quarta-feira, 25 de março de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 876, 877, 878 - continua Do Pagamento Indevido - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 876, 877, 878 - continua
 Do Pagamento Indevido - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título VII – Dos Atos Unilaterais
(Art. 854 a 886) Capítulo III – Do Pagamento Indevido
– Seção III – (art. 876 a 883) – vargasdigitador.blogspot.com - digitadorvargas@outlook.com

Art. 876. Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação que incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição.

Medindo com a régua de Hamid Charaf Bdine Jr, o valor recebido por quem não é credor deve ser restituído, sob pena de enriquecimento injustificado. Do mesmo modo, se o recebimento se verifica sob condição – i.é, dependendo de fato futuro e incerto -, caso o evento condicionante não se verifique, o pagamento efetuado deixa de ser devido, de modo que deve ser restituído (CC 125).

Carlos Roberto Gonçalves, ao comentar o presente dispositivo, anota: “Nessa matéria vigora o tradicional princípio de que todo enriquecimento sem causa jurídica e que acarrete como consequência o empobrecimento de outrem induz obrigação de restituir em favor de quem se prejudica com o pagamento” (Direito civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2004, v. III, p. 580).

Trata-se de uma modalidade de enriquecimento sem causa, tratado especificamente a partir do CC 884. Newton de Lucca registra que os requisitos para a configuração do pagamento indevido são os seguintes: “a) animus solvendi, ou seja, a intenção de pagar; b) inexistência do débito ou pagamento endereçado àquele que não seja o credor” (Comentários ao novo Código Civil, Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. XII, P. 79). (Hamid Charaf Bdine Jr., apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 893 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 25/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No dizer de Ricardo Fiuza, pagamento indevido é aquele feito voluntariamente, e por erro, sobre débito inexistente. Quem recebe pagamento indevido (accipiens) deve devolvê-lo, sob pena de locupletamento. Essa regra também se aplica na hipótese de pagamento de dívida condicional sem que tenha sido cumprida a condição. Em se tratando de pagamento de tributos indevidos, a regra a ser aplicada é a mesma (v. art. 165 do CTN). O instrumento hábil para o recebimento do valor pago indevidamente, não sendo a restituição voluntária ou administrativa, é a ação de repetição do indébito.

Esse artigo repete o de n. 964 do Código Civil de 1916, com pequena melhoria de redação, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. Sobre a matéria, vide Carlos Alberto Dabus Maluf. Pagamento indevido e enriquecimento sem causa. Revista da Faculdade de Direito da USP, v. 93, p. 115, 1998, e Pressupostos do pagamento indevido, RF, 257/379. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 454 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 25/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Conforme Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o pagamento indevido é a principal espécie de enriquecimento sem causa (CC 884 a 886).

O pagamento indevido é o realizado por erro de quem supõe a existência de obrigação inexistente. O pagamento é indevido nos seguintes casos: a) Desacordo sobre a causa (ex.: alguém paga empréstimo sem perceber que a prestação que h avia recebido lhe havia sido paga a título de doação); b) ilicitude (ex.: pagamento realizado por absolutamente incapaz ou contra proibição legal relativa à forma ou o fundo do direito); c) Pagamento anterior à realização da condição suspensiva.

O pagamento anterior ao vencimento do termo não é indevido nem pode ser repetido, porque a obrigação sujeita a atermo existe desde o momento em que contraída (CC 131). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 25.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 877. Àquele que voluntariamente pagou o indevido incumbe a prova de não tê-lo feito por erro.

No dizer de Hamid Charaf Bdine Jr, para que o valor recebido indevidamente seja restituído, aquele que efetuou o pagamento deverá comprovar que o fez por erro. A demonstração de que o pagamento foi feito por equívoco acarretará a conclusão de que não foi espontâneo, consciente e intencional. Vale dizer: foi feito apesar da consciência de que o valor não era devido. Pois, se o valor não era conscientemente devido e o pagamento se fez mesmo assim, não há oportunidade de repetição, na medida em que se equipara a uma liberalidade ou renúncia de direito.

Como se verifica, o Código Civil adotou a teoria subjetiva, tornando indispensável a demonstração do erro. Contudo, se não houve erro, a repetição pode encontrar fundamento no enriquecimento sem causa (CC 884 a 886).

O ônus da prova do erro, segundo o presente dispositivo, é daquele que efetuou o pagamento. Acrescente-se, com amparo na lição de Newton de Lucca, que, caso o pagamento tenha se verificado involuntariamente – por coação, exemplificativamente -, não será o caso de incidência do presente dispositivo, mas de defeito do negócio jurídico (CC 171, II), suscetível de anulação (Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. XII, p. 83).

O art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, estabelece a obrigação de o fornecedor restituir em dobro ao consumidor aquilo que este pagou indevidamente, com correção monetária e juros de mora, salvo engano justificável. A disposição tem natureza distinta do pagamento indevido contemplado no Código Civil, pois não exige o erro do consumidor, limitando-se a estipular uma única hipótese de exclusão de responsabilidade do fornecedor: o engano justificável. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 895 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 25/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No pensar de Ricardo Fiuza, para se receber a restituição do pagamento feito indevidamente é necessário que este tenha sido feito por erro. O ônus da prova do erro incumbe a quem fez o pagamento indevido voluntariamente (solvens).

Este dispositivo repete o art. 965 do Código Civil de 1916, com pequena melhoria de redação, devendo a ele ser dispensado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 454 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 25/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na pauta de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, como espécie de enriquecimento sem causa, o pagamento indevido exige que haja o enriquecimento de uma pessoa, o prejuízo de outra pessoa e o nexo causal entre o enriquecimento  de uma e o prejuízo da outra.

Para que seja indevido o pagamento é necessária a ausência de íntima justificação para o fenômeno (atribuição patrimonial defectiva de causa).

Não é necessária a capacidade para o enriquecido e para o enriquecedor, por se tratar de fato jurídico em sentido estrito.

Se o enriquecedor for capaz e o enriquecimento decorrer de ato seu, é necessário que tenha agido por erro.

A jurisprudência exclui o direito à repetição se o pagamento visar ao cumprimento de prestação de cunho alimentar, se o enriquecido o tiver recebido de boa-fé, com base nos princípios da segurança jurídica e da confiança (ex.: pensão alimentícia, vencimentos de servidor público, pensões e benefícios de aposentadoria). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 25.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 878. Aos frutos, acessões, benfeitorias e deteriorações sobrevindas à coisa dada em pagamento indevido, aplica-se o disposto neste Código sobre o possuidor de boa-fé, conforme o caso.

No entender de Hamid Charaf Bdine Jr, a coisa dada em pagamento indevido fica em poder daquele que a recebeu sem ter direito ao bem. Esse falso credor pode ter agido de boa-fé ou de má-fé e poderá ter percebido frutos do bem ou ter incorporado acessões a ele. Pode ser, ainda, que o bem recebido tenha se deteriorado.

Caso o credor tenha agido de boa-fé, a hipótese se regerá pelo disposto no CC 1.214 e seu parágrafo único, CC 1.217 e CC 1.219. Se tiver agido de má-fé, a questão rege-se pelo disposto no CC 1.214, parágrafo único, CC 1.216, CC 1.218 e CC 1.220. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 897 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 25/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

A doutrina mostra que, aquele que recebeu o pagamento indevido de boa-fé (accipiens   de boa-fé) deverá devolver a coisa recebida indevidamente, mas terá direito de conservar os frutos percebidos e de ser indenizado relativamente às benfeitorias úteis e necessárias. Quanto às voluptuárias, poderá levanta-las, desde que não altere a substância da coisa. O accipiens de má-fé deverá devolver tudo que recebeu, juntamente com seus frutos, não tendo direito a indenização por benfeitorias úteis e necessárias, não podendo, ainda, levantar as voluptuárias. De resto devem ser aplicadas as regras dos possuidor de boa-fé e do possuidor de má-fé (v. CC 1.214 a 1.220). O artigo é mera repetição do art. 966 do Código Civil de 1916, com pequena melhoria de redação, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 455 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 25/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD.

No parecer de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o possuidor é de boa-fé ou de má-fé conforme ignore ou não o vício ou obstáculo que impede a aquisição da coisa (CC 1.201).

O dispositivo manda aplicar esse critério à coisa que é indevidamente entregue ao enriquecido para o cumprimento de obrigação, relativamente a seus frutos, acessões, benfeitorias e deteriorações. Ou seja, se o enriquecido recebe a coisa com o conhecimento de que ela lhe está sendo entregue por erro, será possuidor de má-fé e responderá por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde momento em que se constituiu de má-fé, conforme o CC 1.216, responde pela perda ou deterioração da coisa, ainda que acidentais, salvo se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela na posse do enriquecedor (CC 1.218) e somente pode cobrar ressarcimento pelas benfeitorias necessárias (CC 1.220). o enriquecido de boa-fé é também possuidor de boa-fé e, por isso, não responde pela perda ou deterioração da coisa a que não der causa (CC 1.217), tem direito aos frutos percebidos (CC 1.214) e tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis (CC 1.219). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 25.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 24 de março de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 873, 874, 875 Da Gestão de Negócios - VARGAS, Paulo S. R.




Direito Civil Comentado - Art. 873, 874, 875
 Da Gestão de Negócios - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título VII – Dos Atos Unilaterais
(Art. 854 a 886) Capítulo II – Da Gestão de Negócios
– Seção III – (art. 854 a 875) – vargasdigitador.blogspot.com - digitadorvargas@outlook.com

Art. 873. A ratificação pura e simples do dono do negócio retroage ao dia do começo da gestão, e produz todos os efeitos do mandato.

No despontar de Hamid Charaf Bdine Jr, ratificar é confirmar a gestão. Tal ato implicará validade da gestão desde o seu início e a equipará ao mandato para todos os fins. Isso significa que, se após a gestão o dono do negócio ratificar sem ressalvas os atos do gestor, valerão as regras do mandato para a relação estabelecida entre eles. A ratificação pode ser expressa ou tácita e, ocorrendo, afasta a incidência ao caso das regras da gestão, aplicando-se à relação jurídica os dispositivos relativos ao mandato. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 892 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 24/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Sob a luz da doutrina de Ricardo Fiuza, se o dono do negócio ratificar a gestão pura e simplesmente, converte-a em mandato, e as relações entre ele e o gestor passam a se regular como se, desde o início, fossem mandante e mandatário. O artigo é idêntico ao de n. 1.343 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 452 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft WordAcesso em 24/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a ratificação pode ser expressa ou tácita. É tácita quando o dono do negócio realiza atos somente compatíveis com a aceitação da gestão, como a cobrança e o recebimento de contraprestação de terceiros com quem negócios tiverem sido realizados. O dispositivo manda que se apliquem à gestão ratificada as regras do mandato, desde o início dela. A ratificação da gestão não exonera o gestor por prejuízos que tiver causado culposamente ao dono do negócio, pois tal responsabilidade recai sobre o mandatário, condição que o gestor assume com a ratificação. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 24.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 874. Se o dono do negócio, ou da coisa, desaprovar a gestão, considerando-a contrária aos seus interesses, vigorará o disposto nos CC 862 e 862, salvo o estabelecido nos CC 869 e 870.

Sob o prisma de Hamid Charaf Bdine Jr, caso o dono do negócio desaprove os atos de gestão, valerão as regras mencionadas nos CC 862 e 863, a cujos comentários nos reportamos. Observe-se, contudo, que a desaprovação deve ser fundamentada, não se permitindo que seja externada por mero arbítrio do dono do negócio, o que caracterizaria abuso de direito (CC 187). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 893 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 24/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na pauta de Ricardo Fiuza, o dono do negócio só poderá recusar a ratificação se demonstrar que a gestão foi contrária a seus interesses, hipótese em que o gestor não só responderá por perdas e danos, como também pelo caso fortuito, se não demonstrar que teriam ocorrido os prejuízos ainda quando se houvesse abstido, e também pelos danos da gestão, que excederem seu proveito, devendo restituir as coisas ao estado anterior, ou indenizar a diferença. Repetição do art. 1344 do CC/1916, com pequena melhoria de redação. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 453 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft WordAcesso em 24/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No olhar de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a gestão irregular é ilícito e responsabiliza o gestor pelo pagamento de danos causados ao dono do negócio e até mesmo pelo caso fortuito, salvo se prova que ocorreriam se não tivesse intervindo. A gestão regular, ao contrário é ato lícito e dá ao gestor o direito ao reembolso das despesas que teve. É regular a gestão feita em conformidade com a vontade presumível ou expressa do dono do negócio ou, mesmo que realizada contra esta, se ela for reputada útil para o dono do negócio. Assim, não apenas a ratificação, expressa ou tácita, do dono do negócio firmam a presunção absoluta de sua licitude, mas também o resultado útil da gestão. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 24.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 875. Se os negócios alheios forem conexos ao do gestor, de tal arte que se não possam gerir separadamente, haver-se-á o gestor por sócio daquele cujos interesses agenciar de envolta com os seus.

Parágrafo único. No caso deste artigo, aquele em cujo benefício interveio o gestor só é obrigado à razão das vantagens que lograr.

Como alerta Hamid Charaf Bdine Jr, nos casos em que o gestor tiver negócio conexo ao que administra, há evidente coincidência de interesses entre ambos, o que coloca em risco a idoneidade da gestão. Por isso é que o presente artigo estabelece sociedade entre o gestor e o dono do negócio.

O parágrafo único limita a obrigação do dono do negócio às vantagens que obtiver, afastando a incidência de outras disposições a respeito da responsabilidade pelos atos de gestão.

A norma pretende evitar que o gestor se aproveite das circunstâncias para tirar o proveito da situação em prejuízo do dono do negócio gerido por ele. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 893 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 24/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina de Fiuza, este artigo pressupõe que os negócios em que o gestor interveio não sejam inteiramente alheios, mas conexos aos seus. Assim, não podem ser geridos separadamente; o gestor será considerado sócio do dono do negócio. Nesse caso aplicam-se as normas inerentes ao contrato de sociedade, repetindo esse dispositivo, o art. 1.345 do CC/1916, com pequena melhoria redacional, devendo receber o mesmo tratamento doutrinário. (Clóvis Beviláqua, Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. 9 ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1954, v. 5; e Maria Helena Diniz, Código Civil anotado, São Paulo, Saraiva, 1995).  (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 453 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft WordAcesso em 24/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a proximidade de negócios de duas pessoas, que as obriga à gestão conjunta sem que haja entre elas sociedade é comum. Ocorre, por exemplo, quando são proprietárias de gado cujo manejo seja feito nos mesmos espaços, com sinais distintivos que permitam distinguir a propriedade de cada um; ou num escritório de advocacia em que, não obstante a aparência de atuação conjunta, cada qual seja responsável por seus próprios clientes. Em tais casos, pode ser impossível para o gestor deixar de atuar nos negócios de interesse do dono do negócio sem prejuízo de seus próprios negócios, em razão da conexão existente entre os negócios de ambos.

A consequência da gestão nesses casos, segundo o caput do dispositivo, é a de se considerar sócios gestor e dono do negócio. O dispositivo, no entanto, não esclarece qualquer seria o objeto da sociedade: se, exclusivamente, os bens do dono do negócio ou o conjunto dos bens, do dono do negócio e do gestor. Ambas as soluções apresentam inconvenientes. No primeiro caso, permite lucro ao gestor sobre a administração de negócios que não lhe pertencem e sem a anuência do dono do negócio; no segundo, é o dono do negócio que pode vir a lucrar com negócios que o gestor faz com seus próprios bens. Por equidade, uma vez que o dispositivo a isso não se refere, a melhor solução é a de se partilhar os resultados segundo o valor dos bens ou dos negócios de cada um, evitando-se o enriquecimento sem causa de um ou de outro. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 24.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 23 de março de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 870, 871, 872 – continua Da Gestão de Negócios - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 870, 871, 872 – continua
 Da Gestão de Negócios - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título VII – Dos Atos Unilaterais
(Art. 854 a 886) Capítulo II – Da Gestão de Negócios
– Seção III – (art. 854 a 886) – vargasdigitador.blogspot.com - digitadorvargas@outlook.com

Art. 870. Aplica-se a disposição do artigo antecedente, quando a gestão se proponha a acudir a prejuízos iminentes, ou redunde em proveito do dono do negócio ou da coisa; mas a indenização ao gestor não excederá, em importância, as vantagens obtidas com a gestão.

Acompanhando Hamid Charaf Bdine Jr, tal como resulta do CC 869, nos casos em que a gestão verificar-se com vistas a evitar prejuízos, ou quando trouxer proveitos ao dono do negócio ou da coisa, o gestor ará jus ao reembolso de seus gastos e das despesas necessárias e úteis, bem como ao recebimento da indenização por seus prejuízos.

No entanto, o legislador limita o valor do reembolso ao proveito obtido por ele com a gestão, segundo a parte final do dispositivo. Essa limitação é aplicável aos casos em que houver gestão para afastar prejuízos iminentes ou redunde em vantagem ao dono do negócio, ou também aos casos do artigo antecedente, no qual basta a administração útil? Ora, se quando o gestor intervém para evitar prejuízos ao dono do negócio, ele só recebe o que não exceda as vantagens do dono do negócio, com maior razão valerá o limite se ele apenas administrou utilmente o negócio, sem que houvesse qualquer risco que tornasse imperiosa a gestão. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 891 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 23/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como mostra Ricardo Fiuza, este artigo estabelece uma regra geral: o dominus fica vinculado pelas obrigações contraídas, em seu nome, pelo gestor, e tem de reembolsar as despesas necessárias e uteis, que tiverem sido feitas, se o negócio for utilmente administrado, utiliter gestum. Se a gestão socorrer o dominus de prejuízo iminente, deverá ele indenizar o gestor pelas despesas que tiverem sido feitas, acrescidas de juros legais desde a data do desembolso. Tal indenização não poderá exceder em importância às vantagens provenientes da gestão, impedindo, assim, o enriquecimento sem causa do gestor. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 452 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 23/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o proveito à coisa administrada e proveito ao dono do negócio que é seu dono. Se a gestão redunda em proveito do dono do negócio, ela é utilmente administrada e, portanto, nesta parte o dispositivo nada acrescenta ao CC 869, que é mais amplo.

A exceção que o CC 870 visa a estabelecer em relação à regra do CC 869, portanto, restringe-se à finalidade de acudir prejuízos iminentes e, neste caso, somente seria exceção se, neste caso, ela não fosse útil ao dono do negócio. Contudo, a parte final do dispositivo estabelece que o gestor somente fará jus à indenização se houver alguma vantagem para o dono do negócio. Desse modo, o dispositivo nada acrescenta nem subtrai do sentido do CC 869 e deveria ser suprimido quando da revisão do Código. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 23.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 871. Quando alguém, na ausência do indivíduo obrigado a alimentos, por ele os prestar a quem se devem, poder-lhes-á reaver do devedor a importância, ainda que este não ratifique o ato.

Como observa Hamid Charaf Bdine Jr., aquele que presta alimentos ao credor deve ser reembolsado pelo devedor, mesmo que ele não concorde com o pagamento. Este artigo deve ser conjugado com o disposto no CC 306, pois se o devedor tivesse argumento capaz de excluir sua obrigação de pagar – a maioridade do credor, por exemplo -, não poderá ser obrigado a reembolsar quem quitou a dívida por ele.

Assim sendo, este dispositivo quer apenas dispensar a ratificação do devedor como condição para o reembolso. Não significa, contudo, que o pagamento indevido deva ser reembolsado pelo devedor. Também o presente dispositivo não incidirá ao caso se o gestor não tiver intenção de substituir o ausente, mas apenas pretender fazer caridade (De Lucca, Newton. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. XII, p, 66). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 891 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 23/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina de Ricardo Fiuza prevê um dever cujo cumprimento a lei impõe de modo rigoroso. A pessoa obrigada a prestar alimentos não pode fugir a essa obrigação de assistência legal, pois se assim não fosse o alimentário ficaria exposto ao abandono. Isso ocorreria se os estranhos que viessem em seu socorro não tivesse o direito de repetir os adiantamentos que fizeram. Se o gestor cumprir a obrigação alimentar por caridade, não pode repetir Ci’, parágrafo único, 2ª parte, do CC 872). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 452 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 23/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na pauta de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o CC 871 determina a incidência sobre alimentos da regra do CC 869. Quem presta alimentos no lugar de quem os devia, torna-se credor do alimentante pelos valores efetivamente desembolsados. No mesmo sentido, o CC 305, que, igualmente, incide sobre a matéria. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 23.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 872. Nas despesas do enterro, proporcionadas aos usos locais e à condição do falecido, feitas por terceiro, podem ser cobradas da pessoa que teria a obrigação de alimentar a que veio a falecer, ainda mesmo que esta não tenha deixado bens.

Parágrafo único. Cessa o disposto neste artigo e no antecedente, em se provando que o gestor fez essas despesas com o simples intento de bem-fazer.

Comentário sucinto de Hamid Charaf Bdine Jr, despesas de enterro suportadas por terceiros podem ser cobradas daqueles que deviam alimentos ao defunto, salvo se aquele que pagou o fez com intenção de fazer caridade. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 892 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 23/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No dizer de Ricardo Fiuza, na hipótese prevista neste artigo, aplica-se a mesma regra do artigo anterior, ou seja, se alguém paga as despesas de enterro, estas devem ser repetidas por quem tinha o dever de alimentar o de cujus, ainda que este não possua bens. Se o gestor fez tais despesas com a intenção de fazer caridade, não pode repetir (RT. 255/191 e 242/575). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 452 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 23/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo parecer de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, quando uma pessoa paga as despesas do enterro de outra, em regra, o faz por liberalidade. Pode fazê-lo, no entanto, visando a suprir a impossibilidade daqueles que estão moralmente obrigados a arcar com as despesas destinadas às necessidades iminentes. Neste caso, se não estiver autorizado, pratica gestão de negócios. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 23.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 20 de março de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 867, 868, 869 – continua Da Gestão de Negócios - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 867, 868, 869 – continua
 Da Gestão de Negócios - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título VII – Dos Atos Unilaterais
(Art. 854 a 886) Capítulo II – Da Gestão de Negócios
– Seção III – (art. 854 a 886) – vargasdigitador.blogspot.com - digitadorvargas@outlook.com

Art. 867. Se o gestor se fizer substituir por outrem, responderá pelas faltas do substituto, ainda que seja pessoa idônea, sem prejuízo da ação que a ele, ou ao dono do negócio, contra ela possa caber.

Parágrafo único. Havendo mais de um gestor, solidária será a sua responsabilidade.

Na pauta de Hamid Charaf Bdine Jr, caso o gestor transfira sua função a outro, responde pelas faltas deste, mesmo que sem culpa na escolha ou na vigilância do substituto. Assim, basta que o substituto do gestor tenha cometido a falta para que a responsabilidade do gestor surja, sem impedimento de que este e o dono do negócio tomem medidas contra o substituto.

O parágrafo único do dispositivo consagra a solidariedade da responsabilidade dos vários gestores porventura existentes. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 888 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 20/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Fiuza explica que se o gestor se fizer substituir por outrem, ficarão responsáveis pela gestão os dois: o gestor e o substituto. Com o rigor da lei, o gestor deve ser mais cauteloso na escolha do substituto; o substituto mais cuidadoso em aceitar tal desiderato; e o dono do negócio ficará mais garantido. No parágrafo único está estatuída outra responsabilidade excepcional. No mandato, a solidariedade não é presumida, deve resultar de estipulação expressa; na gestão, a solidariedade é prescrita em lei.

O artigo é idêntico ao de n. 1.337 do Código Civil de 1916, devendo ser a ele dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 450 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, nada obsta que a gestão seja realizada por uma pluralidade de pessoas nem que o gestor possa contratar terceiros para auxiliá-lo ou mesmo para substituí-lo. O dispositivo torna o gestor objetivamente responsável pelos danos causados pelo auxiliar ou pelo substituto na gestão lícita, a responsabilidade de todos somente ocorre se o auxiliar ou substituto agir com culpa. Entre os gestores a responsabilidade é solidaria em relação ao dono do negócio em conformidade com o parágrafo único do dispositivo analisado. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 20.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 868. O gestor responde pelo caso fortuito quando fizer operações arriscadas, ainda que o dono costumasse fazê-las, ou quando preterir interesse deste em proveito de interesses seus.

Parágrafo único. Querendo o dono aproveitar-se da gestão, será obrigado a indenizar o gestor das despesas necessárias, que tiver feito, e dos prejuízos, que por motivo da gestão, houver sofrido.

Na disposição de Hamid Charaf Bdine Jr, caso o gestor decida efetuar operações arriscadas na gestão do negócio alheio, ficará responsável pelos danos decorrentes de caso fortuito, ainda que o dono do negócio também costumasse correr tais riscos. Também responderá pelo fortuito se preterir interesses do dono do negócio em benefício próprio.

A solução resulta do fato de a gestão ser assumida espontaneamente sem obrigatoriedade para o gestor, de maneira que, se ele decidir gerir negócio alheio, assumirá o ônus do resultado negativo decorrente de operações arriscadas.

O parágrafo único deste artigo autoriza o dono do negócio a aproveitar-se dos atos de gestão, mas para isso o obriga a indenizar o gestor de suas despesas necessárias – não as excepcionais ou meramente úteis -, bem como dos prejuízos que tiver suportado em decorrência da gestão. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 889 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 20/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como aponta Ricardo Fiuza, somente o dono pode arriscar o que é seu; ao gestor cabe administrar, e não especular. Deve o gestor defender os interesses alheios na ausência do dono; assim, deve agir com prudência e moderação, ficando fora de as órbita as operações arriscadas. Se arriscar ou especular, responderá inclusive, pelo caso fortuito. Se o dono quiser aproveitar-se da gestão arriscada, deve indenizar o gestor das despesas feitas e do prejuízo que porventura tiver sofrido.

O dispositivo é mera repetição do art. 1.338 do Código civil de 1916, com pequena melhoria de redação, devendo receber o mesmo tratamento doutrinário (v. Clóvis Beviláqua. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil, 9 ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1954, v. 5, p. 70). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 451 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 Lecionando Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, na gestão de negócios realizada contra a autorização presumida ou expressa do dono do negócio, o gestor responde por todo e qualquer dano sofrido pelo dono do negócio, a menos que prove que o dano teria ocorrido se não tivesse intervindo (CC 862).

Na gestão de negócios realizada em conformidade com a vontade presumível do dono do negócio, o gestor ao responde por danos, salvo se agir com culpa, se fizer operações arriscadas ou se preterir interesse do dono do negócio em favor de seus próprios interesses.

A ratificação da gestão cessa a responsabilidade do gestor por danos que causar sem culpa, uma vez que a ratificação converte a gestão em mandato (CC 873 combinado com os CC 667, 676 e 678.

O parágrafo único ficaria melhor localizado no CC 869, que cuida de crédito do gestor junto ao dono do negócio, uma vez que o CC 868 cuida de responsabilidade do gestor. O critério para que o gestor possa cobrar do dono do negócio as despesas necessárias e demais prejuízos que o primeiro tiver sofrido é o da utilidade da administração, nos termos do CC 869. Presume-se que a gestão tenha sido útil se vier a ser ratificada ou se o dono do negócio desejar aproveitar-se da gestão.

Nesses casos, o gestor somente será responsável por danos cometidos culposamente, mas o dono do negócio ficará responsável por reembolsar ao gestor os prejuízos que este sofrer em razão da gestão, compensando-se os valores. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 20.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 869. Se o negócio for utilmente administrado, cumprirá ao dono as obrigações contraídas em seu nome, reembolsando ao gestor as despesas necessárias ou úteis que houver feito, com os juros legais, desde o desembolso, respondendo ainda pelos prejuízos que este houver sofrido por causa da gestão.

§ 1º. A utilidade, ou necessidade, da despesa, apreciar-se-á não pelo resultado obtido, mas segundo as circunstâncias da ocasião em que se fizerem.

§ 2º. Vigora o disposto neste artigo, ainda quando o gestor, em erro quanto ao dono do negócio, der a outra pessoa as contas da gestão.

Sob o prisma de Hamid Charaf Bdine Jr, basta que o negócio seja adequadamente administrado pelo gestor para que o dono do negócio seja obrigado a cumprir os negócios celebrados em seu nome. Em decorrência da utilidade da atuação do gestor, o dono do negócio fica obrigado a reembolsá-lo pelas despesas uteis e necessárias que houver feito o primeiro.

Aqui no presente caso, diversamente do que ocorre com as operações arriscadas (CC 868, parágrafo único), o gestor é indenizado tanto pelas despesas úteis quanto pelas necessárias, pois ele se limitou a cuidar do negócio de modo útil, sem realizar ações arriscadas.

Além do reembolso atualizado das despesas, também incidirão os juros legais sobre a quantia a reembolsar (CC 406). O dispositivo contém inovação relacionada ao texto correspondente do Código Civil de 1916. Trata-se de impor ao dono do negócio, além do reembolso de despesas, a obrigação de indenizar os prejuízos que o gestor houver sofrido em decorrência dos atos de gestão.

Em razão da aparente distinção feita pelo CC 403 entre estes e os lucros cessantes, tais prejuízos poderão compreender aquilo que o gestor deixou de auferir em seu próprio negócio ou atividade, para cuidar dos negócios do terceiro? A interpretação literal levaria a resposta negativa – confiram-se os comentários ao CC 404, parágrafo único. No entanto, a leitura do disposto no § 1º deste dispositivo permite que se conclua que a utilidade ou a necessidade da interrupção das atividades próprias do gestor podem ser avaliadas à luz das circunstâncias da ocasião e da boa-fé de que tratam os CC 113 e 422 deste Código.

Desta forma, se o gestor interrompeu seu negócio – de rentabilidade reduzida -, para gerir o do dono de outro negócio, muito mais rentável, e, com isso, assegurou-lhe ganhos elevados – ou impediu que ele sofresse prejuízos expressivos -, será o caso de obrigar o dono do negócio a incluir os lucros cessantes do gestor na importância pela qual deverá indenizá-lo, observando-se, porém, o limite estabelecido no artigo seguinte.

O § 2º impõe que o dono do negócio indenize o gestor mesmo se este, por erro, der conta a quem não é o dono do negócio. Nesta última hipótese, basta que o gestor esteja em erro, não havendo necessidade de que o falso dono do negócio soubesse, ou pudesse saber, que o gestor estava em erro, tal como o CC 138 deste Código exige.

No que tange à verificação da utilidade da gestão, Carlos Roberto Gonçalves pondera: “Não fica ao alvedrio do titular do negócio declarar se a administração do gestor foi, ou não, útil e necessária, devendo tal aferição ser feita de acordo com os critérios legais. A utilidade da gestão decorre de fatores vários, como sejam a vontade presumível do dono, o interesse deste, bem como as circunstâncias da ocasião em que se fizeram” (Direito civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2004, v. III, p. 577). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 890 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 20/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na síntese de Ricardo Fiuza, se o negócio for utilmente administrado, o dono dele se equipara ao constituinte; deve cumprir as obrigações contraídas em seu nome, e indenizar as despesas úteis e necessárias que tiver feito o gestor, acrescida dos juros legais desde o desembolso. A utilidade ou a necessidade das despesas feitas deverá ser apreciada não pelo resultado obtido, mas segundo as circunstâncias da ocasião em que foram feitas pelo gestor (RI’, 249/233). Se, por erro, o gestor do negócio prestar contas a outrem, deve ser indenizado das despesas úteis e necessárias pelo dominus. O artigo repete o de n. 1.339 do Código Civil de 1916 com pequena melhoria redacional, devendo receber o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 451 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, os efeitos atribuídos pelo dispositivo à administração útil do negócio demonstram que a gestão útil é ato lícito mesmo quando exercida contra a vontade presumível ou expressa do dono do negócio.

Conforme o § 1º, a utilidade da gestão decorre das circunstâncias. Assim, ainda que da gestão não resulte lucro para o dono do negócio, será útil se reduzir os prejuízos que este sofreria caso não ocorresse a intervenção que ele não autorizou.

Decorre da gestão lícita a obrigação de o dono do negócio ressarcir o gestor pelos prejuízos que este sofrer por ter intervindo no negócio, especialmente as despesas necessárias e as úteis acrescidas de juros legais desde a data do efetivo desembolso. Não se indenizam as despesas voluptuárias, como tais consideradas aquelas que poderiam não ter sido realizadas sem que deste fato decorresse qualquer prejuízo para o dono do negócio.

O § 2º é excessivo, por ser evidente que erro na prestação de contas não isenta o dono do negócio da obrigação de reembolsar. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 20.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quinta-feira, 19 de março de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 864, 865, 866 – continua Da Gestão de Negócios - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 864, 865, 866 – continua
 Da Gestão de Negócios - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título VII – Dos Atos Unilaterais
(Art. 854 a 886) Capítulo II – Da Gestão de Negócios
– Seção III – (art. 854 a 886) – vargasdigitador.blogspot.com - digitadorvargas@outlook.com

Art. 864. Tanto que se possa, comunicará o gestor ao dono do negócio a gestão que assumiu, aguardando-lhe a resposta, se da espera não resultar perigo.

Corroborando Hamid Charaf Bdine Jr, o gestor deverá providenciar a comunicação ao dono do negócio de que assumiu a gestão. No entanto, se houver necessidade de atuar antes de receber resposta deste, comunicando-lhe a discordância, deverá fazê-lo, se isso for necessário para evitar danos.

Sua atuação deve restringir-se ao mínimo indispensável tendo natureza predominantemente conservatória. Contudo, sempre que possível, deverá aguardar a resposta, se a espera não prejudicar os atos de gestão.

O silêncio do dono do negócio deverá ser havido como consentimento tácito, salvo se ele não tiver condições de manifestar sua discordância (Newton De Lucca. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, forense, 2003, v. XII, p. 49). De acordo com Carlos roberto Gonçalves, ao receber a comunicação do gestor, “o dono do negócio tomará a gestão, caso em que a situação se regerá pelo CC 874; b) aprová-la-á na parte já realizada, desaprovando-a, porém, para o futuro; d) constituirá procurador, que assumirá o negócio no pé em que se achar, extinguindo-se assim a gestão; e) assumirá pessoalmente o negócio, cessando igualmente a gestão, como no caso da letra anterior” (Direito civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2004, v. III, p. 575). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 887 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 19/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Para a doutrina de Ricardo Fiuza, o gestor de negócio (gestor oficioso assume as funções de mandatário para atender o dono do negócio, ou pela necessidade urgente de tomar uma providência (judicial ou extrajudicial). Como não tem autorização para assim proceder, deve, desde logo, levar o fato ao conhecimento do dono do negócio, que pode concordar com a continuidade da gestão ou interrompê-la. se for necessária, todavia, uma ação pronta, por estar em perigo de serem prejudicados os interesses do dono do negócio, não estará o gestor oficioso obrigado a esperar a sua resposta, não aumentando, nessa hipótese, sua responsabilidade.

Este artigo é mera repetição do art. 1.334 do Código Civil de 1916, com pequena melhoria redacional, devendo ser dado a ele o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 449 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 19/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na orientação de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, ainda que o gestor haja sem contrariar a orientação do dono do negócio, o fato de estar intervindo em negócio alheio sem que seja para tanto autorizado obriga-o a comunicar o fato ao dono do negócio. Deve agir com prudência e cautela e somente dar prosseguimento à gestão se o tempo de espera da resposta do dono do negócio representar perigo para os interesses deste. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 19.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 865. Enquanto o dono não providenciar, velará o gestor pelo negócio, até o levar a cabo, esperando se aquele falecer durante a gestão, as instruções dos herdeiros, sem se descuidar, entretanto, das medidas que o caso reclame.

Na visão de Hamid Charaf Bdine Jr, o gestor deve velar o negócio até que o dono o retome. Poderá, ainda, leva-lo a cabo – liquidá-lo. Se o dono do negócio falecer durante a gestão, o gestor deve aguardar as instruções dos herdeiros e, até recebe-las, não deve se descuidar das medidas reclamadas no caso. É certo, porém, que o gestor pode ser dispensado do ônus previsto neste artigo se sobrevierem circunstâncias excepcionais – tais como doença, acidente etc. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 888 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 19/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina de Ricardo Fiuza, o gestor do negócio assume obrigações de mandatário, devendo velar pelo negócio enquanto o dominus negotii não toma providência; se este falecer, deve aguardar instruções dos seus herdeiros. Responderá, porém, por perdas e danos se, sem motivo, suspender a gestão iniciada acarretando prejuízo a terceiro e ao dono do negócio. Este dispositivo é idêntico ao art. 1.335 do Código Civil de 1916, devendo receber o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 450 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 19/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No ritmo de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a princípio, ninguém é obrigado a se envolver com negócio alheio para evitar prejuízos para seu titular. Se o faz, no entanto, assume a responsabilidade de buscar o melhor resultado possível para a sua intervenção e, em decorrência, de não abandonar o negócio antes de sua conclusão. Deve prosseguir, pois, até que o negócio seja, concluído, salvo se antes receber instruções do dono ou de seus sucessores se aquele vier a falecer. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 19.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 866. O gestor envidará toda sua diligência habitual na administração do negócio, ressarcindo ao dono o prejuízo resultante de qualquer culpa na gestão.

Na lembrança de Hamid Charaf Bdine Jr, como se afirmou nos comentários ao CC 863, o gestor indenizarão o dono do negócio se os prejuízos excederem o proveito de sua gestão. Nessa hipótese, não se exige conduta culposa do gestor, pois ele terá agido contra a vontade do dono do negócio.

No artigo ora em exame, a culpa do gestor é que o obrigará a indenizar o dono do negócio. Assim, mesmo que o proveito do negócio se sobreponha aos prejuízos, haverá obrigação de o gestor indenizar se, culposamente, provocar prejuízos ao dono um resultado positivo de R$10.000,00. No entanto, verifica-se que deixou uma máquina da fábrica do lado de fora das instalações e ela foi furtada. Ao ser reconhecida sua culpa, estará obrigado a indenizar o valor da máquina, ainda que tenha dado lucro ao dono do negócio. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 888 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 19/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Doutrina de Ricardo Fiuza, o gestor deve administrar o negócio com zelo, tomando todas as providências necessárias ao seu bom andamento. Se assim não agir, causando prejuízo ao dono do negócio por culpa sua, deverá ressarci-lo. O artigo é mera repetição do art. 1.336 do Código Civil de 1916, com pequena melhoria de redação, devendo a ele ser dispensado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 450 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 19/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, uma vez que a gestão não seja contrária à vontade expressa ou presumível do dono do negócio ela configura ato lícito. Mesmo que seja lícita, a gestão, de acordo com o presente dispositivo, obriga o gestor a ressarcir ao dono do negócio os prejuízos que o dono do negócio vier a sofrer em decorrência de culpa na intervenção.

A contrario sensu, na gestão lícita o gestor não é responsável por indenizar prejuízos decorrentes da intervenção se tiver agido diligentemente. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 19.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).