quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.442, 1.443 Do Penhor Agrícola –- VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.442, 1.443

Do Penhor Agrícola –- VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro III – Capítulo II – DO PENHOR

Seção V – Do Penhor Rural – Subseção II – Do Penhor Agrícola

(Art. 1.442 e 1.443) - digitadorvargas@outlook.com

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 Art. 1.442. Podem ser objeto de penhor: 

1— máquinas e instrumentos de agricultura; 

II — colheitas pendentes, ou em via de formação; 

III — frutos acondicionados ou armazenados; 

 IV — lenha cortada e carvão vegetal;

V — animais do serviço ordinário de estabelecimento agrícola.

Nos comentários de Loureiro, o artigo em exame abre o estudo do penhor agrícola, que tem por objeto as operações de financiamento da atividade de plantio e produção de vegetais. Vimos que seu prazo de validade máximo é de três anos, prorrogáveis por igual período.

Podem constituir o penhor agrícola não somente o proprietário do imóvel onde se dá o plantio, como também o enfiteuta, o superficiário, o usufrutuário, o arrendatário e o parceiro, independentemente de consentimento do dono do solo (Carvalho santos. Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1953, v. X, p. 173).

Os cinco incisos deste artigo arrolam bens empenháveis, em caráter exemplificativo. Nada impede que outros bens destinados à produção agrícola possam ser dados cm garantia real, embora não elencados na lei. 

O inciso I menciona máquinas e instrumentos de agricultura, que abrange implementos agrícolas, tratores, caminhões. Não se confunde com o penhor de veículos, embora, para melhor publicidade e conhecimento de terceiros de boa-fé, nada impeça a anotação do gravame nos certificados de propriedade dos veículos. 

O inciso II se refere às colheitas pendentes ou em vias de formação. É uma exceção à regra de que a garantia real deve incidir sobre coisas existentes, ou que não adquiriram sua forma definitiva. Não admite a lei, porém, o penhor sobre colheitas futuras, ainda não plantadas, mas somente sobre aquelas que se encontram, no mínimo, já plantadas ou em via de formação no ano do contrato (Bevilaqua, Clóvis. Direito das coisas, 3. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1951, p. 85). Embora ainda não existente, a colheita integra automaticamente a garantia à medida que vai se formando, sem necessidade de qualquer novo ato ou consentimento das partes. 

Assentou o STJ, em relação ao penhor sobre safras futuras, que “não cabe ação de depósito para restituição de bem inexistente ao tempo da celebração do contrato de financiamento” (REsp n. 47.027/RS, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar). A mesma Corte foi mais longe e assentou, em caso em que foi realizada a penhora sem constatação da real existência da colheita, que “infidelidade do depósito de safra futura, mesmo que judicial, não autoriza a pena de prisão civil” (HC n. 26.639/SP, rel. Min. Ari Pargendler. No mesmo sentido, HC n. 11.283/SP, rel. Min. Cesar Asfor Rocha). Os demais incisos deste artigo, claros por si, não comportam maiores considerações. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.544.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 14/01/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

No mesmo sentido Ricardo Fiuza em sua doutrina, o artigo em exame enumera os animais que podem ser objeto de penhor pecuniário, somando aos animais do serviço ordinário de estabelecimento agrícola os que integram a atividade pastoril ou de laticínios (Vide nossos comentários ao CC 1.439 - São espécies de penhor rural: a) agrícola que é aquele que recai sobre máquinas e instrumentos agrícolas, colheitas pendentes ou em via de formação, frutos armazenados, lenha cortada ou madeira das matas; b) pecuário, que é aquele que recai sobre animais do serviço ordinário de estabelecimento agrícola. • No mais, deve ser aplicado à matéria o mesmo tratamento doutrinário dado ao dispositivo apontado. • Equipara-se este artigo ao de n. 781 do Código Civil de 1916. com considerável melhora em sua redação, incorporando o texto da Lei n. 492, de 30-8-1937. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 737, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 14/01/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo o mesmo entendimento Talita Pozzebon Venturini, quanto ao penhor agrícola, serão passíveis de empenhabilidade determinados bens (conforme o CC 1442), desde que as obrigações estejam voltadas ao setor da agricultura: I) máquinas e instrumentos de agricultura; II) colheitas pendentes, ou em via de formação; III) frutos condicionados ou armazenados; IV) lenha cortada e carvão vegetal; V) animais do serviço ordinário de estabelecimento agrícola.

O penhor pecuário tem como objeto de garantia os animais destinados à indústria pastoril, agrícola ou de laticínios, desde que pertencentes da exploração rural. (Talita Pozzebon Venturini, artigo intitulado “Direitos reais de garantia: breve análise sobre penhor, hipoteca e anticrese”, publicado em outubro de 2015 no site Jus.com.br, acessado em 14.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Acrescentando Guimarães e Mezzalira, o penhor agrícola recai sobre coisas relacionadas à exploração da atividade agrícola, tais como máquinas e instrumentos, colheitas, frutos, lenha, carvão vegetal e animais.

Coisa futura pode ser objeto de penhor, como na hipótese de uma lavoura em formação ser concedida em garantia. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.442, acessado em 14.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.443. O penhor agrícola que recai sobre colheita pendente, ou em via de formação, abrange a imediatamente seguinte, no caso de frustrar-se ou ser insuficiente a que se deu em garantia.

Parágrafo único. Se o credor não financiar a nova safra, poderá o devedor constituir com outrem novo penhor, em quantia máxima equivalente à do primeiro; o segundo penhor terá preferência sobre o primeiro, abrangendo este apenas o excesso apurado na colheita seguinte.

Aludem Guimarães e Mezzalira, a safra seguinte também é abrangida pelo penhor agrícola que recaia sobre colheita pendente, ou em via de formação, nos casos em que a garantia se mostrar insuficiente ou frustrar-se. Se o credor não financiar a nova safra, o devedor poderá constituir novo penhor, limitado ao valor do primeiro, que terá preferência sobre o anterior para pagar-se com o produto da nova safra. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.443, acessado em 14.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Como lembra o  relator Ricardo Fiuza, este artigo inova ao permitir que o empenho recaia também sobre a próxima safra se for empenhada colheita em formação, na hipótese de ser ela frustrada ou insuficiente. Se o credor não tiver interesse em financiar a nova safra, o devedor poderá constituir novo penhor, que, no máximo, deverá ser igual ao primeiro, sendo certo que este terá preferência sobre o primeiro, que terá direito apenas ao excesso da nova colheita. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 737, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 14/01/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Da mesma forma Loureiro, este artigo disciplina a extensão legal, independentemente da vontade do devedor, da garantia real para a primeira safra subsequente, se a colheita originalmente empenhada se perdeu ou foi insuficiente para cobrir a dívida. 

Como acentua Glasdton Mamede (Código Civil comentado. São Paulo, Atlas, 2003, v. XIV , p. 212), essa prorrogação não é automática, mas depende de manifestação de vontade do credor. Incide ainda o art. 7º, § 2º, da Lei n. 492/37: “Assiste ao credor o direito de, exibindo a prova do tanto quanto na colheita se lhe consignou, ou se apurou, ou de ter-se frustrado no todo ou em parte, requerer ao juiz competente da situação da propriedade agrícola que faça expedir mandado para a averbação de estender-se o penhor à colheita imediata”.

Em termos diversos, a perda ou insuficiência da colheita original exige exame de fatos a serem provados, de modo que deve haver requerimento judicial de extensão da garantia e averbação no registro imobiliário, para conhecimento de terceiros. Sem tais providências, não pode o credor simplesmente penhorar e excutir o produto da colheita subsequente. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.545.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 14/01/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Buscando na Web, encontrou-se matéria farta exemplificativa para o assunto em comento, intitulado “Penhora de safra – art. 1443 do CC/02”, produzido e postado no site gustavolomeu.wordpress.com, em 07/11/2012: “STJ admite que penhora de safra de cana recaia sobre álcool e açúcar - A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considera que a penhora sobre safra agrícola não deve impedir sua comercialização, transferindo-se para a safra futura. Contudo, quando há em contrato previsão expressa que estabeleça a transferência da garantia aos subprodutos da safra penhorada, deve prevalecer o contrato. 

No caso julgado, a usina queria que a penhora recaísse sobre a safra futura, conforme prevê o artigo 1.443 do Código Civil: “O penhor agrícola que recai sobre colheita pendente, ou em via de formação, abrange a imediatamente seguinte, no caso de frustrar-se ou ser insuficiente a que se deu em garantia.” 

 

Contudo, Nancy Andrighi considerou que transferir a penhora para safras futuras, também objeto de garantias autônomas, poderia ser inócua a partir de um efeito em cadeia: a safra que garante uma dívida poderia ser vendida livremente pelo devedor, fazendo com que as duas dívidas passassem a ser garantidas pela safra futura, que novamente poderia ser vendida e assim sucessivamente. 

 

Trechos do voto da Min. Nancy Andrighi: Recurso Especial Nº 1.232.798 – SP (2011/0010164-6). Estão mantidos na íntegra, incluindo a referência ao CPC/1973 - “De fato,  a jurisprudência  vem se  orientando  no sentido  de  que  a  penhora sobre bens fungíveis se aperfeiçoa independentemente da tradição dos bens e, na hipótese de  recair  sobre  safra  agrícola,  não  deve  impedir  a  respectiva  comercialização, transferindo-se sempre à safra futura, que deverá ser apresentada no momento oportuno. Contudo,  havendo  entre  as  partes  previsão  expressa  no  contrato,  como  reconheceu  o TJ/SP, no sentido da transferência da garantia ao álcool ou ao açúcar produzido a partir a cana dada em penhor, essa disposição deve prevalecer, salvo impedimento legal.


O recorrente argumenta que a penhora dos produtos beneficiados lhe traria excessiva onerosidade, vedada pelo art. 620 do CPC/1973. Contudo, esse argumento não pode ser acolhido por três motivos: (…) ”qualquer  penhora  de  bens,  em  princípio,  pode mostrar-se onerosa ao devedor, mas essa é uma decorrência natural da existência de uma dívida não paga. O princípio da vedação à onerosidade excessiva não pode ser convertido em uma panaceia, que leve a uma ideia de proteção absoluta do inadimplente em face de seu credor. Alguma onerosidade é natural ao procedimento de garantia de uma dívida, e o art. 620 do CPC/1973 destina-se apenas a decotar exageros evidentes, perpetrados em situações nas  quais  uma  alternativa  mais  viável  mostre se  clara.  Não  se  pode  alegar  que  haja onerosidade  excessiva  num  procedimento  de  transferência  de  garantias  expressamente previsto em contrato e aceito pelo devedor.

 

Em  terceiro  lugar,  se  de  fato  as  safras  futuras  são  objeto  de  garantias autônomas, relativas a outras obrigações, negar-se a penhora sobre os produtos derivados da safra  atual  acabaria  gerando  um  efeito  em  cadeia:  a safra  que  garante  uma  dívida, nessa  hipótese,  poderia  ser  vendida  livremente  pelo  devedor  (como  se  sobre  ela  não pesasse  qualquer  ônus), fazendo  com  que  a safra futura  garanta  duas  dívidas. Caso  o pagamento  não  ocorra  a  tempo,  também  essa  safra  futura  poderia  ser  comercializada livremente,  transferindo  o  acúmulo  de  garantias  ainda  para  a  safra seguinte.  E  assim sucessivamente,  gerando  uma  paulatina redução  do  valor  das  garantias  prestadas. Esse procedimento  não  pode  ser  admitido,  especialmente  se  o  contrato  contém  disposição expressa no sentido de evitar esse efeito em cadeia.

De  tudo  decorre  que  este recurso  especial  não  pode ser  acolhido  em sua integralidade.  A  transferência  da  garantia,  da  safra  para  o  produto  dela  derivado,  é providência de rigor. Importante  mencionar  que  se  houver  qualquer  risco  de  perecimento  do álcool ou do açúcar penhorado durante o curso da execução, há dispositivos no Código de Processo Civil adequados a viabilizar a substituição da penhora  (art. 656 e §§) ou à venda imediata desses bens, (art. 670, I, do CPC/1973).” (Sobre gustavolomeu - Mestre em Direito pela FUMEC/MG. Especialista em Direito Civil pela PUC.MG. Graduado em Direito pela UNIVALE/MG. Acessado 14/01/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).