segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

Direito Civil Comentado - Art. 854, 855, 856 Da Promessa de Recompensa - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com -digitadorvargas@outlook.com

 

Direito Civil Comentado - Art. 854, 855, 856
Da Promessa de Recompensa - VARGAS, Paulo S. R.
vargasdigitador.blogspot.com -digitadorvargas@outlook.com

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações

Título VII – Dos Atos Unilaterais (Art. 854 a 886) Capítulo I

– Da Promessa de Recompensa – Seção III – (art. 854 a 886) 

 

Dos Atos Unilaterais – Introdução com crédito a Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira. Os negócios jurídicos são unilaterais se na sua composição participa uma só parte. 

No direito brasileiro, de acordo com o princípio da autonomia da vontade, não se pode excluir a existência de negócios jurídicos unilaterais não previstos em lei (atípicos) (Pontes de Miranda, Tratado, v. 31, p. 6). Diferentemente, em alguns sistemas europeus há regra expressa no sentido da tipicidade, como o art. 457 do Código Civil português e o art. 1.987 do Código Civil italiano.

Os negócios jurídicos unilaterais podem ser autônomos ou dependentes de outros negócios. O Código designa “atos unilaterais”, os negócios jurídicos unilaterais que têm existência autônoma: promessa de recompensa, gestão de negócios, enriquecimento sem causa, pagamento indevido, títulos de crédito. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 16.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 854. Aquele que, por anúncios públicos, se comprometer a recompensar, ou gratificar, a quem preencha certa condição, ou desempenhe certo serviço, contrai obrigação de cumprir o prometido.

No contar de Hamid Charaf Bdine Jr, a promessa de recompensa inclui-se entre os atos unilaterais que são fonte de obrigação. Assim, uma vez preenchidos determinados requisitos, aquele que promete recompensa está vinculado ao cumprimento da prestação oferecida. Tal situação verifica-se quando, por exemplo, colocam-se faixas em determinado bairro prometendo recompensar quem restituir um animal de estimação. A obrigação não decorre do simples fato de restituir-se o animal, mas sim da promessa anterior, feita por anúncios, de que se pagaria recompensa ou gratificação. Do mesmo modo, não é suficiente que se formule pedido de restituição do animal, havendo necessidade de promessa de recompensa ou gratificação consignada no anúncio.

Desde o anúncio público, o promitente considera-se obrigado, mas a exigência da contraprestação prometida dependerá de fato futuro e incerto ou da realização de determinado serviço. a obrigação surgida para o promitente não depende do consentimento da outra parte, cujo serviço não transforma o negócio em bilateral (De Lucca, Newton. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. XII, p. 8 e ss.).

Carlos Roberto Gonçalves aponta os requisitos necessários para que a promessa de recompensa se torne obrigatória: “a) que lhe tenha sido dada publicidade; b) a especificação da condição a ser preenchida ou o serviço a ser desempenhado; e c) a indicação da recompensa ou gratificação” (Direito civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2004, v. III, p. 267).

O requisito da publicidade não implica qualquer restrição a respeito do meio pelo qual a promessa é divulgada, bastando que seja dirigida a pessoas indeterminadas. Assim, tanto o anúncio pela imprensa quanto a distribuição de folhetos ou a afirmação verbal em local em que se encontrem várias pessoas serão suficientes. Nos casos em que a promessa for feita por fornecedores de produtos ou serviços, as regras de incidência predominante serão as do Código de Defesa do Consumidor (CDC 30 a 38). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 878 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 16/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina de Fiuza, a promessa de recompensa pode ser definida como o ato obrigacional de alguém que, por anúncio público, se compromete a recompensar, ou gratificar, pessoa que preencha certa condição ou desempenhe certo serviço. é uma das formas de obrigação resultante de declaração unilateral da vontade. Significa a aplicação do princípio da obrigatoriedade da promessa feita a pessoa ausente.

 

Este dispositivo repete o art. 1.512 do Código Civil de 1916, com pequena melhoria de redação; deve, assim, receber o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 446 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 16/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No esmiuçar de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, promessa de recompensa é a declaração feita mediante anúncio divulgado entre os interessados (público), na qual o autor se obriga a dar uma recompensa ou gratificação a quem preencha certa condição ou pratique determinado ato. Exemplos: promessa para a descoberta de criminoso, para quem devolver animal ou coisa perdida, ao aluno que não faltar a nenhuma aula (promessa por fato omissivo).

 

Distinções: a) a proposta de contrato, ao contrário da promessa de recompensa, até que seja aceita, não obriga o proponente, nem cria direitos para o destinatário, salvo o de concluir o contrato. Depois de aceita, dá origem a contrato. Torna-se irrevogável depois que chega ao conhecimento do destinatário (CC 427). A oferta ao público é um tipo de proposta de contrato (CC 429); b) a promessa unilateral, como a proposta de contrato, visa à realização de um contrato definitivo, não à atribuição de uma prestação ou benefício como ocorre na promessa de recompensa; c) o direito à recompensa a que faz jus aquele que acha e devolve bem alheio (CC 1.234) decorre da lei, diferentemente da promessa de recompensa, que advém de ato de vontade.

 

Espécies de promessa de recompensa: a promessa de recompensa pode corresponder a uma das três espécies, conforme o número de possíveis beneficiários: a) restrita a um; b) múltipla, dirigida a mais de um vencedor e que a admite a pluralidade de recompensas (ex>; mega-sena); c) concurso: os CC 854 a 856 referem-se às três espécies. Os CC 857 e 858 referem-se à promessa restrita a um. Os CC 859 e 869 cuidam do concurso.

 

Capacidade. A lei nada estabelece quanto à capacidade civil do promitente. Pontes de Miranda ensina que é válida a promessa de gratificação feita pelo representante legal de incapaz em nome deste, uma vez que não há restrição legal de incapaz em nome deste, uma vez que não há restrição legal: “Sim, com a assistência dos representantes legais, porém dentro da quantia de que, por lei, podem dispor. A questão reclama a aplicação dos princípios relativos aos pais, tutores e curadores” (Pontes de Miranda, Tratado de direito privado, v. 31, p. 305).

 

Os incapazes não podem doar. Há proibição implícita para os sujeitos ao poder familiar (CC 1.691) e explicita quanto à tutela, aplicável à curatela (CC 1.749, II e CC 1.774). Não é possível, pois, a promessa de recompensa em nome de incapazes sempre que configurar doação, o que será configurado quando da promessa de recompensa não advier um benefício ao incapaz de valor pelo menos igual ao que é prometido em seu nome. A promessa de recompensa permanece eficaz após a morte ou incapacidade do promitente.

 

Forma. A promessa deve assegurar certa publicidade (dirigir-se a várias pessoas indeterminadas). Qualquer meio de veiculação de mensagens pode ser utilizado: imprensa escrita, rádio, televisão, internet, documentos particulares, entre outros. Pode ser tácita (ex.: pau-de-sebo).

 

É eficaz a promessa de recompensar com propriedade imóvel, ainda que não seja feita por meio de escritura pública, pois: “A promessa de bem imóvel, ou de outro bem, para cuja transmissão da propriedade seja necessária a instrumentação pública, não fica adstrita a exigência legal de forma. A promessa de recompensa não contém acordo de constituição. Gera, apenas, obrigação” Pontes de Miranda, Tratado..., v. 31, p. 296).

 

Objeto. Diversas podem ser as ações pretendidas com a promessa: a) preenchimento de condição (ex.: concurso de beleza); b) realização de serviço: obrigação de fazer, não-fazer ou de dar (ex.: restituir); c) qualquer prestação lícita inclusive ato que constitua dever legal (ex.: descoberta, 1.233). Não cria obrigação civil a promessa de recompensa proveniente de jogo ou aposta (CC 814).

 

Qualquer prestação lícita pode ser oferecida como recompensa. Segundo Pontes de Miranda, se a recompensa não tiver sido fixada, pode ser arbitrada pelo juiz (op. cit., p. 323). Entendemos que não, pois o objeto da recompensa é elemento essencial do negócio. O arbitramento judicial violaria a autonomia da vontade. De outro lado, a promessa de recompensa sem a fixação de objeto pode ensejar a responsabilização civil do promitente, uma vez que enseje prejuízo a terceiros, em nome da proteção da confiança. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 16.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 855. Quem quer que, nos termos do artigo antecedente, fizer o serviço, ou satisfizer a condição, ainda que não pelo interesse da promessa, poderá exigir a recompensa estipulada.

 

No parecer de Claudio Luiz Bueno de Godoy, não se exige que a pessoa que satisfizer o interesse do promitente o tenha feito com a intenção de receber a recompensa ou mesmo tivesse conhecimento dela. É suficiente que ela tenha sido oferecida publicamente para que o interessado possa postular a recompensa. Dessa forma, se alguém restitui ao proprietário um cão desaparecido, porque sabia que este lhe pertencia, fará jus à recompensa prometida em faixas colocadas nas imediações, mesmo que delas só venha a ter conhecimento depois da devolução do animal.

 

O presente dispositivo demonstra que a obrigação constitui-se independente da concordância do titular do direito à recompensa, nascendo exclusivamente com a manifestação pública de vontade do promitente, de forma diversa do que ocorre com os contratos – fontes de obrigações que só se aperfeiçoam com a conjugação de vontades dos manifestantes.

Ao se tornar obrigatória a promessa, aquele que realiza o serviço pode compelir o promitente a cumpri-la por intermédio de ação judicial, que pode ser condenatória ou indenizatória, conforme a natureza da recompensa prometida. Carlos Roberto Gonçalves acrescenta não haver necessidade de se examinar se houve utilidade para o promitente do serviço executado, bastando que sua atividade tenha correspondido ao que foi prometido recompensar (Direito civil brasileiro, São Paulo, Saraiva, 2004, p. 569). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 881 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 16/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na justificativa de Ricardo Fiuza, a promessa feita com publicidade é dirigida a qualquer pessoa. Se alguém apresentar aquilo que foi publicamente pedido, o promitente (aquele que se obriga, por promessa, a dar, fazer ou não fazer alguma coisa) vinculado por sua promessa tem de aceitar a prestação, ou cumprir o que prometeu. Não é necessário que o serviço tenha sido realizado no interesse da recompensa. Basta que corresponda às condições do anúncio, a não ser que o promitente haja, de modo expresso, exigido um ato que se realize por causa de sua solicitação. Este, repete o artigo 1.513 do CC/1916 com pequena melhoria de redação, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 446 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 16/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No entender de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, beneficiário da promessa de recompensa é quem cumpre a condição ou pratica determinado ato, mesmo que não tivesse conhecimento dela. É pessoa meramente determinável (ad incertam personam). A promessa de recompensa deve ser dirigida a duas ou mais pessoas; se feita a determinada pessoa configura-se oferta ou promessa unilateral.

 

O incapaz que cumpre a condição adquire o direito e a pretensão, mas deve ser assistido ou representado quando da cobrança (Pontes de Miranda, Tratado..., v. 31, p. 312). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 16.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 856. Antes de prestado o serviço ou preenchida a condição, pode o promitente revogar a promessa, contanto que o faça com a mesma publicidade; se houver assinado prazo à execução da tarefa, entender-se-á que renuncia o arbítrio de retirar, durante ele, a oferta.

 

Parágrafo único. O candidato de boa-fé, que houver feito despesas, terá direito a reembolso.

 

Sob o viso de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a promessa de recompensa pode ser revogada, desde que: a) o serviço não tenha sido executado ou a condição não haja se verificado; b) a revogação seja divulgada com a mesma publicidade dada à promessa; não tenha sido concedido prazo previsto para a execução do serviço.

 

No caso de haver prazo para a execução da tarefa, a retirada da oferta não pode ser feita durante sua vigência. Nada impede, porém, que seja feita posteriormente. No entanto, ao se esgotar o prazo, a oferta ainda é válida se não tiver havido revogação? Sim, se o interesse do devedor ainda puder ser satisfeito. É o caso da recompensa oferecida a quem se prontificar a ir até uma ilha de difícil acesso resgatar determinada pessoa em 24 horas. Ao ter decorrido o prazo, se a promessa não for revogada, ela ainda é devida se a vítima for resgatada. Segundo Newton de Lucca, nada impede que o promitente “renuncie expressamente à faculdade de revogar” (Comentários ao novo Código Civil, Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. XII, p. 18).

O parágrafo único do dispositivo assegura ao candidato de boa-fé que tiver feito despesas para atender à oferta o reembolso delas a despeito da revogação. Aplica-se exclusivamente aos casos em que ocorrer a revogação, pois, se a promessa subsistir, o candidato não será indenizado se não obtiver sucesso na empreitada. Ora, ao assumir gastos destinados a satisfazer o interesse do ofertante, o candidato assume o risco de nada receber se não tiver êxito, assim como o de ter despesas superiores ao valor prometido. Apenas se a promessa for revogada é que o candidato de boa-fé fará jus ao reembolso do que gastou por terem sido frustradas suas expectativas – criadas pelo ofertante que a refogou, ainda que licitamente. (Claudio Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 882 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 16/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No enfoque de Ricardo Fiuza, a promessa pode ser revogada antes de prestado o serviço ou cumprida a condição, desde que seja dada à revogação a mesma publicidade dispensada à promessa. Se, contudo, for fixado prazo para o cumprimento da tarefa, subentende-se que, durante esse período, o promitente renuncia o direito à revogação. Fica salvaguardado ao candidato de boa-fé o reembolso das despesas eventualmente feitas, antes da revogação. Mais uma vez é valorizado no Código Civil o princípio da boa-fé, que deve estar sempre presente nas relações obrigacionais. Mais um artigo que é mera repetição do CC/1916, art. 1.514, caput. Deve lhe ser dado, pois, o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 447 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 16/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Sob o prisma de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a promessa de recompensa é eficaz até que seja adimplida, revogada ou, se com prazo, até o vencimento deste.

Para que a revogação da promessa de recompensa seja eficaz deverá ser feita com o mínimo de publicidade utilizado para a publicização da promessa.

A revogação antecipada da promessa de recompensa dá aos candidatos que tiverem realizado despesas para atendê-la direito ao reembolso das despesas, salvo se tiverem procedido de má-fé. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 16.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

domingo, 19 de fevereiro de 2023

Comentários ao Código Penal – Art. 100 Ação pública e de iniciativa privada VARGAS, Paulo S. R. – vargasdigitador.blogspot.com

 

Comentários ao Código Penal – Art. 100
Ação pública e de iniciativa privada
  VARGAS, Paulo S. R.
vargasdigitador.blogspot.com

digitadorvargas@outlook.com –
 Título VII – Da Ação Penal

 

Ação pública e de iniciativa privada (Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/7/1984)

Art. 100. A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido.

§ 1º. A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça.

§ 2º. A ação de iniciativa privada é promovida mediante queixa do ofendido ou de quem tenha qualidade para representa-lo.

§ 3º. A ação de inciativa privada pode intentar-se nos crimes de ação pública, se o Ministério Público não oferece denúncia no prazo legal.

§ 4º. No caso de morte do ofendido ou de ter sido declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou de prosseguir na ação passa ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. 

Conceito de ação - Conforme esclarece Humberto Theodoro Júnior, “modernamente, prevalece a conceituação da ação como direito público subjetivo exercitável pela parte para exigir do Estado a obrigação da tutela jurisdicional, pouco importando seja esta de amparo ou desamparo à pretensão de quem o exerce. É, por isso, abstrato. E, ainda, autônomo, porque pode ser exercitado sem sequer relacionar-se com a existência de um direito subjetivo material, em casos como o da ação declaratória negativa. É, finalmente, instrumental, porque se refere sempre à decisão a uma pretensão ligada ao direito material (positiva ou negativa).” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, v. 1, p. 53).

Condições da ação - São condições necessárias ao regular exercício do direito de ação de natureza penal: a) legitimidade das partes; b) interesse de agir; c) possibilidade jurídica do pedido; d) justa causa. (Em posição contrária, José Barcelos de Souza afirma não ser “a justa causa uma condição autônoma, uma quarta condição da ação” (Direito processual civil e penal, p. 161).

A denúncia deve vir acompanhada com o mínimo embasamento probatório, ou seja, com lastro probatório mínimo (HC 88.601/ CE, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJU de 22/6/2007), apto a demonstrar, ainda que de modo incidiário, a efetiva realização do ilícito penal por parte do denunciado. Em outros termos, é imperiosa existência de um suporte legitimador que revele de modo satisfatório e consistente, a materialidade do fato delituoso e a existência de indícios suficientes de autoria do crime, a respaldar a acusação, de modo a tornar esta plausível. Não se revela admissível a imputação penal destituída de base empírica idônea (INQ 1.978/PR, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, DJU de 17/08/2007) o que implica a ausência de justa causa a autorizar a instauração da persecutio críminis in iudicio (STJ, HC 145748/SP, Rel. Min. Felix Fischer. 5a T., DJe 2/8/2010).

A denúncia (...] não pode ser o resultado de vontade pessoal e arbitrária do acusador. O Ministério Público, para validamente formular a denúncia penal, deve ter por suporte uma necessária base empírica, a fim de que o exercício desse grave dever-poder não se transforme em um instrumento de injusta persecução estatal. O ajuizamento da ação penal condenatória supõe a existência de justa causa, que se tem por inocorrente quando o comportamento atribuído ao réu nem mesmo em tese constitui crime, ou quando, configurada uma infração penal, resulta de pura criação mental da acusação (STJ, Ap. 41.8, Rel. Min. José Delgado, Corte Especial, DJ 3/4/2006, p. 196).

Rejeição da denúncia ou queixa - O art. 395 do Código de Processo Penal, com a redação determinada pela Lei na 11.719, de 20 de junho de 2008, dispõe, verbis: Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: I - for manifestamente inepta; II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou III — faltar justa causa para o exercício da ação penal.

No dizer de Rogério Greco, (Código Penal comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários sobre o Título VII “Da Ação Penal” – “Ação pública e de iniciativa privada – Art. 100 do CP, respectivamente p. 225-229): Quanto às espécies de ação penal - O Código Penal e a legislação processual penal preveem duas espécies de ação penal, a saber: ação penal pública e ação penal privada. A regra prevista no art. 100 do Código Penal diz que toda ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido.

Da iniciativa - Na verdade, todas as ações são públicas, variando, contudo, sua iniciativa, que pode ser pública (quando proposta por órgão oficial) ou privada.

Das espécies de ação de iniciativa pública: a) incondicionada ou b) condicionada à representação do ofendido ou à requisição do Ministro da Justiça.

Dos princípios informadores da ação penal de iniciativa pública: a) obrigatoriedade ou legalidade; b) oficialidade; c) indisponibilidade; d) indivisibilidade; e e) intranscendência.

Na ação penal pública, vigoram os princípios da obrigatoriedade e da indivisibilidade da ação penal, os quais, respectivamente, preconizam que o Ministério Público não pode dispor sobre o conteúdo ou a conveniência do processo. Porém, não é necessário que todos os agentes ingressem na mesma oportunidade no polo passivo da ação, podendo haver posterior aditamento da denúncia {STJ, HC 27119/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª T., DJ 25/8/2003, p. 341).

Das espécies de ação penal de iniciativa privada: a) privada propriamente dita; b) privada subsidiária da pública e c) privada personalíssima.

Ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública: Vide art. 5º, LIX, da CF. Poderá ser intentada nos crimes de ação de iniciativa pública, se o Ministério Público não oferecer denúncia no prazo legal. Se houver manifestação pelo arquivamento levada a efeito pelo Ministério Público, para a maioria da doutrina, não poderá ser proposta a ação penal subsidiária. Em sentido contrário, Hélio Tomaghi, entendendo que será possível a ação penal subsidiária mesmo com o pedido de arquivamento do Ministério Público. (TORNAGHI, Hélio. Compêndio de processo penal, v. 11, p. 490-491).

In casu, tendo havido o arquivamento interno da notícia-crime pelo Procurador[1]Geral de Justiça, e não tendo sido apresentado recurso, não é cabível o ajuizamento posterior de ação penal privada subsidiária da pública, pois a inércia do órgão ministerial não restou caracterizada (STJ, HC 133227/ BA, Rel. Min. Felix Fischer, 5a T., Dje 14/12/2009).

Se o Ministério Público requer o arquivamento de representação, o servidor público representante não pode formular queixa para instauração de ação privada subsidiária. É que em tal circunstância o MP não foi omisso (STJ, CE AgRg na APn 302/DF, DJ 18/12/2006, p. 274).

A ação penal privada subsidiária só tem cabimento nas hipóteses em que configurada a inércia do Ministério Público, ou seja, quando transcorrido o prazo para o oferecimento da denúncia, o Parquet não a apresenta, -não requer diligências, tampouco pede o arquivamento (STJ, HC 64564/GO, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª T., DJ 9/4/2007, p. 259).

A ação penal privada subsidiária da pública, disciplinada nos arts. 29 do Código de Processo Penal e 5º, inciso LIX, da Constituição Federal, pode ser intentada tanto nos crimes que devam ser processados mediante ação penal pública condicionada como incondicionada, desde que configurada a inércia do Ministério Público, ou seja, quando o Parquet deixar de oferecer a denúncia ou de requerer o arquivamento do inquérito ou, ainda, de solicitar diligências, dentro do prazo previsto pelo art. 46 do Código de Processo Penal (STJ, HC 46959/ RJ, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª T., DJ 18/12/2006 p. 415).

Princípios informadores da ação penal de iniciativa privada: a) oportunidade; b) disponibilidade; c) indivisibilidade.

Da Representação Criminal ou requisição do Ministro da Justiça - Tanto a representação criminal como a requisição do Ministro da Justiça são consideradas condições de procedibilidade para o regular exercício da ação penal de iniciativa pública condicionada, sem as quais se toma impossível a abertura de inquérito policial ou o oferecimento de denúncia pelo Ministério Público.

Para a representação destinada à ação pública condicionada, não se exige o consentimento do marido previsto no art. 35 do CPP (STF, RT 618, p. 401).

A Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, concedeu a ordem de habeas corpus, mudando o entendimento quanto à representação prevista no art. 16 da Lei na 11.340/2006 (Lei Maria da Penha). Considerou que, se a vítima só pode retratar-se da representação perante o juiz, a ação penal é condicionada. Ademais, a dispensa de representação significa que a ação penal teria prosseguimento e impediria a reconciliação de muitos casais (STJ, HC 113.60S/MG, Rel. originário Min. Og Fernandes, Rel. para acórdão Min. Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ-SP), julgado em5/3/2009).

O crime de embriaguez ao volante, previsto no art. 306 do Código de Trânsito brasileiro, é de ação penal pública incondicionada, em face do caráter coletivo do bem jurídico tutelado (segurança viária), razão pela qual não depende de representação para a instauração do inquérito policial e início da ação penal. Precedentes desta Corte (STJ, HC 99468/SP, Rel2. Mina. Laurita Vaz, 53 T., DJe 9/3/2009).

Da Lei Maria da Penha e necessidade de representação: A garantia de livre e espontânea manifestação conferida à mulher pelo art. 16 da Lei Maria da Penha, na hipótese de renúncia à representação, que deve ocorrer perante o magistrado e representante do Ministério Público, em audiência especialmente designada para esse fim, justifica uma interpretação restritiva do art. 41 da mesma lei. O processamento do ofensor, mesmo contra a vontade da vítima, não é a melhor solução paia as famílias que convivem com o problema da violência doméstica, pois a conscientização, a proteção das vítimas e o acompanhamento multidisciplinar com a participação de todos os envolvidos são medidas juridicamente adequadas, de preservação dos princípios do direito penal e que conferem eficácia ao comando constitucional de proteção à família (STJ, HC 155057/RJ, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª T., DJe 2/8/2010).

A família é a base da sociedade e tem a especial proteção do Estado; a assistência à família será feita na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. Inteligência do art. 226 da Constituição da República. As famílias que se erigem em meio à violência não possuem condições de ser base de apoio e desenvolvimento para os seus membros, de forma que os filhos daí advindos dificilmente terão condições de conviver sadiamente em sociedade, daí a preocupação do Estado em proteger especialmente essa instituição, criando mecanismos, como a Lei Maria da Penha, para tal desiderato. Somente o procedimento da Lei nº 9.099/1995 exige representação da vítima no crime de lesão corporal leve ou culposa para a propositura da ação penal. Não se aplicam aos crimes praticados contra a mulher, no âmbito doméstico e familiar, os ditames da Lei nº 9.099/1995. Inteligência do art. 41 da Lei n° 11.340/2006. A lesão corporal praticada contra a mulher no âmbito doméstico é qualificada por força do art. 129, § 9º, do Código Penal e se disciplina segundo as diretrizes desse diploma legal, sendo a ação penal pública incondicionada. Ademais, sua nova redação, feita pelo art. 44 da Lei nº 11.340/2006, impondo pena máxima de três anos à lesão corporal qualificada, praticada no âmbito familiar, proíbe a utilização do procedimento dos Juizados Especiais, afastando, por mais um motivo, a exigência de representação da vítima. Ordem denegada. Precedentes citados: HC 84.83 I-RJ, DJe 5/5/ 2008, e REsp. 1.000.222-DF, DJe 24/11/2008 (STJ, HC 106.805/MS, Relª. Minª. Jane Silva (Desembargadora convocada do TJ/MG), DJ 9/3/2009).

Da morte do ofendido ou declaração de ausência - Não se tratando de ação penal de natureza personalíssima, quando houver a morte do ofendido ou de ter sido declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou de prosseguir na ação passa ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.

Quanto ao desarquivamento do inquérito policial e provas novas - Arquivado o inquérito policiai, por despacho do juiz, a requerimento do Promotor de Justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem novas provas (STF, Súmula na 524).

As provas capazes de autorizar o desarquivamento do inquérito e consequente início da ação penal hão de ser substancialmente inovadoras, não bastando sejam formalmente novas (STJ, HC 122328/ SP, Rel. Min. Og Fernandes, 6ª T., DJe 14/12/2009).

A denúncia somente poderá ser aditada (Nos termos do caput do art. 384 do Código de Processo Penal, com a nova redação que lhe foi dada pela Lei na 11.719, de 20 de junho de 2008, encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em consequência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo da 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente), e receber nova capitulação legal com o surgimento de novas provas. Novas provas são as que já existiam e não foram produzidas no momento processual oportuno, ou que surgiram após o encerramento do inquérito policial. Arquivado o inquérito a requerimento do Ministério Público, nova ação penal não pode ser iniciada sem novas provas (STJ, Apn. 31 l/RO, Ação Penal 2000/0043398-5/CE, Corte Especial, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 4/9/2006, p. 198).

Da suspensão condicional do processo e ação penal de iniciativa privada - O benefício processual previsto no art. 89 da Lei n2 9.099/1995, mediante a aplicação da analogia in bonam partem, prevista no art. 32 do Código de Processo Penal, é cabível também nos casos de crimes de ação penal privada. Precedentes do STJ (STJ, RH C17061/ RJ, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, 6“T., DJ 26/6/2006, p. 199).

Nos crimes em que o jus persequendi é exercido por ação de iniciativa privada como tal o crime de injúria, é impróprio o uso do instituto da suspensão condicional do processo, previsto no art. 89 da Lei n2 9.099/95, já que a possibilidade de acordo é da essência do seu modelo, no qual tem vigor os princípios da oportunidade e da disponibilidade (STJ, HC 1743 l/SP, Rel. Min. Vicente Leal, 6ª T., DJ 23/6/2003 p. 444).

Da queixa-crime não assinada pelo querelante - Constituiu óbice ao regular desenvolvimento da ação penal a falta de menção do fato criminoso no instrumento de mandato visando à propositura da queixa-crime, que também não foi assinada pela querelante com o advogado constituído. Segundo os arts. 43, III,5 44 e 568, todos do Código de Processo Penal, a citada omissão só pode ser suprida dentro do prazo decadencial, tendo em vista que a expressão ‘a todo tempo’ significa ‘enquanto for possível’ (STJ, HC 450I7/GO, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, 6ª T., DJ 27/3/2006, p. 339).

Procuração e poderes para queixa-crime - É necessário constar do instrumento procuratório outorgado para o oferecimento da queixa-crime, além dos poderes especiais para o ato, o nome do querelado, a menção ao fato criminoso, ou ao artigo da lei violado, permitida a sanação de eventual defeito da representação do querelante, somente dentro do prazo decadencial conferido peio art. 38 do digesto processual penal (TJMG, Processo 2.0000.00.475739-5/000[l], Rel. Des. Antônio Armando dos Anjos, DJ 9/8/2005).

Em sentido contrário, a jurisprudência desta Corte é no sentido de que eventuais vícios ou irregularidades no instrumento de mandato, os quais se relacionam com a legitimidade do representante da parte e, não, com a legitimidade da própria parte, podem ser sanadas a qualquer tempo, mesmo após o decurso do prazo decadencial, nos termos do art. 569 do Código de Processo Penal. Não há forma rígida para a representação, bastando a manifestação inequívoca do ofendido ou de seu representante legal, no sentido de que sejam tomadas providências, hipótese ocorrida no caso dos presentes autos. A falta de menção do fato delituoso na procuração configura defeito sanável a qualquer tempo, pois não interfere na legimatio ad causam. Precedentes desta Corte (STJ, H C 67830/SC, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª T., DJ 18/6/2007, p. 283).

Da desistência da ação penal de iniciativa privada: A desistência da ação penal privada pode ocorrer a qualquer momento, somente surgindo óbice intransponível quando já existente decisão condenatória transitada em julgado (STF, Tribunal Pleno, HC 83228/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 11/11/2005, p. 6). (Greco, Rogério. Código Penal comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários sobre o Título VII “Da Ação Penal” – “Ação pública e de iniciativa privada – Art. 100 do CP, respectivamente p. 225-229. Ed. Impetus.com.br, acesso em 19/02/2023 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na interessante apreciação do tema, Wagner Muniz, comentários ao art. 100 do CP, em artigo intitulado “Teoria do Crime: Noções Introdutórias”, publicado em maio de 2022, incisivo, ilustra:

Chama-se de Teoria do Crime, à parte da ciência criminal na qual se dispõe a explicar o que é o crime, i.é, a Teoria Geral do Crime. Quais as características de qualquer delito. o delito pode-se interpretá-lo como injusto penal ou como injusto punível. O injusto penal é o fato típico e antijurídico. O conceito de crime pode se dar em três aspectos, sendo eles: formal, material ou analítico. Anteriormente a concepção se dava de duas formas: material ou formal.

O fato típico é a ação humana que se adequa ao tipo penal descrito em lei. Na contramão do fato atípico que é a conduta que não preenche os requisitos descritos no tipo penal. Para que determinado fato seja considerado crime, será necessário caracterizar os outros elementos do crime, pois sem ele não há necessidade de tutela penal. Podemos conceituar segundo o Professor Damásio de Jesus, os elementos necessários: a conduta, o resultado, a relação de causalidade ou nexo causal e a tipicidade.

Na visão de Antonio García-Pablos de Molina (2008, p. 01), a criminologia é uma ciência empírica e interdisciplinar, que se preocupa com o estudo do crime, da pessoa do infrator, da vítima e do controle social do comportamento delitivo, e trata de ministrar uma informação válida e constatada sobre a gênese, dinâmica e variáveis principais do crime, contemplando-o como problema individual e social, assim como sobre os programas para sua prevenção especial, as técnicas de intervenção positiva no homem delinquente e os diversos modelos ou sistemas de resposta ao delito. Zaffaroni (2003, p. 99) destaca que, ocupa-se das circunstâncias humanas e sociais relacionadas com surgimento, a prática e maneira de evitar o crime, assim como tratamento dos criminosos. Para a maioria dos autores, Lombroso foi o fundador da criminologia moderna.

Os sujeitos do crime são as pessoas ou entes que estão relacionados à prática e aos efeitos da empreitada criminosa. Dividindo-se em sujeito ativo – autor/coautor do fato, aquele que realiza direta ou indiretamente a conduta criminosa, seja isoladamente, seja em concurso (dois ou mais agentes), podendo este receber vários nomes bem como: agente (geral), indiciado (no inquérito policial), acusado (com oferecimento da denúncia ou queixa), réu (após o recebimento da inicial acusatória), reeducando (durante a execução penal), condenado (após o trânsito em julgado da condenação), egresso (após o cumprimento da pena), criminoso e delinquente (objeto de estudo das ciências penais, como na criminologia) – e sujeito passivo, aquele que é o titular do bem jurídico protegido pela lei penal violada por meio da conduta criminosa. Este pode-se ser nomenclaturado como vítima ou de ofendido.

O objeto do crime é o bem ou objeto contra o qual se dirige a conduta criminosa. Pode ser jurídico ou material. Objeto jurídico é o bem jurídico, isto é, o interesse ou valor protegido pela norma penal. A título de exemplo, no art. 121 do Código Penal, a objetividade jurídica recai na vida humana. O objeto material, de seu turno, é a pessoa ou a coisa que suporta a conduta criminosa. No homicídio, exemplificativamente, é o ser humano que teve sua vida ceifada pelo comportamento do agente, de acordo com Cleber Masson (2022, p. 174).

 

Para Cleber Masson (2022, p. 161): o conceito de crime é o ponto de partida para compreensão dos principais institutos do Direito Penal. E embora aparentemente simples, a sua definição completa e pormenorizada apresenta questões complexas que acarretam várias consequências ao estudo dos pontos mais exigidos em provas e concursos públicos. Qualquer operador do Direito, iniciante ou avançado, ainda não muito versado na área penal, se considera apto a fornecer o conceito de crime. Diz-se frequentemente: “Crime é o fato típico, ilícito…”, sem maior preocupação científica. Assim, não deve ser. Quando lhe for indagado o conceito de crime, uma resposta mais técnica e minuciosa deve ser apresentada. De fato, o crime pode ser conceituado levando em conta três aspectos: material, legal e formal ou analítico.


De acordo com o critério material ou substancial, crime é toda ação ou omissão humana que lesa ou expõe a perigo de lesão bens jurídicos penalmente tutelados. A presente fórmula leva em consideração a relevância do mal produzido aos interesses e valores selecionados pelo legislador como merecedores da tutela penal. Esse conceito de crime serve como fator de legitimação do Direito Penal em um Estado Democrático de Direito. O mero princípio da reserva legal se mostra insuficiente, ou seja, não basta apenas a lei para que qualquer conduta seja considerada penalmente ilícita.

Quanto ao critério legal, o conceito de crime é o fornecido pelo legislador. O Código Penal não possui nenhum dispositivo conceituando crime, tal tarefa ficou a cargo da Lei de Introdução ao Código Penal (Decreto-lei 3.914, de 9 de dezembro de 1941), em seu artigo 1º, que nos traz a seguinte redação: Art. 1º Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente.

A diferenciação, portanto, é nítida. A distinção entre crime e contravenção penal é de grau, quantitativa (quantidade da pena), e também qualitativa (qualidade da pena) e não ontológica. Quando o preceito secundário cominar pena de reclusão ou detenção, teremos um crime. Por outro lado, se o preceito secundário não apresentar as palavras “reclusão” ou “detenção”, estará se referindo a uma contravenção penal, uma vez que a lei a ela comina pena de prisão simples ou de multa. O Direito Penal brasileiro acolheu um sistema dicotômico, ao fracionar o gênero infração penal em duas espécies: crime ou delito e contravenção penal. Os termos crimes e delito se equivalem, ainda que em determinadas situações a Lei Maior e a legislação ordinária utilizarem a palavra delito, impropriamente, como sinônima de infração penal, bem como o art. 5º, inc. XL, da Carta Magna, e nos arts. 301 e 302 do Código de Processo Penal.

No crime temos: pena de reclusão ou de detenção, isolada, alternativa ou cumulativamente com a pena de multa. Já na contravenção penal: pena de prisão simples ou multa, isolada, alternativa ou cumulativamente. Em outros países como França e Alemanha, adotaram o sistema tricotômico, onde: crimes seriam as infrações mais graves, delitos as intermediarias e por fim, as contravenções penais as de menor gravidade. O Código Penal e a Lei das Contravenções Penais preveem algumas distinções quantitativas e qualitativas entre o crime e contravenção penal. A título de exemplo, quanto a aplicação da lei penal: a lei penal brasileira é aplicável, via de regra, aos crimes cometidos no território nacional (CRFB/88, art. 5º, caput) e a diversos crimes praticados no estrangeiro, em razão da sua extraterritorialidade (CP, art. 7º). Nas contravenções a lei brasileira somente incide no tocante às contravenções penais praticadas no território nacional (LCP, art. 2º).

Tratando-se da tentativa, nos crimes, é punível a tentativa (CP, art. 14, II). Mas, não se pune a tentativa de contravenção (LCP, art. 4º). O elemento subjetivo dos crimes pode ser doloso, culposo ou preterdoloso (CP, arts. 18 e 19), já nas contravenções penais, basta a ação ou omissão voluntária (LCP, art. 3º). Quanto a culpabilidade, nos crimes são compatíveis com o erro de tipo (CP, art. 20) e com erro de proibição (CP, art. 21), mas nas contravenções penais, admitem unicamente a ignorância ou a errada compreensão da lei, se escusáveis (LCP, art. 8º).

No crime, o tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 40 (quarenta) anos (CP, art. 75). Nas contravenções penais, a duração da pena de prisão simples não pode, em caso algum, ser superior a 5 (cinco) anos. Em relação ao período de prova dos sursis, nos crimes, varia entre dois a quatro anos, e, excepcionalmente, de quatro a seis anos (CP, art. 77, caput e § 2º), já nas contravenções penais, o período de sursis é de um a três anos (LCP, art. 11). O prazo mínimo das medidas de segurança, nos crimes, é de um a três anos (CP, art. 97, § 1º), nas contravenções penais, o prazo mínimo é de seis meses (LCP, art. 16). Nos crimes, a ação penal pode ser pública, incondicionada ou condicionada, ou de iniciativa privada (CP, art. 100). Nas contravenções penais, a ação penal é pública incondicionada (LCP, art. 17).

O critério analítico também é chamado de formal ou dogmático, este funda-se nos elementos que compõem a estrutura do crime. Basileu Garcia sustentava ser o crime composto por quatro elementos: fato típico, ilicitude, culpabilidade e punibilidade. Tal posição quadripartida é minoritária e, portanto, deve ser afastada, pois a punibilidade não é elemento do crime, mas uma consequência de sua prática. A título de exemplo, vamos imaginar um crime que prescreveu, não é porque operou-se o instituto da prescrição que o crime deixou de existir no mundo fático, dessa forma, o crime independe da punibilidade. Outros autores como Nélson Hungria, Aníbal Bruno, E. Magalhães Noronha, Francisco de Assis Toledo, Cezar Roberto Bittencourt e Luiz Regis Prado perfilham do entendimento da posição tripartida, onde os elementos do crime seriam: fato típico, ilicitude e culpabilidade. Hans Welzel, criador do finalismo penal, definia o crime como fato típico, ilícito e culpável: “O conceito de culpabilidade acrescenta ao de ação antijurídica – tratando-se de uma ação doloso ou não dolosa – um novo elemento, que se transforma em delito”.

A distinção entre os perfis clássico e finalista, onde a sua alocação do dolo e da culpa, reside principalmente, não em um sistema tripartido ou bipartido relativamente à estrutura do delito. No sistema clássico: crime é um fato típico e ilícito, praticado por agente culpável. No sistema finalista temos duas vertentes: crime como um fato típico e ilícito, praticado por agente culpável e também o conceito de crime como um fato típico e ilícito. Há doutrinadores que entendem o crime como fato típico e ilícito, são eles: René Ariel Dotti, Damásio E. de Jesus e Júlio Fabbrini Mirabete e outros. Os seguidores da teoria bipartida, a culpabilidade deve ser excluída da composição do crime, uma vez que se trata de pressuposto de aplicação de pena. Para a configuração do crime bastam o fato típico e a ilicitude, a culpabilidade importará na possibilidade (ou não) de imposição de pena.

Por fim, em sua redação original, o Código Penal de 1940 acolheu o conceito tripartido do crime, onde este é relacionado ao sistema clássico. Eram, portanto, elementos do crime o fato típico, a ilicitude e a culpabilidade. Acontece que, houve uma mudança com o advento da Lei 7.209/1984, onde o responsável pela redação da nova Parte Geral do Código Penal, a deixou a impressão de ter sido adotado um conceito bipartidário de crime, ligado obrigatoriamente à teoria finalista da conduta, segundo Masson (2022). (Wagner Muniz, comentários ao art. 100 do CP, em artigo intitulado “Teoria do Crime: Noções Introdutórias”, publicado em maio de 2022, no site wagnermunizk.jusbrasil.com.br, acesso em 19/02/2023 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Encerrando os comentários Flávio Olímpio de Azevedo. Comentários ao artigo 98 e 99 do Código Penal, ao falar sobre o Título VII “Da ação penal, resumindo o assunto em cinco parágrafos:

O direito de ação é exercício de provocar o Judiciário para um pronunciamento diante de uma ocorrência de uma infração penal é expressão constitucional de exigir a prestação jurisdicional aplicando o jus puniendi em nome do Estado, mediante um processo justo é garantido o sagrado direito de defesa.

Da Ação penal quanto à titularidade – pode ser pública ou Ação penal pública incondicionada à representação e Ação pública condicionada à representação, distinção que atende a critério de conveniência político-criminal.

Da Ação penal pública incondicionada – sem necessidade de queixa é iniciada por meio de petição denominada denúncia apresentada pelo Ministério Público, legitimado por atribuição constitucional (art. 129) provoca o Juiz para prestação jurisdicional.

Dependendo quando a lei exigir, pode ser representação do ofendido ou requisição do Ministro da Justiça ao Ministério Público que ao receber o pedido que lhe é dirigida, havendo elementos suficientes de tipificação penal apresentar a denúncia ou solicitar novos documentos, requisitar abertura de inquérito policial, ainda arquivar a requisição, enfim não é obrigado a iniciar a persecução penal.

Ação penal privada condicionada: “é a transferência do direito de acusar do Estado para particular, pois o interesse eminentemente privado.” Note-se que não é transferido o direito de punir, mas tão somente, o direito de agir. (Código Penal comentado, Guilherme de Souza Nucci, Editora RT, p. 101).

Por ser sujeita a representação do ofendido inicia-se com petição intitulada de queixa com os mesmos requisitos da denúncia (art. 41 do CPP).

A vítima maior de 18 anos tem legitimidade de representar, ou representante legal, no caso de impedimento da vítima mentalmente enferma ou ainda não tendo, será nomeado pelo Juiz um curador.

Em caso de morte da vítima, tem legitimidade os familiares, cônjuge, descendente ou irmão na forma do parágrafo quarto. (Flávio Olímpio de Azevedo. Comentários ao artigo 98 e 99 do Código Penal, ao falar sobre o Título VII “Da ação penal, publicados no site Direito.com, acessado em 19/02/2023, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sábado, 18 de fevereiro de 2023

Comentários ao Código Penal – Arts. 98, 99 Substituição da pena por medida de Segurança para o semimputável e dos direitos do internado VARGAS, Paulo S. R. - vargasdigitador.blogspot.com digitadorvargas@outlook.com –

Comentários ao Código Penal – Arts. 98, 99
Substituição da pena por medida de
Segurança para o semimputável
 e dos direitos do internado
  VARGAS, Paulo S. R. - vargasdigitador.blogspot.com
digitadorvargas@outlook.com
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Whatsapp: +55 22 98829-9130 

Parte Geral –Título VI – Das Medidas de segurança 

 

Substituição da pena por Medida de Segurança para semimputável e dos direitos do internado (Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/7/1984)

Art. 98. Na hipótese do parágrafo único do art. 26 deste Código e necessitando o condenado de especial tratamento curativo, a pena privativa de liberdade pode ser substituída pela internação, ou tratamento ambulatorial, pelo prazo mínimo de 1 (um) a 3 (três) anos, nos termos do artigo anterior e respectivos §§ 1º a 4º.

Segundo o título que antecede o artigo e seguindo a apreciação de Greco, Rogério. Código Penal comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários sobre o Capítulo VII “Substituição da pena por Medida de Segurança para semimputável – Art. 98 do CP, as colocações que devem ser feitas são as seguintes:

O semimputável foi condenado; foi-lhe aplicada uma pena; agora, em virtude da necessidade de especial tratamento curativo, pois sua saúde mental encontra-se perturbada, a pena privativa de liberdade a ele aplicada poderá ser substituída pela internação ou pelo tratamento ambulatorial.

Embora a lei determine, da mesma forma que o inimputável, que a internação ou o tratamento ambulatorial seja por prazo indeterminado, pois o art. 98 nos remete ao art. 97 e seus §§ 1º ao 4º, entendemos que, nesse caso especificamente, o tempo da medida de segurança jamais poderá ser superior ao tempo da condenação do agente. Querer auxiliar o agente portador de enfermidade mental retirando-o do convívio pernicioso do cárcere é uma conduta extremamente louvável, desde que o condenado não tenha de se submeter a uma medida de segurança que ultrapasse o tempo de sua condenação, uma vez que, se assim acontecesse, estaríamos agravando sua situação, mesmo que utilizássemos o argumento do tratamento curativo, dizendo que a medida de segurança seria o remédio adequado ao seu mal.

Havendo medida de segurança substitutiva de pena privativa de liberdade, a sua duração não pode ultrapassar ao tempo determinado para cumprimento da pena. (Precedentes) (STJ, H C 56828/SP, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., DJ 4/9/2006, p. 311).

Dissertando sobre o tema, Luiz Regis Prado traz á colação os diversos posicionamentos, prelecionando: “Na primeira hipótese de substituição (semimputabilidade), entende-se, por um lado, que a medida de segurança imposta não poderá exceder a duração da pena que havia sido aplicada pelo juiz. Se o prazo se esgotasse sem que o paciente se encontrasse plenamente recuperado, o mesmo deveria ser colocado à disposição do juízo cível competente. Em sentido oposto, argumenta-se que o prazo de duração da medida de segurança não deverá se ater à duração da pena substituída, cabendo tal procedimento somente na hipótese de superveniência de doença mental (art. 682, § 2º, do CPP). Nesse caso, o tempo dedicado ao tratamento terapêutico do condenado será computado para os fins de detração penal (art. 42 do CP).” (PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro - Parte gerai, p. 471).

O art. 26 do CPB, que trata sobre o tema da imputabilidade penal, é claro ao distinguir duas situações diferentes, atribuindo-as soluções diversas; no caso de o agente, ao tempo da ação ou omissão, ser inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato, em razão de doença mental ou desenvolvimento mental incompleto, será isento de pena, ao passo que o agente, que não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do faro ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, terá a pena reduzida de um a dois terços. Afastada a necessidade de tratamento psiquiátrico ao agente, que tem diminuída a sua capacidade de entendimento e determinação, com base nas circunstâncias fáticas e na conclusão da perícia realizada, não há falar em substituição da pena privativa de liberdade por medida de segurança (STJ, HC 94660/RJ Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Dje 19/12/2008).

A duração da medida de segurança substitutiva imposta em razão da superveniência de doença mental não pode ultrapassar o tempo determinado para o cumprimento da pena privativa de liberdade, sob pena de ofensa à coisa julgada (STJ, HC 41419/SP, Rel. Min. Nilson Naves, 6ª T., DJ 7/1 1/2005, p. 391). (Greco, Rogério. Código Penal comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários sobre o Capítulo VII “Substituição da pena por Medida de Segurança para semimputável – Art. 98 do CP, p. 222-223. Ed. Impetus.com.br, acesso em 18/02/2023 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo ainda a maratona de Adalberto José Moreira, comentários ao art. 98 e 99 ”Imposição da Medida de Segurança para inimputável – Autora: Maria Eduarda Mincachi Moreira, com o título “A imputabilidade do psicopata assassino em série no Brasil,  Para o semimputável, supracitado no parágrafo único do art. 26 do mesmo dispositivo legal, é possível que, verificando a necessidade, esse agente tenha sua pena substituída por medida de segurança, é o que diz o art. 98 do Código Penal:

 

A medida de segurança detentiva sujeita o inimputável ou semimputável à internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou na falta desse em outro estabelecimento penal adequado.

 

Essa espécie de medida de segurança pode ser aplicada tanto aos inimputáveis quanto aos semimputáveis, nos termos do art. 97, caput, e 98, ambos do CP. A internação deve ser realizada no denominado hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou em estabelecimento adequado para os fins terapêuticos. As regras referentes ao hospital de custódia e tratamento psiquiátrico estão previstas nos arts. 99 a 101, da LEP.

 

Pós considerações, passa-se à análise dos conceitos de doença mental, que se entende como um distúrbio psicológico, distinguindo-se do comportamento normal do ser humano (BRAGA, Hans Robert Dalbello. Manual de direito penal: parte geral, p. 462). Importante salientar não se buscar aqui esgotar completamente o tema, mas, esclarecer, de forma básica, o que é uma doença mental, mencionada no supracitado art. 26 do Código Penal.

 

Cumpre destacar o seguinte: Os profissionais de saúde mental definem um distúrbio psicológico como uma condição que prejudica seriamente a capacidade da pessoa de atuar na vida ou cria um alto nível de angústia interior (às vezes ambos). Essa visão não significa que seja sempre fácil distinguir a categoria “perturbado” da categoria “normal”. De fato, é muito mais correto ver o comportamento anormal como diferente do normal apenas em termos quantitativos. (MORRIS, Charles G. Introdução à psicologia, p.427).

 

Entre as principais doenças mentais, ou doenças psiquiátricas, estão: transtorno bipolar, transtorno obsessivo compulsivo (TOC), distúrbios alimentares, transtornos de ansiedade, esquizofrenia, depressão, estresse pós-traumático, transtorno de personalidade borderline, autismo e o transtorno de psicopatia, que também pode ser entendido como um transtorno de personalidade. (MORRIS, Charles G. Introdução à psicologia, tradução Ludmilla Lima, Marina Sobreira Duarte Baptista. São Paulo: Prentice Hall, 2004, Capítulo 12, p. 400 a 423).

 

Da Psicopatia - De acordo com dicionários da língua portuguesa, psicopata é a pessoa que sofre de doença mental, sendo a psicopatia tal doença, que é caracterizada por transtornos afetivos, comportamentos violentos, atitudes antissociais, mas principalmente o fato de que, indivíduos com essa doença, possuem condutas que são digressivas, mas sem modificação de suas faculdades mentais.  Na classificação atual do Manual Estatístico e Diagnóstico dos Transtornos Mentais 5 (DSM – V), a psicopatia é definida como transtorno de personalidade antissocial.

 

Destacam-se algumas características dos psicopatas apontadas por Cleckley: charme superficial e boa inteligência; ausência de delírios e outros sinais de pensamento irracional; ausência de nervosismo ou manifestações psiconeuróticas; não confiabilidade; falsidade e insinceridade; ausência de remorso ou culpa; comportamentos antissociais não justificados; egocentrismo patológico e incapacidade para amar; pobreza geral na maioria das relações afetivas; frieza nas relações interpessoais em geral; comportamento fantasioso e pouco convidativo; suicídio raramente cometido; vida sexual impessoal, trivial e pobremente integrada. (HENRIQUES, R. P. De H. Cleckley ao DSM-IV-TR: a evolução do conceito de psicopatia rumo à medicalização da delinquência. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, 2009).

 

Logo, a psicopatia, apesar de ser uma doença mental, não altera a percepção intelectual do sujeito, muito pelo contrário, psicopatas são apontados como pessoas muito inteligentes, que alcançam grandes cargos em suas vidas profissionais, porém, não são emotivos como a maioria, não tendo sentimentos como culpa, arrependimento, entre outros. (MONTEIRO, Renan Pereira. Entendendo a psicopatia: contribuição dos traços de personalidade e valores humanos, João Pessoa, 2014. Orientador: Valdiney Veloso Gouveia. Dissertação (Mestrado), UFPB/CCHL, p. 32 e 33).

 

Compreende-se, por fim, que os psicopatas não são pessoas desorientadas, portadoras de deficiência mental, em seu estrito conceito, ou de identidade, não é um louco. Eles não sentem culpa e podem se envolver frequentemente em crimes, inclusive, nos piores casos, assassinatos. MONTEIRO, Renan Pereira. Entendendo a psicopatia: contribuição dos traços de personalidade e valores humanos, João Pessoa, 2014. Orientador: Valdiney Veloso Gouveia. Dissertação (Mestrado), UFPB/CCHL, p. 34).

 

Portanto, a punibilidade destes indivíduos deve ser analisada de forma casuística.

 

Outro grande problema é o fato de que, como já demonstrado, psicopatas são muito inteligentes e possuem capacidade de manipular a maneira como serão identificados perante a justiça, conseguindo caracterizar-se dentro da inimputabilidade, conforme Fernando Wellington Santos da Silva aponta:

 

O judiciário enfrenta grandes desafios, pois, nem sempre, pode contar com um diagnóstico preciso acerca do indivíduo portador de psicopatia. A psiquiatria, unanimemente, vem desenvolvendo a tese de que o psicopata possui consciência dos seus atos, o que se aproxima do Direito em matéria de culpabilidade, mas, como os psicopatas são dissimulados e manipuladores, podem manipular até mesmo o especialista que o avalia. (SILVA, Fernando Wellington Santos Da. A semimputabilidade do psicopata perante o Código Penal brasileiro, p. 8).

 

Nesse mesmo sentido, aponta-se o seguinte esclarecimento sobre o tema: Para os cientistas, a psicopatia é um modo de ser, é algo inerente ao indivíduo. Ele, o psicopata, não tem doença mental, nem retardo, e sendo assim não há que se falar em inimputabilidade, prevista no art. 26, caput, do CP, aos psicopatas. Isto porque, conforme mencionado acima, os transtornos mentais dizem respeito aos casos em que os indivíduos têm sua inteligência e vontade afetados, o que, definitivamente, não é o caso dos indivíduos acometidos pela psicopatia, que são conscientes dos seus atos.

 

Mas há também posicionamento na jurisprudência, defendendo a semimputabilidade quando o réu não possuir em razão da perturbação mental, a capacidade de determinar-se frente ao conhecimento do fato ilícito. Assim, a semimputabilidade somente deverá ser mencionada quando houver claramente um déficit na capacidade de autocrítica e de julgamento de valores ético-morais. (SILVA, Fernando Wellington Santos Da. A semimputabilidade do psicopata perante o Código Penal brasileiro, p. 3).

 

A doença mental da qual é acometida o psicopata, por si só, não faz com que esses indivíduos possuam um retardo mental que os impossibilite de ter consciência sobre a vida e as ações, conforme nos diz Rafaela Pacheco Nunes: Assim, após devidamente processado e julgado, o psicopata considerado culpado pela autoridade competente, não sendo o caso de substituição nem de suspensão da pena e presentes as circunstâncias que conduzem à imposição do regime fechado, terá cárcere como destino, e não os locais destinados à custódia e ao tratamento daqueles que realmente padecem de psicopatologias. (NUNES, Rafaela Pacheco; Roberta Christie P. da Silva; Érica Fontenele Costa Lima; Filipe de Menezes Jesuíno. Revista Acadêmica Escola Superior do Ministério Público do Ceará. A psicopatia no direito penal brasileiro: respostas judiciais, proteção da sociedade e tratamento adequado aos psicopatas – uma análise interdisciplinar, p. 185).

 

Ainda destacando a supracitada autora: A partir da interseção entre Direito Penal, Psicopatologia, Psiquiatria e Psicologia, é possível concluir que o possuidor de personalidade psicopática é, a priori, capaz de compreender o caráter ilícito de seus atos, bem como de dirigir-se orientado por tal entendimento, se assim desejar. Diante disto, pode ser considerado imputável e, por conseguinte, passível de ser penalmente responsabilizado e punido por seus atos. (NUNES, Rafaela Pacheco; Roberta Christie P. da Silva; Érica Fontenele Costa Lima; Filipe de Menezes Jesuíno. Revista Acadêmica Escola Superior do Ministério Público do Ceará. A psicopatia no direito penal brasileiro: respostas judiciais, proteção da sociedade e tratamento adequado aos psicopatas – uma análise interdisciplinar, p. 188 e 189).

 

Ante o todo exposto, verifica-se que há uma inimputabilidade relativa sob o psicopata que comete assassinatos em série, havendo a necessidade de análise específica nos casos, através de perícia médica, por exemplo.

 

Há de se concluir que, a psicopatia é uma doença mental com características únicas, divergindo do conceito comum do que se entende por doente mental, geralmente associado à loucura e falta das faculdades mentais, comportamentos que divergem do senso comum, existindo um entendimento geral de que pessoas portadoras de doença mental são diferentes das demais e não possuem plena consciência de seus atos, o que não se enquadra na psicopatia, como foi demonstrado.

 

Desta forma, sob a perspectiva de que um psicopata é um sujeito de extrema inteligência, não se falaria em inimputabilidade com base no artigo 26 do Código Penal, nos casos em que esses indivíduos cometem assassinatos em série, pensando, inclusive, nas formas cruéis em que esse tipo de crime ocorre, a punição correta seria prisão, diante da segurança da população em geral em que se baseia nosso ordenamento penal.

 

Contudo, alguns desses indivíduos sofrem uma tortura mental descomunal, lhes sendo necessários tratamento psiquiátrico junto às instituições adequadas, forma de punição que se enquadraria, de certo modo, à inimputabilidade e semimputabilidade dos referidos artigos.

 

Conclui-se que, a punibilidade do assassino em série psicopata não possui uma fórmula exata, é necessário que seja feito análise caso por caso e, ainda, que exista um preparo maior do judiciário e dos profissionais da saúde à serviço do judiciário para que a devida sanção seja dada, de forma a garantir a proteção da comunidade e do direito. (Adalberto José Moreira, comentários ao art. 98 ”Imposição da Medida de Segurança para inimputável” e dos Direitos do internado, comentários ao art. 99 – há oito meses no site adalbertojm.jusbrasil.com.br, Autora: Maria Eduarda Mincachi Moreira, com o título “A imputabilidade do psicopata assassino em série no Brasil,  acesso em 18/02/ 2023 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Direitos do internado

Art. 99. O internado será recolhido a estabelecimento dotado de características hospitalares e será submetido a tratamento.

Voltando ao posicionamento e conhecimento de Greco, Rogério. Código Penal comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários sobre o Capítulo VII “Substituição da pena por Medida de Segurança para semimputável e os direito do internados – Art. 98 e 99 do CP, respectivamente, o art. 3º da Lei de Execução Penal assegura ao condenado e ao internado todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela Lei, sendo que o art. 99 do Código Penal, com a rubrica correspondente aos direitos do internado, diz que este será recolhido a estabelecimento dotado de características hospitalares e será submetido a tratamento.

Isso significa que aquele a quem o Estado aplicou medida de segurança, por reconhece-lo inimputável, não poderá, por exemplo, ser recolhido a uma cela de delegacia policial, ou mesmo a uma penitenciária em razão de não haver vaga em estabelecimento hospitalar próprio, impossibilitando-lhe, portanto, o início de seu tratamento.

O entendimento desta Cone Superior é de que a manutenção de inimputável em prisão comum constitui constrangimento ilegal (STJ, HC 134186/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho. 5ª T., DJe 30/11/2009).

A medida de segurança imposta na sentença deve informar a sua execução, não importando, contudo, em constrangimento ilegal, o tempo de permanência necessário à transferência do inimputável do estabelecimento próprio da prisão provisória para aqueloutro ajustado ao decretado pelo Poder Judiciário (STJ, H C 18803/SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 6a T., R T 805, p. 542).

Em que pese ao fato de o paciente se encontrar cumprindo medida de segurança em estabelecimento impróprio, em face da inexistência de vaga em manicômio judiciário, não há falar em constrangimento ilegal se a sua manutenção ali se dá em caráter transitório, até que surja a referida vaga, e em condições especiais (TJMG, Processo 1.0000.09.494988-0/000, Rel. Des. José Antonino Baía Borges, DJ 9/6/2009).

No caso dos autos, imposta medida de segurança de internação, observa-se a existência de patente constrangimento ilegal o fato de ter sido o paciente colocado em presídio comum, em razão da falta de hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou outro estabelecimento adequado. A insuficiência de recursos do Estado não é fundamentação idônea a ensejar a manutenção do paciente em regime prisional, quando lhe foi imposta medida de segurança de internação. Precedentes do STJ (STJ, HC 108517/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª T., DJe 20/10/2008).

Mantém-se a segregação do paciente cuja periculosidade é evidente, ainda que em cadeia pública, no caso de não haver vaga para o cumprimento da medida de internação em estabelecimento adequado. Deve-se observar, contudo, prazo razoável para essa transferência, sob pena de se submeter o paciente a constrangimento ilegal (TJMG, Processo 1.0000.04.413936-8/000[l], Rei. Des. Beatriz Pinheiro Caires, DJ W 12/2004).

Diante da ausência comprovada de vagas em Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico, ao paciente, de periculosidade com[1]provada, deve ser resguardado o direito de cumprir a medida de segurança que lhe restou imposta - internação - em estabelecimento hospitalar psiquiátrico similar. Admitir seja a medida de segurança original convertida era tratamento ambulatorial, consideradas as particularidades do caso em apreço, seria, induvidosamente, agir de modo temerário (TJMG, Processo 1.0000.00.261977-3/000 (1), Rel. Des. José Carlos Abud, DJ 1/12/2002).

Sentença absolutória (art. 26, caput, do CP) que impõe medida de segurança (art. 96- I do CP) consistente em internação pelo prazo mínimo de um ano e determina a prisão do paciente em estabelecimento adequado enquanto não verificada, mediante perícia médica, a cessação da periculosidade. Demora na realização do exame que, diante do estatuído na sentença singular, reclama a transferência do réu reconhecidamente inimputável da penitenciária para estabelecimento adequado ao cumprimento da medida de segurança, à vista das condições psíquicas do paciente (STF, H C 71733/SP, Rel. Min. Francisco Rezek, 2ª T., DJ 10/8/ 1995 p. 23.555). (Greco, Rogério. Código Penal comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários sobre o Capítulo VII “Substituição da pena por Medida de Segurança para semimputável e os direito do internados – Art. 98 e 99 do CP, respectivamente p. 222-223. Ed. Impetus.com.br, acesso em 18/02/2023 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Por sua vez, e encerrando o Título VI, Flávio Olímpio de Azevedo. Comentários aos artigos 98 e 99 do Código Penal, fala sobre o Capítulo VII “Substituição da pena por Medida de Segurança para semimputável e os direitos dos internados:

Quanto à substituição da pena privativa de liberdade pelo tratamento curativo é excepcional ao semimputável, dependendo do grau de enfermidade aplicada à internação ou terapêutica ambulatorial.

A recomendação da medida é dos peritos ao juiz. Endossada pelo seguinte julgado: “Medida de segurança – Semimputável. Entendimento do art. 98 do CP. havendo expressa recomendação dos peritos que procederam ao exame psiquiátrico do réu, acerca da necessidade de tratamento médico, de rigor a substituição da pena imposta, consoante o disposto no art. 98 do Código Penal. (TJSP. APR: 00012808220108260607 SP OO0128-82.2010.8.26.0607, rel. Wilson Barreira, DJ: 12/04/2012, 14ª C. Crim. DJe: 25/04/2012).

Quanto aos direitos do internado: Este preserva todos os direitos não afetados pela medida coercitiva dignidade e integralidade física de acordo com a LEP: “Ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei”. (art. 3º). A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade (art. 10).

Outro direito é de ter o tratamento adequado: “Sofre constrangimento ilegal o paciente que deveria estar cumprindo medida de segurança de internação, ainda que provisória, entretanto, encontra-se recluso em estabelecimento prisional comum, nos moldes do regime fechado”.(TJMG – HC: 10000140268715000 MG. Rel. Agostinho Gomes de Azevedo). (Flávio Olímpio de Azevedo. Comentários ao artigo 98 e 99 do Código Penal, ao falar sobre o Capítulo VII “Substituição da pena por Medida de Segurança para semimputável e os direito do internados, publicados no site Direito.com, acessado em 18/02/2023, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Notas: LEP – Lei de Execução Penal – 11/07/84 – art. 3º. Ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei.  Parágrafo único. Não haverá qualquer distinção de natureza racial, social, religiosa ou política.

Art. 41. Constituem direitos do preso: I. alimentação suficiente e vestuário; II. Atribuição de trabalho e sua remuneração; III. Previdência Social; IV – Constituição de pecúlio; V. Proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação; VI. Exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena; VII. Assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa;; VIII. Proteção contra qualquer forma de sensacionalismo; IX. Entrevista pessoa e reservada com o advogado; X. Visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados; XI. Chamamento nominal; XII. Igualdade de tratamento, salvo quanto às exigências da individualização da pena; XIII. Audiência especial com o diretor do estabelecimento; XIV. Representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito; XV. Contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes. XVI. Atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade da autoridade judiciária competente. (Incluído pela Lei n. 10.713, de 2003). Parágrafo único. Os direitos previstos nos incisos V, X e XV poderão ser suspensos ou restringidos mediante ato motivado do diretor do estabelecimento.

Art. 42. Aplicação ao preso provisório e ao submetido à medida de segurança, no que couber, o disposto nesta Seção.

Art. 99. O Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico destina-se aos inimputáveis e semimputáveis referidos no artigo 26 e se parágrafo único do Código Penal. Parágrafo único. Aplica-se ao hospital, no que couber, o disposto no parágrafo único, do artigo 88 da Lei.

Art. 100. O exame psiquiátrico e os demais exames necessários ao tratamento são obrigatórios para todos os internados.

Art. 101. O tratamento ambulatorial, previsto no artigo 87, segunda parte, do Código Penal, será realizado no Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico ou em outro local com dependência médica adequada.