quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 792, 793, 794 - continua - DO SEGURO DE PESSOA - VARGAS, Paulo S. R.

Direito Civil Comentado - Art. 792, 793, 794 - continua
- DO SEGURO DE PESSOA - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XV – DO SEGURO DE PESSOA
 – Seção III - (art. 789 a 802) - vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 792. Na falta de indicação da pessoa ou beneficiário, ou se por qualquer motivo não prevalecer a que for feita, o capital segurado será pago por metade ao cônjuge não separado judicialmente, e o restante aos herdeiros do segurado, obedecida a ordem da vocação hereditária.

Parágrafo único. Na falta das pessoas indicadas neste artigo, serão beneficiários os que provarem que a morte do segurado os privou dos meios necessários à subsistência.

Nos termos de Claudio Luiz Bueno de Godoy, como se viu nos comentários ao artigo anterior, a escolha do beneficiário, pelo segurado, é livre, com a ressalva contida no artigo seguinte. Pode essa escolha se dar logo no instante da entabulação ou em momento posterior, inclusive por substituição, também como está no dispositivo antecedente. Cuida-se aqui, porém, da hipótese de faltar, por qualquer motivo, o beneficiário de seguro de vida, portanto quando já também falta o segurado, impondo-se à lei deliberar sobre o destino da importância a ser por isso paga. E, nessa senda, diferentemente do Código de 1916, determina a nova lei que então metade do capital segurado seja entregue ao cônjuge não judicialmente separado do segurado e a outra metade a seus herdeiros, conforme a ordem legal de vocação hereditária (CC 1.822). a inovação, em relação ao Código revogado, está no acréscimo do cônjuge como destinatário de metade da verba do seguro, independentemente do regime de bens do casamento. Exige-se, todavia, que esse casamento, ao tempo da morte, ainda persista, portanto, afastando-se a previsão se houver dissolução da sociedade conjugal por separação judicial.

Omite-se, contudo, o artigo em pauta sobre a situação do separado de fato. Veja-se que tal não se deu nem mesmo quando se tratou da situação hereditária do cônjuge, cuja vocação sucessória se condicionou à não ocorrência, ao instante da morte, inclusive de separação de fato, há mais de dois anos, a não ser que sem culpa do sobrevivente. Da mesma forma, no CC 1.642, V, quando se regrou a reivindicação de bem comum doado por cônjuge casado a seu concubino, ressalvou-se a separação de fato já existente, porém, há mais de cinco anos. Pois também na hipótese do dispositivo em discussão, ao que se entende, deve-se ressalvar a separação de fato. Observe-se que a instituição, por lei, de beneficiários subsidiários, atende a um imperativo de solidariedade familiar. É por isso que, além dos herdeiros, hoje o cônjuge é elencado coo tal. Mas, se havida, comprovadamente, separação de fato, rompido está o laço de afetividade que constitui, atualmente, o conteúdo material do casamento. Não por outro motivo é que se permitiu, depois de dois anos dessa separação, o divórcio direto. Não se vê sentido, destarte, em destinar metade do capital segurado a quem, no instante da morte, já estava separado de fato do segurado, mesmo que então já lhe fosse dado estabelecer, como beneficiário, eventual companheiro (CC 793).

Aliás, outra omissão do preceito, que não há, por exemplo, na lei previdenciária (Lei n. 8.213/91) e na lei fiscal (Lei n. 9.250/95), está justamente na indicação do companheiro como beneficiário subsidiário, da mesma forma que como tal se institui o cônjuge, do ponto de vista material, havendo igual família no casamento e na união estável, que, afinal, pode ser provada, embora não da mesma maneira apriorística do casamento, porquanto com a apresentação da certidão do respectivo assento. Contudo, note-se que a lei também inclui o companheiro, malgrado em diferentes condições – o que é objeto de proposta de alteração (ver Projeto de Lei n. 276/2007) -, no rol dos sucessores do morto. Por isso, e mesmo que possa haver sua instituição por ato de vontade do segurado (CC 793), entende-se, por interpretação extensiva, dever-se considerar o companheiro, provada a união estável, com todos seus elementos de configuração, ao momento da morte, beneficiário subsidiário do segurado morte, portanto nas mesmas condições do cônjuge não separado.

A outra metade do capital segurado, como explicita a lei, vai aos herdeiros do segurado falecido, na ordem da respectiva vocação hereditária. Não havendo cônjuge, companheiro nem herdeiros, em geral, receberá o capital segurado quem comprovar que dependia do segurado e que, assim, com sua morte, ficou privado dos meios necessários à subsistência. Considera-se não se deva dar a essa previsão, também nova, contida no parágrafo do artigo em pauta, interpretação restritiva, exigindo, por exemplo, que o beneficiário seja parente do segurado, bastando que comprove dele depender para sua subsistência. Pense-se no caso de alguém cujas necessidades o segurado voluntariamente provia, mesmo sem dever legal. De seu turno, José Augusto Delgado (Comentários ao novo Código Civil, coord. Sálvio Teixeira de Figueiredo. Rio de Janeiro, forense, 2004, v. XI, t. I, p. 741) exemplifica com os menores não parentes, os incapacitados, os serviçais de idade avançada, enfermeiros e assim por diante – sempre, porém, provado que o sinistro lhes tenha retirado os meios de subsistência.  (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 820-821 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Há um histórico antecedendo a Doutrina de Ricardo Fiuza: A redação atual é a mesma do projeto. O CC/2002, a rigor, desmembrou o vetusto art. 1.473 do CC de 1916, em dois novos artigos, quais sejam os CC 791 e CC 792. A redação deste último dispositivo identifica-se, parcialmente, com a do art. W do Decreto-Lei n. 5.384, de 8-4-1943, que dispõe sobre os beneficiários do seguro de vida, assim transcrito, in litteris: “Art. I- Na falta de beneficiário nomeado, o seguro de vida será pago metade à mulher e metade aos herdeiros do segurado. Parágrafo único. Na falta das pessoas acima indicadas, serão beneficiários, os que dentro de seis meses reclamarem o pagamento do seguro e provarem que a morte do segurado os privou de meios para proverem sua subsistência. Fora desses casos, será beneficiária a União”.

Aplicando a Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, em se tratando de seguro de vida, é certo que a livre escolha dos beneficiários constitui, por sua própria natureza, preceito basilar dessa espécie de seguro. Por isso, diz-se que o segurado pode, legitimamente, preterir os próprios parentes, em favor de estranhos. É lícito, porém, ao segurado não indicar, desde logo, o nome do beneficiário, ou, fazendo-o, por alguma razão, não prevalecer tal nomeação; nessas duas hipóteses negativas, a lei determina seja o montante segurado pago, pela metade, ao cônjuge não separado judicialmente, revertendo-se a outra metade aos herdeiros do segurado, obedecida, obviamente, a ordem da vocação hereditária.

O novel dispositivo privilegia o chamado “beneficiário subsidiário”, quando, na ausência de individuação do beneficiário, coloca o cônjuge, desde que não separado judicialmente, em posição favorável quanto aos demais herdeiros do segurado, à medida que lhe garante, separadamente, o seu respectivo quinhão (1/2 do capital segurado), deixando os demais herdeiros, considerados num todo, com a outra metade do montante.

Estando o cônjuge falecido, ou separado judicialmente do segurado, aliado à ausência de qualquer herdeiro deste último, beneficiar-se-ão aqueles que necessitassem do segurado para sua própria subsistência, desde que provem, efetivamente, tal dependência econômica, como condição sine qua non para receber o seguro. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 417 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a indicação do beneficiário não é obrigatória. Se o estipulante não indicar beneficiário, a lei presume que o seguro foi contratado em favor do cônjuge e dos demais herdeiros do segurado. Cabe a analogia com o cônjuge em favor do companheiro.

O dispositivo manda que seja obedecida a ordem de sucessão hereditária. Assim, a existência de descendentes exclui os ascendentes e os colaterais até o 4º grau somente se beneficiam na falta daqueles. A referencia à ordem de vocação hereditária atrais, embora a lei não seja expressa, a observância da proporção a que faz jus os herdeiros beneficiários. Assim, o cônjuge, além de receber a metade do benefício, fará jus, ainda, a uma parte equivalente ao que lhe permitir o direito de concorrer na herança, se incidente. Do mesmo modo, casos netos participem da herança representação, farão jus apenas à parte do herdeiro pré-morto que representarem.

Finalmente, se não houver indicação de beneficiários nem herdeiros, o Código permite que terceiros que ficaram privados do necessário para a sua subsistência em razão da morte do segurado possam reivindicar a indenização. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 13.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 Art. 793. É válida a instituição do companheiro como beneficiário, se ao tempo do contrato o segurado era separado judicialmente, ou já se encontrava separado de fato.

Como leciona Claudio Luiz Bueno de Godoy, no Código Civil de 1916, dispunha-se, no art. 1.474, ser vedada a instituição de beneficiário que estivesse inibido de receber, por doação, do segurado. Era o caso, muito especialmente, da doação feita pelo cônjuge casado a seu concubino, regra que se continha no art. 1.177 do Código anterior e que se repete no CC 550 atual. No artigo em pauta, a rigor, implicitamente contempla-se a mesma proibição, mas com a ressalva que em seu texto se expressa. Na verdade, até o artigo diz mais do que precisava, pois o atual Código foi claro ao diferenciar, nos CC 1723 e 1.727, o companheiro do concubino. Para a nova lei, o companheiro mantém união estável, o antigo concubinato puro, destarte envolvente de pessoas sem impedimento para se casar, incluindo, no entanto, o separado de fato (CC 1.723, § 1º), que, certamente, com o divórcio direto, poderá vir a se casar, de resto já com a separação de fato rompendo-se o laço fundamental do casamento, a relação de afetividade que é seu conteúdo material. Quer-se dizer, então, que, se se trata de companheiro, necessariamente será pessoa solteira, divorciada, separada judicialmente ou mesmo de fato. E o companheiro não só não está inibido de receber doação, como, mais, pode ser instituído beneficiário do seguro de vida do segurado com quem mantém união estável.

Já se o segurado, ao tempo da instituição, era casado, não separado judicialmente nem de fato, para preservar tal relação, proíbe-se a instituição como beneficiário do seguro de quem então será considerado seu concubino (CC 1.727). Ressalva-se, contudo, a posição externada na obra de Caio Mário da Silva Pereira, atualizada por Régis Fichtner (Instituições de direito civil, 11. ed. Rio de Janeiro, forense, 2004, v. III, p. 465), de que, a rigor, a verificação sobre a situação civil do segurado deve ser contemporânea não ao contrato, mas ao instante da morte; assim, se no momento do falecimento o beneficiário se encontrava separado de fato ou judicialmente, terá sido como que convalidada a instituição. Se esta não é a ilação literal da redação do dispositivo, parece razoável ao menos que, a exemplo do que consta do CC 550 atual e como já se defendia à luz do art. 1.474 do Código anterior (v.g., J.M. Carvalho Santos. Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1951, v. XIX, p. 407), se restrinja ao cônjuge, ou a seus herdeiros necessários, a legitimidade exclusiva para questionar o seguro feito ao concubino, à simetria, veja-se, com aquela regra do CC 550. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 822 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em sua doutrina, explica Ricardo Fiuza que, no Código Civil de 1916 não se admitia que o beneficiado pelo seguro de vida fosse pessoa a quem o segurado não pudesse ofertar a sua liberalidade (v.g., concubina do segurado casado), tampouco seria lícito, segundo escólio jurisprudencial, o segurado indicar como beneficiário do seguro o filho adulterino, ao argumento de que, presumidamente, este transferiria o beneficia à sua mãe (arts. 1.474 e 1.177). conferir: RI’ 422/335.

Com o advento da Carta Magna de 1988, denominada pelo saudoso Ulysses Guimarães, “Constituição Cidadã’, é evidente que tais restrições ruíram por terra, em homenagem aos princípios constitucionais nela albergados. Como ressabido, foi no campo do Direito de Família que a Constituição Federal, havendo incursionado com maior profundidade, veio de reclamar do codificar civil uma nova regulamentação, operando-se, de fato, as novas regras, com destaque marcante, no efeito da presente análise, para a seguinte linha inovativa: a família passou a ser reconhecida e protegida, independentemente do casamento (CC 226, caput e § 32), muito embora a entidade familiar, oriunda de união estável, não alcance a qualificação jurídica inerente àquela relação.

Realmente, a partir da Constituição de 1988, o modo da constituição familiar não se tornou exclusivo da união originária do casamento, sendo, igualmente, modelos de família a união estável entre o homem e a mulher, admitida, em toda a sua inteireza, como entidade familiar, e a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes (CC 226, §§ 32 e 42). Por tais razões, a norma confere atualidade constitucional à matéria ora tratada. Dessarte, reconhece-se a união estável como condição de assegurar ao companheiro o direito ao benefício, desde que respeitados os requisitos exigidos no caput. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 418 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na toada de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o Código Civil de 2002 resulta do Anteprojeto preparado pela Comissão Reale em 1969. Embora tenha havido a adaptação do projeto de modo a adaptá-lo à Constituição de 1988, muitos de seus dispositivos deixam transparecer noções incompatíveis com o direito atual.

O dispositivo estabelece a validade da instituição do companheiro como beneficiário. Contemporaneamente, tal faculdade legal é redundante, uma vez que a união estável goza de proteção estatal. Mais do que poder ser indicado como beneficiário, ao companheiro deve-se dar tratamento análogo ao que é dado pele ao cônjuge em matéria de seguro, inclusive a presunção de que seja beneficiário se nenhum tiver sido indicado.

A condição de ser o companheiro separado judicialmente ou separado de fato é redundante, pois predomina o entendimento, baseado no próprio Código Civil, que a união estável somente é possível uma vez que não concorra com o casamento.

Gradativamente, no entanto, tem-se reconhecido a existência de uniões paralelas. Se o impedimento é do desconhecimento do companheiro, tem-se a união estável putativa, que não impede o reconhecimento da condição de companheiro. Consequentemente, não incide a proibição do artigo. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 13.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 794. No seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito.

Lecionando, Claudio Luiz Bueno de Godoy, explicitando o conteúdo do art. 1.475 do Código Civil de 1916, que, como aponta Clóvis Beviláqua (Código Civil comentado, 4. ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1939, v. V, p. 237-8), havia sido já objeto de polêmica na tramitação do projeto, acentua o atual Código que, nos seguros de pessoa em que o sinistro seja o evento morte, real ou presumida – discutindo-se, nesse caso, se só aquela do art. 7º ou também a ausência (pela orientação positiva, veja João Marcos Brito Martins. O contrato de seguro. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2003, p. 145) -, referindo, portanto, dentre as diversas hipóteses de cobertura pessoal, (invalidez, educacional, por sobrevivência), o seguro de vida e de acidentes pessoais, no caso de falecimento do segurado, o capital estipulado não se considera herança, para todos os efeitos. Isso porque, nessas hipóteses, ocorrido o sinistro, o capital segurado pertence a um beneficiário que é necessariamente um terceiro. ou seja, segurado e beneficiário, nesses casos, obviamente não podem ser uma só pessoa. E, sendo assim, tratando-se de valor pertencente ao beneficiário, não se sujeita às dívidas do segurado nem se considera herança, pois, se instituído, pelo contrato, em favor de um herdeiro necessário, por exemplo, não está submetido à colação. Não por diverso motivo a previa o art. 649, VI, do Código de Processo Civil, ser impenhorável o seguro de vida. Apenas há a se ressalvar o entendimento, que já se esposava antes do atual Código, de que pelos prêmios atrasados responde o capital segurado, mesmo no seguro de via, uma vez que, afinal, é a fonte de seu custeio ou da composição do fundo que o suporta (ver comentário ao CC 757). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 822 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo a doutrina de Fiuza, pela simples leitura desse dispositivo, percebe-se, claramente, que a verba oriunda de segura não está sujeita à execução, não podendo, ipso facto, ser dada em garantia, porque impenhorável (art. 649, IX, do CPC/1973, com correspondência no art. 833, do CPC/2015).

Noutro prumo, porém, a jurisprudência tem averbado que “é lícito estipular que a soma do seguro responda pelo pagamento dos prêmios atrasados ou empréstimos feitos pelo próprio segurado sobre a apólice” (RT, 131/725).

Além da vedação da penhora, o capital estipulado não se comunica com a herança, para os efeitos legais. Trata-se de previsão legítima e razoável, ou, porque não dizer, inteiramente lógica. Ora, a inclusão do montante, estipulado no seguro, no acervo hereditário, colocando o beneficiário, quanto a essa estipulação, em igualde de condições com os demais herdeiros, representaria um verdadeiro contrassenso. É que, se o segurado almeja privilegiar o beneficiário, com a antedita estipulação, este passaria a repousar numa situação assaz desvantajosa, à medida que concorreria com todos os herdeiros do segurado para receber o prêmio, desvirtuando, por completo, a essência da doação.

Em verdade, ocorrendo o sinistro, que, nesse caso, seria a morte do segurado, o prêmio deve reverter-se, sem dúvida, em favor do beneficiário, já que, a rigor, aquele montante jamais integrou o patrimônio do segurado para ser considerado como parte da herança por este último deixada. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 418 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No vislumbre de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a indenização consiste em direito subjetivo do beneficiário. Não compõe o patrimônio do segurado. Em razão disso, a indenização não fica sujeita a cobrir eventuais dívidas do segurado. Do mesmo modo, não compõe a herança. Sobre ela não há incidência de imposto de transmissão causa mortis, nem direitos dos herdeiros, salvo se não houver indicação de beneficiário. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 13.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 789, 790, 791-continua - DO SEGURO DE PESSOA - VARGAS, Paulo S. R.

Direito Civil Comentado - Art. 789, 790, 791 - continua
- DO SEGURO DE PESSOA - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XV – DO SEGURO DE PESSOA
 – Seção III - (art. 789 a 802) - vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 789. Nos seguros de pessoas, o capital segurado é livremente estipulado pelo proponente, que pode contratar mais de um seguro sobre o mesmo interesse, com o mesmo ou diversos seguradores.

No lecionar de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a partir deste artigo, o Código Civil de 2002 se dedica ao regramento do seguro de pessoa, tratado separadamente do seguro de dano, dada a diversidade de características de um e outro. Com efeito, data de longe a discussão sobre se ao seguro de pessoa seria aplicável o princípio indenitário, muitos recusando se possa mesmo falar em indenização, no caso de ocorrência de sinistro (ver, para histórico da doutrina a respeito, Pedro Alvim. O contrato de seguro. Rio de Janeiro, forense, 1999, p. 447-53). Tudo porque, a rigor, são inestimáveis a vida e a integridade pessoal do indivíduo, acerca do que se contrata o seguro. Quando muito, cogitar-se-ia não da reparação de um dano havido, na extensão desse prejuízo experimentado, mas da recomposição da perda de uma vantagem que a cessação (ver comentário ao CC 794 sobre casos de morte, real ou presumida) ou deterioração da vida humana representa (cf. Clóvis Beviláqua. Código Civil comentado, 4. ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1939, v. V. p. 202). De qualquer forma, mesmo aceitando que, no seguro de pessoa, a contratação se volte à garantia do indivíduo contra os riscos a sua existência ou integridade, portanto ainda um dano, decerto que o valor a ser pago diante da ocorrência do sinistro se fixa a forfait, ou seja, aprioristicamente, conforme entabulado pelas partes. Não há, este o dado relevante, a limitação ao valor do interesse segurado, porquanto inestimável, justamente pelo que se pode contratar mais de um seguro, com o mesmo ou com diferente segurador. Daí, para muitos, não se falar, no seguro de pessoa, em princípio indenitário.

Certo é que, de todo modo, o importe segurado não encontra restrição outra que não na estimação das próprias partes contratantes. Fixa-se livremente um capital, uma soma, a que corresponde o pagamento do prêmio e que será entregue tão logo comprovada a ocorrência do sinistro. Ou seja, inexiste, como no seguro de dano, qualquer necessidade de avaliação da extensão do prejuízo a ser indenizado. Paga-se o valor arbitrado pelas partes. É, enfim, o que o Código anterior já estabelecia, malgrado referindo, no art. 1.441, apenas o seguro de vida, mas que o artigo em pauta estende a qualquer seguro de pessoa, de vida ou de acidentes, tão somente ressalvando-se, no CC 802, o seguro para garantia de reembolso de despesas médico-hospitalares (seguro-saúde regrado por lei própria, como se verá adiante nos comentários ao dispositivo citado) e o seguro para garantia das despesas com luto e funeral do segurado. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 817-818 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 12/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo o histórico, a redação atual é a mesma do projeto. Trata-se de mera repetição do art. 1.441 do Código de 1916, com pequena mudança redacional. O antigo texto era o seguinte: “Art. 1.441. no caso de seguro sobre a vida, é livre às partes fixar o valor respectivo e fazer mais de um seguro, no mesmo ou em diversos valores, sem prejuízo dos antecedentes”. Essa seção, no Código Civil de 1916, era denominada “Do seguro de vida” (arts. 1.471 a 1.476): agora, no entanto, passa a ser “Do seguro de pessoa”.

Para a doutrina de Ricardo Fiuza, o capital é livremente estipulado pelo proponente, porque difere do seguro da coisa, em que pelo princípio indenitário a indenização há de corresponder a um valor certo do dano sofrido pelo segurado. Em segundo de pessoa, esse princípio não é aplicável, e sim o previdenciário, porquanto o prejuízo é abstrato, a garante é contra os riscos de morte, de perigo à sua integridade física, de quebra e comprometimento da saúde, e de acidentes dos mais variados, aos quais se acha sujeito o segurado, e, afinal, o valor da vida é inestimável, por isso, resulta possível contratar mais de um seguro sobre o mesmo interesse, com o mesmo ou mais de um segurador. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 416 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 12/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No dizer de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o contrato de seguro de danos tem como princípio impedir o enriquecimento sem causa do segurado e, por isso, seu valor é limitado pelo valor do bem segurado.

No seguro de pessoa, seja o seguro de vida ou o de danos à pessoa não é possível o estabelecimento de limite em razão do valor do bem assegurado, uma vez que nem a personalidade nem qualquer de seus atributos são passiveis de valoração econômica.

O seguro de pessoa visa a conceder uma compensação pelo dano causado à pessoa. A liberdade das partes para estabelecer o valor da indenização nesses casos é ampla. Por esse mesmo motivo, nada obsta que o proponente contrate mais de um seguro sobre o mesmo interesse. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 12.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 790. No seguro sobre a vida de outros, o proponente é obrigado a declarar, sob pena de falsidade, o seu interesse pela preservação da vida do segurado.

Parágrafo único. Até prova em contrário, presume-se o interesse, quando o segurado é cônjuge, ascendente ou descendente do proponente.

Para Claudio Luiz Bueno de Godoy, já desde o Código Civil de 1916 era possível entabular contrato de seguro sobre a vida de outrem, portanto que não a do próprio proponente. Ou seja, já se permitia fosse o seguro contratado sobre a própria vida ou sobre a vida de terceiro, apenas que, nessa última hipótese, sob pena de não valer o seguro, o proponente era obrigado a declarar seu interesse pela vida que se garantia, com a entabulação. Esse é o mesmo princípio insculpido no artigo em pauta. Sua redação foi modificada, mas não seu conteúdo. A ideia é a de viabilizar o seguro que compreenda a vida de terceiro, desde que demonstrado que quem realiza o contrato tem interesse na preservação da existência da sobrevivência daquele, cuja vida se segura. Quer dizer, é preciso ficar demonstrado que o proponente não quer ou torce pela morte do segurado. Caso contrário, estaria aberto caminho para contratações ilícitas, em que se apostasse no falecimento de outrem, a fim de que sobreviesse o pagamento de verba securitária assim especulativa.

Em diversos termos, o contratante deve justificar seu móvel à contratação, declarando concretamente por qual razão interessa-lhe, ao revés, a sobrevivência do terceiro. é o caso de fazer seguro o dependente econômico sobre a vida daquele de quem dependa, do credor a respeito da vida do devedor ou do sócio sobre a vida de outro sócio, nos exemplos de Carvalho Santos (Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1951, v. XIX, p. 397). Não se exigiu, como em outras legislações, que o terceiro consentisse na contratação, como também, ao que se entende, não se dispensou a declaração aqui examinada, acaso havido aquele consentimento. A finalidade da norma, afinal, é evitar seguros ilícitos, com risco à vida do terceiro, advindo do interesse do beneficiário na ocorrência do sinistro.

Como está no parágrafo único, presume-se haver interesse na preservação da vida do terceiro quando este for cônjuge, ascendente ou descendente de quem contrata o seguro, pretendendo-se a esse rol, com ampla razão, incluir o companheiro (Projeto de Lei n. 276/2007, já de alteração do Código Civil), o que deve prevalecer desde que, nesses casos, a relação afetiva existente leve à admissão, a priori, de que existente interesse na sobrevivência do terceiro cuja vida se garante. Mas, ressalva o atual Código, essa presunção é relativa, permitindo-se, portanto, prova em contrário. Em relação ao rol que também estava no parágrafo único do art. 1.416 do Código de 1916, não mais nele se inclui o irmão de quem contrata o seguro, destarte exigindo-se a mesma justificação do caput do dispositivo. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 819 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 12/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina de Ricardo Fiuza, quando o seguro de pessoa não compreender a do próprio segurado, mas de outrem, o proponente terá de justificar as razões legítimas e lícitas para a instituição do benefício, sejam de ordem jurídica, econômica, moral ou sentimental.

O parágrafo único do artigo, no entanto, estabelece presunção juris tantum – ou seja, relativa, por admitir prova em contrário – de existir tal interesse, se o segurado for cônjuge, ascendente ou descendente do proponente, já que a relação afetiva ou o parentesco entre eles conduz à conclusão, em geral inarredável, pelo liame existente, sobre o interesse do proponente à preservação da vida daquele(s). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 416 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 12/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Vê-se que ao pensar Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o interesse jurídico de uma pessoa pela vida de outra diz respeito a aspectos afetivos e econômicos. Desde que presentes tais aspectos, pode o estipulante contratar seguro de vida de outrem, independentemente do conhecimento e da aquiescência do segurado. A lei presume a existência de interesse por parte de ascendentes, descendentes e do cônjuge. Por analogia, deve-se presumir, igualmente, o interesse do companheiro. Outros podem demonstrar a existência de interesse, como os enteados e outras pessoas que vivam sob a dependência econômica do segurado. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 12.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 791. Se o segurado não renunciar à faculdade, ou se o seguro não tiver como causa declarada a garantia de alguma obrigação, é lícita a substituição do beneficiário, por ato entre vivos ou de última vontade.

Parágrafo único. O segurador, que não for cientificado oportunamente da substituição, desobrigar-se-á pagando o capital segurado ao antigo beneficiário.

Na pauta de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o seguro de pessoa pode ser instituído em favor de terceiro, como ocorre, então necessariamente, com o seguro de vida. O favorecido por essa contratação é aquele a quem se chama de beneficiário. Trata-se de alguém de livre escolha do segurado, não se repetindo, de forma explícita, a regra do art. 1.474 do antigo Código, que proibia a instituição em favor de quem não pudesse dele receber por doação, como, por exemplo, o concubino do segurado casado, mas porque a matéria está implícita na disposição do CC 793, adiante examinado.

O beneficiário é identificado, pelo segurado, logo no instante da contratação, ou em momento posterior. Por isso mesmo, pode, em regra, ser livremente substituído, por ato inter vivos ou causa mortis. É, a rigor, mera explicitação, para o seguro, do princípio geral contido no CC 438 deste Código comentado. Veja-se, a propósito, que ao beneficiário não há mais que uma expectativa de direito, enquanto não se dá o sinistro, causa do pagamento do capital segurado. Assim, nada impede sua substituição. Solucionando divergência que, sob a égide do Código Civil de 1916, a respeito se erigia, considerou o novo Código ser passível de renúncia essa prerrogativa, afeta ao segurado, de substituir o beneficiário. Da mesma forma, excepcionalmente poderá ser vedada a substituição do beneficiário quando a instituição em seu favor se tiver consumado para garantir alguma obrigação. Pense-se, por exemplo, no devedor que contrata seguro sobre sua vida, beneficiando seu credor, expressando ter sido esse o motivo da contratação. Não haverá nessa hipótese liberalidade pura que possa implicar a livre substituição do beneficiário, ao menos enquanto persistir a dívida. No entanto, com exceção desses casos, constitui direito potestativo do segurado o de substituir o beneficiário. Deve, porém, disso dar aviso ao segurador, sob pena de ele se desobrigar pagando ao anterior beneficiário. Típico caso de pagamento a credor aparente, situação de justificada putatividade que se atribui a conduta do segurado. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 820 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 12/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No diapasão de Ricardo Fiuza, a lei permite a substituição do beneficiário do seguro de vida, por ato unilateral de vontade do segurado, que a essa faculdade não renunciou ao clausular as condições do seguro, desde que este não tenha por origem declarada a garantia de determinada obrigação, o que se dará por ato inter vivos ou causa mortis.

O parágrafo único desse artigo, por sua vez, estabelece que, caso o segurador não seja cientificado, em tempo oportuno, da substituição, resultará liberado do vínculo obrigacional pelo ato de pagamento do capital segurado ao primitivo beneficiário, não podendo, nessa hipótese, o novo beneficiário postular que se lhe pague aquele capital. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 417 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 12/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No dizer de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, assegura-se, em regra, o direito de o estipulante substituir o beneficiário do seguro de vida.

O direito de substituir o beneficiário deixa de existir se a ele renunciar expressamente o estipulante ou se o seguro tiver como causa a garantia de alguma obrigação, como seria o caso de o seguro ter sido contratado visando a garantir a capacidade financeira do beneficiário em caso de falecimento de determinada pessoa de quem seja economicamente dependente. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 12.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 787, 788 - DO SEGURO DE DANO - VARGAS, Paulo S. R.

Direito Civil Comentado - Art. 787, 788
- DO SEGURO DE DANO - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XV – DO SEGURO DE DANO
 – Seção II - (art. 778 a 788) - vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 787. No seguro de responsabilidade civil, o segurador garante o pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro.

§ 1º. Tão logo saiba o segurado das consequências de ato seu, suscetível de lhe acarretar a responsabilidade incluída na garantia, comunicará o fato ao segurador.

§ 2º. É defeso ao segurado reconhecer sua responsabilidade ou confessar a ação, bem como transigir com o terceiro prejudicado, ou indeniza-lo diretamente, sem anuência expressa do segurador.

§ 3º. Intentada a ação contra o segurado, dará este, ciência da lide ao segurador.

§ 4º. Subsistirá a responsabilidade do segurado perante o terceiro, se o segurador for insolvente.

Sob a visão de Claudio Luiz Bueno de Godoy, no artigo presente, o CC/2002 tratou e regulamentou o que sempre se chamou de seguro de responsabilidade civil. Ou seja, o segurador assume a obrigação de garantir o pagamento de perdas e danos que o segurado acaso tenha de fazer em benefício de terceiro. portanto, contrata-se a cobertura da indenização que, eventualmente, o segurado venha a ser obrigado a compor diante de terceiro lesado.

O risco envolve, assim, não só o pagamento de danos emergentes, como também o de lucros cessantes, que, na forma do CC 402, compõem as perdas e danos. O prejuízo a ser coberto pode abranger, ainda, danos pessoais e extrapatrimoniais que a conduta do segurado provocou ao terceiro vitimado. Se, afinal, o seguro se faz contra a responsabilidade civil que pode recair sobre o segurado, forçoso, então, ao que se crê, recorrer à própria noção do instituto, contida no Código Civil. E, com efeito, a responsabilidade civil está afeta, primeiramente, a quem comete ato ilícito (CC 927, caput), compreendido como aquele praticado por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, que viole direito alheio e cause dano a outrem, ainda que exclusivamente moral (CC 186). Portanto, é em toda essa extensão, abrangendo o dano moral, que, como regra, responderá o segurador, inclusive conforme orientação hoje sumulada (v. item a seguir). Ademais, e seguindo a mesma esteira, responderá ele também pela indenização a que esteja obrigado o segurado, independentemente de ação culposa, como tal definida, genericamente, no CC 927, parágrafo único, do atual Código. Isso significa dizer que o segurador garante a responsabilidade civil do segurado, subjetiva e objetiva, como regra em toda a extensão da consequência danosa de sua conduta. Discute-se é se, por conta dessa garantia, o segurador pode ser compelido a honrar a cobertura em ação que diretamente lhe seja movida pelo terceiro-vítima, tal como, para o seguro obrigatório, se possibilitou, de maneira explícita, no CC 788, parágrafo único, adiante examinado, ou se, ao revés, incumbe ao terceiro se voltar contra o segurado causador do dano, que, pagando, recebe a verba do seguro, nos limites do contrato.

O desfavor da ação direta, costuma-se afirmar que falta legitimidade para o terceiro agir com base em contrato de que não fez parte. Ressalte-se, todavia, que, hoje, em virtude da função social do contrato, que, em uma vertente de seu conteúdo, opera verdadeira eficácia social do ajuste (ultra partes), alguém não contratante pode, conforme o caso, discutir contrato – ou com base nele – de que não foi subscritor (veja, a respeito, Cláudio Luiz Bueno de Godoy. A função social do contrato, 2. ed. São Paulo, Saraiva, 2007). Parece, porém, que, no caso, o ponto seja outro. É que, com efeito, o seguro de responsabilidade civil não é uma estipulação que se faz em favor da vítima, por isso não lhe é dado postular diretamente o benefício, como ocorre no seguro universalizado e social que é o seguro obrigatório, de que cuida o artigo seguinte. O seguro de responsabilidade é um seguro de reembolso, que pressupõe, antes, o pagamento pelo segurado ou o reconhecimento, em ação que lhe seja movida, de sua responsabilidade pelo evento danoso que vitimou terceiro, de modo a que, nessa demanda, oferte o segurado a defesa que tiver, decerto que a ele afeta e de seu conhecimento, e não do segurador. E mais, de sorte que não se submeta o terceiro à discussão de disposições contratuais que desconhece. Ou seja, os debates se estabelecem com temática própria: entre o segurado e a vítima acerca da responsabilidade pelo evento; entre o segurado e o segurador sobre a obrigação de garantia. E tanto parece ser essa a solução da lei que o Código Civil de 2002, no § 3º do artigo em discussão, de forma bastante diversa do parágrafo único do artigo seguinte, em vez de aludir a uma ação direta, menciona a ação proposta pelo terceiro contra o segurado, de que se dará ciência ao segurador.

No sentido do descabimento da ação direta, exatamente em função da redação dos §§ 1º a 4º do CC 787, vale conferir a lição do Min. José Delgado in Comentários, coord. Min. Sálvio de Figueiredo. Rio de Janeiro, forense, v. XI, t. I, p. 566-7. Ou, na mesma esteira, lembrando que o tipo do seguro em questão é de reembolso, está a lição de João Marcos Brito Martins (O contrato de seguro. Rio de Janeiro, Forense Universitária, p. 116).

Certo que, primeiramente, tese diversa, tal qual no item abaixo, de identificação da jurisprudência, se exemplifica, vem sendo sedimentada no Superior Tribunal de Justiça, admitindo a ação direta, como se de verdadeira estipulação em favor de terceiro se tratasse, à semelhança do seguro de vida, por exemplo.

Certo, de outra parte, e mesmo assim não fosse, que a jurisprudência já admitiu que, mesmo sem o pagamento pelo segurado, a vítima possa executar diretamente o denunciado, vencido na denunciação, como se ocorrida verdadeira sub-rogação a esta do crédito já julgado em favor daquele, por corolário da procedência da lide secundária.

Certo também que o CDC 101, II, permite que o fornecedor, acionado em demanda de consumo, chame ao processo seu segurador, de modo a que, afinal, possa também este, que assume a condição de litisconsorte passivo, a bem dizer tal qual se dá na denunciação da lide (CPC/1973, art. 75, I, com correspondência no CPC/2015, art. 126), ser condenado de forma solidaria, nos termos do CPC/1973, art. 80, com correspondência no CPC/2015, art. 130, a que remete o dispositivo em comento, de forma expressa.

Não se nega que, no preceito citado, de resto como nele expresso, a faculdade de chamamento seja deferida ao réu (ver Alvim, Arruda, et al. Código de Defesa do Consumidor comentado. São Paulo, RT, p. 217), mas, afinal, de modo a que, com a possibilidade de ampliação da polaridade passiva, se favoreça o consumidor (ver Código de Defesa do Consumidor comentado pelos autos do anteprojeto, Rio de Janeiro, Forense Universitária, p. 827).

De mais a mais, a parte final do mesmo inciso II do CDC 101 permite que, insolvente o fornecedor e se houver seguro, então possa o consumidor mover ação direta contra o segurador.

Por fim, vale a consideração de que a jurisprudência já admitiu a extensão desta disposição a casos, não de relação de consumo, propriamente, mas de acidentes de automóveis, ao menos para permitir a execução pela vítima diretamente contra o segurador do causador da colisão, vencido na denunciação.

Todas essas ressalvas se fazem para que, posto não se aceda à tese da genérica admissibilidade da ação direta da vítima contra o segurador, fique clara a tendência que se erige no sentido de se admitir tal iniciativa.

Na mesma esteira do previsto no CC 771, exige o § 1º do artigo presente que, tão logo saiba, dê o segurado aviso ao segurador do fato constitutivo de sua responsabilidade, garantida pelo ajuste securitário. Veja-se que nem sempre a ciência do segurado se verifica no exato instante da ocorrência do evento, como, por exemplo, no dano que sua construção possa ter causado a terceiro. sobre a significação da exigência de imediata comunicação e sobre as consequências derivadas de sua omissão, remete-se aos comentários ao CC 771, animado pelo mesmo espírito que subjaz ao artigo vertente.

No § 2º, impõe a lei a proibição de o segurado reconhecer sua responsabilidade, confessar, transigir ou ressarcir diretamente o terceiro-vítima sem expressa anuência do segurador. Tratando-se de limitação a direito do segurado, parece ser necessário interpretar restritivamente o preceito, por exemplo, excluindo-se de sua abrangência a confissão ficta ou provocada. Até pelo significado da norma, quer-se evitar que o segurador, por ato e iniciativa próprios, de alguma maneira prejudique a posição jurídica do segurador, por ato e iniciativa próprios, de alguma maneira prejudique a posição jurídica do segurador, impondo-lhe um ressarcimento acaso exagerado ou mesmo indevido. Daí exigir-se sua anuência. Mas justamente por isso é que, mais ainda, não parece razoável impor ao segurado a perda automática do direito à cobertura, como consequência da falta de obtenção de placet do segurador para a prática dos atos elencados na lei, desde eu não lhe tenha sido imposto qualquer dano. Não se crê possa ser presumido, de forma absoluta, um conluio entre segurado e terceiro para prejudicar o segurador, o que se daria com a perda automática do direito ao ressarcimento pelo simples fato da ausência de concordância. Mesmo um involuntário prejuízo não se pode admitir havido, tão só, por essa omissão, devendo-se, conforme se entende, reservar sempre a possibilidade de, apesar de não ocorrida anuência, comprovar o segurado que o ato por ele praticado em nada alterou ou afetou a cobertura que, destarte, certamente haveria de ser honrada, nos mesmos moldes. Lembre-se mesmo que ocasionalmente a transação pode até trazer benefício ao segurador, obrigado então a ressarcir valor menor do que lhe seria afeto se não houvesse o acordo.

O § 3º do artigo examinado dispõe que, ajuizada ação de ressarcimento contra o segurado, deverá ele dar ciência do fato ao segurador, sem que se diga, diferentemente do previsto no CC 456, que na forma das leis do processo. Aliás, bem por isso, sustenta o Ministro Eduardo Ribeiro (“Contrato de seguro – alguns tópicos”. In: O novo Código Civil, coord. Domingos Franciulli Netto, Gilmar Ferreira Mendes e Ives Gandra da Silva Martins Filho. São Paulo, LTr, p. 729-46) que a lei criou, no caso, uma ciência especifica, sem previsão no Código de Processo Civil, que vincula o segurador ao que se decidir na demanda em termos de responsabilidade do segurado. Isso, no entanto, afirma o mesmo autor, sem que a falta da cientificação determine qualquer perda de direito regressivo, de resto como, hoje, também se entende para a denunciação da lide (CPC/1973, 70, III – correspondência no CPC/2015, art. 125), a despeito de que dita obrigatória, mas o que alguns vem reservando, quando muito – já que mesmo nesse caso altera-se a posição da jurisprudência -, à hipótese da evicção (vide CPC/2015, art. 125). Aliás, pela tese exposta, haveria ao segurado a alternativa de cientificar o segurador da demanda indenizatória, a fim de fazê-lo vinculado ao deslinde, ou estabelecer lide regressiva secundária, com a denunciação da lide, cujo cabimento, nas hipóteses de seguro, a reforma processual cuidou de assentar, para permiti-la nos procedimentos de rito sumário (art. 280, do CPC/1973, sem correspondência no CPC/2015, com redação dada pela Lei n. 10.444/2002). Ou seja, para o autor seriam, então duas medidas diversas, quando, ao que se crê, melhor teria andado o Código Civil determinando a cientificação como providência a ser exercitada, tal qual se dispõe no CC 456, na forma dos termos das leis do processo. Ressalve-se, apenas, a todo esse respeito, que hoje é sustentável considerar esteja o segurador vinculado ao ressarcimento se o segurado foi condenado, por conta da relação de direito material de garantia entre ambos existentes, independentemente da cientificação. A discussão que se faria possível entre os dois estaria relacionada com as condições da garantia ajustada, mas não com o pagamento imposto ao segurado mercê da condenação judicial a que submetido. Quando muito, poder-se-ia cogitar de o segurador eventualmente pretender demonstrar que a conduta do segurado, mesmo no processo indenizatório, ostentou-se, por exemplo, por alguma omissão probatória, de modo a agravar importe ressarcitório, aí sim, o que a ciência tenderia a afastar. Mas isso, de toda sorte, sem excluir, ainda, a possibilidade de denunciação da lide, e cuja ausência, como já se decidia, não induz perda do direito regressivo.

Finalmente, estabelece o § 4º que a responsabilidade do segurado subsiste perante o terceiro, se o segurador for insolvente. A regra poderia levar a supor que ao terceiro fosse dado litigar diretamente contra o segurador, voltando-se contra o segurado se aquele se tornasse insolvente, o que, porém, já anteriormente se defendeu incabível. Poder-se-ia argumentar, então que, ao determinar a responsabilidade do segurado diante da insolvência do segurador, quis-se evitar o sobresseguro, que era textualmente permitido no art. 1.437 do Código de 1916, o que também não se considera seja o caso, já no mesmo dispositivo explicitando-se que a contatação de seguro contra a insolvência do segurador não implica a admitir se esteja a erigir mais de uma cobertura para o mesmo interesse (CC 782). Isso tudo se cogita dada a ociosidade do dispositivo, se interpretado, tout court, como simples reforço da responsabilidade pessoal do segurado perante quem foi por ele lesado, a despeito do seguro. Talvez reste só o elastério de que o preceito reafirma a impossibilidade de o segurado se beneficiar, diante do terceiro, da alegação de insolvência de seu garantidor, porquanto não lhe transfere a responsabilidade direta pelos danos que vier a causar (Ver José Augusto Delgado. Comentários ao novo Código Civil, coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira. Rio de Janeiro, Forense, 2004, v. XI, t. I, p. 568). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 11.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 814-815 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Vê-se com a Doutrina de Ricardo Fiuza, que esse artigo inova, ao tratar de uma modalidade especial, que é o seguro de responsabilidade civil, já existente anteriormente, porém não disciplinado pelo CC de 1916. Por tal contrato, transferem-se aos segurados as indenizações eventualmente devidas pelo segurado a terceiros, resultantes de atos ilícitos determinantes dos prejuízos por ele causados e pelos quais seria responsabilizado. Um interessante caso particular desse contrato é o chamado seguro de fidelidade funcional, cujo objeto é a reparação de prejuízo que possa vir a ser ocasionado por funcionários ou empregados que lidem com quantias em dinheiro.

O § 1º desse artigo preceitua ser obrigação do segurado comunicar de pronto ao segurador, tão logo delas tome conhecimento, as consequências de ato seu, capaz de lhe acarretar a responsabilidade objeto da garantia. Esse dever jurídico é ínsito à própria relação securitária, onde, no caso, o segurador assumiu as consequências dos atos que venham de ser cometidos pelo segurado.

O § 2º, por sua vez, estatui ser proibido ao segurado reconhecer sua responsabilidade ou confessar a ação, bem como transigir com o terceiro prejudicado, ou indenizá-lo diretamente, sem anuência expressa do segurador.

A ideia da lei objetiva inibir a frustração de eventual direito do segurador, na hipótese de atuação do segurado à sua revelia, quando já se faz, em decorrência do seguro, incabível uma negociação direta entre o segurado e o terceiro sem a anuência expressa do segurador.

O § 3º determina que, intentada a ação contra o segurado, terá este que dar ciência da lide ao segurador. Também aqui o propósito é o de impedir seja causado injusto prejuízo ao segurador que garantiu o pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro.

Finalmente, o § 4º estatui que a responsabilidade do segurado perante o terceiro subsistirá, caso seja o segurador insolvente. É por demais evidente que não poderia a celebração do seguro de responsabilidade civil dar margem à possibilidade de vir o terceiro a ficar sem ressarcimento algum pelos danos sofridos, o que teria lugar no caso de insolvência do segurador. Assim, estabelece a lei que, uma vez constatada tal situação de insolvência, subsiste a responsabilidade do segurado perante o terceiro, quando aquele for o responsável direito pelo dano causado. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 414 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 11/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na toada de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o seguro de responsabilidade civil, vulgarmente conhecido como “seguro de danos contra terceiros”, visa a garantir o segurado contra indenizações que lhe venham a ser cobradas por danos que vier a causar a terceiros.

Tendo-se em vista que essa modalidade de seguro visa a garantir o segurado contra danos que ele próprio provoca, a lei retira-lhe a possibilidade de reconhecer o direito do terceiro, de transigir ou de indeniza-lo diretamente, sem a anuência da seguradora. Uma vez que a esta incumbirá, por fim, os ônus da indenização, a ela devem ser reservadas tais faculdades.

O parágrafo 4º estabelece que a responsabilidade do segurado perante terceiro se for insolvente a seguradora. A rigor, no entanto, a responsabilidade do segurado junto ao terceiro remanesce sempre e só excepcionalmente tem jurisprudência admitido que o terceiro ajuíze ação diretamente conta a seguradora, em relação a quem não possui a rigor qualquer vínculo jurídico. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 11.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 788. Nos seguros de responsabilidade legalmente obrigatórios, a indenização por sinistro será paga pelo segurador diretamente ao terceiro prejudicado.

Parágrafo único. Demandado em ação direta pela vítima do dano, o segurador não poderá opor a exceção de contrato não cumprido pelo segurado, sem promover a citação deste para integrar o contraditório.

Na luz de Claudio Luiz Bueno de Godoy, de índole essencialmente social, mas de modo particular, já que todo ajuste securitário possui uma função previdenciária, a rigor de cunho social, porquanto de garantia de indenidade das pessoas, o seguro obrigatório encerra, em última análise, uma estipulação em favor de vítimas potenciais e indeterminadas, ressarcidas diante de sinistros em que se converteram riscos previstos em lei. assim é que, já no Decreto-lei n. 73/66, previram-se inúmeras hipóteses em que a contratação do seguro se faz obrigatória, para garantia de terceiros incertos expostos ao risco criado – por exemplo, por quem opera aeronaves comerciais, possui veículos automotores de vias terrestre, fluvial, lacustre e marítima, constrói imóveis em zonas urbanas, dentre outras hipóteses, todas consagradas no art. 20. De todos eles, é bastante comum e cotidiano o Seguro Obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT), regulamentado pelas Leis n. 6.19474 e 8.441/92, que já estabeleciam, antes do novo Código, pagamento da indenização, em valor previamente fixado, equivalente a quarenta salários-mínimos, para o caso de morte, diretamente ao prejudicado. O que, mais recentemente, se reforçou com a Lei n. 11.482/2007, malgrado uma legislação fiscal, mas que em seu art. 8º estabeleceu valores certos para a mesma indenização. É mesmo o que se extrai da própria essência dessa forma de seguro, legalmente obrigatório. Quer-se, com ele, uma cobertura objetiva e genérica a pessoas expostas a risco de dano nos casos que a lei elenca. Por isso, o prejudicado, quando se trata de seguros obrigatórios, pode mover diretamente a ação contra o segurador, sem que a este seja dado, para eximir-se do pagamento, tal qual o expressa o atual Código, alegar falta de pagamento do prêmio pelo segurado. Nada diverso, repita-se, do que, nos acidentes de automóveis, já previa o art. 7º da Lei n. 6.194/74, com redação dada pela Lei n. 8.441/92, inclusive com a possibilidade de indenização cobrada de qualquer seguradora integrante do consórcio de empresas que operam o seguro obrigatório, por vítima de acidente em que envolvido veículo não identificado, com seguro não realizado ou vencido.

É nesses termos que deve ser compreendida a parte final do artigo em pauta, não se admitindo que possa a seguradora, de forma alguma, deduzir, em sua defesa, a exceção do contrato não cumprido pelo segurado, mesmo havida a citação deste (ver Súmula n. 257 do STJ). Na verdade, o que se permite é a denunciação da lide pela seguradora, a fim de reaver, em regresso, a indenização que tiver pago. Tal a redação que se tenciona explicitar com o Projeto de Lei n. 276/2007, já de alteração do Código civil. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 817 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Seguindo a doutrina de Ricardo Fiuza, os seguros de responsabilidade civil obrigatórios são, pela natureza social de que se revestem, satisfeitos em face da simples ocorrência do dano, independentemente da apuração da culpa. Aplica-se em favor do segurado a teoria do risco, aludida no Decreto-lei n. 73/66. O caráter assistencial emprestado ao seguro obrigatório exige, por tal conduto, seja o pagamento feito pela seguradora diretamente ao interessado, terceiro prejudicado, evitando-se, destarte, que pessoas inescrupulosas dele obtenham vantagens indevidas.

O parágrafo único do artigo remete a hipótese ao disposto no CC 476. Entretanto, exige-se maior acuidade na interpretação do seu texto, em face da pretensa exceção arguível. É que feito o seguro em favor de outrem não identificado, terceiro prejudicado potencial, não teria, em verdade tal exceção o condão de afastar a seguradora pelo pagamento do prêmio, enquanto não implementada a obrigação pelo segurado. E o que o sistema de tais seguros objetiva estabelecer: o princípio da universalidade, a tanto que a cobertura à vítima do dano é efetuada independentemente de o veículo ou a própria seguradora serem identificados acionando o beneficiário do seguro qualquer das empresas seguradoras integrantes do consórcio securitário (art. 72 da Lei n. 6.194) e, mais ainda, terá o terceiro prejudicado direito à indenização pelo sinistro, mesmo que não efetuado o pagamento do prêmio pelo segurado. Nesse sentido o SI! tem dirimido, com segurança “A indenização decorrente do chamado seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de vias terrestres (DPVAT), devida a pessoa vítima por veículo identificado que esteja com a apólice de referido seguro vencida, pode ser cobrada de qualquer seguradora que opere no complexo” (STJ. 4’ T., REsp 200.838-60, rel. Mm Cesar Asfor Rocha. DJ de 2-5-2000). A jurisprudência tem sinalizado, de há muito, nessa linha: “Não pode a seguradora se recusar a pagar a indenização proveniente de seguro obrigatório alegando a falta de pagamento do prêmio pelo proprietário do veículo causador do acidente, pois a lei não faz essa exigência, e, além do mais, aquela não terá qualquer prejuízo, pois poderá ingressar cós uma ação regressiva, tudo nos termos da Lei n. 6.194, com a redação dada pela Lei n. 8.441” (RT, 743/300). Observe-se, ademais, a orientação do STJ, ao particularizar a obrigação daquele causador do dano, somente quando inexistente consórcio segurador que assuma o risco: “O dever de indenizar o prejudicado, pelo acidente causado por veículo cujo seguro estava vencido, é do proprietário deste, quando à época do evento danoso ainda não estava em vigor a norma que prevê a obrigação indenizatória do Consórcio de Seguradoras, para esses casos” (STJ, 3’, T., REsp 218.418-SP, rel. Mm Fátima Nancy Andrighi, DJ de 17-9-2001). Diante de tal sentir, afigura-se ambígua e desproposital a narração do texto do referido parágrafo, aparentando prevalecer, em tais hipóteses, a exceção do contrato ao cumprido, quando, em verdade, terá apenas a seguradora demandada o direito de regresso conta o segurado moroso. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 415 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 11/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o beneficiário dos seguros obrigatórios é sempre o terceiro prejudicado. Em razão disso, a ele deve ser paga a indenização. Por ser obrigatório o seguro, o fato de não ter sido pago o respectivo prêmio pelo segurado não exonera a seguradora de pagar ao prejudicado a indenização devida. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 11.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 784, 785, 786 - continua - DO SEGURO DE DANO - VARGAS, Paulo S. R.

Direito Civil Comentado - Art. 784, 785, 786 - continua
- DO SEGURO DE DANO - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XV – DO SEGURO DE DANO
 – Seção II - (art. 778 a 788)
 vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 784. Na se inclui na garantia o sinistro provocado por vício intrínseco da coisa segurada, não declarado pelo segurado.

Parágrafo único. Entende-se por vício intrínseco o defeito próprio da coisa, que se não encontra normalmente em outras da mesma espécie.

No ritmo de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a regra, embora com diversa redação, é a mesma do art. 1.459 do antigo Código. Por ela, quer-se excluir da cobertura securitária o sinistro havido em razão de vício intrínseco da coisa, como tal entendido aquele defeito próprio que não se encontra, de ordinário, em outras coisas da mesma espécie. Ou seja, o princípio é o de que não caiba indenização securitária de danos causados por fator que não seja externo, alheio à coisa segurada.

Sempre se entendeu, porém, desde a vigência do Código Civil de 1916, que a exclusão da cobertura somente se daria se o vício intrínseco fosse causa única do evento danoso. Assim, ao revés, deve-se, ainda hoje, considerar persistente a obrigação contratual ressarcitória se o defeito interno da coisa é apenas uma concausa do evento. O preceito é de ordem dispositiva, de modo a não impedir que o segurado declare a existência do vício e assim contrate garantia que o abranja. Nesse caso, o segurador terá amplas condições de calcular o risco coberto levando em conta a possibilidade de sinistro de acordo com o defeito interno da coisa segurada.

O problema se põe, na verdade, quando o segurado não declara o vício interno que, ademais, vem a ser a causa do evento danoso. Aí então exclui-se a cobertura, de sorte que o segurador não estará obrigado a pagar a respectiva indenização pelos danos havidos à coisa segurada. Fato, porém, é que, desde o Código anterior, reputava-se de rigor a exclusão da cobertura tão somente se o segurado houvesse maliciosamente omitido a declaração do vício intrínseco da coisa ou ao menos se dela tivesse ciência (v.g., Clóvis Beviláqua. Código civil comentado, 4.ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1939, p. 220, J. M. Carvalho Santos. Código Civil brasileiro interpretado, 5.ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1951, v. XIX, p. 369). É, de resto, a mesma regra que se consagra, hoje, no CC 766, parágrafo único, que não afasta a cobertura em casos de omissão do segurado, mas não de má-fé. Ou seja, na síntese de Carvalho Santos (op. cit., p. 369), é preciso, para a incidência da regra em pauta, que o vício intrínseco, além de constituir causa exclusiva do sinistro, seja conhecido do segurado, omisso em informa-lo, e, mais, desconhecido do segurador. É por isso que, em exemplo do mesmo autor, quando coisas sujeitas ordinariamente a incêndio se inflamam, posto que por vício interno, porquanto notória a circunstância, não se afasta a responsabilidade do segurador. Isso também se aplica a vícios de construção, causa de sinistro a atingir imóveis (idem, ibidem). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 809 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 10/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No diapasão de Ricardo Fiuza, cuida-se de causa excludente de garantia haver sido o sinistro provocado por vício intrínseco da coisa segurada. Isenta-se o segurador de qualquer responsabilidade se o risco não for o normalmente previsto e declarado. Em outras palavras, aquele risco configurado em causa externa. É que como pondera João Luiz Alves, o vício intrínseco não é objeto do contrato (Código Civil da República dos Estados Unidos do Brasil anotado, Rio de Janeiro, E. Briguiet, 1917, p. 1007). E, em regra, realmente, o segurado não responde pelos prejuízos resultantes de vício intrínseco à própria coisa segurada. No caso, porém, de o vício intrínseco ser declarado pelo segurado, tomando-se essa causa interna um dado considerável da apólice, haverá de se ter obrigado o segurador a indenizar os prejuízos advindos daquele vício, isto porque objeto de previsão expressa.

O CC/2002 estabelece, no parágrafo único do artigo, uma definição para o vício intrínseco à coisa segura, tendo-o como o defeito próprio da coisa e que não se acha, em regra, em outras da mesma espécie. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 412 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 10/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, sob pena de perda do direito à indenização, o segurado deve declarar todas as circunstâncias capazes de influenciar o valor do seguro (CC 766). Entre as informações relevantes, encontra-se o vício da coisa. Se o vício não for informado à seguradora, fica excluída a garantia pelo fato da coisa causado pelo referido vício. nada impede, obviamente, a estipulação de seguro contra sinistros provocados pelo vício da coisa que seja expressamente acobertado, nem, tampouco, contra a futura. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 10.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 785. Salvo disposição em contrário, admite-se a transferência do contrato a terceiro com a alienação ou cessão do interesse segurado.

§ 1º. Se o instrumento contratual é nominativo, a transferência só produz efeitos em relação ao segurador mediante aviso escrito assinado pelo cedente e pelo cessionário.

§ 2º. A apólice ou o bilhete à ordem só se transfere por endosso em preto, datado e assinado pelo endossante e pelo endossatário.

No pensar de Claudio Luiz Bueno de Godoy, seguindo tendência, já sedimentada, do direito obrigacional, que vê na obrigação um valor patrimonial, por isso passível de cessão, salvo se envolver relação personalíssima, previu o artigo em pauta que também o contrato de seguro pode ser cedido, estabelecendo, em regra, uma transferência que se opera com a alienação do interesse segurado. Todavia, como já observava Clóvis Beviláqua a propósito da disposição do art. 1.463 do Código de 1916 (Código Civil comentado, 4.ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1939, v. V, p. 222), a transferência, nesse caso, não é forçosa, já que é possível, a despeito da alienação, que o interesse contra o risco permaneça com o alienante, de outra parte ao adquirente sendo inútil o seguro. Daí estatuir o CC/2002, sem reiterar a parte final do parágrafo do antigo art. 1.463 – contemplativo de hipótese de automática transmissão, se não vedada pela apólice -, que, frise-se, é admissível a transferência do contrato com a alienação do interesse segurado, mas mediante requisitos que estão nos parágrafos do dispositivo.

Assim, se o seguro for nominativo, como geralmente é, ou melhor, se o instrumento do contrato indicar o segurado/beneficiário, aí então a transferência só produz efeitos perante o segurador mediante aviso escrito e assinado pelo cedente e pelo cessionário, na mesma senda, se houver apólice ou bilhete à ordem, impondo-se a transferência por endosso em preto, assinado pelo endossante e indicando-se explicitamente o endossatário. Segue-se, a esse respeito, a regra geral do CC 290 atual, acerca da cessão. Veja-se, porém, que a ciência ao cedido, no caso do segurador, não implica, em princípio – ao final feita ressalva a que se remete -, a admissão de que ele deva anuir, previamente, à cessão, o que não se exige, até por clara inferência do previsto no § 1º. Exige-se, nesse preceito, o aviso escrito, por qualquer meio, desde que comprovado o recebimento, da ocorrência da cessão, com subscrição do cedente e do cessionário, que passará a ocupar a posição contratual daquele. No entanto, nada impede, em se tratando de direito disponível, que as partes contratantes do seguro, por ajuste, pactuem a vedação da cessão. Se a apólice for ao portador, sua transferência se dá pela tradição.

Deve-se ressalvar, por fim, que a transferência do seguro não pode agravar, por si, o risco garantido pelo segurador sem sua detida cientificação e, nessa hipótese, sem sua concordância a respeito, como ocorre, por exemplo, nos seguros de coisa com perfil do segurado, tal qual no caso dos automóveis. Isso, em diversos termos, significa que na transferência do seguro deve-se o mesmo respeito à regra de boa-fé que há na contratação e que está contida no CC 766. Ou seja, ainda citando o exemplo do seguro de autos, impende, dada a influência das condições do segurado no cálculo do risco, que haja, no caso de alienação da res com transferência do contrato, pronta comunicação ao segurador, com informações que lhe permitam, se necessário, rever o valor do prêmio, ajustando-o ao risco coberto, que, agora, poderá ser diferente. Se isso não se fizer e, depois, ocorrer o sinistro, poderá o segurador se valer da exceção de agravamento do risco, desde que, evidentemente, comprovada a circunstância, não se mantendo, e uma vez que assim seja, com a alienação, as mesmas condições de tráfego, estacionamento e condução do veículo segurado. Ao revés, avisado da alienação e permanecendo a receber o mesmo prêmio, sem qualquer o posição ou ressalva, manifesta-se tácita aquiescência do segurador, que, com a ocorrência do sinistro, não poderá recusar o pagamento da indenização. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 810 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 10/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Para Ricardo Fiuza, esse artigo trata da transmissibilidade dos direitos inerentes ao contrato de seguro. Como referido pelo CC 760, a apólice e o bilhete de seguro podem ser nominativos (onde constante, nominalmente, o segurador e o segurado, bem como o seu representante ou terceiro beneficiário), à ordem (transferíveis por endosso) ou ao portador (sem a nominação do beneficiário, são transferíveis por mera tradição, não exigindo nenhuma formalização). Desse modo, a transferência do contrato a terceiro por alienação ou cessão do interesse segurado é admitida como válida, salvo existindo cláusula expressa em contrário. Entretanto, conforme leciona Sílvio Rodrigues, “a transmissão do direito à indenização não pode implicar prejuízo para o segurador, cuja situação não deve ser por ela agravada” (Direito civil: dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, 27.ed., São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3, p. 355). Os parágrafos ao dispositivo inovam a matéria, trazendo-lhe melhor disciplina para efeito da transmissão. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 413 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 10/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na toada de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo fixa que o seguro de dano é, em regra, transferível ao adquirente da coisa ou do interesse segurado. A intransferibilidade resulta de cláusula expressa.

O fato de a apólice ser nominal não impede a transferência, que se opera mediante aviso do cedente e do cessionário à seguradora.

O referido aviso é desnecessário se a transferência for admitida pela própria apólice ou bilhete de seguro, que contenha a cláusula “à ordem”. Neste caso, basta o endosso assinado pelo cedente e pelo cessionário. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 10.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 786. Paga a indenização, o segurador sub-roga-se, nos limites do valor respectivo, nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano.

§ 1º. Salvo dolo, a sub-rogação não tem lugar se o dano foi causado pelo cônjuge do segurado, seus descendentes ou ascendentes, consanguíneos ou afins.

§ 2º. É ineficaz qualquer ato do segurado que diminua ou extinga, em prejuízo do segurador, os direitos a que se refere este artigo.

A visão de Claudio Luiz Bueno de Godoy, no seguro de dano, e não no de pessoa (cf. CC 800, infra), explicita-se hoje, - já que ausente semelhante regra do Código Civil anterior, muito embora existente previsão a respeito, para o seguro marítimo, no Código Comercial (art. 728) – o direito à sub-rogação do segurador que paga a indenização ao segurado. Ou seja, paga a indenização, nos limites do valor respectivo, fica o segurador autorizado a exercer direito regressivo contra o causador do sinistro, para tanto passando a ocupar a posição jurídica do segurado, de resto tal qual na jurisprudência já se assentara (Súmula n. 188 do STF). Isso, na verdade, porque, ao quitar o valor do prejuízo havido, nos lindes do importe do contrato, a rigor o segurador está pagando dívida de terceiro, aquele causador do dano ao segurado. Põe-se cobro, destarte, à discussão, que antes havia, sobre se o segurador, assim agindo, não estaria sendo duplamente beneficiado, com o recebimento do prêmio e com o ressarcimento do seguro pago. A essa objeção Pedro Alvim (O contrato de seguro. Rio de Janeiro, forense, 1999, p. 490) já respondia ser da natureza da cobertura de sinistro provocado por terceiro a sub-rogação legal, antes prevista no art. 985, III, do Código de 1916, por encerrar-lhe real contraprestação a possibilidade de ressarcimento regressivo, junto ao causador do dano, referindo-se o prêmio pago à cobertura de riscos eventuais, independentes de ato voluntário, posto que de terceiro. de mais a mais, a não ocorrência da sub-rogação deixaria o causador do dano livre de sua responsabilidade, uma vez que nada lhe poderia exigir o segurado, afinal já ressarcido pelo segurador.

Tudo isso se supera, agora, pela previsão expressa do novo Código sobre a possibilidade de sub-rogação, nos limites do contrato, desde que, acrescenta o § 1º, o dano não tenha sido provocado pelo cônjuge, descendente, ascendente, parente consanguíneo ou afim do segurado, devendo-se acrescentar o companheiro, porque, em todos esses casos, pode-se afetar o próprio patrimônio do segurado, mas este, sim, fazendo parte do risco coberto. A ideia do parágrafo, de qualquer forma, é a de dano causado involuntariamente por que, próximo do segurado, de qualquer forma, é a de dano causado involuntariamente por que, próximo do segurado, por relação de casamento, união estável e parentesco, ostenta conduta que se coloca no âmbito do raio do risco coberto, como se o ato fosse do próprio contratante. O Código Civil ressalva, tão somente, dizendo-o então passível de ensejar sub-rogação, o ato doloso que tenha sido praticado por cônjuge ou parente, porque aí justificado o eventual alcance do patrimônio do segurado e, de toda forma, dimanando o dano de ato voluntário praticado por pessoa a ele ligada, igualmente como se excluiria a indenização se dele provinda conduta dolosa.

Finda o dispositivo legal por estabelecer a ineficácia de qualquer ato praticado pelo segurado eu sirva a diminuir ou extinguir, em prejuízo do segurador, o direito à sub-rogação, de que ora se trata. Veja-se que a regra quer assegurar, em última análise, a integralidade do direito regressivo do segurador, resguardando-o contra ato que venha a ser praticado pelo segurado. O exato elastério da norma sobreleva se for levada em conta, por exemplo, a frequente ocorrência de acordos mediante os quais a esse causador do dano o segurado confere ampla quitação, em geral por ocasião do ajuste sobre o pagamento da franquia. Pois sempre se entendeu que, isso sucedido, não haveria crédito em que se pudesse sub-rogar o segurador, extinto pela quitação outorgada. Ou, em diversos termos, não se haveria de cogitar pudesse o segurador, sub-rogando-se na posição jurídica do segurado, exercer uma ação que a este não mais caberia. Nessa senda sobrevém, agora, a determinação legal de que qualquer ato dessa espécie seja ineficaz perante o segurador, que, portanto, não estará impedido de exercer, de toda maneira, seu direito regressivo contra o terceiro causador do dano.

Entretanto, resta indagar: Será assim, ainda que o terceiro desconheça a existência do seguro, acordando com o segurado na justa expectativa de que esteja a quitar completamente os danos que com sua conduta provocou? E se o terceiro sabia ou deveria saber que, por exemplo, estava a acordar somente o pagamento de franquia? Parece ser necessário fazer ressalva nesses casos, corolário da tutela da confiança, cabendo ao segurador voltar-se contra seu segurado, afinal com quem contratou e a quem exclusivamente atribuível a conduta de diminuição ou mesmo impedimento de exercício do direito regressivo, frise-se, sempre que no terceiro se possa reconhecer, conforme as circunstâncias do caso, a justa expectativa de que o acordo se referisse aos efeitos completos do sinistro provocado.

Vale anotar, por último, e a despeito da discussão que, a propósito, desde o Código anterior se levantava, o entendimento, que se esposa, de que o prazo prescricional para exercício do direito regressivo é o comum, reservada a hipótese do CC 206, § 1º, II, para as lides diretamente envolventes do segurado e do segurador, de resto como no preceito expresso. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 812 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 10/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na pauta de Ricardo Fiuza, interessante observar o texto original do dispositivo tal como for proposto pela Câmara: “Art. 786. Paga a indenização (na redação original do anteprojeto falava-se ‘Pagando a indenização’), o segurador se sub-roga integralmente nos direitos e ações que ao segurado competirem contra o autor do dano, sendo ineficaz qualquer ato do segurado que diminua ou extinga tais direitos em prejuízo do segurador Parágrafo único. Salvo dolo, a sub-rogação não tem lugar se o dano foi causado pelo cônjuge do segurado, seus descendentes ou ascendentes, consanguíneos ou afins”. Esse texto foi modificado por emenda da lavra do Senador Gabriel Hermes. Não há artigo correspondente no Código de 1916.

Para a doutrina, a fórmula de garantir a sub-rogação “nos limites da indenização paga” é mais precisa. Como assevera em sua justificativa o iminente senador, nem sempre o seguro cobre integralmente o dano sofrido pelo segurado”, o qual “não deve, por isso, ser compelido a transferir à seguradora o crédito de que seja titular contra o responsável civil, salvo nos limites da indenização que aquela lhe tiver efetivamente pago”.

Esse artigo demonstra assente o direito do segurador de sub-rogar-se, nos limites do valor correspondente, nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o causador do dano. E um imperativo lógico: os direitos e ações que o segurado teria contra o autor do dano serão do segurador, que houve de responder pela garantia, tendo, por consequência, os meios de recuperar a quantia indenizatória que pagou ao segurado.

Por sua vez, o § 1º estabelece que, salvo no caso de dolo, a sub-rogação não ocorrerá se o dano foi causado pelo cônjuge do segurado, seus descendentes ou ascendentes, consanguíneos ou afins. E que, em situações tais, o segurador em exercício da sub-rogação afetaria o patrimônio da família do segurado, desnaturando o contrato de seguro em sua essência.

Finalmente, o § 2º ~ estatui ser ineficaz qualquer ato do segurado que diminua ou extinga, em prejuízo do segurador, os direitos a que se refere este artigo. A cogencia da norma tem o escopo de assegurar a incolumidade da sub-rogação, i.é, a integridade de seus efeitos.  (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 413 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 10/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na suavidade de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, pelo princípio da relatividade dos efeitos do contrato, o contrato de seguro não interfere, em princípio, em eventuais direitos indenizatórios que o segurado venha a adquirir contra terceiro em razão do sinistro. Este dispositivo estabelece, no entanto, a sub-rogação legal dos direitos do segurado uma vez que a seguradora o indenize. A referida sub-rogação é limitada ao valor da indenização.

A sub-rogação não ocorre se o causador do dano for cônjuge ascendente ou descendente do segurado, salvo se o dano for causado por dolo. Deve ser admitida a analogia com o cônjuge para se entender a regra ao dano causado pelo companheiro. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 10.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).