Direito Civil Comentado – Art.
1.442, 1.443
Do Penhor Agrícola –- VARGAS, Paulo S. R.
- Parte Especial – Livro III – Capítulo II – DO PENHOR
– Seção V – Do Penhor Rural – Subseção II – Do Penhor Agrícola
(Art. 1.442
e 1.443) - digitadorvargas@outlook.com
1— máquinas e instrumentos de agricultura;
II — colheitas pendentes, ou em via de formação;
III — frutos acondicionados ou armazenados;
IV — lenha cortada e carvão vegetal;
V — animais do serviço ordinário de estabelecimento agrícola.
Nos comentários de Loureiro, o artigo em exame abre o estudo do penhor agrícola, que tem por objeto as operações de financiamento da atividade de plantio e produção de vegetais. Vimos que seu prazo de validade máximo é de três anos, prorrogáveis por igual período.
Podem constituir o penhor agrícola não somente o proprietário do imóvel onde se dá o plantio, como também o enfiteuta, o superficiário, o usufrutuário, o arrendatário e o parceiro, independentemente de consentimento do dono do solo (Carvalho santos. Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1953, v. X, p. 173).
Os cinco incisos deste artigo arrolam bens empenháveis, em caráter exemplificativo. Nada impede que outros bens destinados à produção agrícola possam ser dados cm garantia real, embora não elencados na lei.
O inciso I menciona máquinas e instrumentos de agricultura, que abrange implementos agrícolas, tratores, caminhões. Não se confunde com o penhor de veículos, embora, para melhor publicidade e conhecimento de terceiros de boa-fé, nada impeça a anotação do gravame nos certificados de propriedade dos veículos.
O inciso II se refere às colheitas pendentes ou em vias de formação. É uma exceção à regra de que a garantia real deve incidir sobre coisas existentes, ou que não adquiriram sua forma definitiva. Não admite a lei, porém, o penhor sobre colheitas futuras, ainda não plantadas, mas somente sobre aquelas que se encontram, no mínimo, já plantadas ou em via de formação no ano do contrato (Bevilaqua, Clóvis. Direito das coisas, 3. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1951, p. 85). Embora ainda não existente, a colheita integra automaticamente a garantia à medida que vai se formando, sem necessidade de qualquer novo ato ou consentimento das partes.
Assentou o STJ, em relação ao penhor sobre safras futuras, que “não cabe ação de depósito para restituição de bem inexistente ao tempo da celebração do contrato de financiamento” (REsp n. 47.027/RS, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar). A mesma Corte foi mais longe e assentou, em caso em que foi realizada a penhora sem constatação da real existência da colheita, que “infidelidade do depósito de safra futura, mesmo que judicial, não autoriza a pena de prisão civil” (HC n. 26.639/SP, rel. Min. Ari Pargendler. No mesmo sentido, HC n. 11.283/SP, rel. Min. Cesar Asfor Rocha). Os demais incisos deste artigo, claros por si, não comportam maiores considerações. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.544. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 14/01/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).
No mesmo sentido Ricardo Fiuza em sua doutrina, o artigo em exame enumera os animais que podem ser objeto de penhor pecuniário, somando aos animais do serviço ordinário de estabelecimento agrícola os que integram a atividade pastoril ou de laticínios (Vide nossos comentários ao CC 1.439 - São espécies de penhor rural: a) agrícola que é aquele que recai sobre máquinas e instrumentos agrícolas, colheitas pendentes ou em via de formação, frutos armazenados, lenha cortada ou madeira das matas; b) pecuário, que é aquele que recai sobre animais do serviço ordinário de estabelecimento agrícola. • No mais, deve ser aplicado à matéria o mesmo tratamento doutrinário dado ao dispositivo apontado. • Equipara-se este artigo ao de n. 781 do Código Civil de 1916. com considerável melhora em sua redação, incorporando o texto da Lei n. 492, de 30-8-1937. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 737, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 14/01/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Seguindo o mesmo entendimento Talita Pozzebon
Venturini, quanto ao penhor agrícola, serão passíveis de empenhabilidade
determinados bens (conforme o CC 1442), desde que as obrigações estejam
voltadas ao setor da agricultura: I) máquinas e instrumentos de agricultura; II) colheitas
pendentes, ou em via de formação; III) frutos condicionados ou armazenados; IV)
lenha cortada e carvão vegetal; V) animais do serviço ordinário de
estabelecimento agrícola.
O penhor pecuário tem como objeto de garantia os animais destinados à indústria pastoril, agrícola ou de laticínios, desde que pertencentes da exploração rural. (Talita Pozzebon Venturini, artigo intitulado “Direitos reais de garantia: breve análise sobre penhor, hipoteca e anticrese”, publicado em outubro de 2015 no site Jus.com.br, acessado em 14.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Acrescentando Guimarães e Mezzalira, o penhor agrícola recai sobre coisas relacionadas à exploração da atividade agrícola, tais como máquinas e instrumentos, colheitas, frutos, lenha, carvão vegetal e animais.
Coisa futura pode ser objeto de penhor, como na hipótese de uma lavoura em formação ser concedida em garantia. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com, comentários ao CC 1.442, acessado em 14.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 1.443. O penhor agrícola que recai sobre colheita pendente, ou em via de formação, abrange a imediatamente seguinte, no caso de frustrar-se ou ser insuficiente a que se deu em garantia.
Parágrafo único. Se o credor não financiar a nova safra, poderá o devedor constituir com outrem novo penhor, em quantia máxima equivalente à do primeiro; o segundo penhor terá preferência sobre o primeiro, abrangendo este apenas o excesso apurado na colheita seguinte.
Aludem Guimarães e Mezzalira, a safra seguinte também é abrangida pelo penhor agrícola que recaia sobre colheita pendente, ou em via de formação, nos casos em que a garantia se mostrar insuficiente ou frustrar-se. Se o credor não financiar a nova safra, o devedor poderá constituir novo penhor, limitado ao valor do primeiro, que terá preferência sobre o anterior para pagar-se com o produto da nova safra. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com, comentários ao CC 1.443, acessado em 14.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Como lembra o relator Ricardo Fiuza, este artigo inova ao permitir que o empenho recaia também sobre a próxima safra se for empenhada colheita em formação, na hipótese de ser ela frustrada ou insuficiente. Se o credor não tiver interesse em financiar a nova safra, o devedor poderá constituir novo penhor, que, no máximo, deverá ser igual ao primeiro, sendo certo que este terá preferência sobre o primeiro, que terá direito apenas ao excesso da nova colheita. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 737, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 14/01/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Da mesma forma Loureiro, este artigo disciplina a extensão legal, independentemente da vontade do devedor, da garantia real para a primeira safra subsequente, se a colheita originalmente empenhada se perdeu ou foi insuficiente para cobrir a dívida.
Como acentua Glasdton Mamede (Código Civil comentado. São Paulo, Atlas, 2003, v. XIV , p. 212), essa prorrogação não é automática, mas depende de manifestação de vontade do credor. Incide ainda o art. 7º, § 2º, da Lei n. 492/37: “Assiste ao credor o direito de, exibindo a prova do tanto quanto na colheita se lhe consignou, ou se apurou, ou de ter-se frustrado no todo ou em parte, requerer ao juiz competente da situação da propriedade agrícola que faça expedir mandado para a averbação de estender-se o penhor à colheita imediata”.
Em termos diversos, a perda ou insuficiência da colheita original exige exame de fatos a serem provados, de modo que deve haver requerimento judicial de extensão da garantia e averbação no registro imobiliário, para conhecimento de terceiros. Sem tais providências, não pode o credor simplesmente penhorar e excutir o produto da colheita subsequente. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.545. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 14/01/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).
Buscando na Web, encontrou-se matéria farta exemplificativa para o assunto em comento, intitulado “Penhora de safra – art. 1443 do CC/02”, produzido e postado no site gustavolomeu.wordpress.com, em 07/11/2012: “STJ admite que penhora de safra de cana recaia sobre álcool e açúcar - A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considera que a penhora sobre safra agrícola não deve impedir sua comercialização, transferindo-se para a safra futura. Contudo, quando há em contrato previsão expressa que estabeleça a transferência da garantia aos subprodutos da safra penhorada, deve prevalecer o contrato.
No
caso julgado, a usina queria que a penhora recaísse sobre a safra futura,
conforme prevê o artigo 1.443 do Código Civil: “O penhor agrícola que recai
sobre colheita pendente, ou em via de formação, abrange a imediatamente
seguinte, no caso de frustrar-se ou ser insuficiente a que se deu em
garantia.”
Contudo, Nancy Andrighi considerou que transferir a penhora
para safras futuras, também objeto de garantias autônomas, poderia ser inócua a
partir de um efeito em cadeia: a safra que garante uma dívida poderia ser
vendida livremente pelo devedor, fazendo com que as duas dívidas passassem a
ser garantidas pela safra futura, que novamente poderia ser vendida e assim sucessivamente.
Em terceiro lugar, se de fato as safras futuras são objeto de garantias autônomas, relativas a outras obrigações, negar-se a penhora sobre os produtos derivados da safra atual acabaria gerando um efeito em cadeia: a safra que garante uma dívida, nessa hipótese, poderia ser vendida livremente pelo devedor (como se sobre ela não pesasse qualquer ônus), fazendo com que a safra futura garanta duas dívidas. Caso o pagamento não ocorra a tempo, também essa safra futura poderia ser comercializada livremente, transferindo o acúmulo de garantias ainda para a safra seguinte. E assim sucessivamente, gerando uma paulatina redução do valor das garantias prestadas. Esse procedimento não pode ser admitido, especialmente se o contrato contém disposição expressa no sentido de evitar esse efeito em cadeia.