sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 795, 796, 797 - continua - DO SEGURO DE PESSOA - VARGAS, Paulo S. R.

Direito Civil Comentado - Art. 795, 796, 797 - continua
- DO SEGURO DE PESSOA - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XV – DO SEGURO DE PESSOA
 – Seção III - (art. 789 a 802) - vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 795. É nula, no seguro de pessoa, qualquer transação para pagamento reduzido do capital segurado.

Na menção de Claudio Luiz Bueno de Godoy, em primeiro lugar, é preciso não olvidar que, no seguro de pessoa, por qualquer de suas modalidades, sobressalta uma especial função previdenciária, mais que ou mesmo sem um caráter indenitário, como no seguro de dano (ver comentário ao CC 789). A particularidade dessa finalidade do seguro de pessoa determina a regra vedatória de qualquer transação que tenha por objeto diminuir o valor do seguro a ser pago. Lembre-se que no seguro de pessoa a fixação do valor segurado se faz de forma apriorística, por estimativa das partes, com base na qual, frise-se, se calcula o prêmio a ser pago. Não se cuida, pois, de estabelecer apenas um teto máximo para indenização do efetivo prejuízo experimentado, como no seguro de dano. Por isso é que a nova lei reputa não se compadecer com a sistemática do seguro de pessoa a transação que reduza o importe do capital segurado a ser pago. Muito menos haveria de se cogitar dessa transação, com o beneficiário, nos seguros de pessoa em que o sinistro é o evento morte, quando o contratante, que é o segurado, responsável pelo pagamento dos prêmios fixados, já não mais sobrevive.

De qualquer maneira, porém, descaberá, em qualquer das formas de seguro de pessoa, dada sua própria natureza e finalidade, a transação que induza o pagamento de capital segurado menor que o contratado. Fulmina a lei tal ajuste com a sansão da nulidade, quando melhor, na observação de Sílvio de Salvo Venosa (Direito civil, 3. ed. São Paulo, Atlas, 2003, v. III, p. 385), será reputá-lo ineficaz, de resto como já se inferia na jurisprudência, levando em conta que o importe pago a menor não extingue a obrigação, cabendo sempre a cobrança da diferença em relação à quantia total do segurado. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 823 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 14/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Aponta Fiuza em sua doutrina que, pelo art. 1.442 do CC de 1916, se às partes seria lícito ficar entre si a taxa do prêmio e, na hipótese, de seguro feito em companhia que adote tabela de prêmio, presume-se que o valor do seguro esteja na conformidade do com ela proposto e aceito. Nesse caso, as tabelas integram o próprio contrato e, celebrado este, entende-se que as partes aceitaram e aderiram, voluntariamente, às respectivas taxas.

Observa-se daí que o segurado e o segurador estão obrigados a preservar a boa-fé, a lealdade e a veracidade, assim a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes; todos os contratos, desenganadamente, devem respaldar-se na boa-fé e na honestidade, mas, no de seguro, sobreleva a importância desse elemento, porque, em regra, funda-se precipuamente nas mútuas afirmações das próprias partes contratantes.

Nessas condições, não é legítimo à seguradora transacionar com o beneficiário visando à diminuição do capital segurado, pois seria juridicamente inconcebível substituir a vontade do segurado, a esta altura já falecido, conferindo interpretação ampliativa ao contrato, ou melhor, mudando-lhe o alcance ou oferecendo-lhe destinação diversa daquela que resulta do seu texto originário, máxime quando esta puder efetivamente traduzir intenção diversa da que almejava o segurado. Justamente por se tratar de verdadeiro direito indisponível do segurado, é vedado qualquer tipo de transação para diminuir o pagamento do capital segurado. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 419 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 14/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No balanço de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, se houver litígio quanto ao direito à indenização, o dispositivo veda que as partes transacionem quanto ao valor desta. A proibição visa a desestimular o não pagamento da indenização quando devida. A nulidade é absoluta, fundada em razão de ordem pública e se a transação, não obstante, vier a ocorrer, a nulidade dela garante ao beneficiário reclamar diferença. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 14.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 796. O prêmio no seguro de vida, será conveniado por prazo limitado, ou por toda a vida do segurado.

Parágrafo único. Em qualquer hipótese, no seguro individual, o segurador não terá ação para cobrar o prêmio vencido, cuja falta de pagamento, nos prazos previstos, acarretará, conforme se estipular, a resolução do contrato, com a restituição da reserva já formada, ou a redução do capital garantido proporcionalmente ao prêmio pago.

Recorda Claudio Luiz Bueno de Godoy que, mesmo sem a explicitação contida no art. 1.471 do Código Civil de 1916, continua a se admitir que o segura de pessoa sobre a vida do segurado compreenda, basicamente, duas hipóteses: os seguros em caso de morte e os seguros em caso de sobrevida. No primeiro caso, obriga-se o segurador a pagar um capital ou uma renda, ou ambos, ao beneficiário, por ocasião do evento morte do segurado; no segundo, ao segurado, se a vida ultrapassar um termo fixado no contrato.

O Código de 2002, no artigo em pauta, mencionou apenas o seguro de vida, propriamente, deixando de aludir ao chamado seguro de sobrevivência, como o fazia o antigo Código, na parte final do art. 1.471. entretanto, isso não significa excluir a possibilidade, ainda, de sua contratação, nunca vedada pelo CC/2002, não olvidando que a matéria é de autonomia privada (v.g., Caio Mário Silva Pereira. Instituições de direito civil, II. ed., atualizada por Regis Fichtner, Rio de Janeiro, Forense, 2004, v. III, p. 464). O que faz o atual Código, no caput do artigo em discussão, é estabelecer a possibilidade de, nos seguros de vida, se convencionar o pagamento do prêmio por certo prazo ou pela vida do segurado, sem a adstrição à anualidade, como constava do art. 1.471 do Código de 1916. O parágrafo único do mesmo artigo determina como que uma potestativa prerrogativa de desistência para o segurado, quando o seguro de vida seja contratado de forma individual.

A propósito é bom lembrar que os seguros de vida podem ser em grupo, ou seja, em que um estipulante age como mandatário dos segurados, instituindo cobertura do evento morte para pagamento do capital ou renda a um beneficiário indicado; em regra, é contratado de forma temporária, com renovações ao cabo de períodos previamente ajustados. Já os seguros individualmente contratados, ao revés, em geral voltam-se a períodos de longa duração, mesmo para os casos de sobrevida, tanto mais para os casos de morte, como observa João Marcos Brito Martins (O contrato de seguro. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2003, p. 143), a se ver prevendo-se, então, verdadeira possibilidade de desistência do segurado quando se subtrai do segurador, em caso de não pagamento do prêmio, a ação de cobrança, deferindo-lhe a lei, tão somente, e conforme o estipulado, ação de resolução do ajuste, com devolução da provisão de capital já formado, e abatidas as perdas causadas ao fundo constituído (ver, a respeito, comentário ao artigo seguinte), ou redução do capital garantido, proporcionalmente ao prêmio pago. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 824 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 14/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Ricardo Fiuza aponta os ensinamentos de Orlando Gomes, “o seguro de vida propriamente dito é o contrato mediante o qual o segurador se obriga a, por morte do segurado, pagar determinada quantia a quem este designar” (Contratos. 8. ed., Rio de Janeiro, Forense, 1981, p. 438). A par dessa conceituação, tem-se que, tanto o seguro pode ser concebido tendo em vista a morte do segurado, como também para o caso de sua sobrevivência.

Dessa maneira, podem-se distinguir duas espécies de seguro de vida: a) quando o segurado morrer, o segurador assume a obrigação de pagar determinada quantia ao beneficiário; e b) o que tem como evento eclotivo a sobrevida do segurado a uma data prefixada, ou seja, trata-se de uma condição suspensiva, sendo certo que o pagamento do prêmio fica condicionado a um evento futuro e incerto, qual seja o de o segurado ultrapassar determinada faixa etária. Na primeira hipótese, estamos diante do seguro de vida stricto sensu, que pode constituir-se por lapso temporal determinado, ou prolongar-se por toda a vida do segurado; na segunda, perfaz-se o chamado “seguro de sobrevivência”, cujo risco reside na sobrevida do segurado a uma data-limite. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 419 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 14/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Para Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o valor do prêmio e sua forma de pagamento são livremente estipulados pelas partes. O seguro de vida pode ser contratado por prazo determinado ou indeterminado e, neste caso, pode ser estabelecido pelas partes que o prêmio seja pago em parcelas periódicas, durante toda a vigência do contrato.

A falta de pagamento do prêmio acarreta a perda do direito à indenização e a resolução do contrato que opera ex lege, independentemente de notificação do devedor.

É possível que o seguro seja acompanhado da formação de reserva a ser resgatada pelo próprio segurado em certas condições. O contrato deve prever o destino a ser dado a tal reserva, se será restituída ao segurado, se será perdida em favor da seguradora ou se garantirá ao segurado a continuidade da garantia com a redução da indenização. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 14.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 797. No seguro de vida para o caso de morte, é lícito estipular-se um prazo de carência, durante o qual o segurador não responde pela ocorrência do sinistro.

Parágrafo único. No caso deste artigo o segurador é obrigado a devolver ao beneficiário o montante da reserva técnica já formada.

No raciocinar de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o dispositivo, diga-se em primeiro lugar, refere, dentre as hipóteses de seguro sobre a vida do indivíduo (veja comentários ao CC 794 e ao artigo anterior), aquele em que se cobre o evento morte, real ou presumida, na forma do CC 7º (quanto à ausência, veja referencia no CC 794). Nesse caso, estabelece a possibilidade de instituição de um prazo de carência, ou seja, interregno dentro do qual, persistente a obrigação de pagamento do prêmio, e mesmo havido o sinistro, não haverá pagamento do capital segurado. É certo que tal contingência depende, fundamentalmente, de ajuste das partes. A lei não impôs, obrigatoriamente, prazo de carência, nem esse prazo pode ser fixado de maneira excessiva, de moro a, configurando abuso, desnaturar a garantia que se quer contratar com o seguro. Pense-se, por exemplo, na hipótese de entabulação por pessoa já idosa e fixação de longo prazo de carência, então quase a afastar, de antemão, a cobertura de sinistro que se venha a dar. Trata-se, porém, de questão casuística, a ser apreciada pelo juiz na hipótese concreta.

Fato é, todavia, que, havido o sinistro do prazo da carência, e embora desobrigado o segurador de pagar o capital estipulado, deverá reembolsar ao segurado o montante da reserva técnica já formada. Essa reserva ou provisão técnica, também mencionada no parágrafo único do artigo anterior, vem prevista nos arts. 28 e 84 do Decreto-Lei n. 73/66, definindo-se, nos seguros de vida individuais, e não nos de grupo, conforme a lição de João Marcos Brito Martins (O contrato de seguro. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2003, p. 143-4), como uma parcela do prêmio, um plus que, fora do cálculo do risco em si, se destina a constituir um depósito garantidor não só do cumprimento das obrigações da seguradora, mas, antes, uma provisão que permite nivelar o prêmio a ser pago, sem permanente e constante alteração de seu valor, correspondente ao aumento de idade do segurado, ampliando-se, assim, o risco de sinistro. Quer dizer, seria uma forma de viabilizar o plano com prêmios nivelados, equilibrados, com reajustes episódicos, sem sucessivos aumentos diante do crescimento da idade do segurado. A questão, porém, é a devida informação ao segurado sobre esse montante, sem o que a devolução deverá se fazer pelo cálculo dos prêmios pagos, abatido quanto se provar despendido à gestão do fundo que o seguro encerra. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 824 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 14/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, o reportado dispositivo vem proteger a figura do segurador, colocado, não raras vezes, em posição inferior à do segurado. Como uma forma de possibilitar àquele um espaço de tempo para se reorganizar financeiramente, a lei faculta às partes interessadas estipularem um prazo de carência, isentando-o, nesse ínterim, de pagar a indenização pela ocorrência do sinistro. Somente ao cabo desse período é que o beneficiário poderá acionar o segurador para o cumprimento da obrigação. Nesse caso excepcional estará o segurador, todavia, obrigado a devolver ao beneficiário toda a quantia da reserva técnica já formada. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 420 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 14/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a fim de se precaver contra riscos já existentes na época da contratação, que o segurado já conhecia ou não, e que acarretam a prematura ocorrência do sinistro, pode a seguradora estabelecer prazo de carência que, como termo inicial, impede a eficácia da obrigação de indenizar até que seja ultrapassado.

Se o contrato contiver previsão de formação de reserva técnica essa deverá ser devolvida ao estipulante ou a seus herdeiros caso o óbito do segurado ocorra antes de ultrapassado o referido prazo. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 14.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 792, 793, 794 - continua - DO SEGURO DE PESSOA - VARGAS, Paulo S. R.

Direito Civil Comentado - Art. 792, 793, 794 - continua
- DO SEGURO DE PESSOA - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XV – DO SEGURO DE PESSOA
 – Seção III - (art. 789 a 802) - vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 792. Na falta de indicação da pessoa ou beneficiário, ou se por qualquer motivo não prevalecer a que for feita, o capital segurado será pago por metade ao cônjuge não separado judicialmente, e o restante aos herdeiros do segurado, obedecida a ordem da vocação hereditária.

Parágrafo único. Na falta das pessoas indicadas neste artigo, serão beneficiários os que provarem que a morte do segurado os privou dos meios necessários à subsistência.

Nos termos de Claudio Luiz Bueno de Godoy, como se viu nos comentários ao artigo anterior, a escolha do beneficiário, pelo segurado, é livre, com a ressalva contida no artigo seguinte. Pode essa escolha se dar logo no instante da entabulação ou em momento posterior, inclusive por substituição, também como está no dispositivo antecedente. Cuida-se aqui, porém, da hipótese de faltar, por qualquer motivo, o beneficiário de seguro de vida, portanto quando já também falta o segurado, impondo-se à lei deliberar sobre o destino da importância a ser por isso paga. E, nessa senda, diferentemente do Código de 1916, determina a nova lei que então metade do capital segurado seja entregue ao cônjuge não judicialmente separado do segurado e a outra metade a seus herdeiros, conforme a ordem legal de vocação hereditária (CC 1.822). a inovação, em relação ao Código revogado, está no acréscimo do cônjuge como destinatário de metade da verba do seguro, independentemente do regime de bens do casamento. Exige-se, todavia, que esse casamento, ao tempo da morte, ainda persista, portanto, afastando-se a previsão se houver dissolução da sociedade conjugal por separação judicial.

Omite-se, contudo, o artigo em pauta sobre a situação do separado de fato. Veja-se que tal não se deu nem mesmo quando se tratou da situação hereditária do cônjuge, cuja vocação sucessória se condicionou à não ocorrência, ao instante da morte, inclusive de separação de fato, há mais de dois anos, a não ser que sem culpa do sobrevivente. Da mesma forma, no CC 1.642, V, quando se regrou a reivindicação de bem comum doado por cônjuge casado a seu concubino, ressalvou-se a separação de fato já existente, porém, há mais de cinco anos. Pois também na hipótese do dispositivo em discussão, ao que se entende, deve-se ressalvar a separação de fato. Observe-se que a instituição, por lei, de beneficiários subsidiários, atende a um imperativo de solidariedade familiar. É por isso que, além dos herdeiros, hoje o cônjuge é elencado coo tal. Mas, se havida, comprovadamente, separação de fato, rompido está o laço de afetividade que constitui, atualmente, o conteúdo material do casamento. Não por outro motivo é que se permitiu, depois de dois anos dessa separação, o divórcio direto. Não se vê sentido, destarte, em destinar metade do capital segurado a quem, no instante da morte, já estava separado de fato do segurado, mesmo que então já lhe fosse dado estabelecer, como beneficiário, eventual companheiro (CC 793).

Aliás, outra omissão do preceito, que não há, por exemplo, na lei previdenciária (Lei n. 8.213/91) e na lei fiscal (Lei n. 9.250/95), está justamente na indicação do companheiro como beneficiário subsidiário, da mesma forma que como tal se institui o cônjuge, do ponto de vista material, havendo igual família no casamento e na união estável, que, afinal, pode ser provada, embora não da mesma maneira apriorística do casamento, porquanto com a apresentação da certidão do respectivo assento. Contudo, note-se que a lei também inclui o companheiro, malgrado em diferentes condições – o que é objeto de proposta de alteração (ver Projeto de Lei n. 276/2007) -, no rol dos sucessores do morto. Por isso, e mesmo que possa haver sua instituição por ato de vontade do segurado (CC 793), entende-se, por interpretação extensiva, dever-se considerar o companheiro, provada a união estável, com todos seus elementos de configuração, ao momento da morte, beneficiário subsidiário do segurado morte, portanto nas mesmas condições do cônjuge não separado.

A outra metade do capital segurado, como explicita a lei, vai aos herdeiros do segurado falecido, na ordem da respectiva vocação hereditária. Não havendo cônjuge, companheiro nem herdeiros, em geral, receberá o capital segurado quem comprovar que dependia do segurado e que, assim, com sua morte, ficou privado dos meios necessários à subsistência. Considera-se não se deva dar a essa previsão, também nova, contida no parágrafo do artigo em pauta, interpretação restritiva, exigindo, por exemplo, que o beneficiário seja parente do segurado, bastando que comprove dele depender para sua subsistência. Pense-se no caso de alguém cujas necessidades o segurado voluntariamente provia, mesmo sem dever legal. De seu turno, José Augusto Delgado (Comentários ao novo Código Civil, coord. Sálvio Teixeira de Figueiredo. Rio de Janeiro, forense, 2004, v. XI, t. I, p. 741) exemplifica com os menores não parentes, os incapacitados, os serviçais de idade avançada, enfermeiros e assim por diante – sempre, porém, provado que o sinistro lhes tenha retirado os meios de subsistência.  (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 820-821 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Há um histórico antecedendo a Doutrina de Ricardo Fiuza: A redação atual é a mesma do projeto. O CC/2002, a rigor, desmembrou o vetusto art. 1.473 do CC de 1916, em dois novos artigos, quais sejam os CC 791 e CC 792. A redação deste último dispositivo identifica-se, parcialmente, com a do art. W do Decreto-Lei n. 5.384, de 8-4-1943, que dispõe sobre os beneficiários do seguro de vida, assim transcrito, in litteris: “Art. I- Na falta de beneficiário nomeado, o seguro de vida será pago metade à mulher e metade aos herdeiros do segurado. Parágrafo único. Na falta das pessoas acima indicadas, serão beneficiários, os que dentro de seis meses reclamarem o pagamento do seguro e provarem que a morte do segurado os privou de meios para proverem sua subsistência. Fora desses casos, será beneficiária a União”.

Aplicando a Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, em se tratando de seguro de vida, é certo que a livre escolha dos beneficiários constitui, por sua própria natureza, preceito basilar dessa espécie de seguro. Por isso, diz-se que o segurado pode, legitimamente, preterir os próprios parentes, em favor de estranhos. É lícito, porém, ao segurado não indicar, desde logo, o nome do beneficiário, ou, fazendo-o, por alguma razão, não prevalecer tal nomeação; nessas duas hipóteses negativas, a lei determina seja o montante segurado pago, pela metade, ao cônjuge não separado judicialmente, revertendo-se a outra metade aos herdeiros do segurado, obedecida, obviamente, a ordem da vocação hereditária.

O novel dispositivo privilegia o chamado “beneficiário subsidiário”, quando, na ausência de individuação do beneficiário, coloca o cônjuge, desde que não separado judicialmente, em posição favorável quanto aos demais herdeiros do segurado, à medida que lhe garante, separadamente, o seu respectivo quinhão (1/2 do capital segurado), deixando os demais herdeiros, considerados num todo, com a outra metade do montante.

Estando o cônjuge falecido, ou separado judicialmente do segurado, aliado à ausência de qualquer herdeiro deste último, beneficiar-se-ão aqueles que necessitassem do segurado para sua própria subsistência, desde que provem, efetivamente, tal dependência econômica, como condição sine qua non para receber o seguro. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 417 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a indicação do beneficiário não é obrigatória. Se o estipulante não indicar beneficiário, a lei presume que o seguro foi contratado em favor do cônjuge e dos demais herdeiros do segurado. Cabe a analogia com o cônjuge em favor do companheiro.

O dispositivo manda que seja obedecida a ordem de sucessão hereditária. Assim, a existência de descendentes exclui os ascendentes e os colaterais até o 4º grau somente se beneficiam na falta daqueles. A referencia à ordem de vocação hereditária atrais, embora a lei não seja expressa, a observância da proporção a que faz jus os herdeiros beneficiários. Assim, o cônjuge, além de receber a metade do benefício, fará jus, ainda, a uma parte equivalente ao que lhe permitir o direito de concorrer na herança, se incidente. Do mesmo modo, casos netos participem da herança representação, farão jus apenas à parte do herdeiro pré-morto que representarem.

Finalmente, se não houver indicação de beneficiários nem herdeiros, o Código permite que terceiros que ficaram privados do necessário para a sua subsistência em razão da morte do segurado possam reivindicar a indenização. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 13.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 Art. 793. É válida a instituição do companheiro como beneficiário, se ao tempo do contrato o segurado era separado judicialmente, ou já se encontrava separado de fato.

Como leciona Claudio Luiz Bueno de Godoy, no Código Civil de 1916, dispunha-se, no art. 1.474, ser vedada a instituição de beneficiário que estivesse inibido de receber, por doação, do segurado. Era o caso, muito especialmente, da doação feita pelo cônjuge casado a seu concubino, regra que se continha no art. 1.177 do Código anterior e que se repete no CC 550 atual. No artigo em pauta, a rigor, implicitamente contempla-se a mesma proibição, mas com a ressalva que em seu texto se expressa. Na verdade, até o artigo diz mais do que precisava, pois o atual Código foi claro ao diferenciar, nos CC 1723 e 1.727, o companheiro do concubino. Para a nova lei, o companheiro mantém união estável, o antigo concubinato puro, destarte envolvente de pessoas sem impedimento para se casar, incluindo, no entanto, o separado de fato (CC 1.723, § 1º), que, certamente, com o divórcio direto, poderá vir a se casar, de resto já com a separação de fato rompendo-se o laço fundamental do casamento, a relação de afetividade que é seu conteúdo material. Quer-se dizer, então, que, se se trata de companheiro, necessariamente será pessoa solteira, divorciada, separada judicialmente ou mesmo de fato. E o companheiro não só não está inibido de receber doação, como, mais, pode ser instituído beneficiário do seguro de vida do segurado com quem mantém união estável.

Já se o segurado, ao tempo da instituição, era casado, não separado judicialmente nem de fato, para preservar tal relação, proíbe-se a instituição como beneficiário do seguro de quem então será considerado seu concubino (CC 1.727). Ressalva-se, contudo, a posição externada na obra de Caio Mário da Silva Pereira, atualizada por Régis Fichtner (Instituições de direito civil, 11. ed. Rio de Janeiro, forense, 2004, v. III, p. 465), de que, a rigor, a verificação sobre a situação civil do segurado deve ser contemporânea não ao contrato, mas ao instante da morte; assim, se no momento do falecimento o beneficiário se encontrava separado de fato ou judicialmente, terá sido como que convalidada a instituição. Se esta não é a ilação literal da redação do dispositivo, parece razoável ao menos que, a exemplo do que consta do CC 550 atual e como já se defendia à luz do art. 1.474 do Código anterior (v.g., J.M. Carvalho Santos. Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1951, v. XIX, p. 407), se restrinja ao cônjuge, ou a seus herdeiros necessários, a legitimidade exclusiva para questionar o seguro feito ao concubino, à simetria, veja-se, com aquela regra do CC 550. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 822 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em sua doutrina, explica Ricardo Fiuza que, no Código Civil de 1916 não se admitia que o beneficiado pelo seguro de vida fosse pessoa a quem o segurado não pudesse ofertar a sua liberalidade (v.g., concubina do segurado casado), tampouco seria lícito, segundo escólio jurisprudencial, o segurado indicar como beneficiário do seguro o filho adulterino, ao argumento de que, presumidamente, este transferiria o beneficia à sua mãe (arts. 1.474 e 1.177). conferir: RI’ 422/335.

Com o advento da Carta Magna de 1988, denominada pelo saudoso Ulysses Guimarães, “Constituição Cidadã’, é evidente que tais restrições ruíram por terra, em homenagem aos princípios constitucionais nela albergados. Como ressabido, foi no campo do Direito de Família que a Constituição Federal, havendo incursionado com maior profundidade, veio de reclamar do codificar civil uma nova regulamentação, operando-se, de fato, as novas regras, com destaque marcante, no efeito da presente análise, para a seguinte linha inovativa: a família passou a ser reconhecida e protegida, independentemente do casamento (CC 226, caput e § 32), muito embora a entidade familiar, oriunda de união estável, não alcance a qualificação jurídica inerente àquela relação.

Realmente, a partir da Constituição de 1988, o modo da constituição familiar não se tornou exclusivo da união originária do casamento, sendo, igualmente, modelos de família a união estável entre o homem e a mulher, admitida, em toda a sua inteireza, como entidade familiar, e a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes (CC 226, §§ 32 e 42). Por tais razões, a norma confere atualidade constitucional à matéria ora tratada. Dessarte, reconhece-se a união estável como condição de assegurar ao companheiro o direito ao benefício, desde que respeitados os requisitos exigidos no caput. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 418 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na toada de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o Código Civil de 2002 resulta do Anteprojeto preparado pela Comissão Reale em 1969. Embora tenha havido a adaptação do projeto de modo a adaptá-lo à Constituição de 1988, muitos de seus dispositivos deixam transparecer noções incompatíveis com o direito atual.

O dispositivo estabelece a validade da instituição do companheiro como beneficiário. Contemporaneamente, tal faculdade legal é redundante, uma vez que a união estável goza de proteção estatal. Mais do que poder ser indicado como beneficiário, ao companheiro deve-se dar tratamento análogo ao que é dado pele ao cônjuge em matéria de seguro, inclusive a presunção de que seja beneficiário se nenhum tiver sido indicado.

A condição de ser o companheiro separado judicialmente ou separado de fato é redundante, pois predomina o entendimento, baseado no próprio Código Civil, que a união estável somente é possível uma vez que não concorra com o casamento.

Gradativamente, no entanto, tem-se reconhecido a existência de uniões paralelas. Se o impedimento é do desconhecimento do companheiro, tem-se a união estável putativa, que não impede o reconhecimento da condição de companheiro. Consequentemente, não incide a proibição do artigo. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 13.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 794. No seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito.

Lecionando, Claudio Luiz Bueno de Godoy, explicitando o conteúdo do art. 1.475 do Código Civil de 1916, que, como aponta Clóvis Beviláqua (Código Civil comentado, 4. ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1939, v. V, p. 237-8), havia sido já objeto de polêmica na tramitação do projeto, acentua o atual Código que, nos seguros de pessoa em que o sinistro seja o evento morte, real ou presumida – discutindo-se, nesse caso, se só aquela do art. 7º ou também a ausência (pela orientação positiva, veja João Marcos Brito Martins. O contrato de seguro. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2003, p. 145) -, referindo, portanto, dentre as diversas hipóteses de cobertura pessoal, (invalidez, educacional, por sobrevivência), o seguro de vida e de acidentes pessoais, no caso de falecimento do segurado, o capital estipulado não se considera herança, para todos os efeitos. Isso porque, nessas hipóteses, ocorrido o sinistro, o capital segurado pertence a um beneficiário que é necessariamente um terceiro. ou seja, segurado e beneficiário, nesses casos, obviamente não podem ser uma só pessoa. E, sendo assim, tratando-se de valor pertencente ao beneficiário, não se sujeita às dívidas do segurado nem se considera herança, pois, se instituído, pelo contrato, em favor de um herdeiro necessário, por exemplo, não está submetido à colação. Não por diverso motivo a previa o art. 649, VI, do Código de Processo Civil, ser impenhorável o seguro de vida. Apenas há a se ressalvar o entendimento, que já se esposava antes do atual Código, de que pelos prêmios atrasados responde o capital segurado, mesmo no seguro de via, uma vez que, afinal, é a fonte de seu custeio ou da composição do fundo que o suporta (ver comentário ao CC 757). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 822 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo a doutrina de Fiuza, pela simples leitura desse dispositivo, percebe-se, claramente, que a verba oriunda de segura não está sujeita à execução, não podendo, ipso facto, ser dada em garantia, porque impenhorável (art. 649, IX, do CPC/1973, com correspondência no art. 833, do CPC/2015).

Noutro prumo, porém, a jurisprudência tem averbado que “é lícito estipular que a soma do seguro responda pelo pagamento dos prêmios atrasados ou empréstimos feitos pelo próprio segurado sobre a apólice” (RT, 131/725).

Além da vedação da penhora, o capital estipulado não se comunica com a herança, para os efeitos legais. Trata-se de previsão legítima e razoável, ou, porque não dizer, inteiramente lógica. Ora, a inclusão do montante, estipulado no seguro, no acervo hereditário, colocando o beneficiário, quanto a essa estipulação, em igualde de condições com os demais herdeiros, representaria um verdadeiro contrassenso. É que, se o segurado almeja privilegiar o beneficiário, com a antedita estipulação, este passaria a repousar numa situação assaz desvantajosa, à medida que concorreria com todos os herdeiros do segurado para receber o prêmio, desvirtuando, por completo, a essência da doação.

Em verdade, ocorrendo o sinistro, que, nesse caso, seria a morte do segurado, o prêmio deve reverter-se, sem dúvida, em favor do beneficiário, já que, a rigor, aquele montante jamais integrou o patrimônio do segurado para ser considerado como parte da herança por este último deixada. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 418 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No vislumbre de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a indenização consiste em direito subjetivo do beneficiário. Não compõe o patrimônio do segurado. Em razão disso, a indenização não fica sujeita a cobrir eventuais dívidas do segurado. Do mesmo modo, não compõe a herança. Sobre ela não há incidência de imposto de transmissão causa mortis, nem direitos dos herdeiros, salvo se não houver indicação de beneficiário. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 13.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 789, 790, 791-continua - DO SEGURO DE PESSOA - VARGAS, Paulo S. R.

Direito Civil Comentado - Art. 789, 790, 791 - continua
- DO SEGURO DE PESSOA - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XV – DO SEGURO DE PESSOA
 – Seção III - (art. 789 a 802) - vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 789. Nos seguros de pessoas, o capital segurado é livremente estipulado pelo proponente, que pode contratar mais de um seguro sobre o mesmo interesse, com o mesmo ou diversos seguradores.

No lecionar de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a partir deste artigo, o Código Civil de 2002 se dedica ao regramento do seguro de pessoa, tratado separadamente do seguro de dano, dada a diversidade de características de um e outro. Com efeito, data de longe a discussão sobre se ao seguro de pessoa seria aplicável o princípio indenitário, muitos recusando se possa mesmo falar em indenização, no caso de ocorrência de sinistro (ver, para histórico da doutrina a respeito, Pedro Alvim. O contrato de seguro. Rio de Janeiro, forense, 1999, p. 447-53). Tudo porque, a rigor, são inestimáveis a vida e a integridade pessoal do indivíduo, acerca do que se contrata o seguro. Quando muito, cogitar-se-ia não da reparação de um dano havido, na extensão desse prejuízo experimentado, mas da recomposição da perda de uma vantagem que a cessação (ver comentário ao CC 794 sobre casos de morte, real ou presumida) ou deterioração da vida humana representa (cf. Clóvis Beviláqua. Código Civil comentado, 4. ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1939, v. V. p. 202). De qualquer forma, mesmo aceitando que, no seguro de pessoa, a contratação se volte à garantia do indivíduo contra os riscos a sua existência ou integridade, portanto ainda um dano, decerto que o valor a ser pago diante da ocorrência do sinistro se fixa a forfait, ou seja, aprioristicamente, conforme entabulado pelas partes. Não há, este o dado relevante, a limitação ao valor do interesse segurado, porquanto inestimável, justamente pelo que se pode contratar mais de um seguro, com o mesmo ou com diferente segurador. Daí, para muitos, não se falar, no seguro de pessoa, em princípio indenitário.

Certo é que, de todo modo, o importe segurado não encontra restrição outra que não na estimação das próprias partes contratantes. Fixa-se livremente um capital, uma soma, a que corresponde o pagamento do prêmio e que será entregue tão logo comprovada a ocorrência do sinistro. Ou seja, inexiste, como no seguro de dano, qualquer necessidade de avaliação da extensão do prejuízo a ser indenizado. Paga-se o valor arbitrado pelas partes. É, enfim, o que o Código anterior já estabelecia, malgrado referindo, no art. 1.441, apenas o seguro de vida, mas que o artigo em pauta estende a qualquer seguro de pessoa, de vida ou de acidentes, tão somente ressalvando-se, no CC 802, o seguro para garantia de reembolso de despesas médico-hospitalares (seguro-saúde regrado por lei própria, como se verá adiante nos comentários ao dispositivo citado) e o seguro para garantia das despesas com luto e funeral do segurado. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 817-818 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 12/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo o histórico, a redação atual é a mesma do projeto. Trata-se de mera repetição do art. 1.441 do Código de 1916, com pequena mudança redacional. O antigo texto era o seguinte: “Art. 1.441. no caso de seguro sobre a vida, é livre às partes fixar o valor respectivo e fazer mais de um seguro, no mesmo ou em diversos valores, sem prejuízo dos antecedentes”. Essa seção, no Código Civil de 1916, era denominada “Do seguro de vida” (arts. 1.471 a 1.476): agora, no entanto, passa a ser “Do seguro de pessoa”.

Para a doutrina de Ricardo Fiuza, o capital é livremente estipulado pelo proponente, porque difere do seguro da coisa, em que pelo princípio indenitário a indenização há de corresponder a um valor certo do dano sofrido pelo segurado. Em segundo de pessoa, esse princípio não é aplicável, e sim o previdenciário, porquanto o prejuízo é abstrato, a garante é contra os riscos de morte, de perigo à sua integridade física, de quebra e comprometimento da saúde, e de acidentes dos mais variados, aos quais se acha sujeito o segurado, e, afinal, o valor da vida é inestimável, por isso, resulta possível contratar mais de um seguro sobre o mesmo interesse, com o mesmo ou mais de um segurador. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 416 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 12/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No dizer de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o contrato de seguro de danos tem como princípio impedir o enriquecimento sem causa do segurado e, por isso, seu valor é limitado pelo valor do bem segurado.

No seguro de pessoa, seja o seguro de vida ou o de danos à pessoa não é possível o estabelecimento de limite em razão do valor do bem assegurado, uma vez que nem a personalidade nem qualquer de seus atributos são passiveis de valoração econômica.

O seguro de pessoa visa a conceder uma compensação pelo dano causado à pessoa. A liberdade das partes para estabelecer o valor da indenização nesses casos é ampla. Por esse mesmo motivo, nada obsta que o proponente contrate mais de um seguro sobre o mesmo interesse. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 12.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 790. No seguro sobre a vida de outros, o proponente é obrigado a declarar, sob pena de falsidade, o seu interesse pela preservação da vida do segurado.

Parágrafo único. Até prova em contrário, presume-se o interesse, quando o segurado é cônjuge, ascendente ou descendente do proponente.

Para Claudio Luiz Bueno de Godoy, já desde o Código Civil de 1916 era possível entabular contrato de seguro sobre a vida de outrem, portanto que não a do próprio proponente. Ou seja, já se permitia fosse o seguro contratado sobre a própria vida ou sobre a vida de terceiro, apenas que, nessa última hipótese, sob pena de não valer o seguro, o proponente era obrigado a declarar seu interesse pela vida que se garantia, com a entabulação. Esse é o mesmo princípio insculpido no artigo em pauta. Sua redação foi modificada, mas não seu conteúdo. A ideia é a de viabilizar o seguro que compreenda a vida de terceiro, desde que demonstrado que quem realiza o contrato tem interesse na preservação da existência da sobrevivência daquele, cuja vida se segura. Quer dizer, é preciso ficar demonstrado que o proponente não quer ou torce pela morte do segurado. Caso contrário, estaria aberto caminho para contratações ilícitas, em que se apostasse no falecimento de outrem, a fim de que sobreviesse o pagamento de verba securitária assim especulativa.

Em diversos termos, o contratante deve justificar seu móvel à contratação, declarando concretamente por qual razão interessa-lhe, ao revés, a sobrevivência do terceiro. é o caso de fazer seguro o dependente econômico sobre a vida daquele de quem dependa, do credor a respeito da vida do devedor ou do sócio sobre a vida de outro sócio, nos exemplos de Carvalho Santos (Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1951, v. XIX, p. 397). Não se exigiu, como em outras legislações, que o terceiro consentisse na contratação, como também, ao que se entende, não se dispensou a declaração aqui examinada, acaso havido aquele consentimento. A finalidade da norma, afinal, é evitar seguros ilícitos, com risco à vida do terceiro, advindo do interesse do beneficiário na ocorrência do sinistro.

Como está no parágrafo único, presume-se haver interesse na preservação da vida do terceiro quando este for cônjuge, ascendente ou descendente de quem contrata o seguro, pretendendo-se a esse rol, com ampla razão, incluir o companheiro (Projeto de Lei n. 276/2007, já de alteração do Código Civil), o que deve prevalecer desde que, nesses casos, a relação afetiva existente leve à admissão, a priori, de que existente interesse na sobrevivência do terceiro cuja vida se garante. Mas, ressalva o atual Código, essa presunção é relativa, permitindo-se, portanto, prova em contrário. Em relação ao rol que também estava no parágrafo único do art. 1.416 do Código de 1916, não mais nele se inclui o irmão de quem contrata o seguro, destarte exigindo-se a mesma justificação do caput do dispositivo. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 819 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 12/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina de Ricardo Fiuza, quando o seguro de pessoa não compreender a do próprio segurado, mas de outrem, o proponente terá de justificar as razões legítimas e lícitas para a instituição do benefício, sejam de ordem jurídica, econômica, moral ou sentimental.

O parágrafo único do artigo, no entanto, estabelece presunção juris tantum – ou seja, relativa, por admitir prova em contrário – de existir tal interesse, se o segurado for cônjuge, ascendente ou descendente do proponente, já que a relação afetiva ou o parentesco entre eles conduz à conclusão, em geral inarredável, pelo liame existente, sobre o interesse do proponente à preservação da vida daquele(s). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 416 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 12/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Vê-se que ao pensar Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o interesse jurídico de uma pessoa pela vida de outra diz respeito a aspectos afetivos e econômicos. Desde que presentes tais aspectos, pode o estipulante contratar seguro de vida de outrem, independentemente do conhecimento e da aquiescência do segurado. A lei presume a existência de interesse por parte de ascendentes, descendentes e do cônjuge. Por analogia, deve-se presumir, igualmente, o interesse do companheiro. Outros podem demonstrar a existência de interesse, como os enteados e outras pessoas que vivam sob a dependência econômica do segurado. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 12.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 791. Se o segurado não renunciar à faculdade, ou se o seguro não tiver como causa declarada a garantia de alguma obrigação, é lícita a substituição do beneficiário, por ato entre vivos ou de última vontade.

Parágrafo único. O segurador, que não for cientificado oportunamente da substituição, desobrigar-se-á pagando o capital segurado ao antigo beneficiário.

Na pauta de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o seguro de pessoa pode ser instituído em favor de terceiro, como ocorre, então necessariamente, com o seguro de vida. O favorecido por essa contratação é aquele a quem se chama de beneficiário. Trata-se de alguém de livre escolha do segurado, não se repetindo, de forma explícita, a regra do art. 1.474 do antigo Código, que proibia a instituição em favor de quem não pudesse dele receber por doação, como, por exemplo, o concubino do segurado casado, mas porque a matéria está implícita na disposição do CC 793, adiante examinado.

O beneficiário é identificado, pelo segurado, logo no instante da contratação, ou em momento posterior. Por isso mesmo, pode, em regra, ser livremente substituído, por ato inter vivos ou causa mortis. É, a rigor, mera explicitação, para o seguro, do princípio geral contido no CC 438 deste Código comentado. Veja-se, a propósito, que ao beneficiário não há mais que uma expectativa de direito, enquanto não se dá o sinistro, causa do pagamento do capital segurado. Assim, nada impede sua substituição. Solucionando divergência que, sob a égide do Código Civil de 1916, a respeito se erigia, considerou o novo Código ser passível de renúncia essa prerrogativa, afeta ao segurado, de substituir o beneficiário. Da mesma forma, excepcionalmente poderá ser vedada a substituição do beneficiário quando a instituição em seu favor se tiver consumado para garantir alguma obrigação. Pense-se, por exemplo, no devedor que contrata seguro sobre sua vida, beneficiando seu credor, expressando ter sido esse o motivo da contratação. Não haverá nessa hipótese liberalidade pura que possa implicar a livre substituição do beneficiário, ao menos enquanto persistir a dívida. No entanto, com exceção desses casos, constitui direito potestativo do segurado o de substituir o beneficiário. Deve, porém, disso dar aviso ao segurador, sob pena de ele se desobrigar pagando ao anterior beneficiário. Típico caso de pagamento a credor aparente, situação de justificada putatividade que se atribui a conduta do segurado. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 820 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 12/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No diapasão de Ricardo Fiuza, a lei permite a substituição do beneficiário do seguro de vida, por ato unilateral de vontade do segurado, que a essa faculdade não renunciou ao clausular as condições do seguro, desde que este não tenha por origem declarada a garantia de determinada obrigação, o que se dará por ato inter vivos ou causa mortis.

O parágrafo único desse artigo, por sua vez, estabelece que, caso o segurador não seja cientificado, em tempo oportuno, da substituição, resultará liberado do vínculo obrigacional pelo ato de pagamento do capital segurado ao primitivo beneficiário, não podendo, nessa hipótese, o novo beneficiário postular que se lhe pague aquele capital. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 417 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 12/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No dizer de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, assegura-se, em regra, o direito de o estipulante substituir o beneficiário do seguro de vida.

O direito de substituir o beneficiário deixa de existir se a ele renunciar expressamente o estipulante ou se o seguro tiver como causa a garantia de alguma obrigação, como seria o caso de o seguro ter sido contratado visando a garantir a capacidade financeira do beneficiário em caso de falecimento de determinada pessoa de quem seja economicamente dependente. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 12.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 787, 788 - DO SEGURO DE DANO - VARGAS, Paulo S. R.

Direito Civil Comentado - Art. 787, 788
- DO SEGURO DE DANO - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XV – DO SEGURO DE DANO
 – Seção II - (art. 778 a 788) - vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 787. No seguro de responsabilidade civil, o segurador garante o pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro.

§ 1º. Tão logo saiba o segurado das consequências de ato seu, suscetível de lhe acarretar a responsabilidade incluída na garantia, comunicará o fato ao segurador.

§ 2º. É defeso ao segurado reconhecer sua responsabilidade ou confessar a ação, bem como transigir com o terceiro prejudicado, ou indeniza-lo diretamente, sem anuência expressa do segurador.

§ 3º. Intentada a ação contra o segurado, dará este, ciência da lide ao segurador.

§ 4º. Subsistirá a responsabilidade do segurado perante o terceiro, se o segurador for insolvente.

Sob a visão de Claudio Luiz Bueno de Godoy, no artigo presente, o CC/2002 tratou e regulamentou o que sempre se chamou de seguro de responsabilidade civil. Ou seja, o segurador assume a obrigação de garantir o pagamento de perdas e danos que o segurado acaso tenha de fazer em benefício de terceiro. portanto, contrata-se a cobertura da indenização que, eventualmente, o segurado venha a ser obrigado a compor diante de terceiro lesado.

O risco envolve, assim, não só o pagamento de danos emergentes, como também o de lucros cessantes, que, na forma do CC 402, compõem as perdas e danos. O prejuízo a ser coberto pode abranger, ainda, danos pessoais e extrapatrimoniais que a conduta do segurado provocou ao terceiro vitimado. Se, afinal, o seguro se faz contra a responsabilidade civil que pode recair sobre o segurado, forçoso, então, ao que se crê, recorrer à própria noção do instituto, contida no Código Civil. E, com efeito, a responsabilidade civil está afeta, primeiramente, a quem comete ato ilícito (CC 927, caput), compreendido como aquele praticado por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, que viole direito alheio e cause dano a outrem, ainda que exclusivamente moral (CC 186). Portanto, é em toda essa extensão, abrangendo o dano moral, que, como regra, responderá o segurador, inclusive conforme orientação hoje sumulada (v. item a seguir). Ademais, e seguindo a mesma esteira, responderá ele também pela indenização a que esteja obrigado o segurado, independentemente de ação culposa, como tal definida, genericamente, no CC 927, parágrafo único, do atual Código. Isso significa dizer que o segurador garante a responsabilidade civil do segurado, subjetiva e objetiva, como regra em toda a extensão da consequência danosa de sua conduta. Discute-se é se, por conta dessa garantia, o segurador pode ser compelido a honrar a cobertura em ação que diretamente lhe seja movida pelo terceiro-vítima, tal como, para o seguro obrigatório, se possibilitou, de maneira explícita, no CC 788, parágrafo único, adiante examinado, ou se, ao revés, incumbe ao terceiro se voltar contra o segurado causador do dano, que, pagando, recebe a verba do seguro, nos limites do contrato.

O desfavor da ação direta, costuma-se afirmar que falta legitimidade para o terceiro agir com base em contrato de que não fez parte. Ressalte-se, todavia, que, hoje, em virtude da função social do contrato, que, em uma vertente de seu conteúdo, opera verdadeira eficácia social do ajuste (ultra partes), alguém não contratante pode, conforme o caso, discutir contrato – ou com base nele – de que não foi subscritor (veja, a respeito, Cláudio Luiz Bueno de Godoy. A função social do contrato, 2. ed. São Paulo, Saraiva, 2007). Parece, porém, que, no caso, o ponto seja outro. É que, com efeito, o seguro de responsabilidade civil não é uma estipulação que se faz em favor da vítima, por isso não lhe é dado postular diretamente o benefício, como ocorre no seguro universalizado e social que é o seguro obrigatório, de que cuida o artigo seguinte. O seguro de responsabilidade é um seguro de reembolso, que pressupõe, antes, o pagamento pelo segurado ou o reconhecimento, em ação que lhe seja movida, de sua responsabilidade pelo evento danoso que vitimou terceiro, de modo a que, nessa demanda, oferte o segurado a defesa que tiver, decerto que a ele afeta e de seu conhecimento, e não do segurador. E mais, de sorte que não se submeta o terceiro à discussão de disposições contratuais que desconhece. Ou seja, os debates se estabelecem com temática própria: entre o segurado e a vítima acerca da responsabilidade pelo evento; entre o segurado e o segurador sobre a obrigação de garantia. E tanto parece ser essa a solução da lei que o Código Civil de 2002, no § 3º do artigo em discussão, de forma bastante diversa do parágrafo único do artigo seguinte, em vez de aludir a uma ação direta, menciona a ação proposta pelo terceiro contra o segurado, de que se dará ciência ao segurador.

No sentido do descabimento da ação direta, exatamente em função da redação dos §§ 1º a 4º do CC 787, vale conferir a lição do Min. José Delgado in Comentários, coord. Min. Sálvio de Figueiredo. Rio de Janeiro, forense, v. XI, t. I, p. 566-7. Ou, na mesma esteira, lembrando que o tipo do seguro em questão é de reembolso, está a lição de João Marcos Brito Martins (O contrato de seguro. Rio de Janeiro, Forense Universitária, p. 116).

Certo que, primeiramente, tese diversa, tal qual no item abaixo, de identificação da jurisprudência, se exemplifica, vem sendo sedimentada no Superior Tribunal de Justiça, admitindo a ação direta, como se de verdadeira estipulação em favor de terceiro se tratasse, à semelhança do seguro de vida, por exemplo.

Certo, de outra parte, e mesmo assim não fosse, que a jurisprudência já admitiu que, mesmo sem o pagamento pelo segurado, a vítima possa executar diretamente o denunciado, vencido na denunciação, como se ocorrida verdadeira sub-rogação a esta do crédito já julgado em favor daquele, por corolário da procedência da lide secundária.

Certo também que o CDC 101, II, permite que o fornecedor, acionado em demanda de consumo, chame ao processo seu segurador, de modo a que, afinal, possa também este, que assume a condição de litisconsorte passivo, a bem dizer tal qual se dá na denunciação da lide (CPC/1973, art. 75, I, com correspondência no CPC/2015, art. 126), ser condenado de forma solidaria, nos termos do CPC/1973, art. 80, com correspondência no CPC/2015, art. 130, a que remete o dispositivo em comento, de forma expressa.

Não se nega que, no preceito citado, de resto como nele expresso, a faculdade de chamamento seja deferida ao réu (ver Alvim, Arruda, et al. Código de Defesa do Consumidor comentado. São Paulo, RT, p. 217), mas, afinal, de modo a que, com a possibilidade de ampliação da polaridade passiva, se favoreça o consumidor (ver Código de Defesa do Consumidor comentado pelos autos do anteprojeto, Rio de Janeiro, Forense Universitária, p. 827).

De mais a mais, a parte final do mesmo inciso II do CDC 101 permite que, insolvente o fornecedor e se houver seguro, então possa o consumidor mover ação direta contra o segurador.

Por fim, vale a consideração de que a jurisprudência já admitiu a extensão desta disposição a casos, não de relação de consumo, propriamente, mas de acidentes de automóveis, ao menos para permitir a execução pela vítima diretamente contra o segurador do causador da colisão, vencido na denunciação.

Todas essas ressalvas se fazem para que, posto não se aceda à tese da genérica admissibilidade da ação direta da vítima contra o segurador, fique clara a tendência que se erige no sentido de se admitir tal iniciativa.

Na mesma esteira do previsto no CC 771, exige o § 1º do artigo presente que, tão logo saiba, dê o segurado aviso ao segurador do fato constitutivo de sua responsabilidade, garantida pelo ajuste securitário. Veja-se que nem sempre a ciência do segurado se verifica no exato instante da ocorrência do evento, como, por exemplo, no dano que sua construção possa ter causado a terceiro. sobre a significação da exigência de imediata comunicação e sobre as consequências derivadas de sua omissão, remete-se aos comentários ao CC 771, animado pelo mesmo espírito que subjaz ao artigo vertente.

No § 2º, impõe a lei a proibição de o segurado reconhecer sua responsabilidade, confessar, transigir ou ressarcir diretamente o terceiro-vítima sem expressa anuência do segurador. Tratando-se de limitação a direito do segurado, parece ser necessário interpretar restritivamente o preceito, por exemplo, excluindo-se de sua abrangência a confissão ficta ou provocada. Até pelo significado da norma, quer-se evitar que o segurador, por ato e iniciativa próprios, de alguma maneira prejudique a posição jurídica do segurador, por ato e iniciativa próprios, de alguma maneira prejudique a posição jurídica do segurador, impondo-lhe um ressarcimento acaso exagerado ou mesmo indevido. Daí exigir-se sua anuência. Mas justamente por isso é que, mais ainda, não parece razoável impor ao segurado a perda automática do direito à cobertura, como consequência da falta de obtenção de placet do segurador para a prática dos atos elencados na lei, desde eu não lhe tenha sido imposto qualquer dano. Não se crê possa ser presumido, de forma absoluta, um conluio entre segurado e terceiro para prejudicar o segurador, o que se daria com a perda automática do direito ao ressarcimento pelo simples fato da ausência de concordância. Mesmo um involuntário prejuízo não se pode admitir havido, tão só, por essa omissão, devendo-se, conforme se entende, reservar sempre a possibilidade de, apesar de não ocorrida anuência, comprovar o segurado que o ato por ele praticado em nada alterou ou afetou a cobertura que, destarte, certamente haveria de ser honrada, nos mesmos moldes. Lembre-se mesmo que ocasionalmente a transação pode até trazer benefício ao segurador, obrigado então a ressarcir valor menor do que lhe seria afeto se não houvesse o acordo.

O § 3º do artigo examinado dispõe que, ajuizada ação de ressarcimento contra o segurado, deverá ele dar ciência do fato ao segurador, sem que se diga, diferentemente do previsto no CC 456, que na forma das leis do processo. Aliás, bem por isso, sustenta o Ministro Eduardo Ribeiro (“Contrato de seguro – alguns tópicos”. In: O novo Código Civil, coord. Domingos Franciulli Netto, Gilmar Ferreira Mendes e Ives Gandra da Silva Martins Filho. São Paulo, LTr, p. 729-46) que a lei criou, no caso, uma ciência especifica, sem previsão no Código de Processo Civil, que vincula o segurador ao que se decidir na demanda em termos de responsabilidade do segurado. Isso, no entanto, afirma o mesmo autor, sem que a falta da cientificação determine qualquer perda de direito regressivo, de resto como, hoje, também se entende para a denunciação da lide (CPC/1973, 70, III – correspondência no CPC/2015, art. 125), a despeito de que dita obrigatória, mas o que alguns vem reservando, quando muito – já que mesmo nesse caso altera-se a posição da jurisprudência -, à hipótese da evicção (vide CPC/2015, art. 125). Aliás, pela tese exposta, haveria ao segurado a alternativa de cientificar o segurador da demanda indenizatória, a fim de fazê-lo vinculado ao deslinde, ou estabelecer lide regressiva secundária, com a denunciação da lide, cujo cabimento, nas hipóteses de seguro, a reforma processual cuidou de assentar, para permiti-la nos procedimentos de rito sumário (art. 280, do CPC/1973, sem correspondência no CPC/2015, com redação dada pela Lei n. 10.444/2002). Ou seja, para o autor seriam, então duas medidas diversas, quando, ao que se crê, melhor teria andado o Código Civil determinando a cientificação como providência a ser exercitada, tal qual se dispõe no CC 456, na forma dos termos das leis do processo. Ressalve-se, apenas, a todo esse respeito, que hoje é sustentável considerar esteja o segurador vinculado ao ressarcimento se o segurado foi condenado, por conta da relação de direito material de garantia entre ambos existentes, independentemente da cientificação. A discussão que se faria possível entre os dois estaria relacionada com as condições da garantia ajustada, mas não com o pagamento imposto ao segurado mercê da condenação judicial a que submetido. Quando muito, poder-se-ia cogitar de o segurador eventualmente pretender demonstrar que a conduta do segurado, mesmo no processo indenizatório, ostentou-se, por exemplo, por alguma omissão probatória, de modo a agravar importe ressarcitório, aí sim, o que a ciência tenderia a afastar. Mas isso, de toda sorte, sem excluir, ainda, a possibilidade de denunciação da lide, e cuja ausência, como já se decidia, não induz perda do direito regressivo.

Finalmente, estabelece o § 4º que a responsabilidade do segurado subsiste perante o terceiro, se o segurador for insolvente. A regra poderia levar a supor que ao terceiro fosse dado litigar diretamente contra o segurador, voltando-se contra o segurado se aquele se tornasse insolvente, o que, porém, já anteriormente se defendeu incabível. Poder-se-ia argumentar, então que, ao determinar a responsabilidade do segurado diante da insolvência do segurador, quis-se evitar o sobresseguro, que era textualmente permitido no art. 1.437 do Código de 1916, o que também não se considera seja o caso, já no mesmo dispositivo explicitando-se que a contatação de seguro contra a insolvência do segurador não implica a admitir se esteja a erigir mais de uma cobertura para o mesmo interesse (CC 782). Isso tudo se cogita dada a ociosidade do dispositivo, se interpretado, tout court, como simples reforço da responsabilidade pessoal do segurado perante quem foi por ele lesado, a despeito do seguro. Talvez reste só o elastério de que o preceito reafirma a impossibilidade de o segurado se beneficiar, diante do terceiro, da alegação de insolvência de seu garantidor, porquanto não lhe transfere a responsabilidade direta pelos danos que vier a causar (Ver José Augusto Delgado. Comentários ao novo Código Civil, coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira. Rio de Janeiro, Forense, 2004, v. XI, t. I, p. 568). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 11.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 814-815 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Vê-se com a Doutrina de Ricardo Fiuza, que esse artigo inova, ao tratar de uma modalidade especial, que é o seguro de responsabilidade civil, já existente anteriormente, porém não disciplinado pelo CC de 1916. Por tal contrato, transferem-se aos segurados as indenizações eventualmente devidas pelo segurado a terceiros, resultantes de atos ilícitos determinantes dos prejuízos por ele causados e pelos quais seria responsabilizado. Um interessante caso particular desse contrato é o chamado seguro de fidelidade funcional, cujo objeto é a reparação de prejuízo que possa vir a ser ocasionado por funcionários ou empregados que lidem com quantias em dinheiro.

O § 1º desse artigo preceitua ser obrigação do segurado comunicar de pronto ao segurador, tão logo delas tome conhecimento, as consequências de ato seu, capaz de lhe acarretar a responsabilidade objeto da garantia. Esse dever jurídico é ínsito à própria relação securitária, onde, no caso, o segurador assumiu as consequências dos atos que venham de ser cometidos pelo segurado.

O § 2º, por sua vez, estatui ser proibido ao segurado reconhecer sua responsabilidade ou confessar a ação, bem como transigir com o terceiro prejudicado, ou indenizá-lo diretamente, sem anuência expressa do segurador.

A ideia da lei objetiva inibir a frustração de eventual direito do segurador, na hipótese de atuação do segurado à sua revelia, quando já se faz, em decorrência do seguro, incabível uma negociação direta entre o segurado e o terceiro sem a anuência expressa do segurador.

O § 3º determina que, intentada a ação contra o segurado, terá este que dar ciência da lide ao segurador. Também aqui o propósito é o de impedir seja causado injusto prejuízo ao segurador que garantiu o pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro.

Finalmente, o § 4º estatui que a responsabilidade do segurado perante o terceiro subsistirá, caso seja o segurador insolvente. É por demais evidente que não poderia a celebração do seguro de responsabilidade civil dar margem à possibilidade de vir o terceiro a ficar sem ressarcimento algum pelos danos sofridos, o que teria lugar no caso de insolvência do segurador. Assim, estabelece a lei que, uma vez constatada tal situação de insolvência, subsiste a responsabilidade do segurado perante o terceiro, quando aquele for o responsável direito pelo dano causado. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 414 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 11/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na toada de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o seguro de responsabilidade civil, vulgarmente conhecido como “seguro de danos contra terceiros”, visa a garantir o segurado contra indenizações que lhe venham a ser cobradas por danos que vier a causar a terceiros.

Tendo-se em vista que essa modalidade de seguro visa a garantir o segurado contra danos que ele próprio provoca, a lei retira-lhe a possibilidade de reconhecer o direito do terceiro, de transigir ou de indeniza-lo diretamente, sem a anuência da seguradora. Uma vez que a esta incumbirá, por fim, os ônus da indenização, a ela devem ser reservadas tais faculdades.

O parágrafo 4º estabelece que a responsabilidade do segurado perante terceiro se for insolvente a seguradora. A rigor, no entanto, a responsabilidade do segurado junto ao terceiro remanesce sempre e só excepcionalmente tem jurisprudência admitido que o terceiro ajuíze ação diretamente conta a seguradora, em relação a quem não possui a rigor qualquer vínculo jurídico. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 11.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 788. Nos seguros de responsabilidade legalmente obrigatórios, a indenização por sinistro será paga pelo segurador diretamente ao terceiro prejudicado.

Parágrafo único. Demandado em ação direta pela vítima do dano, o segurador não poderá opor a exceção de contrato não cumprido pelo segurado, sem promover a citação deste para integrar o contraditório.

Na luz de Claudio Luiz Bueno de Godoy, de índole essencialmente social, mas de modo particular, já que todo ajuste securitário possui uma função previdenciária, a rigor de cunho social, porquanto de garantia de indenidade das pessoas, o seguro obrigatório encerra, em última análise, uma estipulação em favor de vítimas potenciais e indeterminadas, ressarcidas diante de sinistros em que se converteram riscos previstos em lei. assim é que, já no Decreto-lei n. 73/66, previram-se inúmeras hipóteses em que a contratação do seguro se faz obrigatória, para garantia de terceiros incertos expostos ao risco criado – por exemplo, por quem opera aeronaves comerciais, possui veículos automotores de vias terrestre, fluvial, lacustre e marítima, constrói imóveis em zonas urbanas, dentre outras hipóteses, todas consagradas no art. 20. De todos eles, é bastante comum e cotidiano o Seguro Obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT), regulamentado pelas Leis n. 6.19474 e 8.441/92, que já estabeleciam, antes do novo Código, pagamento da indenização, em valor previamente fixado, equivalente a quarenta salários-mínimos, para o caso de morte, diretamente ao prejudicado. O que, mais recentemente, se reforçou com a Lei n. 11.482/2007, malgrado uma legislação fiscal, mas que em seu art. 8º estabeleceu valores certos para a mesma indenização. É mesmo o que se extrai da própria essência dessa forma de seguro, legalmente obrigatório. Quer-se, com ele, uma cobertura objetiva e genérica a pessoas expostas a risco de dano nos casos que a lei elenca. Por isso, o prejudicado, quando se trata de seguros obrigatórios, pode mover diretamente a ação contra o segurador, sem que a este seja dado, para eximir-se do pagamento, tal qual o expressa o atual Código, alegar falta de pagamento do prêmio pelo segurado. Nada diverso, repita-se, do que, nos acidentes de automóveis, já previa o art. 7º da Lei n. 6.194/74, com redação dada pela Lei n. 8.441/92, inclusive com a possibilidade de indenização cobrada de qualquer seguradora integrante do consórcio de empresas que operam o seguro obrigatório, por vítima de acidente em que envolvido veículo não identificado, com seguro não realizado ou vencido.

É nesses termos que deve ser compreendida a parte final do artigo em pauta, não se admitindo que possa a seguradora, de forma alguma, deduzir, em sua defesa, a exceção do contrato não cumprido pelo segurado, mesmo havida a citação deste (ver Súmula n. 257 do STJ). Na verdade, o que se permite é a denunciação da lide pela seguradora, a fim de reaver, em regresso, a indenização que tiver pago. Tal a redação que se tenciona explicitar com o Projeto de Lei n. 276/2007, já de alteração do Código civil. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 817 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Seguindo a doutrina de Ricardo Fiuza, os seguros de responsabilidade civil obrigatórios são, pela natureza social de que se revestem, satisfeitos em face da simples ocorrência do dano, independentemente da apuração da culpa. Aplica-se em favor do segurado a teoria do risco, aludida no Decreto-lei n. 73/66. O caráter assistencial emprestado ao seguro obrigatório exige, por tal conduto, seja o pagamento feito pela seguradora diretamente ao interessado, terceiro prejudicado, evitando-se, destarte, que pessoas inescrupulosas dele obtenham vantagens indevidas.

O parágrafo único do artigo remete a hipótese ao disposto no CC 476. Entretanto, exige-se maior acuidade na interpretação do seu texto, em face da pretensa exceção arguível. É que feito o seguro em favor de outrem não identificado, terceiro prejudicado potencial, não teria, em verdade tal exceção o condão de afastar a seguradora pelo pagamento do prêmio, enquanto não implementada a obrigação pelo segurado. E o que o sistema de tais seguros objetiva estabelecer: o princípio da universalidade, a tanto que a cobertura à vítima do dano é efetuada independentemente de o veículo ou a própria seguradora serem identificados acionando o beneficiário do seguro qualquer das empresas seguradoras integrantes do consórcio securitário (art. 72 da Lei n. 6.194) e, mais ainda, terá o terceiro prejudicado direito à indenização pelo sinistro, mesmo que não efetuado o pagamento do prêmio pelo segurado. Nesse sentido o SI! tem dirimido, com segurança “A indenização decorrente do chamado seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de vias terrestres (DPVAT), devida a pessoa vítima por veículo identificado que esteja com a apólice de referido seguro vencida, pode ser cobrada de qualquer seguradora que opere no complexo” (STJ. 4’ T., REsp 200.838-60, rel. Mm Cesar Asfor Rocha. DJ de 2-5-2000). A jurisprudência tem sinalizado, de há muito, nessa linha: “Não pode a seguradora se recusar a pagar a indenização proveniente de seguro obrigatório alegando a falta de pagamento do prêmio pelo proprietário do veículo causador do acidente, pois a lei não faz essa exigência, e, além do mais, aquela não terá qualquer prejuízo, pois poderá ingressar cós uma ação regressiva, tudo nos termos da Lei n. 6.194, com a redação dada pela Lei n. 8.441” (RT, 743/300). Observe-se, ademais, a orientação do STJ, ao particularizar a obrigação daquele causador do dano, somente quando inexistente consórcio segurador que assuma o risco: “O dever de indenizar o prejudicado, pelo acidente causado por veículo cujo seguro estava vencido, é do proprietário deste, quando à época do evento danoso ainda não estava em vigor a norma que prevê a obrigação indenizatória do Consórcio de Seguradoras, para esses casos” (STJ, 3’, T., REsp 218.418-SP, rel. Mm Fátima Nancy Andrighi, DJ de 17-9-2001). Diante de tal sentir, afigura-se ambígua e desproposital a narração do texto do referido parágrafo, aparentando prevalecer, em tais hipóteses, a exceção do contrato ao cumprido, quando, em verdade, terá apenas a seguradora demandada o direito de regresso conta o segurado moroso. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 415 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 11/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o beneficiário dos seguros obrigatórios é sempre o terceiro prejudicado. Em razão disso, a ele deve ser paga a indenização. Por ser obrigatório o seguro, o fato de não ter sido pago o respectivo prêmio pelo segurado não exonera a seguradora de pagar ao prejudicado a indenização devida. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 11.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).