comentário ao CC 682), igualmente haverá irrevogabilidade e ineficácia da revogação que, apesar disso, manifeste-se.

O mandato conferido no interesse comum do mandante e do mandatário, ou do mandante e de terceiro, via de regra, como observa De Plácido e Silva (Tratado do mandato e prática das procurações. Rio de Janeiro, Forense, 1989, v. II, p. 892), subsume-se à hipótese da primeira parte do preceito ou, então, significa forma de cumprir qualquer obrigação ou negócio preliminar, o que se contemplou no CC 686, parágrafo único, adiante examinado. Aliás, em virtude desse preceito, não se repetiu, no artigo em comento, a segunda parte do inciso II do art. 1.317 do CC/1916, não se tendo repetido seu inciso III por concernir a matéria de direito societário. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 708 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 23/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Seguindo a doutrina de Ricardo Fiuza, nesta hipóteses, a cláusula de irrevogabilidade representa, verdadeiramente, uma condição acessória de um contrato principal, de natureza bilateral, ou funciona como um meio para cumprir o fim: a realização da obrigação contratada.

Doutra banda, a revogação do mandato não surtirá quaisquer efeitos, juridicamente considerados, quando a cláusula de irrevogabilidade houver sido constituída em benefício do mandatário. A razão de ser dessa restrição reside, essencialmente, na necessidade de se resguardar e tutelar os interesses do mandatário, que se inclinou a aceitar a incumbência de representar o mandante, se, a contrapartida de perceber qualquer bônus para tanto. Nada mais razoável, portanto, do que fornecer-lhe tal garantia, para não ser surpreendido com a repentina e injustificada resilição do mandato. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 367 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 23/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a compreensão desta norma exige ter em mente que, apesar de o mandato ser exercido em nome do mandante, a outorga pode visar a atender ao interesse concreto de qualquer pessoa: do próprio mandante, do mandatário ou de terceiros. Assim, v.g., se A promete vender a B um imóvel e, paralelamente, outorga a B poderes para representa-lo na escritura de compra e venda, esse mandato terá sido outorgado no interesse do próprio mandatário que, como comprador, é o maior interessado na escritura de compra e venda.

Desse modo, se o mandante manifestar a vontade de revogar o mandato, tal revogação não terá eficácia, permanecendo os poderes outorgados ao mandatário. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 23.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).