sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 749, 750, 751 – continua - DO TRANSPORTE DE COISAS - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 749, 750, 751 – continua 
- DO TRANSPORTE DE COISAS - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XIV – Do Transporte – Seção III
Do Transporte de Coisas - (art. 743 a 756)
 vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 749. O transportador conduzirá a coisa ao seu destino tomando todas as cautelas necessárias para mantê-la em bom estado e entregá-la no prazo ajustado ou previsto.

No entendimento de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o contrato de transporte de cargas, quanto à responsabilidade do transportador, a rigor não difere contrato de transporte de  pessoas, essencialmente envolvendo-se, tanto num quanto noutro, uma obrigação de resultado, afeta ao transportador, de fazer chegar a pessoa ou coisa a seu destino, sem qualquer dano, incólume. É a cláusula de incolumidade ínsita a essa espécie contratual, pelo que responde o transportador independentemente de culpa, como de resto se dá, no Código Civil de 2002, no tocante às atividades de risco inerente e especial, como é a de transporte. Certamente, essa responsabilidade encontra excludentes, valendo, a propósito, remissão aos comentários aos CC 734 e 735, em que a matéria já foi enfrentada e cuja substância aqui não se altera.

É bem de ver que o artigo em questão cuidou do deslocamento da coisa de modo a não só evitar que ela sofra dano, bem como a que se a faça entregar no tempo ajustado. De novo, tal qual se estabeleceu para o transporte de pessoas, sem qualquer ressalva de prazo de carência, determinou-se que o transportador obedecesse ao tempo ajustado para entrega da coisa transportada. Por isso, também nesse passo, cabe a advertência feita nos comentários ao CC 737, a que se remete, acerca da inaplicabilidade de lei especial que fixe prazos mínimos para que o dano resultante de atraso seja indenizado, que não se compreenda apenas como um período acima do qual o ressarcimento se fará de maneira automática, sem qualquer excludente, mas com possibilidade de limitação ou tarifação do quantum indenizatório. De toda a sorte, vale a remissão aos comentários dos artigos mencionados anteriormente, evitando-se repetição.

Conforme regra em si do direito obrigacional, se não for ajustado termo final para entrega, tratando-se de prestação que, naturalmente, envolve tempo para ser cumprida, deve-se cogitar não da exigibilidade à vista, mas do chamado prazo moral, ou seja, aquele razoável para adimplemento, de acordo com as circunstâncias específicas do transporte contratado. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 771 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 24/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na visão de Ricardo Fiuza, a cláusula de incolumidade (CC 734) considera-se ínsita, também, no transporte de coisas. O transportador deve tomar todas as cautelas para manter a mercadoria em bom estado e entrega-la no prazo ajustado ou previsto. Este artigo indica as principais obrigações do transportador. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 394 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 24/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na orientação de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o contrato de transporte estabelece obrigação de resultado. Com ele, o transportador assume o dever de entregar a mercadoria a seu destinatário nas condições ajustadas. Será responsabilizado civilmente, pela mora ou pelo inadimplemento contratual. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 24.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 Art. 750. A responsabilidade do transportador, limitada ao valor constante do conhecimento, começa no momento em que ele, ou seus prepostos, recebem a coisa; termina quando é entregue ao destinatário, ou depositada em juízo, se aquele não for encontrado.

Para Claudio Luiz Bueno de Godoy, em primeiro lugar, o Código Civil de 2002 preestabelece o valor da mercadoria, pelo qual responde o transportador. Não se tata, aqui, de limitação indevida, porquanto, como se viu nos comentários aos CC 743 e 744, o conhecimento de transporte da carga deverá identificar seu valor, inclusive mercê de devida informação do expedidor. Por isso mesmo, esse o importe que se considera seja o das coisas transportadas, e que define a extensão da responsabilidade que a propósito é afeta ao transportador, e que, evidentemente, não exclui a eventual obrigação de indenizar por título ou causa outra, como lucros cessantes ou mesmo, se for o caso, danos extra-patrimoniais.

Além disso, fixa o Código Civil de 2002, no artigo em comento, o exato instante em que o transportador passa a responder pelas mercadorias cujo transporte lhe e confiado. A lei estabelece que isso se dá desde quando haja o recebimento da carga. A disposição não é diversa daquela que já se continha no art. 101 do Código Comercial, determinando o mesmo termo inicial para a responsabilidade do transportador. Da mesma forma, o Decreto n. 2.681/12, cuidando do transporte ferroviário, dispôs no seu art. 3º que a responsabilidade do transportador começa ao ser recebida a mercadoria na estação pelos empregados da estrada de ferro, antes mesmo do despacho. Quanto ao transporte aéreo fixou-se a mesma a responsabilidade desde o recebimento da carga (art. 245, Lei n. 7.565/86). Assim, ainda, o art. 9º, caput, da Lei n. 11.442/2007, que dispôs sobre o transporte rodoviário de cargas em território nacional, apenas omisso na referência à consignação, todavia o que se deve colmatar pelo socorro à parte final do artigo em comento; ou o art. 13, caput, da Lei n. 9.611/98, acerca do transporte multimodal, realizado mercê de um único contrato, todavia executado por mais de um meio de transporte.

Toda essa legislação especial sempre estendeu a responsabilidade do transportador até o instante da entrega da mercadoria ao destinatário. Pois é, também, o que explicita o novo Código Civil, ressalvando que, não sendo encontrado o consignatário, a coisa deve ser depositada em juízo.

Já se decidiu, porém, conforme citação a seguir, que a omissão do transportador no preenchimento do conhecimento de transporte não pode servir de eximente à sua responsabilidade pelos danos havidos na carga transportada, tanto mais se, como se viu nos comentários ao CC 730 e 744, o contrato de transporte é informal.

A questão, porém, que se põe, surge quando o expedidor não declara o valor das mercadorias. Por exemplo, o art. 14, parágrafo único, da Lei n. 11.442/2007, que disciplina o transporte rodoviário de cargas em território nacional, nesses casos limita a responsabilidade do transportador ao importe equivalente a dois Depósitos Especiais de Saque (DES) por quilograma de peso bruto transportado. É, a rigor, uma tarifação legal apriorística do valor de mercadorias que o expedidor omitiu. E que, portanto, somente pode ser entendida quando essa omissão for imputável a ele, expedidor, mas, segundo se crê, sempre que não lhe seja possível provar valor maior, ônus que passa a ser seu, a si afeto (v. comentários ao CC 744), sob pena de indevido enriquecimento do transportador e mesmo de afronta ao sistema constitucional e geral do CC/2002 no sentido da plena reparabilidade dos prejuízos havidos no desempenho de atividade que induz especial risco (v. comentários ao CC 732 e 927, parágrafo único). Exatamente o mesmo problema que, antes do CC/2002, suscitava já o art. 17, § 3º, da Lei n. 9.611/98, ordenadora do transporte multimodal.

Portanto, se a ausência da devida informação não pode beneficiar o expedidor, do mesmo modo não pode ser foco de indevida vantagem ao transportador. Tudo, assim, se há de apreciar, seja dado reiterar, uma vez informal o contrato de transporte, no campo da prova produzida e que, nesse ponto, incumbe a quem expede a carga. Ainda se admita, conforme a previsão de lei, uma tarifação apriorística, destarte falhando a prova, do valor das mercadorias. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 772 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 24/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como aponta a doutrina de Ricardo Fiuza, no contrato de transporte de coisas, a responsabilidade do transportador – limitada ao valor constante do conhecimento – tem início no momento em que ele, ou os seus prepostos, recebem a coisa, e se encerra com sua entrega ao destinatário, ou depositada em juízo, se o destinatário não for encontrado.

Correm os riscos por conta do transportador, sendo sua responsabilidade objetiva, salvo força maior devidamente comprovada, ou se a coisa se perdeu ou deteriorou por culpa exclusiva do remetente, como na hipótese de vício próprio da coisa, sendo ela facilmente deteriorável, por exemplo, e tendo sido circunstância omitida pelo expedidor. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 395 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 24/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o transportador tem a obrigação de resultado de entregar a coisa incólume ao destinatário. Responde objetivamente por danos ocasionados durante o transporte, salvo se decorrente de fortuito externo, i.é, fato que não seja próprio da atividade de transporte. O conhecimento vale como prova da propriedade da mercadoria. O transportador se desobriga mediante a entrega da mercadoria ao destinatário ou a quem lhe apresentar o conhecimento. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 24.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 751. A coisa, depositada ou guardada nos armazéns do transportador, em virtude de contrato de transporte, rege-se, no que couber, pelas disposições relativas a depósito.

No diapasão de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o artigo presente assenta a responsabilidade do transportador pela coisa a si confiada, durante o período em que ela esteja à sua disposição, depositada ou guardada em seus armazéns, quer porque, caso já tenha sido recebida, aguarda o despacho, o deslocamento, quer porque, se o transporte já tiver sido feito, espera a entrega ao destinatário.

Neste interregno, o Código Civil estabelece que a responsabilidade do transportador rege-se pelas mesmas regras que regulamentam a responsabilidade do depositário. Com efeito, pelo contrato de depósito, como é sabido, o depositário recebe objeto móvel para guardar, até que o depositante o reclame (CC 627). Incumbe-lhe, fundamentalmente, um dever de custódia, um dever de cuidado na guarda e conservação da coisa. É, da mesma forma, a diligência que se exige do transportador, a respeito das coisas que deverão ser ou que foram transportadas, mas se encontram depositadas a seus cuidados, à sua disposição.

Impende é que, seguindo a norma geral do artigo anterior, a mercadoria já tenha sido recebida pelo transportador e ainda por ele não entregue ao destinatário. Ou seja, sua responsabilidade, enquanto a coisa esteja depositada, se dá desde que tal depósito já se tenha feito a seus cuidados, vale dizer, durante o período que vai do recebimento à entrega, que é, segundo a lei, o interregno durante o qual o transportador responde pela carga. Tal dever acessório que tem o transportador, de guarda e cuidado para com a coisa transportada, já levou mesmo antiga doutrina a definir a natureza do transporte como verdadeiro depósito, o que se encontra superado pela entrevisão de um contrato autônomo e, agora, típico, cuja prestação principal é o deslocamento da coisa ou da pessoa. Claro que o transportador também é responsável por eventual armazenamento que se faça em meio ao percurso, por interrupção do deslocamento, sempre sem a necessidade de que o local do armazenamento seja próprio do transportador. Importa é que a coisa esteja ainda sob seus cuidados, armazenada em local de sua responsabilidade, de sua escolha. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 773 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 24/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina de Ricardo Fiuza, o artigo antecedente consta que a responsabilidade do transportador começa a correr desde o momento em que recebe a mercadoria e acaba com a efetiva entrega desta em seu destino. Pode ocorrer de antes de iniciada, efetivamente, a viagem, ou depois de terminada, seja a coisa depositada ou guardada nos armazéns do transportador, regendo-se a questão, no que couber, pelas disposições do contrato de depósito (CC 627 e ss).

O contrato de transporte tem afinidades com o de locação de coisas e de serviços, o de empreitada e de depósito. A respeito deste último, a relação é mais íntima, como se conclui do disposto neste artigo. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 395 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 24/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na toada de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, em razão do contrato de transporte, pode a coisa vir a ser guardada pelo transportador antes ou depois de concluído o trajeto. O dispositivo manda aplicar à relação entre expedidor e transportador as regras relativas ao contrato de depósito enquanto perdure essa situação. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 24.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 746, 747, 748 – continua - DO TRANSPORTE DE COISAS - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 746, 747, 748 – continua 
- DO TRANSPORTE DE COISAS - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XIV – Do Transporte – Seção III
Do Transporte de Coisas - (art. 743 a 756)
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Art. 746. Poderá o transportador recusar a coisa cuja embalagem seja inadequada, bem como a que possa pôr em risco a saúde das pessoas, ou danificar o veículo e outros bens.

Como explica Claudio Luiz Bueno de Godoy, foi sempre previsão constante, nas leis especiais editadas acerca do transporte de cargas (art. 49, Decreto n. 51.813/63; art. 37, Decreto n. 90.959/85; Decreto n. 1.832/96), a possibilidade de o transportador recusar a mercadoria a ser transportada em virtude do seu mal acondicionamento. Isso porque é obrigação do expedidor embalar adequadamente a coisa que será deslocada, de acordo com sua natureza, de modo a evitar a causação de danos a pessoas ou coisas. Pois o Código Civil de 2002 repete a regra, mas acrescenta uma cláusula geral, a autorização pra a recusa sempre que a coisa cujo transporte se pretende possa por em risco, de qualquer modo, a saúde das pessoas ou a integridade do veículo transportador ou de quaisquer outros bens. Porém, ao ser aceito o transporte, sem ressalva, responsabiliza-se o transportador pelos danos que a carga possa sofrer, a par da responsabilidade perante terceiros dos danos que ela possa provocar.

Bem de ver que, nos casos de carga proibida – ou com regras específicas para deslocamento, pela sua especial periculosidade – a recusa não é uma opção do transportador, mas um dever seu, tanto quanto desacompanhada de seus correspondentes documentos, como está no artigo seguinte. A exigência de correto acondicionamento da coisa, que se impõe ao expedidor, bem assim a prerrogativa de recusa, pelo transportador, se a embalagem for inadequada, na verdade representam ainda a contrapartida da responsabilidade do condutor. Ou seja, como é responsabilidade do transportador a preservação da higidez da coisa transportada, então natural que se exija seja-lhe ela entregue adequadamente embalada, conforme sua natureza e o meio de deslocamento que se fará.

A não ser assim, e sobrevindo o dano à carga, resultante do mau acondicionamento pelo expedidor, afasta-se a responsabilidade do transportador, inclusive como, para o transporte rodoviário de cargas, se expressou no art. 12, II, da Lei n. 11.442/2007 ou, antes, para o transporte multimodal – regido por um único contrato, mas executado mediante mais de uma modalidade de transporte – já se havia levado ao texto do art. 16, II, da Lei n. 9.611/98. Isso, porém, vale a ressalva, na relação interna entre os contratantes, eis que não se exime o transportador da responsabilidade por danos havidos a terceiros, posto que assegurado direito regressivo diante do expedidor (v. ainda, comentários ao CC 735).

Veja-se, de outra parte, que o Código Civil de 2002 não fez nenhuma ressalva, ao contrário do que se poderia considerar inferido da redação do art. 50 do Decreto n. 51.813/63, por exemplo, que pudesse induzir interpretação de que o transportador é obrigado a receber a coisa se seu reclamo contra o mau acondicionamento não for acatado, apenas se eximindo da respectiva responsabilidade. Antes de tudo, o regramento presente procura evitar danos, que inclusive podem atingir terceiros, assim além da questão da responsabilidade do transportador, apenas. Confira-se, a respeito, o que se deduziu no comentário ao CC 739, acerca da questão da segurança como justificativa da recusa do transportador à entabulação do ajuste. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 768-769 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 23/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na toada de Ricardo Fiuza, uma das obrigações do remetente é a de entregar a mercadoria devida e convenientemente embalada, atendendo à natureza e características da coisa que será transportada. Sendo inadequada a embalagem verifica-se que ela pode pôr em risco a saúde das pessoas, ou danificar o veículo e outros bens, o transportador pode recusar a coisa, negando-se a efetuar o transporte. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 393 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 23/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Sob a luz de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a rigor, o princípio da boa-fé objetiva permite a recusa de qualquer coisa cujo transporte seja inadequado, não apenas em razão da embalagem. Assim, é lícito o limite imposto por transportadores para a dimensão dos volumes transportados, bem como a recusa de transporte de produtos químicos, de animais ou plantas que sejam objeto de restrições administrativas. Somente não são admissíveis as restrições arbitrárias, i.é, aquelas que não tenham justificativa num interesse público importante. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 23.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 747. O transportador deverá obrigatoriamente recusar a coisa cujo transporte ou comercialização não sejam permitidos, ou que venha desacompanhada dos documentos exigidos por lei ou regulamento.

Na esteira de Claudio Luiz Bueno de Godoy, se no dispositivo anterior se autoriza o transportador – portanto, sendo-lhe deferida uma prerrogativa – a recusar o transporte de mercadorias que estejam mal acondicionadas ou que possam colocar em risco a saúde alheia, o veículo pelo qual se efetua o deslocamento ou outras mercadorias, no artigo presente se obriga o transportador a recusar o transporte de cargas proibidas ou desacompanhadas da respectiva documentação.

E também aqui, não se cuida de regra nova, eis que já antes constante de legislação especial, por exemplo valendo a remissão ao que previa o art. 242 do Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei n. 7.565/86). Quando se determina a recusa de transporte de mercadoria proibida, preserva-se mesmo a licitude do objeto do contrato. Ou, caso se prefira, do objeto da prestação do transportador.

Com efeito, não se compadece o sistema com a possibilidade de que sejam transportadas coisas cuja comercialização seja proibida, ou cuja posse por vezes constitui mesmo crime, como no caso dos entorpecentes. Deve-se lembrar, ainda, a ocasional existência de restrições legais ao transporte de coisas perigosas, como combustível, por exemplo, que devem ensejar obrigatória recusa do transportador a tanto não adequado.

Por fim, estabelece o preceito também a obrigatória recusa quando a mercadoria não estiver acompanhada de sua documentação, exigida por norma legal ou regulamentar, pense-se, por exemplo, no transporte rodoviário de cargas desacompanhadas de sua nota fiscal. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 769-770 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 23/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, além dos casos previstos no artigo antecedente, e com maior razão, o transportador terá de recusar, “deve obrigatoriamente recusar”, a coisa cujo transporte ou comercialização não sejam permitidos, ou que venha desacompanhada dos documentos exigidos por lei ou regulamento. Não se trata de uma faculdade do transportador, mas de um dever legal. O objeto transportado tem de ser lícito. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 394 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 23/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, é comum a proibição de se transportar animais ou plantas para outros países, tendo-se em vista a proteção sanitária e o combate à proliferação de doenças. Razões de saúde ou de segurança podem determinar a proibição de transporte de determinados bens. O contrato de transporte deve respeitar tais proibições, sob pena de nulidade. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 23.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 748. Até a entrega da coisa, pode o remetente desistir do transporte e pedi-la de volta, ou ordenar seja entregue a outro destinatário, pagando, em ambos os casos, os acréscimos de despesa decorrentes da contraordem, mais as perdas e danos que houver.

Na toada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, tal como se dá no transporte de pessoas, a propósito remetendo-se aos comentários do CC 740, e lá fixando-se um limite especial, não estipulado no presente dispositivo, ao menos por incidência do Código Civil, para a respectiva cláusula penal compensatória, pode haver desistência do contrato de transporte de coisas, manifestável até sua entrega ao transportador.

Além disso, veja-se que, no transporte de pessoas, esse exercício não se condiciona, propriamente, ao início do percurso, eis que mesmo durante o trajeto poderá haver desistência. A previsão de desistência para o transporte de mercadorias até sua entrega reforça antigo entendimento que via nesta espécie um contrato real, somente aperfeiçoado com a tradição da coisa a ser transportada. Mas, como se viu nos comentários ao CC 730, o contrato de transporte, mesmo de cargas, é consensual, sendo que a entrega já constitui ato de execução.

De mais a mais, nada impedia que a lei estabelecesse, mesmo assim, a possibilidade de arrependimento. Porém, ao fazê-lo, exatamente porque o contrato já estaria então aperfeiçoado, não eximiu o desistente de compor as perdas e danos provocadas pelo seu arrependimento. É possível a fixação prévia desse valor, por acordo das partes, mediante o estabelecimento de cláusula penal, malgrado sem limite que se determinou para o transporte de pessoas, mas atendendo-se ao princípio de equilíbrio das relações contratuais que permeia o ordenamento como um todo (CF 3º, I), não só o CDC 53. A propósito, remete-se aos comentários do CC 732.

Bem de ver que, no Decreto n. 19.473/30, particularmente em seu art. 7º, facultava-se ao remetente, todavia então obrigado a pagar o frete por inteiro, exigir o desembarque imediato da mercadoria, mesmo já em trânsito, portanto ainda depois de sua entrega (right of stopage in transitu). Nem se considera que essa possibilidade esteja excluída pelo atual Código Civil, apenas se ressalvando a verificação de eventual prejuízo maior, inclusive, quanto aos lucros cessantes, que se componha pelo pagamento integral do frete, sempre observada eventual abusividade, conforme o dano real comprovado no caso concreto.

Mas, além da desistência, o preceito em questão permite que o expedidor altere o destino da carga, tal qual já se continha no art. 113 do Código Comercial. Ao que se entende, tal alteração poderá ser feita mesmo quando a mercadoria já estiver em trânsito, sempre mediante o ressarcimento do acréscimo de despesas que a contraordem pode induzir, inclusive reajuste do frete, se for o caso. A ressalva, porém, que se há de fazer quanto a qualquer alteração que se faça com relação ao destino de mercadoria cujo deslocamento já se iniciou é a eventual onerosidade excessiva que a variação pode ensejar e que persista mesmo diante da revisão do frete. Essa situação autoriza a recusa da alteração pelo transportador, tal qual o caso em que não se acorda o reajuste do frete devido pelo acréscimo de esforço para o serviço alterado, quando então o transportador permanece com a obrigação de entrega no local do destino original. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 770-771 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 23/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na toada de Ricardo Fiuza, como no transporte de pessoas, em que o passageiro tem direito a rescindir o contrato antes de iniciada a viagem (CC 740), no transporte de mercadoria, até a entrega da coisa, pode o remetente desistir do transporte e pedi-la de volta, ou ordenar que seja entregue a outro destinatário. Em ambos os casos, terá de pagar os acréscimos de despesa decorrentes da contraordem, mais as perdas e danos que houver. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 394 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 23/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Sob a luz de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o contrato de transporte de coisa é realizado entre o expedidor e o transportador. O destinatário não é parte, a menos que ele mesmo seja o expedidor. O dispositivo confirma o poder de disposição que tem o expedidor sobre a coisa. É ele quem determina a quem a mercadoria deverá ser entregue e tem assegurado o direito de alterar a destinação do bem, ficando obrigado ao pagamento dos acréscimos provenientes da alteração de desígnios. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 23.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 22 de janeiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 743, 744, 745 – continua - DO TRANSPORTE DE COISAS - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 743, 744, 745 – continua  
- DO TRANSPORTE DE COISAS - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XIV – Do Transporte – Seção III
Do Transporte de Coisas - (art. 743 a 756)
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Art. 743. A coisa, entregue ao transportador, deve estar caracterizada pela sua natureza, valor, peso e quantidade, e o mais que for necessário para que não se confunda com outras, devendo o destinatário ser indicado ao menos pelo nome e endereço.

Vivenciando Claudio Luiz Bueno de Godoy, no contrato de transporte de coisas, o transportador as recebe do expedidor ou remetente para entregá-las ao destinatário ou consignatário. Impende que a coisa recebida esteja devidamente especializada, identificada, individuada, a fim de que não seja confundida com outras, conforme a lei determina. A ideia é a de que seja sempre reconhecível a coisa – e suas condições – entregue ao transporte, para perfeita execução e eficácia do contrato, ademais de viabilizar a concreta responsabilidade do transportador. Por isso, exige-se que a mercadoria a ser transportada, além de ser devidamente acondicionada, sob pena de se poder rejeitar seu deslocamento (CC 764), venha a ser caracterizada, com indicação de natureza, peso, valor e quantidade, também para servir à sua identificação.

Em diversos termos, objeto passível de transporte é a coisa identificável, mercê de dados que, como se verá nos comentários ao artigo seguinte, serão aludidos no conhecimento de transporte, sem prejuízo de o transportador exigir sua relação escrita e assinada.

Por isso, afeta ao expedidor o dever mesmo de declarar os dados de identificação da mercadoria, até como forma de se estabelecer a exata responsabilidade do transportador pelos danos que sejam causados à coisa, além de evitar qualquer fraude do remetente, de resto como já se continha no art. 5º do Decreto n. 2.681/12. Da mesma forma, o expedidor deve especificar quem seja o destinatário, ao menos indicando seu nome e endereço. Nada impede que o destinatário seja o próprio expedidor. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 766 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Há um histórico: Este artigo corresponde ao art. 749 do Projeto de Lei n. 634/75, que utilizava a palavra “condutor”, trocada por “transportador”, conforme subemenda do Relator-Geral Ernani Satyro, na Câmara, na primeira fase de tramitação do projeto. Não há paralelo no Código Civil de 1916.

Para a doutrina de Fiuza, no contrato de transporte de coisas participam o remetente ou expedidor – pessoa que entrega a coisa a ser transportada – e o transportador – pessoa que recebe a coisa, obrigando-se a transportá-la. o destinatário ou consignatário é a pessoa a quem é destinada a coisa. As vezes o expedidor é ao mesmo tempo, destinatário, como no caso em que o remetente envia coisas em seu próprio nome, de um lugar para outro.

A descrição ou especificação da coisa transportada é necessária, para que não se confunda com outras. Para tanto, deve estar caracterizada pela sua natureza, valor, peso, quantidade e o que mais for preciso para determinar sua identificação. O destinatário deve estar indicado, ao menos, pelo nome e endereço, podendo constar outros dados, como nacionalidade, estado civil, número de carteira de identidade, inscrição na Junta Comercial, número no cadastro de pessoas jurídicas etc. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 392 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Para Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o transporte exige que a coisa transportada seja infungível, pois o transportador deve levar ao destino os mesmos bens que recebeu para transportar. A infungibilidade decorre da caracterização da coisa, sendo sua natureza, peso, quantidade e outras características necessárias à sua individuação. Igualmente, o destinatário deve ser indicado com seu nome e endereço. Tal individuação visa ao cumprimento do contrato de transporte, porque quem contrata é o expedidor. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 22.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 744. Ao receber a coisa, o transportador emitirá conhecimento com a menção dos dados que a identifiquem, obedecido o disposto em lei especial.

Parágrafo único. O transportador poderá exigir que o remetente lhe entregue, devidamente assinada, a relação discriminada das coisas a serem transportadas, em duas vias, uma das quais, por ele devidamente autenticada, ficará fazendo parte integrante do conhecimento.

Na pauta de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o conhecimento de transporte, de frete ou de cargas, é o documento que o transportador emite quando recebe a mercadoria a ser transportada. Prova o recebimento da coisa, devidamente identificada, com os dados mencionados no artigo anterior, tanto quanto se identificam as partes envolvidas, assim o expedidor, o transportador e o destinatário, por fim detalhando-se as condições do transporte, tal como o valor do frete, vale dizer, a remuneração devida pelo deslocamento contratado.

O Código Civil remete à legislação especial porquanto, de fato, conforme a natureza do transporte de coisas, inúmeras leis regram a expedição ou emissão do conhecimento de transporte. Por exemplo, o Decreto n. 1.832/96 regula o transporte ferroviário e o conhecimento que dele se expede. Já o art. 235 do Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei n. 7.565/86) cuida do conhecimento de transporte aéreo de carga, discriminando tudo quanto ele deve conter, acrescentando o art. 240 que, por ele, se presume, de forma relativa, a conclusão do contrato, o recebimento da carga e as condições do transporte. Mas bem adverte o art. 226, da mesma normatização, que a falta, irregularidade ou perda do conhecimento de carga não prejudica a existência e eficácia do contrato de transporte, apenas que inviabilizando possa o transportador pretender limitar sua responsabilidade em função do que dele constaria, por exemplo no que toca ao valor da carga, sujeitando-se a eventual arbitramento.

Editada a Lei n. 11.442, de 05.01.2007, tendente a disciplinar o transporte rodoviário de cargas em território nacional, igualmente se dispôs, no art. 6º, sobre a prestação desse serviço sob contrato ou conhecimento de transporte, que deve conter os dados identificativos das partes e do frete. Nada diverso do quanto, antes, para o transporte multimodal (um único contrato de transporte, contudo efetuado por mais de um meio), já se havia levado ao texto dos arts. 8º e 9º da Lei n. 9.611/98. Lembre-se, porém, conforme se acentuou nos comentários ao CC 730, que o contrato de transporte não exige forma especial, pelo que o conhecimento não pode condicionar o seu aperfeiçoamento. Como, do mesmo modo, não se há de olvidar da primazia do regramento geral do CC/2002 acerca do transporte, quando confrontado com a lei especial (CC 732). Apenas que, como está no item da jurisprudência, a seguir, ausente o conhecimento, inverte-se o ônus de provar questões afetas ao conteúdo da mercadoria transportada.

Lembre-se, a propósito, conforme se acentuou já nos comentários ao CC 730, que o contrato de transporte não exige forma especial, pelo que o conhecimento não condiciona seu aperfeiçoamento. O conhecimento de transporte sempre foi considerado um título de crédito, desde o Decreto n. 19.473/30, que regulamentava os conhecimentos de transporte de mercadorias por terra, água ou ar, depois alterado pelos Decretos n. 4.938/42 e Decreto n. 90.959/85, o chamado Regulamento Geral dos Transportes. São títulos impróprios, por que representativos das mercadorias, mas dotados, se não emitidos com a respectiva proibição, portanto com a cláusula não à ordem, da possibilidade de endosso, de tal sorte que o endossatário presume-se o titular das coisas nele discriminadas, ou, na justa advertência de Fran Martins (Contratos e obrigações comerciais, 7. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1984, p. 252-3), titulares do direito de receber ou retirar a mercadoria transportada.

A perda ou extravio do conhecimento enseja procedimento próprio previsto também na lei especial, com aviso que se deve dar ao transportador, para que retenha a mercadoria. A essa matéria se tornará quando do exame do CC 754.

Acrescenta, finalmente, o parágrafo único, do artigo em comento, ser direito potestativo da transportador exigir declaração assinada pelo expedidor, dando conta da discriminação das coisas a serem transportadas. Trata-se de medida de cautela de que pode se valer o transportador, assim garantindo-se contra o eventual transporte de carga ilegal. Uma vez exigida e apresentada a declaração, uma de suas duas vias passa a fazer parte integrante do conhecimento. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 767 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Para a doutrina de Ricardo Fiuza, o conhecimento de transporte, também chamado conhecimento de frete ou conhecimento de carga, prova o recebimento da coisa e da obrigação de transportá-la. no conhecimento, a coisa deve estar identificada, com os dados mencionados no artigo anterior. Lei especial deve mencionar os demais requisitos do conhecimento.

O conhecimento é documento emitido pelo transportador. Está preso ao princípio da literalidade> o que está escrito vale e deve ser cumprido. Os direitos e deveres das partes estão nele consignados, pelo que goza de autonomia. E considerado título de crédito, embora improprio, representando as coisas ou mercadorias objeto do transporte e mencionadas no documento. Em regra, é título à ordem, e, como tal, pode ser endossado; o último endossatário e detentor do conhecimento presume-se titular da mercadoria constante no título. É claro, o conhecimento nominativo com a cláusula “não à ordem” não pode ser endossado.

Para facilitar a elaboração do conhecimento e dar mais segurança à relação entre as partes, o transportador poderá exigir que o remetente lhe entregue, devidamente assinada, a relação discriminada das coisas que serão transportadas, em duas vias. Uma das vias, devidamente autenticada pelo transportador, ficará fazendo parte integrante do conhecimento. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 393 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Sob o prisma de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, “Conhecimento” ou “nota de conhecimento” é o documento emitido pelo transportador ao expedidor, que contenha os dados identificadores da coisa transportada, inclusive o valor dela. O valor declarado da coisa assegura o valor a ser indenizado ao transportador em caso de dano ou extravio, bem como o valor máximo da indenização a ser paga pelo transportador nos mesmos casos (CC 750). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 22.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 745. Em caso de informação inexata ou falsa descrição no documento a que se refere o artigo antecedente, será o transportador indenizado pelo prejuízo que sofrer, devendo a ação respectiva ser ajuizada no prazo de cento e vinte dias, a contar daquele ato, sob pena de decadência.

Na toada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, já se viu, em primeiro lugar, até por conta da responsabilidade a ele afeta, que o transportador pode exigir, por um lado, a devida discriminação, pelo expedidor, das mercadorias que deverão ser transportadas, de suas condições, natureza e características. Por outro lado, como em qualquer contrato, no transporte deve imperar padrão ético de conduta das partes, que, pelo quanto o princípio da boa-fé objetiva lhes impõe, na sua função supletiva, devem cuidar da devida informação sobre o que interesse ao escorreito cumprimento da prestação.

Nesse sentido é que se refere a lei à precisa informação que deve prestar o expedidor sobre as mercadorias a serem transportadas, inclusive de modo que tais dados, levados ao conhecimento de transporte, sejam exatos.

Não se olvide a responsabilidade do transportador e a possibilidade de que ele venha a experimentar algum prejuízo decorrente da incorreção de dados fornecidos pelo expedidor e levados ao conhecimento. Não é diferente a previsão que em lei especial já se continha, como o art. 239 do Código Brasileiro de Aeronáutica sobre o transporte aéreo. Segundo esse preceito, sem prejuízo de sua responsabilidade penal, o expedidor deve responder pela exatidão das indicações e declarações constantes do conhecimento aéreo e pelo dano que, em consequência de suas indicações ou declarações irregulares, inexatas ou incompletas, venha a sofrer o transportador ou qualquer outra pessoa.

Na redação de igual artigo do Código Civil de 2002, este que ora se comenta, o problema está em que se estabelece prazo decadencial para exercício da ação indenizatória pelo transportador que tenha experimentado prejuízo em decorrência das informações imprecisas do remetente – fugindo à regra geral acerca dos prazos de ação de responsabilidade, que são de prescrição, por não envolverem direitos potestativos, estes sim, indutivos do curso de prazo de decadência, segundo o Código Civil de 2002 – de 120 dias, frise-se, contados, segundo a dicção legal daquele ato, sugerindo a possível interpretação de que o termo a quo se contaria da emissão do conhecimento.

Sucede que, mesmo havido dano diretamente oriundo dessas inexatas informações levadas ao conhecimento, como quando o transportador seja apenado pela incorreção, pela irregularidade das condições de peso, por exemplo, o fato constitutivo de seu direito ressarcitório não se terá ostentado já no momento da emissão do conhecimento. Pior, pense-se, pense-se, na exemplificação de Zeno Veloso (Novo Código Civil comentado, coord. Ricardo Fiuza. São Paulo, Saraiva, 2002, p. 672), no transporte de mercadoria inflamável, circunstancia não informada, que se incendeia durante o transporte e causa dano ao transportador.

Evidente que a ação ressarcitória não pode ter seu prazo de propositura iniciado da expedição do conhecimento, supondo-se até que o caso seja de prejuízo diretamente resultante da imprecisão do conhecimento de transporte, já ao que não se acede. De toda a forma, nessas hipóteses não se considera que o termo inicial de contagem de prazo se possa dar antes de havido o prejuízo, cujo ressarcimento se perseguirá com a propositura da demanda indenizatória. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 768 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Com a Doutrina de Ricardo Fiuza, o transporte, como qualquer contrato, é regido pelos princípios de probidade e boa-fé (CC 422). Se o remetente apresenta ao transportador a relação das mercadorias com informação inexata ou falsa descrição destas, o transportador será indenizado pelo prejuízo que sofrer, devendo a ação respectiva ser ajuizada no prazo de cento e vinte dias, a contar da data em que ocorreu o dano, sob pena de decadência.

Para exemplificar, imagine-se o caso de a mercadora ser altamente inflamável, ou de ser facilmente deteriorável, e essas circunstâncias terem sido omitidas pelo remetente, ou, o que é mais grave, terem sido prestadas falas informações a respeito, e, no percurso, por causa dessas qualidades, ocorrer incêndio no navio, no trem, no caminhão etc., ou aparecer estragado ou contaminado o restante da carga. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 393 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Explicam Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, em que situações um transportador pode sofrer prejuízo por informações inexatas do expedidor. Em regra, somente ao indenizar o expedidor valor superior ao que deveria indenizar, em virtude de se ter baseado em falsas informações prestadas pelo expedidor. O dispositivo é pouco operativo, pois, se o transportador discordar do valor declarado pelo expedidor após a perda do bem ele deixará de efetuar o pagamento e, logo, a ação de cobrança competirá ao expedidor. O prazo de 120 dias fica, em última instância, na dependência de ação do expedidor. A rigor, no entanto, não há o menor sentido em se limitar do tempo o direito do transportador de provar que o valor da mercadoria transportada não corresponde ao valor declarado. Em suma, o dispositivo atenta contra a razoabilidade e, ao impedir a restituição integral do dano é inconstitucional. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 22.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 21 de janeiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 740, 741, 742 - DO TRANSPORTE DE PESSOAS - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 740, 741, 742
- DO TRANSPORTE DE PESSOAS - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XIV – Do Transporte – Seção II
Do Transporte de Pessoas - (art. 734 a 742)
 vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 740. O passageiro tem direito a rescindir o contrato de transporte antes de iniciada a viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor da passagem, desde que feita a comunicação ao transportador em tempo de ser renegociada.

§ 1º. Ao passageiro é facultado desistir do transporte, mesmo depois de iniciada a viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor correspondente ao trecho não utilizado, desde que provado que outra pessoa haja sido transportada em seu lugar.

§ 2º. Não terá direito o reembolso do valor da passagem o usuário que deixar de embarcar, salvo se provado que outra pessoa foi transportada em seu lugar, caso em que lhe será restituído o valor do bilhete não utilizado.

§ 3º. Nas hipóteses previstas neste artigo, o transportador terá direito de reter até cinco por cento da importância a ser restituída ao passageiro, a título de multa compensatória.

Na balada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o dispositivo presente trata, a rigor, da desistência do passageiro, em situações diversas, mas de maneira mais abrangente do que dispõe o art. 49 do Código de Defesa do Consumidor, que apenas permite, no prazo de sete dias, arrependimento nos casos de contratação à distância e, conforme interpretação extensiva, de vendas emocionais.

Assim, reforçando-se o quanto já expendido nos comentários ao CC 732, ter-se-á, mesmo nas hipóteses em que o transporte envolva, o que não se dá sempre, de maneira necessária, uma relação de consumo, a aplicação do Código Civil, que, nesta parte, é mais afeiçoado ao comando constitucional de proteção do consumidor (CC 5º, XXXII), à ideia básica de equilíbrio e solidarismo nas relações entre as pessoas, também emanada da Constituição (art. 3º, I­).

Nesta senda, permite o Código Civil de 2002 que o passageiro rescinda – na verdade, tecnicamente um caso de resilição unilateral, porque de verdadeira desistência ou arrependimento (CC 473) – o contrato de transporte, por sua vontade, com consequências diversas conforme a existência de prévia comunicação e o tempo de sua manifestação. Em diversos termos, o artigo em comento cuida da desistência, com consequências diferentes, nas seguintes situações: a) antes de iniciada a viagem, com direito do passageiro à restituição do valor do trecho faltante, mas só se demonstrado que, efetivamente, outra pessoa foi transportada em seu lugar; b) quando já iniciada a viagem, com direito do passageiro à restituição do valor do trecho faltante, mas só se demonstrado que, efetivamente, outra pessoa foi transportada em seu lugar; c) mesmo antes de iniciada a viagem, mas sem comunicação prévia da desistência, com direito à restituição do valor da passagem apenas quando igualmente se comprovar que outra pessoa foi transportada no lugar do desistente.

Nesses casos em que o transportador deve devolver o valor do bilhete, fará jus, como está na lei, à multa de até 5% da importância da restituição. Trata-se de cláusula penal compensatória, pelo que, por um lado, não há antinomia real com o CDC 52, § 1º, que estabelece uma cláusula penal moratória. De outro tanto, não se compreende, se se estatui cláusula penal, por natureza convencional, haver uma estipulação legal, que independa de prévio ato de manifestação de vontade, tanto mais se a lei alude a uma multa de até 5%, portanto o que deverá ser previamente pactuado, aí sim, observado o teto da legislação.

Pelo seu silêncio a respeito, bem como pelo que se poderia inferir da interpretação a contrario sensu do artigo, nos casos de o passageiro, antes da viagem, desistir sem comunicar a tempo de haver substituição, ou de desistir durante o percurso sem provar sua substituição no trecho faltante, ser-lhe-ia imposta a total perda do valor do bilhete. Aliás, o Código Civil foi explícito em caso de desistência sem aviso prévio e sem prova de que houve substituição (§ 2º).

Bem de ver, todavia, que tal orientação não só conflita com o princípio traduzido pela previsão do CDC 53, que pretende vedar a perda total de valores pagos quando inadimplente o consumidor, como, antes, parece não se ajustar aos valores mencionados anteriormente, de equilíbrio e solidarismo nas relações jurídicas, dispostos na Constituição Federal, de que inclusive há exemplos múltiplos no CC/2002, até mesmo quando possibilita a redução, veja-se, de cláusulas penais que o juiz repute excessivas (CC 413). Trata-se de imperativo de equidade que, segundo se entende, determina uma interpretação sistemática, e à luz da Constituição, do artigo vertente, portanto muito além de seu sentido literal.

Por isso se poderá reputar abusiva a perda completa do valor pago, acrescentando-se que a abusividade não consubstancia fenômeno de exclusiva repressão na legislação consumerista, na exata medida em que, como se disse, afronta a ideia, diretamente dimanada da Constituição Federal (art. 3º, I), de equilíbrio nas relações jurídicas, posto se a pondere de forma adequada à eventual formação de vínculo entre iguais. De toda sorte, caberá ao juiz, nessas hipóteses, estimar a extensão da perda do valor da passagem, conforme o prejuízo que possa o passageiro ter causado, mas por qualquer de suas modalidades, por qualquer forma de manifestação. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 763-764 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 21/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo a doutrina apontado por Ricardo Fiuza, a rescisão unilateral do contrato de transporte tem de ser tempestiva. O passageiro pode desistir da viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor da passagem. Mas terá de comunicar o transportador em tempo de ser renegociada a passagem.

Mesmo depois de iniciada a viagem, no meio do percurso, portanto, o passageiro pode desistir do transporte, tendo direito à restituição do valor da passagem correspondente ao trecho não utilizado, desde que fique provado que, em seu lugar, outra pessoa foi transportada no percurso faltante.

O usuário que deixou de embarcar, que não se apresentou na hora determinada para a partida, que, intempestivamente tenha desistido da viagem, não terá direito ao reembolso do valor da passagem, a não ser que prove que outra pessoa foi transportada em sua vaga, e, aí, ser-lhe-á devolvido o valor do bilhete que não utilizou.

Em qualquer dos casos previstos neste artigo, a título de multa compensatória, o transportador terá direito de reter até cinco por cento da importância a ser restituída ao passageiro. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 391 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entendimento de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo dá ao passageiro o direito excepcionalíssimo de rescindir o contrato de transporte antes de iniciada a viagem. Uma vez que o referido direito seja exercido a tempo de o transportador renegociar a passagem, faz jus o passageiro ao reembolso do preço pago, podendo lhe ser descontado o equivalente a 5% do preço a título de multa compensatória.

A desistência da viagem após se ter percorrido determinado trecho dá ao passageiro o direito de obter o reembolso do preço proporcional ao trecho por percorrer, desde que o passageiro prove que outra pessoa foi transportada em seu lugar. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 21.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 741. Interrompendo-se a viagem por qualquer motivo alheio à vontade do transportador, ainda que em consequência de evento imprevisível, fica ele obrigado a concluir o transporte contratado em outro veículo da mesma categoria, ou, com a anuência do passageiro, por modalidade diferente, à sua custa, correndo também por sua conta as despesas de estada e alimentação do usuário, durante a espera de novo transporte.

Sob o prisma de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a regra do artigo presente revela com clareza o risco que o legislador entendeu inerente à atividade de transporte; por isso, impôs-se ao transportador uma responsabilidade independente de culpa e a obrigação, nessa esteira, de concluir viagem iniciada e que se tenha interrompido mesmo que por evento fortuito u de força maior. Em outros termos, e porque lhe é afeta uma obrigação de resultado, caso o transporte se tenha iniciado, é dever do transportador conclui-lo, sempre, mesmo se houver interrupção por fato alheio, que não lhe seja atribuível.

Além disso, impende fazê-lo, à sua custa, nos mesmos moldes do transporte contratado, ou seja, por veículo da mesma categoria, como a lei determina, só se admitindo meio diverso se houver o pacet do passageiro. Até que se implemente o novo transporte para conclusão da viagem, ocasionais despesas com hospedagem e alimentação correm também por conta do transportador. José Maria Trepat Cases (Código Civil comentado, coord. Álvaro Vilaça Azevedo. São Paulo, Atlas, 2003, v. VIII, p. 174-5),  com base inclusive em aresto do STJ, lembra que, em virtude da regra em comento, a qual impõe a responsabilidade dos transportadores pela conclusão da viagem iniciada e interrompida, mesmo pelo casus, é dever de todos eles aceitar o passageiro de outro para dar cabo da exigência legal em comento, sob pena de cumprir perdas e danos. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 764 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 21/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Para Fiuza, em qualquer hipótese, ainda que por caso fortuito, se a viagem for interrompida, o transportador fica obrigado a concluir o transporte contratado em outro veículo da mesma categoria, ou, se o passageiro concordar por modalidade diferente, à sua custa. Durante a espera do novo transporte, correm por conta do transportador as despesas de estada e alimentação do usuário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 391 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Sob o prisma de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o transportador tem o dever de resultado de levar o passageiro e sua bagagem em segurança até o destino acertado. Ele não se desobriga nem mesmo diante da ocorrência de fortuito externo que interrompa a viagem. O CDC 84 (Lei n. 8.078/90) dá ao consumidor o direito de exigir o cumprimento específico da obrigação pelo fornecedor. Caso o transportador não proceda no sentido de reduzir os prejuízos sofridos pelos passageiros, ainda que em razão de fortuito externo, violará seu dever legal e ficará obrigado a indenizar os passageiros pelos danos morais e materiais que sua falta acarretar. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 21.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 742. O transportador, uma vez executado o transporte, tem direito de retenção sobre a bagagem de passageiro e outros objetos pessoais deste, para garantir-se do pagamento do valor da passagem que não tiver sido feito no início ou durante o percurso.

Na toada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, bem de ver, antes de mais nada, que legislação especial, particularmente acerca do transporte de cargas, já conferia ao transportador o direito de reter coisas transportadas como garantia do pagamento do frete. Assim, o próprio Código Comercial, nos arts. 116 e 117, malgrado referindo a uma não mais existente hipoteca tácita, que foi substituída pela noção de direito de retenção (v.g., Martins, Fran. Contratos e obrigações comerciais, 7. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1984, p. 261), dispunha que o transportador podia reter a mercadoria para vendê-la e, com o respectivo produto, ver seu crédito pago. Da mesma forma o vetusto Decreto n. 19.472/30, alterado pelo Decreto n. 19.754/31, previa igual direito ao transportador, de retenção das coisas transportadas.

Trata-se mesmo de uma medida inspirada na equidade, de sorte a equilibrar a relação contratual, permitindo ao transportador que retenha consigo coisa transportada ou bagagem e objetos de passageiros, até ser pago o valor ajustado pelo respectivo transporte. É o que o Código Civil explicita para o transporte de pessoas, à semelhança da retenção que faculta ao hoteleiro, para garantia do pagamento do valor da hospedagem, mas sem erigir um penhor legal, tal qual procede no CC 1.467, I.

A distinção é relevante porquanto, na retenção que se faz para tornar o penhor legal efetivo, há a necessidade de posterior ato judicial homologatório (homologação de penhor legal), o que não ocorre com o direito de retenção, exercitado extrajudicialmente, eis que não é necessária qualquer formalidade homologatória posterior (ver a respeito: Fonseca, Arnoldo Medeiros da. Direito de retenção, 2. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1944, p. 287).

Porém, tanto quanto no penhor legal que tem o hospedeiro sobre a bagagem do hóspede, ou mesmo o do fornecedor de alimento sobre bens do freguês, a ideia do legislador foi garantir de forma especial o pagamento à consideração de que geralmente é desconhecido o usuário do serviço.

O transportador que retém a bagagem ou outros objetos pessoais que estiverem com o passageiro por ocasião do transporte passa a ter sobre a res o dever de custódia, empregando na guarda e conservação a diligência que o exigir a natureza da coisa, aqui, de novo, à semelhança do que se dá com o credor pignoratício (CC 1.435, I). Tem, em contrapartida, porquanto possuidor da coisa, o direito básico de defender essa posse, pela utilização dos interditos, e de ser ressarcido pelas despesas de conservação ou prejuízos decorrentes de ignorados vícios da res. A todo este propósito vale conferir, ainda uma vez, Arnoldo Medeiros da Fonseca (op. cit., p. 267-76).

Veja-se, por fim, que o Código Civil concede ao transportador o direito de retenção apenas para garantia do valor da passagem e não de eventuais danos que o passageiro tenha provocado.  (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 765 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 21/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina de Ricardo Fiuza, no caso de o viajante não ter pago a passagem no início ou durante o percurso, terá de fazê-lo ao final, uma vez executado ou concluído o transporte. Não o fazendo, o transportador tem direito de retenção dobre a bagagem e outros objetos pessoais do passageiro, para garantir-se do pagamento do valor da passagem. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 392 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Concluindo com Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo estabelece o direito de retenção da bagagem do passageiro em favor do transportador para o pagamento da passagem. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 21.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).