terça-feira, 21 de abril de 2015

CÓDIGO PENAL – DECRETO-LEI N 2.848, DE 07 DE DEZEMBR0 DE 1940 – EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS DA NOVA PARTE ESPECIAL DO CÓDIGO PENAL - (...) PARTE ESPECIAL - DOS CRIMES CONTRA A PESSOA - DOS CRIMES CONTRA A VIDA - VARGAS DIGITADOR



CÓDIGO PENAL – DECRETO-LEI N 2.848, DE 07 DE DEZEMBR0 DE 1940 – EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS DA NOVA PARTE ESPECIAL DO CÓDIGO PENAL - (...) PARTE ESPECIAL -  DOS CRIMES CONTRA A PESSOA -  DOS CRIMES CONTRA A VIDA - VARGAS DIGITADOR

DOS CRIMES CONTRA A PESSOA

37. O título I da “Parte Especial” ocupa-se dos crimes contra a pessoa, dividindo-se em seis capítulos, com as seguintes rubricas: “Dos crimes contra a vida”, “Das lesões corporais”, “Da periclitação da vida e da saúde”, “Da rixa”, “Dos crimes contra a honra” e “Dos crimes contra a liberdade individual”. Não há razão para que continuem em setores autônomos os “crimes contra o a honra” e os “crimes contra a liberdade individual” (que a lei atual denomina “crimes contra o livre gozo e exercício dos direitos individuais”): seu verdadeiro lugar é entre os crimes contra a pessoa, de que constituem subclasses. A honra e a liberdade são interesses, ou bens jurídicos inerentes à pessoa, tanto quanto o direito à vida ou à integridade física.

DOS CRIMES CONTRA A VIDA

38. O projeto mantém a diferença entre uma forma simples e uma forma qualificada então enumeradas no § 2º do artigo 121. Umas dizem com intensidade do dolo, outras com o modo de ação ou com a natureza dos meios empregados; mas todas são especialmente destacadas pelo seu valor sintomático: são circunstâncias reveladoras de maior periculosidade ou extraordinário grau de perversidade do agente. Em primeiro lugar, vem o motivo torpe (isto é, o motivo que suscita a repugnância geral, v.g.: a cupidez, a luxúria, o despeito da imoralidade contrariada, o prazer do mal etc)  ou fútil (isto é, que, pela sua mínima importância, não é causa suficiente para o crime). Vem a seguir o “emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso (isto é, dissimulado na sua eficiência maléfica) ou cruel (isto é, que aumenta inutilmente o sofrimento da vítima, ou revela uma brutalidade fora do comum ou em contraste com o mais elementar sentimento de piedade) ou de que possa resultar perigo comum”. Deve notar-se que, para a inclusão do motivo fútil e emprego de meio cruel entre os agravantes que qualificam o homicídio, há mesmo uma razão de ordem constitucional, pois o único crime comum, contra o qual a nossa vigente Carta Pública permite que a sanção penal possa ir até à pena de morte, é o “homicídio cometido por motivo fútil e com extremos de perversidade” (artigo 122, n. 13, j). são também qualificativas do homicídio as agravantes que traduzem um modo insidioso da atividade executiva do crime (não se confundindo, portanto, com o emprego de meio insidioso), impossibilitando ou dificultando a defesa da vítima (como a traição, a emboscada, a dissimulação etc.). Finalmente, qualifica o homicídio a circunstância de ter sido cometido “para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime”. É claro que esta qualificação não diz com os casos e3m que o homicídio é elemento de crime complexo (in exemplis: artigos 157, § 3º, in fine, e 159, § 3º), pois, em tais casos, a pena, quando não mais grave, é, pelo menos, igual à do homicídio qualificado.

39. Ao lado do homicídio com pena especialmente agravada, cuida o projeto do homicídio com pena especialmente atenuada, isto é, o homicídio praticado “por motivo de relevante valor social, ou moral”, ou “sob o domínio de emoção violenta, logo em seguida a injusta provação da vítima”. Por “motivo de relevante valor social ou moral”, o projeto entende significar o motivo que, em si mesmo, é aprovado pela moral prática, como, por exemplo, a compaixão ante o irremediável sofrimento da vítima (caso do homicídio eutanásico), a indignação contra um traidor da pátria etc.

No tratamento do homicídio culposo, o projeto atendeu à urgente necessidade de punição mais rigorosa do que a constante da lei penal atual, comprovadamente insuficiente. A pena cominada é a de detenção por 1 (um) a 3 (três) anos, e será especialmente aumentada se o evento “resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte, ofício ou atividade”, ou quando “o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante”. Deve notar-se, além disso, que entre as penas acessórias (Capítulo V do Título V da Parte Geral), figura a de “incapacidade temporária para a profissão ou atividade cujo exercício depende de licença, habilitação ou autorização do poder público”, quando se trate de crime cometido com infração de dever inerente à profissão ou atividade. Com estes dispositivos, o projeto visa, principalmente, a condução de automóveis, que constitui, na atualidade, devido a um generalizado descaso pelas cautelas técnicas (notadamente quanto à velocidade), uma causa frequente de eventos lesivos contra a pessoa, agravando-se o mal com o procedimento post factum dos motoristas, que, tão-somente com o fim egoístico de escapar à prisão em flagrante ou à ação da justiça penal, sistematicamente imprimem maior velocidade ao veículo, desinteressando-se por completo da vítima, ainda quando um socorro imediato talvez pudesse evitar-lhe a morte.

40. O infanticídio é considerado um delictum exceptum quando praticado pela parturiente sob a influência do estado puerperal. Esta cláusula, como é óbvio, não quer significar que o puerpério acarrete sempre uma perturbação psíquica: é preciso que fique averiguado ter esta realmente sobrevindo em consequência daquele, de modo a diminuir a capacidade de entendimento ou de autoinibição da parturiente. Fora daí, não há por que distinguir entre infanticídio e homicídio. Ainda quando ocorra a honoris causa (considerada como lei vigente como razão de especial abrandamento da pena), a pena aplicável é a de homicídio.

41. Ao configurar o crime de induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio,  o projeto contém inovações: é punível o fato ainda quando se frustre o suicídio; desde que resulte lesão corporal grave ao que tentou matar-se, e a pena cominada será aplicada em dobro se o crime obedece a móvel egoístico ou é praticado contra menor ou pessoa que,, por qualquer outra causa, tenha diminuída a capacidade de resistência.


Mantém o projeto a incriminação do aborto, mas declara penalmente lícito, quando praticado por médico habilitado, o aborto necessário, ou em caso de prenhez resultante de estupro. Militam em favor da exceção razões de  ordem social e individual, a que o legislador penal não pode deixar de atender.

DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR - 1. O QUE É DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR - CURSO DE DIREITO FAMESC 8º PERÍODO - PROFESSORA NEUZA - 1ª AULA - FEV/2015 - VARGAS DIGITADOR



DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR – ANTÔNIO CARLOS GIL – ATLAS S.A.2015 – PREFÁCIO – 1. O QUE É DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR - VARGAS DIGITADOR

Prefácio

Com intensidade muito maior do que em qualquer outra época, o ensino universitário vem sendo objeto de discussão. Discute-se o acesso de um contingente cada vez maior de pessoas a esse nível de ensino. Discute-se o perfil do profissional que a universidade deve formar. Discute-se o que fazer para tornar mais eficaz o ensino proporcionado pelos estabelecimentos de Ensino Superior. E, em relação a este item, o papel das novas tecnologias de ensino corresponde, sem dúvida, à discussão mais constante.

Também se discute acerca da preparação dos professores universitários. E é consenso que essa preparação deve ocorrer principalmente em cursos de pós-graduação, como define a Lei de Diretrizes e Bases. Como consequência, os cursos de Mestrado e Doutorado vêm sendo muito procurados por profissionais com interesse no exercício do Magistério Superior. Basta considerar que em 1996, segundo dados da CAPES, existiam 67.820 alunos da pós-graduação no país e em 2003 eram 112.237.

Os cursos de pós-graduação, no seu sentido estrito, têm como objetivo principal formar pesquisadores, o que contribui significativamente para que seus concluintes possam ministrar melhores aulas. Mas esses cursos, em sua grande maioria,não oferecem a seus estudantes disciplinas voltadas para o desenvolvimento de habilidades pedagógicas, que são tão importantes para o professor quanto os conhecimentos específicos referentes às disciplinas que pretendem lecionar. Isto porque nem as novas concepções acerca do papel do professor nem o desenvolvimento das tecnologias de comunicação foram capazes de tornar desnecessária a presença em sala de aula de professores hábeis para promover apresentações, animar discussões e incentivar os estudantes a desenvolver atividades fora da sala de aula.

Requer-se, ainda, a presença em sala de aula de profissional que, mediante habilidosa combinação de suas habilidades pessoais com as exigências do ambiente e as expectativas dos estudantes, seja capaz de tornar o aprendizado mais agradável e eficiente. É necessária a presença de profissional que saiba definir objetivos de ensino, selecionar conteúdos, escolher as estratégias de ensino mais adequadas e promover uma avaliação comprometida coma aprendizagem. Ou, em outras palavras, de um professor que detenha conhecimentos e habilidades relacionadas à Didática, especificamente Didática do Ensino Superior.

O ensino de Didática tem sido bem aceito no Ensino Básico e Médio, mas não no Ensino Superior. Basta considerar que um dos mais importantes livros destinados à preparação de professores universitários, que é o Wilbert J. McKeachie, vem sendo editado nos EUA há mais de 50 anos, com o título Teaching tips (“Dicas de ensino”). Constitui ele excelente manual de didática do Ensino Superior.

Ao aceitar, portanto, a publicação desta Didática do Ensino Superior, a Editora Atlas, cujas obras se destinam principalmente ao público universitário, demonstra sua crença nas possibilidades de aprimoramento do pessoal docente nesse nível. Não poderia, portanto, ao prefaciar este livro, deixar de agradecer à Editora Atlas, de forma especial ao seu Presidente, Luiz Hermann Júnior, e ao seu Diretor de Marketing Editorial, Ailton Bonfim Brandão, a confiança depositada nesta obra. E de lembrar, com muita saudade, o apoio oferecido por tantos anos por Luiz Hermann ao nosso trabalho e ao de tantos outros autores nacionais.
ANTONIO CARLOS GIL

1 – O que é didática do Ensino Superior

Durante muito tempo prevaleceu no âmbito do Ensino Superior a crença de que, para se tornar um bom professor neste nível, bastaria dispor de comunicação fluente e sólidos conhecimentos relacionados à disciplina que pretendesse lecionar. A justificativa dessa afirmação fundamentava-se no fato de o corpo discente das escolas superiores ser constituído por adultos, diferentemente do corpo discente do ensino básico, constituído por crianças e adolescentes. Assim, esses alunos não necessitariam do auxílio de pedagogos. Aliás, o próprio termo pedagogia tem sua origem relacionada à palavra criança (em grego: paidos = criança; gogein = conduzir). Os estudantes universitários, por já possuírem uma “personalidade formada” e por saberem o que pretendem, não exigiriam de seus professores mais do que competência para transmitir os conhecimentos e para sanar suas dúvidas. Por essa razão é que até recentemente não se verificava preocupação explícita das autoridades educacionais com a preparação de professores para o Ensino Superior. Ou melhor, preocupação existia,mas com a preparação de pesquisadores, ficando subentendido que quanto melhor pesquisador fosse mais competente professor seria.

Hoje são poucas as pessoas envolvidas com as questões educacionais que aceitam uma justificativa desse tipo. O professor universitário, como o de qualquer outro nível, necessita não apenas de sólidos conhecimentos na área em que pretende lecionar, mas também de habilidades pedagógicas suficientes para tornar o aprendizado mais eficaz. Além disso, o professor universitário precisa ter uma visão de mundo, de ser humano, de ciência e de educação compatível com as características de sua função.

As deficiências na formação do professor universitário ficam claras nos levantamentos que são realizados com estudantes ao longo dos cursos. Nestes é comum verificar que a maioria das críticas em relação aos professores refere-se à “falta de didática”. Por essa razão é que muitos professores e postulantes à docência em cursos universitários vêm realizando cursos de didática do Ensino Superior, que são oferecidos em nível de pós-graduação, com uma frequência cada vez maior, por instituições de Ensino Superior.

Como este livro é inteiramente dedicado à Didática do Ensino Superior, seu Capítulo 1 destina-se à discussão do significado da formação dos professores universitários. Após estudá-lo cuidadosamente, você será capaz de:

·       Analisar o conceito de Didática em um contexto histórico;
·       Reconhecer a importância da opção pelo ensino ou pela aprendizagem;
·       Contrastar diferentes abordagens acerca do processo da aprendizagem;
·       Contrastar os princípios da Pedagogia e da Andragogia;
·       Identificar fatores que contribuem para a eficácia da aprendizagem.

1.1  – Qual o lugar da didática na formação de professores

O termo didática deriva do grego didaktiké, que tem o significado de arte de ensinar. Seu uso difundiu-se com o aparecimento da obra de Jan Amos Comenius (1592-1670), Didactica Magna, ou Tratado da arte universal de ensinar tudo a todos, publicada em 1657. Nos dias atuais, deparamo-nos com muitas definições diferentes de didática, mas quase todas apresentam-na como ciência, técnica ou arte de ensinar. Uma definição obtida em dicionário atual a vê como “parte da Pedagogia que trata dos preceitos científicos que orientam a atividade educativa de modo a torná-la mais eficiente” (HOUAISS, 2011). Com efeito, a Pedagogia reconhecida tradicionalmente como a arte e a ciência da educação, enquanto ao didática é definida como a ciência e a arte do ensino. Para Masetto (1997), Didática é “o estudo do processo de ensino-aprendizagem em sala de aula e de seus resultados” e surge, segundo Libâneo (1994, p. 58), “quando os adultos começam a intervir na atividade de aprendizagem das crianças e jovens através da direção deliberada e planjeda do ensino, ao contrário das formas de intervenção mais ou menos espontâneas de antes”.

Até o final do século XIX, a Didática encontrou seus fundamentos quase que exclusivamente na filosofia. Isso pode ser constatado não apenas nos trabalhos de Comenius, mas também nos Jean Jacques Rousseau (1712-1778), Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827), Johann Friedrich Herbart (1777-1841) e de outros pedagogos desse período. As obras desses autores, no entanto, mostraram-se bastante adiantadas em relação às concepções psicológicas dominantes em seu tempo.

A partir do final do século XIX, a Didática passou a buscar fundamentos também nas ciências, especialmente na Biologia e na Psicologia, graças às pesquisas de cunho experimental. No início do século XX, por sua vez, surgiram números movimentos de reforma escolar tanto na Europa quando na América. Embora diversos entre si, esses movimentos reconheciam a insuficiência da didática tradicional e aspiravam a uma educação que levasse mais em conta os aspectos psicológicos envolvidos no processo de ensino. Costuma-se reunir essas tendências pedagógicas sob o nome de Pedagogia da “Escola Nova” ou da “Escola Ativa”. A literatura referente a essas tendências é muito extensa e envolve obras de autores como: Ovide Decroly (1881- 1932), da Bélgica, Georg Kerschensteiner (1854-1932), da Alemanha, Roger cousinet (1881-1973), da França, Édouard Claparède (1873-1940), da Suíça, e John Dewey (1859-1952), dos Estados Unidos. Esses movimentos surgiram dentro de um contexto histórico-social que teve como foco principal o processo de industrialização, com a burguesia industrial firmando-se como classe hegemônica e interessada, consequentemente, na difusão de suas ideias liberais.

O movimento escolanovista surgiu como uma nova forma de tratar os problemas da educação, procurando fornecer um conjunto de princípios tendentes a rever as formas tradicionais de ensino. A Escola Nova pretendia ser um movimento de renovação pedagógica de cunho fundamentalmente técnico, que buscava aplicar na prática educativa os conhecimentos derivados das ciências do comportamento. Com efeito, a partir da segunda década do século XX a Didática passou a seguir os postulados da Escola Nova. Como essa perspectiva afirmava a necessidade de partir dos interesses espontâneos e naturais da criança, passou-se a valorizar os princípios de atividade, liberdade e individualização. Abandonou-se a visão da criança como um adulto em miniatura para centrar-se nela como um ser capaz de adaptar-se a cada uma das fases de sua evolução. Assim, do aluno passivo ante os conhecimentos transmitidos pelo professor passou-se ao aluno que se autoeduca ativamente num processo natural, sustentado pelos interesses e ações concretas de seus colegas.

A ideia básica da Escola Nova é a de que o aluno aprende melhor por si próprio. A atenção às diferenças individuais e a utilização de jogos educativos passaram, portanto, a ter maior destaque. Dessa forma, a Didática da Escola Nova passou a considerar o aluno como sujeito da aprendizagem. O que caberia ao professor seria colocar o aluno em situações em que fosse mobilizada a sua atividade global, possibilitando a manifestação de suas atividades verbais, escritas, plásticas ou de qualquer outro tipo. O centro da atividade escolar não seria, portanto, nem o professor nem a matéria, mas o aluno ativo e investigador. Ao professor caberia principalmente incentivar, orientar e organizar as situações de aprendizagem, adequando-as às capacidades e às capacidades e às características individuais dos alunos.

No Brasil, as ideias da escola Nova tornaram-se conhecidas na década de 1920 e foram muito prestigiadas após a Revolução de 11930, graças ao trabalho de educadores domo Fernando de Azevedo, Anísio Teixeira e Lourenço Filho. Estas ideias, no entanto, receberam muitas críticas, principalmente dos educadores mais conservadores. A Escola Nova foi acusada de não exigir nada dos alunos, de abrir mão dos conteúdos tradicionais e de acreditar ingenuamente em sua espontaneidade. Como as mudanças introduzidas pela Revolução de 1930 não foram suficientes para abalar significativamente o conservadorismo das elites brasileiras, a Escola Nova não conseguiu modificar de maneira significativa os métodos didáticos utilizados nas escolas brasileiras. Mas no meio acadêmico universitário, o ensino da Didática continuou até a década de 1950 a privilegiar objetivos, temas e procedimentos metodológicos de inspiração escolanovista.

Do início da década de 1950 até o final da década de 1970, o ensino da didática privilegiou métodos e técnicas de ensino com vistas a garantir a eficiência da aprendizagem dos alunos e a defesa de sua neutralidade científica. O tecnicismo passou a assumir uma posição fundamental no discurso educacional e consequentemente no ensino da Didática. Enquanto disciplina acadêmica, a didática passou a enfatizar a elaboração de planos de ensino, a formulação de objetivos instrucionais, a seleção de conteúdos, as técnicas de exposição e de condução de trabalhos em grupo e a utilização de tecnologias a serviço da eficiência das atividades educativas. A Didática passou a ser vista principalmente como um conjunto de estratégias para proporcionar o alcance dos produtos educacionais, confundindo-se com a Metodologia de Ensino. Seus propósitos eram, pois, os de “fornecer subsídios metodológicos aos professores para ensinar bem, sem se perguntar a serviço do que e de quem se ensina” (OLIVEIRA, ANDRÉ, 2003, p. 13). Essa tendência acentuou-se com a adoção das políticas de cunho desenvolvimentarista pelo governo militar que se instalou em 1964, que tinha a formação de mão-de-obra como o referencial central da educação.

A partir do final da década de 1970, acentuaram-se as críticas a essa Didática instrumental, sobretudo em relação aos pressupostos da neutralidade científica e técnica que a envolvem. De fato, a Didática, nessa perspectiva, pode ser concebida como um conjunto de conhecimentos técnicos apresentados de forma universal e, consequentemente, desvinculados dos problemas relativos ao sentido e aos fins da educação, dos conteúdos específicos e do contesto sociocultural concreto em que foram gerados (CANDAU, 1986).

As principais críticas a essa didática instrumental têm sido feitas por educadores vinculados à corrente conhecida como didática crítico-social dos conteúdos. Segundo os que a defendem, é necessário, em primeiro lugar, definir um projeto de sociedade que contemple a escola com função de transformação da realidade na qual está inserida. A partir desse projeto de sociedade, busca-se uma proposta pedagógica que instrumentalize o aluno para que, como cidadão, possa transformar a realidade existente. Um dos principais expoentes desse movimento é José Carlos Libâneo, que afirma em um de seus textos:

          “Insistimos bastante na exigência didática de partir do nível de conhecimentos já alcançado, da capacidade atual de assimilação e do desenvolvimento mental do aluno. Mas, atenção: não existe o aluno em geral, mas um aluno vivendo numa sociedade determinada, que faz parte de um grupo social e cultural determinado, sendo que essas circunstâncias interferem na sua capacidade de aprender,nos seus valores e atitudes, na sua linguagem e suas motivações. Ou seja, a subjetividade e a experiência sociocultural concreta dos alunos são o ponto de partida para a orientação da aprendizagem. Um professor que aspira ter uma boa didática necessitra aprender a cada dia como lidar com a subjetividade dos alunos, sua liguagem, suas percepções, sua prática de vida. Sem essa disposição, será incapaz de colocar problemas, desafios, perguntas, relacionados com os conteúdos, condição para se conseguir uma aprendizagem significativa. [...] A didática hoje precisa comprometer-se com a qualidade cognitiva das aprendizagens e esta, por sua vez, está associada à aprendizagem do pensar. Cabe-lhe investigar como se pode ajudar os alunos a se constituírem como sujeitos pensantes, capazes de pensar e lidar com conceitos, argumentar, resolver problemas, para se defrontarem com dilemas e problemas da vida prática. [...] Para adequar-se às necessidades contemporâneas relacionadas com as formas de aprendizagem, a didática precisa fortalecer a investigação sobre o papel mediador do professor na preparação dos alunos para o pensar. [...] Nesse caso, a questão está em como o ensino pode impulsionar o desenvolvimento das competências cognitivas mediante a formação de conceitos teóricos. Ou, em outras palavras, o que fazer para estimular as capacidades investigadoras dos alunos ajudando-os a desenvolver competências e habilidades mentais (LIBÂNEO, 2001, p. 3).

A polêmica em relação à Didática é bastante acentuada. Na verdade,e sta disciplina nunca foi monolítica. É o que prova a própria necessidade de adjetivação adotada muitas vezes: Didática renovada, Didática ativa, Didática nova, didática tradicional, Didática experimental, Didática psicológica, Didática sociológica, Didática filosófica, Didática moderna, Didática geral, didática especial etc. (CASTRO, 1991, p, 21). Essa  polêmica, no entanto,não aparece com tanta ênfase em relação ao ensino universitário. Embora os estudiosos da educação insistam na importância da aquisição de conhecimentos e habilidades pedagógicas pelos professores também nesse nível de ensino, muitos professores universitários não reconhecem a importância da Didática para a sua formação.

Cabe considerar também que a maioria dos professores universitários não dispõe de preparação pedagógica. E também qe, ao contrário dos que lecionam em outros níveis, muitos professores universitários exercem duas atividades: a de profissional de determinada área e a de docente, com a predominância da primeira. Por essa razão, tendem a conferir menos atenção às questões de natureza didática que os professores dos demais níveis, que são os que receberam sistematicamente formação pedagógica.

Aliás, no Ensino Superior é onde menos se verifica menor diversidade em relação às práticas didáticas. As aulas expositivas são as mais frequentes e o professor de modo geral aprende a ensinar por ensaio e erro. O professor constitui a principal fonte sistemática de informações, e uma das habilidades que mais incentivam nos alunos é a da menorização. A prática mais constante de avaliação da aprendizagem consiste em aplicar provas e dar notas, que com frequência também é usada como meio de estabelecer autoridade em relação ao aluno. Aos alunos, por sua vez, cabe colocarem-se na condição de ouvintes e esperar que os professores “deem aulas”. Até parece, como afirma Maria Isabel Cunha (1997, p. 26), “que os professores criam um certo sentimento de culpa se não são eles que estão ‘em ação’, isto é, ocupando espaço com a palavra na sala de aula”.

1.2  Ensino ou aprendizagem?

Uma das principais questões relacionadas à atuação do professor universitário refere-se à relação entre ensino e aprendizagem. Trata-se de um assunto bastante polêmico, apesar de alguns autores considerarem-no uma falsa questão. Para Abreu e Masetto (1986), uma das mais importantes opções feitas pelo professor dá-se entre o ensino que ministra ao aluno e a aprendizagem que este adquire.

Muitos professores, ao se colocarem à frente de uma classe, tendem a se ver como especialistas na disciplina que lecionam a um grupo de alunos interessados em assistir a suas aulas. Dessa forma, as ações que desenvolvem em sala de aula podem ser expressas pelo verbo ensinar ou por correlatos, como: instruir, orientar, apontar, guiar, dirigir, treinar, formar, amoldar, preparar, doutrinar e instrumentar. A atividade desses professores, que, na maioria das vezes, reproduz os processos pelos quais passaram ao longo de sua formação, centraliza-se em sua própria pessoa, em suas qualidades e habilidades. Assim, acabam por demonstrar que fazem uma inequívoca opção pelo ensino.

Esses professores percebem-se como especialistas em determinada área do conhecimento e cuidam para que seu conteúdo seja conhecido pelos alunos. “A sua arte é a arte da exposição” (LEGRAND, 1976, p. 63). Seus alunos, por sua vez, recebem a informação, que é transmitida coletivamente. Demonstram receptividade e a assimilação correta por meio de “deveres”, “tarefas” ou “provas individuais”. Suas preocupações básicas podem ser expressas por indagações como: “Que programa devo seguir?”, “Que matéria devo dar?”, “Que critério deverei utilizar para aprovar ou reprovar os alunos?”.

Mas há professores que veem os alunos como os principais agentes do processo educativo. Preocupam-se em identificar suas aptidões, necessidades e interesses com vistas a auxiliá-los na coleta das informações de que necessitam no desenvolvimento de novas habilidades, na modificação de atitudes e comportamentos e na busca de novos significados nas pessoas, nas coisas e nos fatos. Suas expectativas, interesses, possibilidades, oportunidades e condições para aprender. Atuam, portanto, como facilitadores da aprendizagem, segundo a linguagem utilizada por Carl Rogers (1902-1987). Os educadores progressistas, preocupados com uma educação para a mudança, constituem os exemplos mais claros de adoção desta postura. Seus alunos são incentivados a expressar suas próprias ideias, a investigar com independência e a procurar os meios para o seu desenvolvimento individual e social.

À medida que a ênfase é colocada na aprendizagem, o papel predominante do professor deixa de ser o de ensinar, e passa a ser o de ajudar o aluno a aprender. Este contexto, educar deixa de ser a “arte de introduzir ideias na cabeça das pessoas, mas de fazer brotar ideias” (WERNER, BOWER, 1984, p. 1-15). As preocupações básicas desses professores, por sua vez, são expressas em indagações como: “Quais as expectativas dos alunos?”, “Em que medida determinado aprendizado poderá ser significativo para eles?”, “Quais as estratégias mais adequadas para facilitar seu aprendizado?”.

Consciente ou inconscientemente, os professores tendem a enfatizar um ou outro polo, o que faz com que sua atuação se diversifique significativamente. Em apoio à postura que enfatiza o ensino, costuma-se lembrar que o magistério é uma vocação, que a missão do professor é a de ensinar, que para isso é que ele se preparou e que, à medida que seja um especialista na matéria e que domine a “arte de ensinar”, ninguém melhor do que ele poderá contribuir para que, por meio de seu ensino, os alunos aprendam.

Muitas críticas, no entanto, têm sido feitas à postura dos professores que conferem maior ênfase ao ensino. Segundo Paulo Freire (2002, p, 86),

A narração, de que o educador é o sujeito, conduz os educandos à memorização mecânica do conteúdo narrado. Mais ainda, a narração os transforma em “vasilhas”, em recipientes a serem “enchidos” pelo educador. Quanto mais vá enchendo os recipientes com seus “depósitos”, tanto melhor educador será. Quanto mais se deixarem totalmente “encher”, tanto melhores educados serão.

Esse tipo de educação, caracterizada pelo ato de transmitir, depositar ou transferir valores e conhecimentos, é chamado por Paulo Freire (2002, p. 67) de “bancária”, pois nela:

a)    O educador é o que educa; os educandos, os que são educados;

b)    O educador é o que sabe; os educandos, os que não sabem;

c)     O educador é o que pensa; os educandos, os pensados;

d)    O educador é o que diz a palavra; os educandos, os que a escutam docilmente;

e)    O educador é o que disciplina; os educandos, os disciplinados;

f)      O educador é o que opta e prescreve sua opção; os educandos, os que seguem a prescrição;

g)    O educador é o que atua; os educandos, os que têm a ilusão de que atuam na atuação do educador;

h)    O educador escolhe o conteúdo programático; os educandos jamais são ouvidos nesta escolha, acomam-se a ele;

i)       O educador identifica a autoridade do saber com sua autoridade funcional, que se opõe, antagonicamente, à liberdade dos educandos; estes devem adaptar-se às determinações daquele;

j)      O educador, finalmente, é o sujeito do processo; os educandos, meros objetos.

De fato, as perspectivas educacionais mais modernas, que se apoiam tanto numa visão humanista da educação quanto nas contribuições fornecidas pelas ciências do comportamento, concorrem para valorizar a ênfase na aprendizagem dos alunos sobre o ensino de seus professores. Hoje, o que mais interessa é a aquisição de uma mentalidade científica, o desenvolvimento das capacidade de análise, síntese e avaliação, bem como o aprimoramento da imaginação criadora. Nesse contexto, o que menos interessa é a informação especializada. O principal papel do professor do ensino Superior passa a ser, portanto, o de formar pessoas, prepará-las para a vida e para a cidadania e treiná-las como agentes privilegiados do progresso social.

Mas a ênfase na aprendizagem, a despeito de seus inegáveis méritos humanistas e do embasamento nas modernas teorias e pesquisas educacionais, também tem gerado equívocos. Há professores que exageram o peso a ser atribuído às qualidades pessoais de amizade, carinho, compreensão, amor, tolerância e abnegação e simplesmente excluem a tarefa de ensinar de suas cogitações funcionais. Alicerçados no princípio de que “ninguém ensina ninguém”, atribuído a Rogers, muitos professores simplesmente se eximem da obrigação de ensinar. Na verdade, o que passam a fazer nada mais é que, mediante o argumento da autoridade, desprezam a tarefa de ensinar, “entram no jogo das classes dominantes, pois a estas interessa um professor bem comportado, um missionário de um apostolado, um abnegado; tudo, menos um profissional que tem como função principal o ensino” (ALMEIDA, 1986).

Para muitos professores universitários, essa polêmica ao existe. Boa parte desses professores aprendeu seu ofício como os antigos aprendiam: fazendo. Os professores universitários não recebem preparação pedagógica específica e mesmo ao longo da sua vida profissional raramente têm a oportunidade de participar em cursos, seminários ou reuniões sobre métodos de ensino e avaliação da aprendizagem. A pedagogia fica, portanto, ao sabor dos dotes naturais de cada professor.

O que de fato ocorre é que a grande maioria dos professores universitários ainda vê o ensino principalmente como transmissão de conhecimento através das aulas expositivas. Muitos estão certamente atentos às inovações pedagógicas, sobretudo no referente à tecnologia material de ensino, mas muitos outros mantêm uma atitude conservadora. Isto não significa que a generalidade dos professores negligencie a qualidade do ensino a que são devotados,mas que, de modo geral, não tem incentivos para desenvolver a sua capacidade pedagógica e que, muitas vezes,nem dispõe de informação sobre a evolução da pedagogia universitária.

A pedagogia do Ensino Superior tem progredido com novos conceitos e novos métodos. O estudante, que era visco como sujeito passivo, é hoje substituído pelo sujeito ativo da aprendizagem. Ele procura ativamente a informação complementar necessária para a solução de problemas concretos, estruturando racionalmente os conhecimentos que vai adquirindo, entrelaçando o que lhe é transmitido com o que ele próprio procura. Com isto, o ensino passa a ser mais do que a transmissão de conhecimento. Passa a exigir o fornecimento de métodos e de ferramentas para o desempenho desse papel ativo. Dessa forma, a atenção principal na ação educativa transfere-se, em grande parte, do ensino para a aprendizagem. Mudou com isto o papel do professor, em síntese, a atenção principal na ação educativa, transfere-se, em grande parte, do ensino para a aprendizagem. Assim, o professor mais do que transmissor de conhecimento, é um facilitador da aprendizagem.

Embora a polêmica persista, não é difícil constatar que o ensino torna-se muito mais eficaz quando os alunos de fato participam. As aulas tornam-se muito mais vivas e interessantes quando são entrecortadas com perguntas feitas aos alunos. Elas concluem a rumos diferentes, conforme as respostas dos alunos. Uma resposta suscita uma informação adicional que suscita outra pergunta e, consequentemente, outra resposta. Desta forma, as aulas passam geralmente a requerer uma breve revisão, que é feita coloquialmente com a participação dos alunos.

Os professores deixa de ser a figura central em sala de aula. Com a participação dos alunos é que a aula verdadeiramente é tecida. Lembrando os magníficos versos de João Cabral de Melo Neto, em Tecendo a manhã:

                    Um galo sozinho não tece uma manhã:
                    Ele precisará sempre de outros galos,
                    De um que apanhe esse grito
                    E o lance a outro; de um outro galo
                    Que apanhe o grito de um galo antes
                    E o lance a outro; e de outros galos
                    Que com muitos outros galos se cruzem
                    Os fios de sol de seus gritos de galo,
                    Para que a manhã, desde uma teia tênue,
                    Se vá tecendo, entre todos os galos.

Neste contexto, o professor passa a ter um papel mais difícil. Com frequência, tem que improvisar. Já não pode limitar-se a explanar a matéria. Tem que estar preparado para, a qualquer momento, ter que reorientar a aula, dar-lhe uma nova perspectiva. Precisa garantir que aula que ministra é superior à leitura de um livro ou à assistência a um filme. Mesmo porque muitas das aulas ministradas em cursos universitários não passam de seções de leitura, diferindo das aulas medievais apenas porque o livro utilizado pelo lente naquela época foi substituído pelas transparências projetadas.

Uma velha anedota auxilia no entendimento desta questão. É possível ensinar um cachorro a falar? Sim, e é muito fácil. O difícil é fazê-lo aprender.

1.3  Como abordar o processo de ensino

O fenômeno educativo não é uma realidade acabada capaz de ser identificada clara e precisamente em seus múltiplos aspectos. Por ser um fenômeno humano e histórico, tende a ser abordado sob diferentes óticas. Mizukami (1986) define cinco abordagens: tradicional, comportamentalista, humanista, cognitivista e sociocultura, que são apresentadas a seguir.

Abordagem tradicional. Esta abordagem privilegia o professor como especialista, como elemento fundamental na transmissão dos conteúdos. O aluno é considerado um receptor passivo, até que, de posse dos conhecimentos necessários, torna-se capaz de ensiná-los a outros e a exercer eficientemente uma profissão. Essa abordagem denota uma visão individualista do processo educativo e do caráter cumulativo do conhecimento. O ensino é caracterizado pelo verbalismo do professor e pela memorização do aluno. Sua didática pode ser resumida em “dar a lição” e “tomar a lição”, e a avaliação consiste fundamentalmente em verificar a exatidão da reprodução do conteúdo comunicado em aula.

Abordagem comportamentalista. Para os comportamentalistas ou behavioristas, o conhecimento é resultado direto da experiência. A escola é reconhecida como a agência que educa formalmente e os modelos educativos são desenvolvidos com base na análise dos processos por meio dos quais o comportamento é modelado e reforçado. O professor é visto como um planejador educacional que transmite conteúdos que têm como objetivo o desenvolvimento de competências. Para Skinner, um dos principais teóricos desta abordagem, a realidade é um fenômeno objetivo e o ser humano é um produto do meio, podendo, portanto, ser controlado e manipulado. Dessa forma, o ensino se dá num processo que tem como modelo a instrução programada, na qual assume fundamental importância o controle do trabalho pelo professor, não interessando tanto a atividade mais autônoma do estudante.

Abordagem humanista. Esta abordagem foca predominantemente o desenvolvimento da personalidade dos indivíduos e tem Carl Rogers como um de seus principais teóricos. O professor não transmite conteúdos, mas dá assistência aos estudantes, atuando como facilitador da aprendizagem. O conteúdo emerge das próprias experiências dos estudantes, que são considerados num processo contínuo de descoberta de si mesmos. A ênfase é no sujeito, mas uma das condições necessárias para o desenvolvimento individual é o ambiente. Assim, a escola é vista como a instituição que deve oferecer condições que possibilitem a autonomia dos alunos.

Abordagem cognitivista. Esta abordagem é fundamentalmente interacionalista. O conhecimento é entendido como produto das interações entre sujeito e objeto, não enfatizando nenhum polo desta relação, como acontece na abordagem comportamentalista, que enfatiza o objeto,e na humanista, que enfatiza o sujeito.os principais representantes desta corrente são Jean Piaget e Jerome Bruner. O cognitivismo considera o indivíduo como um sistema aberto, que passa por reestruturações sucessivas, em busca de um estágio final nunca alcançado completamente. Assim, a escola deveria proporcionar ao estudante as oportunidades de investigação individual que lhe possibilitassem aprender por si próprio. O ensino compatível com esta abordagem deveria fundamentar-se no ensaio-e-erro, na pesquisa e na solução de problemas por parte dos estudantes e não na aprendizagem de definições, nomenclaturas e fórmulas. A estratégia  geral do processo seria a de ajudar o estudante no desenvolvimento de um pensamento autônomo, crítico e criativo. Não seriam privilegiadas ações finalistas, mas mediadoras do processo de aprendizagem. Estas deveriam contribuir para a organização do raciocínio com vistas a lidar com informações, estabelecer relações entre conteúdos e conduzir a uma generalização cognitiva que possibilitasse sua aplicação em outras situações e momentos da aprendizagem. Aos professores caberia proporcionar a orientação necessária para que os objetos pudessem ser explorados pelos estudantes sem o oferecimento de soluções prontas.

Abordagem sociocultural. Esta abordagem enfatiza os aspectos socioculturais que envolvem o processo de aprendizagem. Assim como o construtivismo, esta abordagem pode ser considerada interacionista. No entanto, confere ênfase especial ao sujeito como elaborador e criador do conhecimento. O ser humano torna-se efetivamente um “ser sujeito” à medida que, integrado ao seu contexto, reflete sobre ele e toma consciência de sua historicidade. A educação torna-se, portanto, fator de suma importância na passagem das formas mais primitivas de consciência para uma consciência crítica. Sendo o ser humano sujeito de sua própria educação, as ações educativas devem ter como principal objetivo promovê-lo e não ajustá-lo à sociedade. Um dos principais representantes dessa corrente é Paulo Freire, para quem a verdadeira educação é a educação problematizadora, que auxilia na superação da relação opressor-oprimido. A essência desta educação é a dialogicidade, por meio da qual educador e educando tornam-se sujeitos de um processo em que crescem juntos. Nessa abordagem, o conhecimento deve ser entendido como uma transformação contínua e não transmissão de conteúdos programados.

1.4  Pedagogia ou Andragogia?

Embora o professor seja frequentemente visto como o principal elemento do processo de aprendizagem, ele não tem naturalmente o domínio de fatores relacionados aos estudantes, tais como suas características pessoais, necessidades e interesses na é capaz também, na maioria dos casos, de influenciar significativamente a organização administrativa da escola. Mas ele tem muita responsabilidade em relação ao conhecimento da disciplina que ministra, às habilidades para comunicação dos conteúdos, à maestria em relação ao uso de recursos instrucionais e ao clima estabelecido em sala de aula.

Como foi visto, a preparação dos professores para o ensino básico dá-se em cursos que oferecem disciplinas de cunho pedagógico. Também foi lembrado que a palavra pedagogia refere-se à condução de crianças. Dessa forma, cursos dessa natureza não seriam adequados para a preparação de professores universitários, cujos alunos, embora nem sempre sejam adultos, estão mais próximos dessa etapa da vida do que da infância. Por essa razão é que a partir do último quartel do século XX, graças ao aparecimento do livro The modern pratice of adult education, de Malcom Knowles (1970), começou a popularizar-se o termo Andragogia para referir-se à arte e à ciência de orientar os adultos a aprender.

A Andragogia fundamenta-se nos seguintes princípios:

1.     Conceito de aprendente. Este conceito é adotado como alternativa ao de “aluno” ou “formando”. O aprendente, ou aquele que aprende, é autodirigido, o que significa que é responsável pela sua aprendizagem e estabelece e delimita o seu percurso educacional.

2.     Necessidade do conhecimento. Os adultos sabem melhor d que as crianças da necessidade de conhecimento. Eles se sentem muito mais responsáveis pela sua aprendizagem e pela delimitação de seu percurso educacional.

3.     Motivação para aprender. O modelo andragógico leva em conta as motivações externas, como melhor trabalho e aumento salarial, mas valoriza, particularmente, as motivações internas, relacionadas com a sua própria vontade de crescimento, como autoestima, reconhecimento, autoconfiança e atualização das potencialidades pessoais.

4.     O papel da experiência. Os adultos entram num processo educativo com experiências bastante diversas e é a partir delas que eles se dispõem a participar ou não de algum programa educacional. Por isso, essas experiências devem ser aceitas como fonte de recrursos a serem valorizados e partilhados e servir de base para a formação. Os conhecimentos do professor e os recursos instrucionais, como os livros e as projeções, são fontes que por si só não garantem o interesse pela aprendizagem. Devem ser vistos como opções que são colocadas à disposição para a livre escolha do aprendiz.

5.     Prontidão para o aprendizado. O adulto tem uma orientação mais pragmática do que a criança. O adulto está pronto para aprender o que decide aprender. Ele se torna disponível para aprender quando pretende melhorar seu desempenho em relação a determinado aspecto de sua vida. Sua seleção de aprendizagem é natural e realista; por isso, muitas vezes ele se nega a aprender o que os outros lhe impõem. Além disso, sua retenção tende a decrescer quando percebe que o conhecimento não pode ser aplicado imediatamente. Assim, convém organizar as experiências de aprendizagem de acordo com unidades temáticas que tenham sentido e sejam adequadas às tarefas que os adultos são solicitados a realizar nos seus diversos contextos de vida.

Dessa forma, uma educação no contexto andragógico requer:

·       Elaboração de diagnósticos de necessidades e interesses dos estudantes;
·       Definição de objetivos e planejamento das tarefas com a participação dos estudantes;
·       Estabelecimento de um clima cooperativo, informal e de suporte à aprendizagem;
·       Seleção de conteúdos significativos para os estudantes;
·       Definição de contratos e projetos de aprendizagem;
·       Aprendizagem orientada para tarefas ou centrada em problemas;
·       Uso de projetos de investigação, estudo independente e técnicas vivenciais;
·       Valorização de discussão e da solução de problemas em grupo;
·       Utilização de procedimentos de avaliação diretamente relacionados à aprendizagem.

Embora a adoção do conceito de Andragogia não seja consensual, pode-se afirmar que a prática docente do professor universitário pode ser significativamente melhorada com a adoção de seus princípios.

1.5  O que torna o aprendizado eficaz

 As considerações apresentadas na seção 1.4 indicam a conveniência do professor em fazer sua opção preferencial pela aprendizagem. Mas essa opção por si só não é garantia de um aprendizado eficaz. Muitos outros fatores naturalmente concorrem para que os alunos sejam capazes de compreender fatos e teorias, desenvolver habilidades para a solução de problemas. Podem ser consideradas três fontes independentes de influência sobre a aprendizagem: o estudante, o professor e o curso. Para cada uma dessas fontes, por sua vez, identificam-se algumas variáveis. As variáveis relacionadas aos alunos referem-se às suas aptidões, aos seus hábitos de estudo e à sua motivação. As variáveis relacionadas aos professores reeferem-0se principalmente aos conhecimentos relativos à matéria, às suas habilidades pedagógicas, à sua motivação e à sua percepção acercada educação. As variáveis relacionadas ao curso, por fim, referem-se aos objetivos propostos e aos métodos utilizados para alcançá-los.

1.5.1     Variáveis relacionadas aos alunos

As diferenças individuais relativas às habilidades dos estudantes constituem importante influência em relação à aprendizagem. Em muitos cursos, o nível intelectual dos alunos, suas aptidões específicas, assim como os conhecimentos e as habilidades desenvolvidos anteriormente, explicam em boa parte as diferenças de desempenho dos alunos. Estudantes com maior talento para a matemática poderão aprender mais facilmente os conteúdos das disciplinas de um curso de engenharia do que estudantes com maior aptidão verbal.

Não é confortável para um educador humanista, que luta para vencer as desigualdades sociais e para promover o desenvolvimento dos alunos, ressaltar a importância das diferenças individuais no desempenho acadêmico. Com efeito, sua atuação deverá voltar-se constantemente para a sua relativização. Não há, no entanto, como deixar de considerar os resultados das pesquisas psicológicas e a experiência dos professores universitários, que indicam o peso, ainda que relativo, das diferenças individuais. Por essa razão é que os professores devem considerar o peso desses fatores tanto no planejamento quanto na condução de suas aulas e na avaliação da aprendizagem.

Outro importante fator na determinação do sucesso na aprendizagem é a motivação do aluno. A motivação é que nos impulsiona para a ação, e tem origem numa necessidade. Assim, à medida que o aluno sente necessidade de aprender, tende a buscar fontes capazes de satisfazê-las, tais como leituras, aulas e discussões. A influência da motivação é facilmente verificável. Alunos motivados aprendem muito mais facilmente do que os nãomotivados. A motivação constitui um problema bastante complexo, pois, tendo origem numa necessidade, não pode, a rigor, ser determinada por um fator externo, como a ação educativa do professor, o que não significa que este não disponha de elementos para canalizar a motivação dos alunos para alvos apropriados.

Os hábitos dos alunos também são muito importantes no que se refere à aprendizagem. Alunos que planejam seus estudos, fazem anotações das aulas, adotam técnicas de leitura e revisam constantemente a matéria costumam se sair melhor nos estudos. E é interessante considerar que de todas as variáveis relacionadas à aprendizagem estas são as que mais facilmente podem ser manipuladas pelos alunos com vistas ao sucesso. Por essa razão é que se propõe aos professores não apenas que ensinem a matéria, mas também que ensinem sés alunos a aprender.

1.5.2     Variáveis relacionadas ao professor

Habilidades, motivação e hábitos de estudo dos alunos, a despeito de sua importância, não são suficientes para explicar o sucesso em relação à aprendizagem. Cabe, portanto, considerar o papel do professor nesse processo.

Costuma-se considerar muito importantes os conhecimentos de que o professor dispõe em relação à matéria que se dispõe a ensinar. Com efeito, o professor que conhece bem os conteúdos da disciplina que ministra demonstra muito mais segurança ao ensinar, expõe com maior propriedade e é capaz de responder sem maiores dificuldades às perguntas formuladas pelos alunos. Mas há outros fatores a serem considerados, já que alguns professores mostram-se mais competentes que outros para manter os alunos atentos, para explanar conceitos complexos e pata criar uma atmosfera agradável em sala de aula. Assim, pode-se considerar que a efetiva prática do professor universitário repousa sobre um tripé que envolve os conhecimentos específicos relacionados á matéria, a suas habilidades pedagógicas  e à sua motivação.

As habilidades pedagógicas do professor universitário não têm sido devidamente consideradas ao longo da história desse nível de ensino. Tanto dos professores do ensino fundamental quanto do ensino médio há muito tempo se exige formação específica, quer por meio do curso normal, hoje em nível superior, quer de licenciaturas específicas. Nesses cursos, mediante disciplinas como Didática, Metodologia do Ensino, psicologia da aprendizagem e Prática de Ensino, os professores podem desenvolver as habilidades necessárias para o desempenho de suas atribuições de professor. Dos professores universitários exige-se hoje, de acordo com Lei de Diretrizes e Bases, formação em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado. Ocorre, porém, que a maioria desses programas não contempla seus concluintes com disciplinas de caráter didático-pedagógico. Dessa forma, o desenvolvimento de habilidades pedagógicas dos professores universitários costuma dar-se por meio de cursos específicos ou de leituras desenvolvidas individualmente. Muitos professores também conseguem, por meio de intuição e da experiência, obter altos níveis de capacitação pedagógica. Outros, no entanto, tentem a permanecer carentes de habilidades pedagógicas ao longo de toda a sua vida acadêmica.

O aprendizado dos alunos também tem a ver com a motivação do professor. Quando o professor está motivado para ensinar e demonstra o seu entusiasmo com a matéria, cria-se um clima muito mais favorável para a aprendizagem. E convém considerar que essa motivação depende muito menos do salário e das condições de ensino do que do quão responsável o professor se sente pelo aprendizado dos alunos e quão realizadora e desafiador é a sua missão.

1.5.3     Variáveis relacionadas ao curso

Além das variáveis relacionadas aos professores e alunos, também devem ser consideradas as relacionadas ao curso, sobretudo as relacionadas aos seus objetivos e à sua organização. Os cursos oferecidos nas universidades e faculdades têm (ou deveriam ter!) objetivos. Convém considerar que hoje as escolas dispõem de mais liberdade nesse aspecto do que dispunham no passado. Antes da vigência da Lei de Diretrizes e Bases, o Conselho Nacional de Educação fixava currículos mínimos para cada curso superior. Hoje, apresenta apenas as diretrizes curriculares, o que faz com que a escola tenha muito mais flexibilidade para definir seus currículos, bem como para estabelecer os objetivos de seus cursos e disciplinas.

Os objetivos mais amplos, referentes principalmente ao profissional que se deseja formar, são definidos pela escola. Já os objetivos mais específicos, que se referem aos conhecimentos e habilidades esperados dos alunos ao final de cada aula ou unidade de ensino, são definidos pelo professor. E são estes os que mais diretamente influenciam o aprendizado dos alunos. Dos objetivos formulados para cada disciplina é que dependem a definição dos conteúdos, a determinação das estratégias de ensino, a seleção de recursos instrucionais e também as técnicas de avaliação. Nem sempre, porém, os objetivos são claramente formulados, o que dificulta a elaboração de um plano de ensino adequado, favorecendo a aquisição de um aprendizado que não corresponde ao que é desejado.

A organização do curso também exerce influência significativa sobre o aprendizado. As principais variáveis relativas a esta dimensão são: a carga horária destinada à disciplina; o ano ou semestre em que é ministrada; as disciplinas já cursadas pelo estudante, assim como as que são cursadas paralelamente; a qualidade dos recursos instrucionais; e o número de alunos em classe. De modo geral, os professores têm pouca ou nenhuma influência na administração de fatores.

Também há que se considerar que as crenças dos dirigentes das instituições educacionais nem sempre coincidem com as crenças dos professores. Até mesmo porque nem sempre os dirigentes podem ser considerados educadores, mas empresários que ainda se prendem a modelos administrativos em que o mais importante é a redução dos custos. Parece até mesmo que muitos desses dirigentes desconhecem o significado de vantagens competitivas. Dessa forma, muitos dirigentes tendem a admitir que basta oferecer aos professores recursos mínimos naturalmente pela atenção dos alunos e pelas tradicionais anotações em sala de aula. Os professores, com frequência, sentem-se desestimulados ou mesmo proibidos de adotar posturas mais criativas nos cursos que lecionam.

Também há dirigentes empresários que, por conta de uma leitura equivocada de textos sobre qualidade total, assumem a crença de que o “cliente é o rei” e que é preciso “encantá-lo”. Nesse processo, o professor passa a ter menos poder em relação aos alunos, cujos clamores por facilidades com frequência sensibilizam os dirigentes que temem perdê-los. Já é comum dirigentes recepcionarem professores dizendo que dispõem de mais currículos de professores que de matrículas de alunos, o que leva alguns professores a procurarem antes de tudo granjear a simpatia dos alunos, o que faz, nesses casos, com que a popularidade do professor se torne mais importante do que a qualidade de ensino.

Leituras recomendadas

LIBÂNEO, José Carlos. O ensino de graduação na universidade: a aula universitária. Disponível em: <www.ucg.br/site_docente/edu/libaneo/pdf/ensino. acesso em: 3 ago 2005.

Este texto apresenta reflexões sobre parâmetros de qualidade do ensino e da gestão de unidades de Ensino Superior diante das mudanças que vêm ocorrendo na sociedade e no mundo do conhecimento e da formação profissional. Sugere, inicialmente, as relações entre a qualidade de ensino e o trabalho docente em sala de aula. Após apresentar dados sobre a situação do ensino universitário, aponta formas alternativas de aula universitária e de organização escolar.

MASETTO, Marcos Tarciso. Competência pedagógica do professor universitário. São Paulo: Summus, 2003.


Este livro analisa aspectos diversos da atividade do professor universitário, desde o planejamento curricular e o discernimento das prioridades, passando pela interação entre os participantes do processo de ensino, recursos técnicos e tecnológicos até a dimensão política de sua atuação.