terça-feira, 21 de janeiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 740, 741, 742 - DO TRANSPORTE DE PESSOAS - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 740, 741, 742
- DO TRANSPORTE DE PESSOAS - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XIV – Do Transporte – Seção II
Do Transporte de Pessoas - (art. 734 a 742)
 vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 740. O passageiro tem direito a rescindir o contrato de transporte antes de iniciada a viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor da passagem, desde que feita a comunicação ao transportador em tempo de ser renegociada.

§ 1º. Ao passageiro é facultado desistir do transporte, mesmo depois de iniciada a viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor correspondente ao trecho não utilizado, desde que provado que outra pessoa haja sido transportada em seu lugar.

§ 2º. Não terá direito o reembolso do valor da passagem o usuário que deixar de embarcar, salvo se provado que outra pessoa foi transportada em seu lugar, caso em que lhe será restituído o valor do bilhete não utilizado.

§ 3º. Nas hipóteses previstas neste artigo, o transportador terá direito de reter até cinco por cento da importância a ser restituída ao passageiro, a título de multa compensatória.

Na balada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o dispositivo presente trata, a rigor, da desistência do passageiro, em situações diversas, mas de maneira mais abrangente do que dispõe o art. 49 do Código de Defesa do Consumidor, que apenas permite, no prazo de sete dias, arrependimento nos casos de contratação à distância e, conforme interpretação extensiva, de vendas emocionais.

Assim, reforçando-se o quanto já expendido nos comentários ao CC 732, ter-se-á, mesmo nas hipóteses em que o transporte envolva, o que não se dá sempre, de maneira necessária, uma relação de consumo, a aplicação do Código Civil, que, nesta parte, é mais afeiçoado ao comando constitucional de proteção do consumidor (CC 5º, XXXII), à ideia básica de equilíbrio e solidarismo nas relações entre as pessoas, também emanada da Constituição (art. 3º, I­).

Nesta senda, permite o Código Civil de 2002 que o passageiro rescinda – na verdade, tecnicamente um caso de resilição unilateral, porque de verdadeira desistência ou arrependimento (CC 473) – o contrato de transporte, por sua vontade, com consequências diversas conforme a existência de prévia comunicação e o tempo de sua manifestação. Em diversos termos, o artigo em comento cuida da desistência, com consequências diferentes, nas seguintes situações: a) antes de iniciada a viagem, com direito do passageiro à restituição do valor do trecho faltante, mas só se demonstrado que, efetivamente, outra pessoa foi transportada em seu lugar; b) quando já iniciada a viagem, com direito do passageiro à restituição do valor do trecho faltante, mas só se demonstrado que, efetivamente, outra pessoa foi transportada em seu lugar; c) mesmo antes de iniciada a viagem, mas sem comunicação prévia da desistência, com direito à restituição do valor da passagem apenas quando igualmente se comprovar que outra pessoa foi transportada no lugar do desistente.

Nesses casos em que o transportador deve devolver o valor do bilhete, fará jus, como está na lei, à multa de até 5% da importância da restituição. Trata-se de cláusula penal compensatória, pelo que, por um lado, não há antinomia real com o CDC 52, § 1º, que estabelece uma cláusula penal moratória. De outro tanto, não se compreende, se se estatui cláusula penal, por natureza convencional, haver uma estipulação legal, que independa de prévio ato de manifestação de vontade, tanto mais se a lei alude a uma multa de até 5%, portanto o que deverá ser previamente pactuado, aí sim, observado o teto da legislação.

Pelo seu silêncio a respeito, bem como pelo que se poderia inferir da interpretação a contrario sensu do artigo, nos casos de o passageiro, antes da viagem, desistir sem comunicar a tempo de haver substituição, ou de desistir durante o percurso sem provar sua substituição no trecho faltante, ser-lhe-ia imposta a total perda do valor do bilhete. Aliás, o Código Civil foi explícito em caso de desistência sem aviso prévio e sem prova de que houve substituição (§ 2º).

Bem de ver, todavia, que tal orientação não só conflita com o princípio traduzido pela previsão do CDC 53, que pretende vedar a perda total de valores pagos quando inadimplente o consumidor, como, antes, parece não se ajustar aos valores mencionados anteriormente, de equilíbrio e solidarismo nas relações jurídicas, dispostos na Constituição Federal, de que inclusive há exemplos múltiplos no CC/2002, até mesmo quando possibilita a redução, veja-se, de cláusulas penais que o juiz repute excessivas (CC 413). Trata-se de imperativo de equidade que, segundo se entende, determina uma interpretação sistemática, e à luz da Constituição, do artigo vertente, portanto muito além de seu sentido literal.

Por isso se poderá reputar abusiva a perda completa do valor pago, acrescentando-se que a abusividade não consubstancia fenômeno de exclusiva repressão na legislação consumerista, na exata medida em que, como se disse, afronta a ideia, diretamente dimanada da Constituição Federal (art. 3º, I), de equilíbrio nas relações jurídicas, posto se a pondere de forma adequada à eventual formação de vínculo entre iguais. De toda sorte, caberá ao juiz, nessas hipóteses, estimar a extensão da perda do valor da passagem, conforme o prejuízo que possa o passageiro ter causado, mas por qualquer de suas modalidades, por qualquer forma de manifestação. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 763-764 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 21/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo a doutrina apontado por Ricardo Fiuza, a rescisão unilateral do contrato de transporte tem de ser tempestiva. O passageiro pode desistir da viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor da passagem. Mas terá de comunicar o transportador em tempo de ser renegociada a passagem.

Mesmo depois de iniciada a viagem, no meio do percurso, portanto, o passageiro pode desistir do transporte, tendo direito à restituição do valor da passagem correspondente ao trecho não utilizado, desde que fique provado que, em seu lugar, outra pessoa foi transportada no percurso faltante.

O usuário que deixou de embarcar, que não se apresentou na hora determinada para a partida, que, intempestivamente tenha desistido da viagem, não terá direito ao reembolso do valor da passagem, a não ser que prove que outra pessoa foi transportada em sua vaga, e, aí, ser-lhe-á devolvido o valor do bilhete que não utilizou.

Em qualquer dos casos previstos neste artigo, a título de multa compensatória, o transportador terá direito de reter até cinco por cento da importância a ser restituída ao passageiro. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 391 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entendimento de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo dá ao passageiro o direito excepcionalíssimo de rescindir o contrato de transporte antes de iniciada a viagem. Uma vez que o referido direito seja exercido a tempo de o transportador renegociar a passagem, faz jus o passageiro ao reembolso do preço pago, podendo lhe ser descontado o equivalente a 5% do preço a título de multa compensatória.

A desistência da viagem após se ter percorrido determinado trecho dá ao passageiro o direito de obter o reembolso do preço proporcional ao trecho por percorrer, desde que o passageiro prove que outra pessoa foi transportada em seu lugar. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 21.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 741. Interrompendo-se a viagem por qualquer motivo alheio à vontade do transportador, ainda que em consequência de evento imprevisível, fica ele obrigado a concluir o transporte contratado em outro veículo da mesma categoria, ou, com a anuência do passageiro, por modalidade diferente, à sua custa, correndo também por sua conta as despesas de estada e alimentação do usuário, durante a espera de novo transporte.

Sob o prisma de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a regra do artigo presente revela com clareza o risco que o legislador entendeu inerente à atividade de transporte; por isso, impôs-se ao transportador uma responsabilidade independente de culpa e a obrigação, nessa esteira, de concluir viagem iniciada e que se tenha interrompido mesmo que por evento fortuito u de força maior. Em outros termos, e porque lhe é afeta uma obrigação de resultado, caso o transporte se tenha iniciado, é dever do transportador conclui-lo, sempre, mesmo se houver interrupção por fato alheio, que não lhe seja atribuível.

Além disso, impende fazê-lo, à sua custa, nos mesmos moldes do transporte contratado, ou seja, por veículo da mesma categoria, como a lei determina, só se admitindo meio diverso se houver o pacet do passageiro. Até que se implemente o novo transporte para conclusão da viagem, ocasionais despesas com hospedagem e alimentação correm também por conta do transportador. José Maria Trepat Cases (Código Civil comentado, coord. Álvaro Vilaça Azevedo. São Paulo, Atlas, 2003, v. VIII, p. 174-5),  com base inclusive em aresto do STJ, lembra que, em virtude da regra em comento, a qual impõe a responsabilidade dos transportadores pela conclusão da viagem iniciada e interrompida, mesmo pelo casus, é dever de todos eles aceitar o passageiro de outro para dar cabo da exigência legal em comento, sob pena de cumprir perdas e danos. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 764 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 21/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Para Fiuza, em qualquer hipótese, ainda que por caso fortuito, se a viagem for interrompida, o transportador fica obrigado a concluir o transporte contratado em outro veículo da mesma categoria, ou, se o passageiro concordar por modalidade diferente, à sua custa. Durante a espera do novo transporte, correm por conta do transportador as despesas de estada e alimentação do usuário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 391 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Sob o prisma de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o transportador tem o dever de resultado de levar o passageiro e sua bagagem em segurança até o destino acertado. Ele não se desobriga nem mesmo diante da ocorrência de fortuito externo que interrompa a viagem. O CDC 84 (Lei n. 8.078/90) dá ao consumidor o direito de exigir o cumprimento específico da obrigação pelo fornecedor. Caso o transportador não proceda no sentido de reduzir os prejuízos sofridos pelos passageiros, ainda que em razão de fortuito externo, violará seu dever legal e ficará obrigado a indenizar os passageiros pelos danos morais e materiais que sua falta acarretar. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 21.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 742. O transportador, uma vez executado o transporte, tem direito de retenção sobre a bagagem de passageiro e outros objetos pessoais deste, para garantir-se do pagamento do valor da passagem que não tiver sido feito no início ou durante o percurso.

Na toada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, bem de ver, antes de mais nada, que legislação especial, particularmente acerca do transporte de cargas, já conferia ao transportador o direito de reter coisas transportadas como garantia do pagamento do frete. Assim, o próprio Código Comercial, nos arts. 116 e 117, malgrado referindo a uma não mais existente hipoteca tácita, que foi substituída pela noção de direito de retenção (v.g., Martins, Fran. Contratos e obrigações comerciais, 7. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1984, p. 261), dispunha que o transportador podia reter a mercadoria para vendê-la e, com o respectivo produto, ver seu crédito pago. Da mesma forma o vetusto Decreto n. 19.472/30, alterado pelo Decreto n. 19.754/31, previa igual direito ao transportador, de retenção das coisas transportadas.

Trata-se mesmo de uma medida inspirada na equidade, de sorte a equilibrar a relação contratual, permitindo ao transportador que retenha consigo coisa transportada ou bagagem e objetos de passageiros, até ser pago o valor ajustado pelo respectivo transporte. É o que o Código Civil explicita para o transporte de pessoas, à semelhança da retenção que faculta ao hoteleiro, para garantia do pagamento do valor da hospedagem, mas sem erigir um penhor legal, tal qual procede no CC 1.467, I.

A distinção é relevante porquanto, na retenção que se faz para tornar o penhor legal efetivo, há a necessidade de posterior ato judicial homologatório (homologação de penhor legal), o que não ocorre com o direito de retenção, exercitado extrajudicialmente, eis que não é necessária qualquer formalidade homologatória posterior (ver a respeito: Fonseca, Arnoldo Medeiros da. Direito de retenção, 2. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1944, p. 287).

Porém, tanto quanto no penhor legal que tem o hospedeiro sobre a bagagem do hóspede, ou mesmo o do fornecedor de alimento sobre bens do freguês, a ideia do legislador foi garantir de forma especial o pagamento à consideração de que geralmente é desconhecido o usuário do serviço.

O transportador que retém a bagagem ou outros objetos pessoais que estiverem com o passageiro por ocasião do transporte passa a ter sobre a res o dever de custódia, empregando na guarda e conservação a diligência que o exigir a natureza da coisa, aqui, de novo, à semelhança do que se dá com o credor pignoratício (CC 1.435, I). Tem, em contrapartida, porquanto possuidor da coisa, o direito básico de defender essa posse, pela utilização dos interditos, e de ser ressarcido pelas despesas de conservação ou prejuízos decorrentes de ignorados vícios da res. A todo este propósito vale conferir, ainda uma vez, Arnoldo Medeiros da Fonseca (op. cit., p. 267-76).

Veja-se, por fim, que o Código Civil concede ao transportador o direito de retenção apenas para garantia do valor da passagem e não de eventuais danos que o passageiro tenha provocado.  (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 765 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 21/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina de Ricardo Fiuza, no caso de o viajante não ter pago a passagem no início ou durante o percurso, terá de fazê-lo ao final, uma vez executado ou concluído o transporte. Não o fazendo, o transportador tem direito de retenção dobre a bagagem e outros objetos pessoais do passageiro, para garantir-se do pagamento do valor da passagem. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 392 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Concluindo com Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo estabelece o direito de retenção da bagagem do passageiro em favor do transportador para o pagamento da passagem. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 21.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 737, 738, 739 - continua - DO TRANSPORTE DE PESSOAS - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 737, 738, 739 - continua
- DO TRANSPORTE DE PESSOAS - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XIV – Do Transporte – Seção II
Do Transporte de Pessoas - (art. 734 a 742)
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Art. 737. O transportador está sujeito aos horários e itinerários previstos, sob pena de responder por perdas e danos, salvo motivo de força maior.

No compasso de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a regra em comento nada mais significa senão a obrigação que tem o transportador de cumprir sua prestação, tal como convencionada. Ou seja, incumbe-lhe atender, no deslocamento que propicia ao passageiro, o exato horário previamente estabelecido e, também, o itinerário antecipadamente informado. Isso implica, ao revés, em que, havido atraso ou alteração de trajeto, responde o transportador pelos prejuízos decorrentes, ressalva a prova de que ocorrida força maior.

Veja-se, quanto ao atraso, e conforme já acentuado nos comentários ao CC 732, a qe ora se remete, que, já não fosse a força revogadora da superveniência do Código de Defesa do consumidor, lei posterior subjetivamente especial, a previsão dos arts. 230 e 231 do Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei n. 7.565/86) acerca do transporte nacional efetuado pelo meio aéreo, ao fixar limite mínimo para que o atraso de voo pudesse ensejar indenização, ostenta-se visivelmente incompatível com a disposição do CC 737, ora em comento.

É bom não olvidar que, no CC 732, o atual Código estabeleceu a primazia de seus preceitos em relação a dispositivos da lei especial que com ele se mostrassem, como no caso, incompatíveis. Na melhor das hipóteses, também como já se disse nos comentários do CC 732, o limite mínimo de quatro horas de atraso, determinado no Código de Aeronáutica, apenas pode ser admitido, em interpretação sistemática e harmonizadora como Código Civil de 2002, se compreendido como uma hipótese em que a indenização se paga de forma automática, só pelo fato do retardo, sem qualquer excludente, porém com possibilidade de tarifação ou limitação do quantum indenizatório. Mas sempre sem prejuízo de se poder provar dano maior, evidente que com o ônus a tanto atinente, assim correndo-se o risco de nada se conseguir provar.

O atraso pode provocar danos materiais e, muito frequentemente, pode provocar também danos morais. A essa verificação importará a aferição das circunstâncias do caso concreto, a extensão e condições do atraso e do passageiro durante sua permanência, valendo diferenciar, a propósito, o que seja mero e pequeno incômodo, contingência própria da vida de relações, do que signifique verdadeiro abalo psíquico, frustração grave de justa expectativa do contratante, real afronta a direito da personalidade.

Da mesma forma, a mudança do itinerário pode, conforme a hipótese fática, induzir dano ao passageiro, material e/ou moral, de possível cumulação, valendo não olvidar o padrão de transparência que a boa-fé objetiva impõe nas relações contratuais, particularmente caracterizadas pela adesão, como via de regra se dá nos transportes, assim sobressaindo a necessidade de detida informação sobre as condições do deslocamento, aí incluindo-se o itinerário a ser percorrido, até para possibilitar a mais livre escolha do passageiro diante das opções que existem para o deslocamento pretendido.

Ocorrência lamentavelmente comum que se tem dado, sobretudo no transporte aéreo, é o chamado overbooking, resultado da venda de bilhetes em número superior ao de assentos, como forma de prevenção contra desistências, que, se não sucedem, levam à necessidade de recolocação de alguns passageiros em voos não raro com horários e percursos diversos, por exemplo, com conexões que a contratação original não envolvia. Evidente que o caso é de indenização pelos prejuízos causados, não excluída ou afastada pela ocasional autorização administrativa dos órgãos reguladores.

A responsabilidade pelos danos decorrentes de atraso e mudança de itinerário, de acordo com a lei, somente se elide pela ocorrência de força maior. A respeito das excludentes no contrato de transporte, remete-se ao exame já detidamente efetuado nos comentários ao CC 734 e 735, apenas reiterando, quanto à força maior e caso fortuito, conforme já acentuado no comentário ao CC 734, que eles devem ser externos para afastar a responsabilidade objetiva do transportador, e que isso não ocorre quando se trata de defeitos mecânicos do veículo de transporte. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 760 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 20/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Enquanto que para Fiuza o transportador tem de cumprir os itinerários e obedecer aos horários previstos no contrato ou regulamentos é, salvo motivo de força maior, responder pelos danos que decorrerem de atrasos ou mudanças de percurso. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 390 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a jurisprudência divide-se quanto à necessidade prova de danos pelo consumidor quando há descumprimento de horário pelo transportador. Admite-se que o dano moral é damnun in re ipsa, pois sua configuração não depende de prova exaustiva; pode ser presumida a partir de certas condutas). Nesse sentido: REsp n. 659.760-MG, Rel. Min. Aldir Passarinho Jr., j. 4.04.2006.

O simples atraso no voo, de per si, já caracteriza a prestação de serviço como inadequada, posto que o contrato de transporte é de resultado, sendo irrelevante a demonstração dos danos suportados pelos passageiros em razão de seus próprios interesses, origina-se a responsabilidade civil da companhia aérea em indenizar o incômodo causado ao seu passageiro. A obrigação de indenizar das companhias aéreas é objetiva, pois se trata de companhia concessionária de serviço público de transporte aéreo (§ 6º, art. 37, CF), tanto no que tange aos danos patrimoniais, quanto aos danos morais (...). Apelação parcialmente provida. Decisão: Conhecer. Dar parcial provimento. Unânime” (Apelação Cível, n. 2000015000380apc/DF, 3ª Turma Cível do TJDFT, Rel. Campos Amaral, j. 10.04.2000, p. DJU 17.05.00, p. 30). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 20.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 738. A pessoa transportada deve sujeitar-se às normas estabelecidas pelo transportador, constantes no bilhete ou afixadas à vista dos usuários, abstendo-se de quaisquer atos que causem incômodo ou prejuízo aos passageiros, danifiquem o veículo, ou dificultem ou impeçam a execução normal do serviço.

Parágrafo único. Se o prejuízo sofrido pela pessoa transportada for atribuível à transgressão de normas e instruções regulamentares, o juiz reduzirá equitativamente a indenização, na medida em que a vítima houver concorrido para a ocorrência do dano.

Na esteira de Claudio Luiz Bueno de Godoy, por sua natureza bilateral, o contrato de transporte, uma vez aperfeiçoado, enseja obrigações a ambas as partes. Pois, das obrigações básicas do passageiro, a par do pagamento do preço do bilhete, cuida o artigo em comento. Conforme seus termos, o passageiro é obrigado, durante o transporte, a atender as instruções legais, administrativas e regulamentares que visam a garantir a segurança do deslocamento e a tranquilidade dos demais passageiros. Assim, deve-se abster o passageiro da prática de qualquer ato que, como genericamente está na lei, dificulte ou impeça o normal deslocamento, a regular prestação do serviço de transporte. Apenas que, quanto a específicas instruções para determinada forma de transporte, devem ser objeto de regular informação ao passageiro, corolário do dever de transparência que a boa-fé objetiva exige venha a permear as relações contratuais (CC 422). Repete-se, de maneira genérica é dever do transportado não agir de modo a perturbar os outros passageiros e a prejudicar o normal transcurso do transporte.

Aliás, a propósito, vale não olvidar previsão da lei especial de regulação do transporte aéreo, compatível com o novo Código Civil e por isso com plena aplicabilidade, dispondo sobre verdadeiro poder de polícia ao comandante da aeronave (Arts. 165 e ss, da Lei. n. 7.565/86), podendo mesmo ordenar o desembarque de passageiro de qualquer forma inconveniente, porquanto infringente das obrigações mencionadas anteriormente. Aliás, a mesma prerrogativa é reconhecida por Sílvio de Salvo Venosa a qualquer preposto do transportador que seja responsável pelo deslocamento, sempre a bem da segurança do serviço, afinal um dos deveres de quem o presta (Direito civil, 3. ed. São Paulo, Atlas, 2003, v. III, p. 490).

Por fim, o parágrafo único do dispositivo em comento trata da indenização dos danos sofridos pelo passageiro e/ou pela bagagem durante o transporte, mas para cuja eclosão tenha este contribuído. Ou seja, cuida-se da culpa concorrente da vítima, que deve levar à proporcionalização da indenização. Tem-se causa de redução da indenização de responsabilidade objetiva do transportador. E aqui impende repetida menção à questão da concorrência normativa da legislação consumerista, que não faz qualquer remissão à culpa concorrente, mas apenas à culpa exclusiva da vítima como excludente da responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços (art. 14).

Porém, consoante já se vinha entendendo, mesmo sob a égide do Código de Defesa do Consumidor, a redução da indenização imposta pela concorrência da culpa da vítima constitui medida de prestígio à própria boa-fé objetiva, que inúmeros deveres anexos ou laterais impõe ao fornecedor. Ou seja, de ambos os contratantes, mesmo nas relações intrinsecamente desiguais, se exige padrão de comportamento solidário e leal que, a rigor, decorre mesmo de imperativo constitucional (CF 3º, I). Significa dizer que não seria leal, solidário, equitativo que a vítima se beneficiasse de uma indenização completa quando, mesmo objetiva a responsabilidade do outro contratante, tivesse contribuído, com sua conduta culposa, para a ocorrência dos danos que veio a sofrer. Por isso, a previsão de culpa concorrente no CC/2002, a rigor, não se mostra verdadeiramente incompatível com o Código de Defesa do Consumidor. Além disso, no parágrafo em comento, essa concorrência de culpa acaba ostentando plena coincidência com a regra geral a respeito editada no capítulo da responsabilidade civil (CC 945 e seu comentário).

Por fim, duas últimas ressalvas. Primeiro, a de que, hoje, seja conforme o parágrafo presente, seja de acordo com o CC 945, quando se alude à redução equitativa da indenização, concorrendo culpa da vítima, não se reparte necessariamente em porções iguais o valor da reparação, mas sim proporcionalizado de acordo com o grau de contribuição da vítima para o prejuízo experimentado. Segundo, a de que, havida exclusiva culpa da vítima, causa única do dano ocorrido, não haverá indenização a ser paga pelo transportador, já que quebrado o correspondente nexo de causalidade daquele prejuízo com o serviço do transporte. E, malgrado ausente expressa a alusão do CC/2002 à culpa exclusiva enquanto causa excludente, ao contrário do que está no CDC 14, § 3º, II, sua incidência se deduz mesmo da previsão de que a concorrência de culpa da vítima reduz a indenização. Por isso, sua culpa exclusiva afasta, de todo, a indenização, a propósito, remete-se ao que já expendido nos comentários ao CC 734. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 761-762 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 20/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, uma das situações que importam a quebra do nexo causal é o fato da vítima, i.é, quando a própria vítima desatende ao dever de cuidado e auxilia de algum modo na ocorrência do dano.

Avisos e instruções do transportador reforçam o dever de cuidado dos passageiros e, segundo critério de razoabilidade, podem ser cobrados dos mesmos, com a finalidade de imputar-lhes parte da responsabilidade na causação de dano e até mesmo para isentar o transportador.

O artigo 742 confere ao transportador o direito de retenção sobre a bagagem do passageiro, para a garantia de eventuais créditos que tenha contra ele. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 20.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 739. O transportador não pode recusar passageiros, salvo os casos previstos nos regulamentos, ou se as condições de higiene ou de saúde do interessado o justificarem.

Sob o prisma de Claudio Luiz Bueno de Godoy, em primeiro lugar, há serviços de transporte que, mesmo entregues à execução dos particulares por concessão, permissão ou autorização, são públicos e essenciais, assim de prestação continuada e que, portanto, não podem ser recusados. Veja-se, a propósito, o já expendido no comentário ao CC 731, bastando lembrar, como exemplo, o transporte coletivo municipal, tal como está no CF 30, V, que, ademais, deve ser combinado com o CDC 22.

Mas, de maneira geral, colocando-se o transportador em estado de oferta pública e permanente, obriga-se à contratação perante um público indistinto de usuários, desde que paguem o bilhete e se mantenham adequados às condições gerais que permitam a escorreita prestação do serviço, de forma segura e sem perturbar os demais passageiros, assim, antes de mais nada, conforme as circunstâncias já mencionadas no artigo anterior, e por isso, exemplificativamente, sendo recusável o embarque de passageiro menor desacompanhado ou não autorizado, na forma e quando o exija a Lei n. 8.069/90 (ECA).

Porém, mais ainda, salienta o artigo agora em comento que o transporte poderá ser igualmente recusado se o passageiro, além de não atender às instruções legais ou regulamentares, apresentar-se ao transporte em condições de saúde e higiene que potencialmente afetem ou prejudiquem os demais passageiros. Nesse pondo, de novo incide a concorrência normativa do Código de Defesa do Consumidor, que autoriza a recusa do fornecimento do serviço, no art. 49, II, em conformidade com os usos e costumes. É o que se entende também aplicável de maneira geral ao transporte, porquanto na senda de sua principiologia e posto não se trata, na hipótese fática, de relação de consumo. Pense-se no exemplo do passageiro que não se ostente convenientemente trajado, o que se deve aferir in rebus, conforme a época e o lugar do transporte.

Por fim, mas não em diferente sentido, mesmo causas inespecíficas no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor, desde que consonantes com a finalidade de preservar, de maneira geral, a regular prestação do serviço de transporte, devem ser admitidas como fonte de recusa do passageiro. Assim, qualquer hipótese de risco à segurança, não só à saúde alheia ou aos bons costumes. Pense-se, como exemplo, em pessoa que queira embarcar acompanhado de animal perigoso. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 762 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 20/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na linha da doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, em princípio, não se admite a recusa de contratar por parte do transportador, a não ser nos casos previstos nos regulamentos, ou se as condições de higiene ou de saúde do interessado o justificarem. Imagine-se o caso de o passageiro se apresentar exalando mau cheiro extremo, incomodando e perturbando os demais passageiros, ou com saúde tão debilitada que só devesse ser transportado em ambulância.

Embora este artigo não mencione expressamente, devem ser incluídas outras situações, como a do passageiro que se encontra em trajes menores, indecentemente, ou o que está completamente embriagado ou drogado, ou que porta, na cintura, ostensivamente, arma branca ou de fogo. Isto para não falar em viajante que forçou a entrada em ônibus interurbano, na rodovia Transamazônica, trazendo uma serpente enrolada no braço, alegando que a cobra venenosa era seu animal de estimação, e tinha de viajar em sua companhia. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 390 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na toada de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o transporte de passageiros é, ordinariamente, atividade que conforma relação de consumo. O Código de Defesa do Consumidor veda a discriminação de consumidores e a recusa de atendimento às suas demandas, na medida da possibilidade do fornecedor (CDC 39, II).

O dispositivo em questão concretiza a regra geral relativamente ao contrato de transporte. Em regra, não pode o transportador recusar passageiros. Somente poderá fazê-lo diante de circunstâncias graves que ponham em risco o próprio transporte e os demais passageiros. A menção às condições de higiene e de saúde do interessado no dispositivo é meramente exemplificativa. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 20.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 734, 735, 736 - continua - DO TRANSPORTE DE PESSOAS - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 734, 735, 736 - continua
- DO TRANSPORTE DE PESSOAS - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XIV – Do Transporte – Seção II
Do Transporte de Pessoas - (art. 734 a 742)
 vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 734. O transportador responde pelos danos causados às pessoas transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força maior, sendo nula qualquer cláusula excludente da responsabilidade.

Parágrafo único. É lícito ao transportador exigir a declaração do valor da bagagem a fim de fixar o limite da indenização.

Como lembra Claudio Luiz Bueno de Godoy, mesmo antes e a despeito da edição do Código Civil de 2002, sempre se admitiu que, ínsita ao contrato de transporte, havia, coo de fato há, uma cláusula de incolumidade, porquanto ao transportador afeta uma obrigação de resultado, a de levar o passageiro e suas bagagens ao destino, a salvo e incólumes, ademais, induvidoso tratar-se de uma atividade perigosa, induzindo, assim, caso típico de risco criado.

Pois exatamente nessa esteira instituiu-se, de forma genérica, como se deu o Código Civil a regrar o transporte, uma responsabilidade indenizatória para o transportador, do embarque ao desembarque – os quais, aliás, a Lei n. 7.565/86 (Código Brasileiro de Aeronáutica) por exemplo, explicita serem parte da execução do contrato de transporte (art. 233) -, a responsabilidade de culpa e só elidível por força maior, como está na lei e na esteira do que, para a responsabilidade civil em geral, se estabeleceu, quanto às atividades que ensejam risco especial, no CC 927, parágrafo único.

Era mesmo uma tendência, evidenciada desde a previsão do art. 17 do Decreto n. 2.681/12, que cuidava da responsabilidade das estradas de ferro, com culpa presumida. Assim, igualmente, comportou-se a jurisprudência, inclusive interpretando a regra do decreto citado como atinente a uma responsabilidade objetiva, mais que de culpa presumida, e estendendo-a a outras espécies de transporte.

Bem se verá, aliás, que o Código Civil de 2002, ao dispor sobre a responsabilidade no contrato de transporte, da mesma maneira com que regrou a responsabilidade civil, no capítulo próprio (ver comentários ao CC 927 e ss), incorporou a seu texto muito do que já haviam consolidado os tribunais. Pois, assentado que a responsabilidade do transportador, uma vez inalcançado o resultado pelo qual se obrigou, prescinde da verificação de sua culpa, bastando a demonstração do nexo de causalidade entre o prejuízo sofrido e a atividade de transporte, ressalvou a lei – ademais da regra do CC 741, acerca da conclusão de viagem interrompida mesmo que pelo casus – que essa responsabilidade apenas se exclui se provada força maior, tal como, para as obrigações em geral, se previu no CC 393. E lá se a definiu, sem distinção para o caso fortuito, o qual, portanto, se deve entender também excludente da responsabilidade do transportador, como fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.

Insta não olvidar, porém, que o transporte envolve forçosamente uma atividade que cria especial risco (Ver CC 927, parágrafo único) e a que, destarte, inerentes alguns eventos de força maior ou caso fortuito. Ou seja, é preciso diferenciar o que se passou a denominar fortuito interno do fortuito externo, conforme o acontecimento se apresente, ou não, ao transporte. Por isso mesmo, vem-se considerando que eventos como o defeito mecânico ou o mal súbito do condutor não eximam o transportador da responsabilidade pelos danos causados no transporte (fortuitos internos). Ao revés, prejuízos ocasionados ao passageiro ou à bagagem por obra de enchente, terremotos, raios são, aí sim, fortuitos externos e, destarte, causa excludente, por efetivamente romperem o nexo de causalidade do dano com a atividade de transporte. O assalto, como regra, sempre se considerou um fortuito externo, o que se vem, todavia, revendo em casos com ocorrências repetidas, praticas reiteradamente nas mesmas circunstâncias, sem medidas preventivas que razoavelmente se poderia esperar fossem tomadas.

Mais, até, como já tive oportunidade de sustentar, procurando fixar um conteúdo para a cláusula geral do CC 927, parágrafo único, e dissociado da ideia de defeito de segurança (periculosidade anormal, adquirida), no exercício da atividade que cria risco especial, assim compreendida a responsabilidade independente de culpa, ademais a que atinente a uma causalidade a merecer releitura, porquanto não só mais física, porém, antes, jurídica, reduz-se o espaço reservado para a entrevisão da estraneidade de eventos fortuitos, inclusive coo, ocasionalmente, o assalto em relação ao transporte. Com efeito, se o transportador responde pelo risco especial que sua atividade induz, então deixa de importar, na mesma extensão, a discussão sobre medidas preventivas que pudesse razoavelmente tomar para impedir ocorrências como roubos, tiroteios ou outras semelhantes. Tal debate importaria à luz da necessidade de se verificar se sucedido defeito de segurança. Mas não é o que se admite dar substrato à responsabilidade pelo risco da atividade, inclusive levada, agora, à disposição geral do CC 927, parágrafo único, bastando aferir se a atividade desempenhada, de que decorrente o prejuízo havido, induz risco diferenciado aos direitos, bens e interesses alheios, ou seja, se o evento lesivo se favorece pelo exercício da atividade, dado o risco especial que ela enseja (ver comentário ao artigo e, ainda: Claudio Luiz Bueno de Godoy. Responsabilidade Civil pelo risco da atividade. São Paulo, Saraiva, 2009). Daí já se ter decidido, como citado no item reservado à jurisprudência, por exemplo, que o transportador de valores responde pelos danos impingidos à vítima de atropelamento de seu turno provocado por disparo de arma que atingiu o motorista.

Ainda quanto às excludentes, tem-se renovado o mesmo problema, já examinado nos comentários ao CC 732, a que se remete, relativo à concorrência normativa como o Código de Defesa do Consumidor. Por exemplo, na legislação consumerista, como se disse, a cuja conceituação via de regra, malgrado nem sempre, se subsumirá o transporte, prevê-se a culpa exclusiva da vítima como excludente da responsabilidade do fornecedor, o que o Código Civil omite, ao menos quando não haja concorrência do transportador (CC 738, parágrafo único). De toda a sorte, a culpa exclusiva da vítima, tal qual se dá, com infeliz frequência, nos casos do chamado surf ferroviário, quebra o nexo de causalidade e deve, assim, ter igual efeito excludente ao que se reserva ao fortuito externo. Porém, tornar-se-á a esse assunto da concorrência com o Código de Defesa do Consumidor, em matéria de excludentes, no exame dos artigos subsequentes.

De novo expressão da absorção, pelo Código Civil de 2002, de orientação jurisprudencial já consolidada, o artigo em comento veda ajuste, no contrato de transporte, de qualquer cláusula excludente de responsabilidade. É o que já constava da Súmula n. 161 do STF e já se havia incorporado à legislação consumerista (art. 25). Isso, na verdade, porque próprio do contrato de transporte, corolário da boa-fé objetiva nas relações contratuais (CC 422), é o dever de segurança afeto ao transportador, que não se pode afastar, sob pena, primeiro, de se desnaturar a avença e, segundo, tanto mais, uma vez evidenciada relação de consumo já intrinsecamente desequilibrada e o que não se pode agravar com a exclusão da responsabilidade do transportador. Não se veda a cláusula de limitação de responsabilidade desde que, por um lado, não se preste a burlar a vedação da exclusão, e por outro, com especial cautela nas relações desiguais, usada a fim de verificar se sua previsão decorre de consenso e não de imposição. Veja-se, mais ainda, que, mesmo no regime do Código Civil de 1916, cláusulas excludentes já não eram aceitas para afastar responsabilidade por dolo, a que se equipara a culpa grave.

Por fim, e para se evitar incerteza quanto ao importe indenizatório, permite-se hoje, pelo parágrafo único do artigo em comento, que exija o transportador a declaração, feita pelo passageiro, do valor de sua bagagem, sob pena da recusa ao contrato – que não é a regra (CC 739) -, estabelecendo-se, dessa forma, o limite da indenização. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 755-756 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 17/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na linha da doutrina de Ricardo Fiuza, o transportador tem de levar o passageiro vivo e incólume a seu destino e responde pelos danos a ele causados, bem como a sua bagagem. Em todo contrato de transporte há, ínsita, a cláusula de incolumidade.

No contrato de transporte, a responsabilidade do transportador é objetiva, prescindindo, portanto, de verificação de culpa, sendo suficiente a demonstração da relação causal entre a atividade e o dano. Tratando-se de transporte efetuado por pessoas jurídicas de direito privado, prestadoras de serviço público, a responsabilidade objetiva é estatuída em norma constitucional (CF 37, § 6~).
Mas a excludente da força maior (vis maior) aproveita ao transportador (CC 393, § 1º). Se o navio, em meio à tempestade, naufragou; se despencou o raio que destruiu o ônibus, não há responsabilidade civil.
Encontramos decisões judiciais afirmando que não responde a empresa transportadora pela morte de passageiro, no interior do veículo, no meio da viagem, em consequência de assalto, por tal evento resulta de força maior e não configura risco coberto pela tarifa (Adcoas, 1981, n. 80.420); nem pelo fato de passageiro de ônibus ser atingido por estilhaço de vidro produzido por uma pedra atirada por terceiros, ato equiparado a caso fortuito, não havendo que falar em divergência com a Súmula 187 do STF (JB, 141/182).
É nula a cláusula de não indenizar, i.é, não tem qualquer validade e eficácia o dispositivo que afaste a responsabilidade do transportador. Nesse sentido, aliás, enuncia a Súmula 161 do STF: “Em contrato de transporte é inoperante a cláusula de não indenizar”. Aponte-se, ainda, que, na maioria dos casos, o contrato de transporte forma-se por adesão, e, também por essa razão, para impedir que se frustrem as justas expectativas, a boa-fé e os direitos do aderente, a cláusula de não indenizar é abusiva, inadmissível, nula de pleno direito (CC 421, 422, 423 e 424 e CDC, 51, I, e 54).

A doutrina admite, todavia – com cuidados e ressalvas -, a cláusula que limite a responsabilidade, desde que não seja expediente falacioso para burlar a proibição da cláusula excludente da responsabilidade, quando a indenização, por exemplo, for fixada em valor ridículo, insignificante (STJ, 4~ T., REsp 76.619, em 12-2-1996). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 389 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 17/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a responsabilidade civil do transportador é objetiva e sua obrigação é de resultado. É nula a cláusula de não indenizar (Súmula 161 do STF).

Na responsabilidade objetiva não se perquire de culpa do agente. Isso não significa que ele tenha de indenizar a vítima sempre que esta vier a sofrer um prejuízo, pois é necessário tenha de indenizar a vítima sempre que esta vier a sofrer m prejuízo, pois é necessário que o dano seja proveniente do serviço prestado, i.é, que haja nexo causal. Assim as hipóteses de exoneração da responsabilidade civil do transportador são todas relacionadas à inexistência ou quebra do nexo de causalidade entre o dano e o serviço que presta.

 Causas de exoneração da responsabilidade do transportador: a) culpa exclusiva da vítima; b) culpa de terceiro (CC 735) – somente elide a responsabilidade do transportador a força maior (ex.: roubo, pedrada), não os fatos que constituem risco natural do transporte, coo os danos decorrentes de acidente de trânsito, ainda que a culpa pelo acidente seja atribuída a terceiro, conforme a Súmula n. 187 do STF: “A responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente com o passageiro, não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 17.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 735. A responsabilidade contratual do transportador por acidente com o passageiro não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva.

Na toada de Godoy, novamente em reforço à constatação de que o Código Civil, na matéria atinente à responsabilidade do transportador, incorporou muito do que a jurisprudência já havia consolidado, conforme se vem acentuando desde os comentários aos artigos precedentes, no dispositivo em questão repete-se, a rigor, o que se continha na Súmula n. 187 do STF, estatuindo que o chamado fato de terceiro não elide a responsabilidade do transportador, contra quem terá ação regressiva.

O primeiro problema que a respeito se coloca é a exata definição de fato de terceiro, ou de quem seja terceiro, e mesmo sua diferenciação para a força maior, tratada no artigo anterior. Em princípio, na responsabilidade civil, deve-se entender como   terceiro quem não integre um dos polos da respectiva relação, portanto quem não seja agente ou vítima. Ou, melhor, é preciso que alguém se interponha na relação agente/vítima, ademais mostrando-se estranho à responsabilidade daí dimanada. Por isso, para fins de excludente, não são terceiros os pais quando respondem pelos atos dos filhos, ou o patrão, acerca dos atos dos empregados. Nesse sentido, portanto, a condição de terceiro só se configurará como causa excludente caso se trate de alguém completamente estranho à pessoa causadora direta do dano, ou mesmo à sua atividade.

Em segundo lugar, é bom lembrar ter sempre se entendido em doutrina que o fato de terceiro, desde que a causa única do evento danoso e sem qualquer ligação com o devedor, fosse excludente de responsabilidade, porquanto, assim caracterizado, seria causa de quebra do nexo de causalidade. Tal como se viu quanto à força maior nos comentários ao artigo precedente, o fato de terceiro será estranho ao responsável no transporte quando não se ligar ao risco da atividade por ele desempenhada. Esse o ponto que se reputa nodal e por vezes confundido, quando se cuida de equiparar o fato de terceiro à força maior sempre que revelado por um evento inevitável. Parece mais se afeiçoar aos pressupostos atuais da responsabilidade civil, máxime em atividades indutivas de especial risco como é a de transporte (CC 927), a verificação sobre se o fato atribuível ao terceiro se coloca ou não dentro dos limites razoáveis do risco criado, e assim assumido, pela atividade do transportador.

Em terceiro lugar, considera-se diferencial do fato de terceiro, em relação à força maior, a possibilidade de se determinar um agente específico responsável pela conduta.

Pois preceitua o Código Civil de 2002 que o fato de terceiro não exclui a responsabilidade do transportador, solução exatamente oposta da que se contém no art. 14. § 3º, II, do Código de Defesa do Consumidor. A antinomia, segundo se entende, mostra-se solucionável pela consideração de que, afinal, o fato de terceiro, conforme se apresente, pode ou não romper o nexo de causalidade. E, se rompe, exclui a responsabilidade civil, decerto do que não está a tratar o artigo do Código Civil, ora em comento. Mas isto, repita-se por relevante, desde que havida a estraneidade, ao transportador, do fato de terceiro, causa única do evento danoso. Então, rompe-se o nexo de causalidade, faltando assim requisito mesmo para aplicação de regra de responsabilidade sem culpa, já que não se cuida, não transporte, de teoria do risco agravado, sem excludentes, ao que soa da redação do próprio CC 734.

Já, ao revés, se a conduta do terceiro, mesmo causadora do evento danoso, coloca-se nos lindes do risco do transportador, destarte se relacionando, mostrando-se ligada à sua atividade, então, a exemplo do fortuito interno, não se exclui a respectiva responsabilidade. É o que ocorre, por exemplo, quando o passageiro sofre prejuízo porque o veículo em que conduzido é fechado por terceiro. esse foi o pressuposto sobre o qual se assentou a Súmula n. 187 do STF e parece ser a interpretação reservada ao artigo em exame. Tanto assim é que os tribunais, em inúmeras oportunidades, já vinham afastando a incidência da súmula naqueles casos em que o passageiro fosse atingido, v.g., por uma pedra lançada por terceiro, dado configurar-se no caso um fato externo à atividade, todavia não quando o evento se repetisse nas mesmas circunstâncias, sem medidas preventivas que razoavelmente se esperava fossem tomadas, tal como se disse em relação ao assalto nos comentários ao artigo anterior, e com a mesma da redução ao âmbito de incidência da excludente em virtude da aplicação da cláusula geral do CC 927, parágrafo único. Com isso, harmonizam-se as previsões do Código Civil, no artigo vertente, e as disposições do Código de Defesa do Consumidor, do art. 14, § 3º, II. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 757-758 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 17/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Para a doutrina de Fiuza, copiou-se aqui a Súmula 187 do STF: “A responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente com o passageiro, não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva ‘~.

Se, por exemplo, um outro veículo, por imperícia do condutor, desgovernou-se e atingiu o ônibus em que estava o passageiro, que sofreu fraturas e escoriações, a responsabilidade do transportador persiste, e ele terá de indenizar os danos sofridos pela vítima. Mas poderá acionar, regressivamente, o terceiro causador do acidente.  (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 389 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 17/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, somente fatos extraordinários (ex.: roubo, pedrada) elidem a responsabilidade do transportador, não os fatos inerentes à atividade, que constituem caso fortuito interno ou risco natural do transporte, como os danos decorrentes de acidente de trânsito, ainda que a culpa pelo acidente seja atribuída a terceiro, conforme a Súmula n. 187 do STF. Já aqui mostrada no artigo anterior. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 17.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 Art. 736. Não se subordina às normas do contrato de transporte o feito gratuitamente, por amizade ou cortesia.

Parágrafo único. Não se considera gratuito o transporte quando, embora feito sem remuneração, o transportador auferir vantagens indiretas.

O Código Civil de 2002, no artigo em comento, no entendimento de Claudio Luiz Bueno de Godoy, enfrenta antiga discussão sobre a natureza do transporte feito por cortesia ou amizade, a carona que se dá a alguém que vem a sofrer dano durante o percurso. O debate não era ocioso dado que, admitida a tese de se tratar de contrato, e porque gratuito, a responsabilidade daquele a quem o ajuste não beneficiava, portanto o transportador, somente se erigiria em caso de dolo ou culpa grave, que a ele se equipara, conforme já previa o art. 1.057 do Código Civil de 1916, repetido pelo Código Civil de 2002 art. 392.

Destarte, suposta contratual a responsabilidade de quem oferece carona, apenas por dolo, ou culpa grave, haveria o dever de indenizar o passageiro danificado durante o transporte gratuito – este por amizade ou cortesia. Pois era essa a tese que parecia prevalecer, não sem críticas, antes da edição do CC/2002, mercê inclusive da edição da Súmula n. 145 do STJ, segundo a qual “no transporte desinteressado, de simples cortesia, o transportador só será civilmente responsável por danos causados ao transportado quando incorrer em dolo ou culpa grave”.

Todavia, a nova normatização civil expressa, no artigo em comento, não se submeter ao regime contratual o transporte feito por mera amizade ou cortesia. Assim, ao que se entende, consagra-se, para este transporte desinteressado, a tese da responsabilidade extracontratual, que se rege pelo CC 927 e ss, suscitando discussão outra, sobre se o caso é de teoria da culpa ou do risco, muito embora não se furte a observar que a carona não encerra, nos termos do parágrafo único daquele mesmo CC 927 e a despeito do perigo inerente a todo transporte, uma atividade normalmente desenvolvida de modo a criar habitual risco aos direitos de outrem, pelo que a responsabilidade será baseada na demonstração de dolo ou de qualquer modalidade ou grau de culpa, mesmo que leve. Mas é bem de ver que, no quanto aqui interessa, a hipótese não se sujeitará ao regramento do contrato de transporte. Não se sujeitará, mesmo, ao regime dos contratos.

Porém, ressalva o Código Civil de 2002 que, por vezes, mesmo sem remuneração direta, o transporte não é desinteressado. Produz, ao revés, vantagens indiretas, portanto, bem longe de consubstanciar mera cortesia ou amizade. Nesses casos, a regência é do ordenamento aplicável ao contrato de transporte. Assim, por exemplo, o sistema de concessão de milhagens, bilhetes de fidelidade, ou mesmo o transporte solidário, o chamado rodízio. Da mesma forma, no exemplo de Humberto Theodoro Jr. (“Do transporte de pessoas no novo Código Civil”. In: Revista dos Tribunais, 2003, v. 807, p. 11-26), o corretor que leva o cliente em seu veículo para visitar um imóvel. Muito menos haverá de se cogitar de regramento outro que não o contratual nos casos de transporte coletivo clandestino, que, malgrado feito ao arrepio da regulamentação estatal, como se impõe (CC 731), não pode, no âmbito civil, excluir a responsabilidade do transportador, nos termos deste Código. Por fim, igualmente não se vem considerando seja desinteressado o transporte coletivo devidamente regulamentado, mas disponibilizado ao idoso sem pagamento de passagem, pois em verdade há custo diluído que indica não agir o concessionário por mera cortesia. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 759 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 17/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Para a doutrina de Fiuza, no sentido deste dispositivo, há a Súmula 145 do STJ: “No transporte desinteressado, de simples cortesia, o transportador só será civilmente responsável por danos causados ao transportado quando incorrer em dolo ou culpa grave”.

Se o transporte representa ato de mero favor, e feito gratuitamente, por amizade, cortesia, a rigor, nem configura contrato de transporte. A relação não fica regida pelas normas deste Capítulo. Nem há, no caso, responsabilidade objetiva do condutor. Com maior razão se o transporte gratuito está sendo feito por necessidade, urgência, solidariedade. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 390 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 17/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o transporte gratuito não se regula pelos dispositivos do contrato de transporte. No transporte gratuito, a responsabilidade do transportador é subjetiva, i.é, somente reponde mediante a prova de que agiu com culpa. É nesse sentido a Súmula n. 145 do STJ: “No transporte desinteressado, de simples cortesia, o transportador só será civilmente responsável por danos causados ao transportado quando incorrer em dolo ou culpa grave.

Se o transportador obtém proveito econômico com o transporte de forma indireta, como ocorre no transporte de empregados pelo próprio empregador, o transporte não se considera gratuito.

O transportador que celebra contrato com empresa para o transporte de seus empregados não fornece ao passageiro um transporte gratuito e tem a obrigação de levar a viagem a bom termo, obrigação que assume com a pessoa que transporta, pouco importando quem forneceu o numerário para o pagamento da passagem (STJ, REsp. 238.676-RJ, rel. Mm. Ruy Rosado de Aguiar, j. 08.02.2000). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 17.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).