terça-feira, 28 de abril de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 942, 943 Da Obrigação de Indenizar - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 942, 943
Da Obrigação de Indenizar - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título IX – Da Responsabilidade Civil
(Art. 927 a 943) Capítulo I – Da Obrigação de Indenizar
– vargasdigitador.blogspot.com

Art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação.

Parágrafo único. São solidariamente responsáveis com os autores os coautores e as pessoas designadas no CC 932.

No lecionar de Cláudio Luiz Bueno De Godoy, o dispositivo, que em sua essência coincide com aquele que o precedeu, na legislação de 1916, consagra a regra da responsabilidade patrimonial do obrigado a reparar um dano causado. Ou seja, tem-se uma obrigação nascida da prática do ilícito, que impõe uma prestação, no caso ressarcitória, a que é subjacente, como sempre, nas obrigações perfeitas, a garantia patrimonial do devedor, ressalvada a garantia pessoa que há nas dívidas alimentares e resultantes da infidelidade do depósito.

E, acrescente-se, havendo mais de um causador do dano a ser reparado, erige-se entre eles uma responsabilidade solidária, de tal arte que todos se vinculam à integralidade da prestação ressarcitória, podendo por ela ser exigidos untos ou separadamente, à escolha da vítima.

Também assim sucede nos casos de responsabilidade indireta, ou seja, por fato de terceiro, tal como previsto no CC 932, o que se explicita no parágrafo da norma em comento, apenas, em relação ao art. 1.518, de CC/1916, ajustando-se a denominação dos coautores. Bem de ver, todavia, que nessa coautoria deve incluir-se também o partícipe do direito penal, não havendo, para a responsabilização civil, de proceder à distinção respectiva que há no direito penal. Para fins civis, responde solidariamente quem tenha, de forma eficiente, concorrido à causação do dano, portanto cuja conduta se integre no nexo causal, posto que plúrimo.

Vale também anotar que a alusão, na cabeça do artigo, à responsabilidade de quem seja o autor da ofensa ou da violação a um direito deveria ser adequada à nova redação do CC 186, que, diversamente do anterior art. 159 do CC/1916, não mais se utiliza da alternativa mas, ao revés, define o ilícito como a ação ou omissão voluntária, negligente ou imprudente, que viola direito e causa dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, razão, até, de não mais colocar em alternância a violação do direito e o prejuízo daí decorrente, mas a propósito remetendo-se ao comentário do preceito do CC 186.

Acentue-se, por fim, a contradição de fato existente entre a determinação do parágrafo único do preceito – que, por não ressalvar a hipótese, pode ser considerada também alusiva a uma responsabilidade solidária existente entre os pais e seus filhos, pelos atos por estes praticados, assim como do tutor e curador com relação aos atos do pupilo e curatelado – e a previsão da responsabilidade subsidiária dos incapazes, contida no CC 928. Isso, se pretende corrigir no Projeto de Lei n. 276/2007, de alteração do CC/2002, mas afirmando-se uma responsabilidade não mais subsidiária, e sim solidária do incapaz, embora ressalvando-se que sempre de forma equitativa e sem prejuízo de seus alimentos, e dos de seus dependentes, conforme já examinado no comentário ao CC 928, a que ora se remete o leitor. Decerto todavia que, enquanto não aprovada modificação desse teor, a compreensão do parágrafo único do artigo em comento deverá ficar adstrita aos casos em que, como sustentam Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho, a responsabilidade indireta não exclua a direta, como na hipótese do empregador e do empregado, mas não dos pais, tutores e curadores e de seus filhos, tutelados e curatelados, em que, ao revés, a responsabilidade indireta dos primeiros é substitutiva e exclusiva, portanto afastando a responsabilidade dos autores diretos e, por conseguinte, afastando qualquer solidariedade de que se pudesse cogitar (Comentários ao novo Código Civil, coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Rio de Janeiro, Forense, 2004, v. XIII, p. 315-6). (Cláudio Luiz Bueno De Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 948-49 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 28/04/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em sua doutrina Ricardo Fiuza aponta este artigo regulando a responsabilidade patrimonial, pela qual os bens do responsável pela violação respondem pela reparação do dano acarretado ao ofendido. Em princípio, a responsabilidade é individual, mas há casos de responsabilidade indireta, em que a pessoa responde por ato de terceiro (CC 932, I a V), estabelecendo este artigo que se aplica o princípio da solidariedade, sendo tanto o agente causado do dano como o seu responsável obrigados pela reparação integral do dano. O mesmo princípio da solidariedade aplica-se diante do concurso de agentes na prática do ilícito, ou seja, quando duas ou mais pessoas violam direito alheio e causam-lhe dano (v. Carlos Roberto Gonçalves, Responsabilidade civil, 2 ed. São Paulo, Saraiva, 1984, p. 165).

Sugestão legislativa: o art. 928, como antes visto, estabelece uma hierarquização na responsabilidade patrimonial em casos de danos ocasionados por incapaz, ao estabelecer que “o incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis não tiveram obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios suficientes”. Esta regra conflita com o presente artigo e, por isso, na nota ao CC 928 propusemos ao Deputado Ricardo Fiuza sua substituição por outra norma. No entanto, o disposto no parágrafo único do CC 928 deve ser aproveitado no que se refere à preservação dos meios necessários à subsistência do incapaz, deslocando-o para um parágrafo a constar deste CC 942, com a redação a seguir sugerida.

Art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor; todos responderão solidariamente pela reparação.

§ 1º São solidariamente responsáveis com os autores os coautores e as pessoas designadas no CC 932.

§ 2º O incapaz responderá pela indenização, preservando-se os meios indispensáveis à sua subsistência.

(Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 485/486, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 28/04/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Falando de Responsabilidade Patrimonial, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apontam o dispositivo consagrar a regra da responsabilidade do patrimônio do agressor pela reparação dos danos causados. É esse, portanto, o fundamento legal que permite ao estado juiz coercitivamente expropriar o patrimônio do devedor para solver as dívidas que ele voluntariamente não adimpliu. Não são todos os bens do devedor, porém, que respondem por suas dívidas. A legislação processual cuida das exceções a essa regra ao dispor sobre os bens impenhoráveis (CPC art. 833). Além dos casos da responsabilidade indireta disciplinada pelo CC 932, há outros casos ainda em que os bens de terceiros que não tenham concorrido para a ofensa ou a violação do direito podem ser utilizados para reparação do dano (CPC art. 790). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 28.04.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 Art. 943. O direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a herança.

Sob o prisma de Cláudio Luiz Bueno De Godoy, a regra, em verdade, apenas consagra o princípio geral, primeiro, de que os direitos e ações de uma pessoa se transmitem aos herdeiros por ocasião de sua morte. Assim, tocam aos herdeiros, desde o instante do falecimento do autor da herança, não só indenização já fixada em favor do falecido como mesmo a ação tendente a postulá-la. De outra parte, e inversamente, também as obrigações passivas do de cujus se transmitem, o que o preceito igualmente assenta, mas aqui com a ressalva de que, sempre, na força da herança. A bem dizer, a segunda parte da norma em comento deve sem encarada de forma sistemática, sensível à concorrência dos CC 1.792, segundo o qual o herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança (herda, destarte, intra vires hereditatis), e, CC 1.997, que faz da massa transmitida o objeto da garantia do pagamento das dívidas do falecido (CPC, art. 796).

A supressão da ressalva final do antigo art. 1.526 do CC/1916, acerca da exclusão da regra da transmissão nos casos previstos na lei, não altera o sentido da norma nem a torna infensa ao influxo das regras gerais de instransmissibilidade, como no caso das obrigações personalíssimas ou na sucessão a título singular, malgrado não no legado, dado que os bens que são dele objeto não se furtam à garantia que o espólio encerra, na ordem de preferência do CC 1.967 (ver Almeida, José Luiz Gavião de. Código Civil comentado, coord. Álvaro Vilaça Azevedo. São Paulo, Atlas, 2003, v. XVIII, p. 81).

A grande controvérsia, todavia, que sempre gravitou em torno da regra da transmissibilidade da obrigação de reparar está na sua eventual pertinência ao prejuízo moral que se tenha causado ao autor da herança, sendo comum argumentar-se que os herdeiros apenas poderiam dar continuidade a uma ação de indenização dessa espécie já iniciada pela vítima, antes de sua morte. Ou, por outra, aos herdeiros não caberia a iniciativa de demanda na qual se postulasse indenização por agravo a direitos da personalidade afinal extintos com a morte de quem não ajuizou, antes, aquela ação.

A rigor, porém, não há que confundir a intransmissibilidade de direitos da personalidade de quem já morreu, por isso que personalíssimos, com a transmissão do direito à indenização por sua ofensa, sucedida antes da morte do ofendido. Portanto, também nesses casos deve-se aplicar a regra do dispositivo presente. E, mais, hoje em dia vem se discutindo se não há, verdadeiramente, uma projeção dos direitos da personalidade para depois da morte, corolário da admissão de que fundados em valor social básico e perene, como é a dignidade da pessoa humana, assim suscitando proteção, inclusive mercê de indenização moral, mesmo diante de ofensas post mortem, como está por exemplo, no Código Civil português, no art. 70, n. 1, e, ao que se entende, igualmente se contém no CC 12 brasileiro, particularmente em seu parágrafo único, mas a cujo comentário se remete o leitor. (Cláudio Luiz Bueno De Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 950-51 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 28/04/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo o histórico apresentado por Ricardo Fiuza, o dispositivo em tela não foi modificado no Senado Federal e na Câmara dos Deputados no período final de tramitar do projeto. A redação atual e a mesma do projeto. Corresponde ao art. 1.526 do Código Civil anterior, sendo que no dispositivo em análise não foram excetuados os casos de exclusão da transmissibilidade por sucessão.

Em sua Doutrina, na redação de Ricardo Fiuza, a obrigação de exigir a reparação e de prestá-la transmite-se por sucessão causa mortis, mas é limitada, quanto à responsabilidade do sucessor, às forças da herança.

Assim, este dispositivo deve ser interpretado com atenção às restrições constantes das outras regras deste Código Civil: “art. 1.792. O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe a prova do excesso, salvo se houver inventário, que o escuse, demonstrando o valor dos bens herdados”, e “Art. 1997”. A herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido; mas, feita a partilha, só respondem os herdeiros, cada qual em proporção da parte que na herança lhe coube”. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 486, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 28/04/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na redação de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, transmissibilidade do dever de indenizar, o dispositivo consagra a regra de que os bens e direitos da pessoa se transmitem aos seus herdeiros com sua morte.

Diferentemente das penas e sanções de caráter punitivo, que não podem ultrapassar a pessoa do agressor, a reparação civil transmite-se como todos os demais bens e direitos, inclusive o dever de indenizar oriundo da ofensa a direito da personalidade (CC 12, parágrafo único). Nesse sentido: “O direito de exigir reparação a que se refere o CC 943 abrange inclusive os danos morais, ainda que a ação não tenha sido iniciada pela vítima” (Enunciado 454 da V Jornada de Direito Civil). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 28.04.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).