terça-feira, 30 de abril de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 313, 314, 315 Do Objeto do Pagamento e Sua Prova – VARGAS, Paulo S. R.


     DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 313, 314, 315
                   Do Objeto do Pagamento e Sua Prova – VARGAS, Paulo S. R.
 
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título III – DO ADIMPLEMENTO E EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES
 (art. 304 a 388) Capítulo I – DO PAGAMENTO – Seção III –
Do Objeto do Pagamento e Sua Prova - vargasdigitador.blogspot.com

Art. 313. O credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe e devida, ainda que mais valiosa.

Surfando no conhecimento de Pereira, temos que a solutio para gerar o efeito de extinguir a obrigação, ela deve guardar estreita harmonia com o objeto da prestação. Assim, o pagamento deve coincidir com a coisa devida, entregando-se o bem prometido (obrigações de dar), praticando (obrigações de fazer) ou se abstendo de praticar determinado ato (obrigações de não fazer). Segundo Pereiro, o objeto do pagamento “deve reunir a identidade, a integridade e a indivisibilidade, i.é, o solvens tem de prestar o devido, todo o devido e por inteiro”. (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, op. cit., p. 183). Assim, o credor não será obrigado a aceitar coisa que não esteja em perfeita conformidade ao objeto da obrigação, ainda que de valor superior, uma vez que a entrega de objeto diverso não solve a obrigação. Nesses casos, para que se dê a quitação do débito, haverá a necessidade de concordância do credor, caso em que se dará a extinção da obrigação por dação em pagamento (CC. Arts, 356 a 359).
O pagamento de indenização em sub-rogação ao cumprimento da prestação não é pagamento em sentido técnico, dado que não guarda perfeita identidade com o objeto da obrigação. O credor tem direito à coisa devida, mas, na sua falta, tem a faculdade de receber o substitutivo (perdas e danos) (Direito.com acesso em 29.04.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Embarcando no trailer de Ricardo Fiuza, este artigo, no Código Civil de 1916, estava inserido na Seção I do Capítulo I, que tratava das obrigações de dar coisa certa. No novo Código o dispositivo foi deslocado para o Capítulo II, referente ao pagamento, posição, a nosso ver, mais adequada, uma vez que a norma se aplica às várias espécies de obrigações, e não apenas à de dar coisa certa.

O devedor só se desonera da obrigação após entregar ao credor exatamente o objeto que prometeu dar, ou realizar o ato a que se comprometeu, ou se abster da prestação, nas obrigações de não fazer. Do contrário, a obrigação converter-se-á em perdas e danos, conforme já tivemos oportunidade de explicar nos comentários anteriores. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 179, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 29/04/2019, VD).

Primeiramente, segundo Bdine Jr., a regra era prevista para a obrigação de coisa certa e passou a ser regra geral do pagamento; o credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais valiosa. Dessa forma, seja a obrigação de dar, fazer ou não fazer, não será possível obrigar o credor a aceitar prestação que não seja a que foi objeto do ajuste.

O conceito de prestação diversa compreende tanto a quantidade quanto a qualidade. O credor não pode ser obrigado a receber uma mansão no litoral baiano, no valor de R$ l.000.000,00, se o devedor se obrigou a lhe entregar um apartamento de 50 metros quadrados em Cidade Ademar, periferia de São Paulo. O credor pode exigir a entrega deste último, a despeito da intenção do devedor em lhe entregar a casa de praia.

A entrega de uma prestação diversa daquela devida só é possível se houver anuência do credor, o que implicará dação em pagamento, hipótese de adimplemento que se examinará adiante (arts. 356 a 359). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 294. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26.04.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 314. Ainda que a obrigação tenha por objeto a prestação divisível, não pode o credor ser obrigado a receber, nem o devedor a pagar, por partes, se assim não se ajustou.

O entendimento de Bdine Jr., é que a obrigação divisível não pode ser paga de forma parcial se isso não foi convencionado. Esse dispositivo encontra paralelo no art. 313, segundo o qual ninguém é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida. Contudo, se a obrigação for fracionada entre diversos credores, não se poderá negar ao credor o direito de efetuar o pagamento proporcionalmente a cada um dos credores, como o art. 257 do Código Civil autoriza. Observe-se, contudo, que os pagamentos parciais não acarretam redução das garantias da dívida, nos termos do art. 1.241 deste Código (Pereira, Caio Mário da Silva Instituições de direito civil, 20.ed., atualizada por Luiz Roldão de Freitas Gomes. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. II, p. 185).

Convém destacar, porém, que o Código de Defesa do Consumidor autoriza o consumidor a quitar seu débito antecipadamente, total ou parcialmente, nos casos do seu art. 52, § 2º, da legislação consumerista, e que a boa-fé e as hipóteses de adimplemento substancial do contrato podem permitir que se identifiquem exceções à regra consagrada nesse dispositivo (Martins-Costa, Judith. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. V, t. I, p. 188). Desse modo, é possível reconhecer abuso de direito (arts. 187 do CC) na recusa do credor em receber o pagamento parcelado de contas de luz ou água em atraso, para evitar o corte de energia, pois a outra solução possível será cortar o fornecimento e cobrar a dívida. Assim, se o consumidor quer pagar os débitos vincendos e parcelar o atrasado, não se vislumbra finalidade social e econômica útil para a recusa ao recebimento parcelado, como o Egrégio Primeiro Tribunal de Alçada Civil já teve oportunidade de decidir em acórdão proferido nos autos do Agravo de Instrumento n. 1.130.350.7, rel. Juiz Rui Cascaldi, j. 16.10.2002.

No que se refere ao adimplemento substancial, vale invocar a lição de Judith Martins-Costa: “a substantial performance, ensina Couto e Silva, constitui o adimplemento tão próximo do resultado final, que, tendo-se em vista a conduta das partes, exclui-se o direito de resolução, permitindo-se tão somente o pedido de indenização” (ibidem, p. 112). A ilustre autora sustenta que, nos casos de adimplemento substancial, o pagamento parcelado é de ser admitido (ibidem, p. 188).

O abuso de direito do credor poderia ser identificado nos casos em que o devedor inadimplente não dispõe de patrimônio algum, ou opõe à execução embargos que protelam por muito tempo o recebimento efetivo da dívida. Nessas hipóteses, qual a razão jurídica para que o credor recuse o parcelamento? Se não houver fundamento jurídico defensável para essa recusa, ela será abusiva, a despeito do teor do artigo em exame.

Atualmente, a possibilidade de parcelamento da dívida está prevista no art. 745-A do Código de Processo Civil/1973 (com correspondência no art. 916, do CPC/2015), que admite expressamente que o executado deposite nos autos da execução, no prazo dos embargos, 30% do valor devido, com custas e honorários, e obtenha o parcelamento do saldo em seis parcelas. Tal dispositivo dispensa o exame do prejuízo do credor com o procedimento e a verificação da possibilidade econômica do devedor. limita-se a criar uma regra genérica que parcialmente revoga o art. 314 do Código Civil. Mas o parcelamento admitido pelo Código de Processo Civil também não pode ser absoluto: identificada situação em que o parcelamento pleiteado pelo devedor é dispensável e que a demora é extremamente nociva ao credor, abre-se a possibilidade de utilizar os argumentos até aqui expostos para, agora, afastar a regra benéfica ao devedor e recusar a aplicação do art. 745-A, CPC/1973 (correspondência no art. 916, do CPC/2015) ao caso, com amparo na boa-fé objetiva e na vedação ao abuso de direito. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 297. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26.04.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

A doutrina exposta por Ricardo Fiuza destaca a não inovação ao direito anterior, visto tratar-se de mera repetição do art. 889 no Código Civil de 1916, cabendo idêntico tratamento doutrinário. As prestações parciais só podem ser aceitas quando houver previsão específica no contrato ou assentimento expresso do credor. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 179, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 29/04/2019, VD).

No comentário retirado de Direito.com., por faltar o requisito da integralidade, o cumprimento em partes da prestação não será aceito como pagamento, se não houver convecção nesse sentido. Exceção à regra consiste nos casos em que houver diversos credores e o objeto da prestação for divisível, hipótese em que o devedor pagará pro rata aos titulares do crédito. (Direito.com acesso em 29.04.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 315. As dívidas em dinheiro deverão ser pagas no vencimento, em moeda corrente e pelo valor nominal, salvo o disposto nos artigos subsequentes.

Segundo entendimento de Guimarães e Mezzalina, o artigo 315 é expressão do curso forçado da moeda em curso legal, obrigando o devedor a efetuar o pagamento na moeda nacional e pelo valor, nominalmente, indicado na obrigação.

Todas as obrigações, em um dado momento, podem se converter em obrigações pecuniárias. Há aquelas que, desde o surgimento, já têm a estrega de dinheiro como objeto, como o mútuo pecuniário, mas todas as demais, sejam de dar, fazer ou não fazer, podem se transformar em obrigação de entregar dinheiro, caso se impossibilitem por culpa do devedor. além delas, há ainda as obrigações decorrentes de atos ilícitos, em que o dever de reparação se liquida em dinheiro. A moeda tem três valores diversos: (i) valor intrínseco, que é aquele correspondente ao valor do material de que é produzida; (ii) valor nominal, que é o imposto pelo Estado; e (iii) valor comercial, que se traduz na estimativa da moeda como uma mercadoria e que, portanto, está sujeito às oscilações de mercado. Para maiores esclarecimentos a respeito do princípio nominalista, vide comentários ao artigo 318. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 29.04.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Às páginas 298, Bdine Jr., comenta que em se tratando de dívida em dinheiro, faz-se o pagamento por seu valor nominal em moeda corrente. O dispositivo ressalva as regras dos artigos posteriores, nos quais estão disciplinadas a teoria da imprevisão (art. 317) e a vedação do emprego do dólar como critério de correção monetária (art. 318) Bdine Jr., Hamid Charaf. Comentário ao artigo 315 do Código civil, In Peluso, Cezar (coord.). Trata-se da adoção do princípio do nominalismo, definido por Carlos Roberto Gonçalves como aquele pelo qual “se considera como valor da moeda nominal que lhe atribui o Estado” (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2004, v. II, p. 58). O autor distingue com precisão dívidas de dinheiro, disciplinadas neste artigo, e as de valor: as primeiras têm por objeto o próprio dinheiro, enquanto as últimas visam à representação do valor de algum bem. Por exemplo, dívidas de dinheiro são as de pagar débito oriundo de empréstimo de dinheiro; dívidas de valor são as que equivalem ao valor necessário ao conserto de um automóvel danificado por ato ilícito do devedor (ibidem, p. 60). Segundo Sílvio Rodrigues, “o devedor de uma importância em dinheiro se libera oferecendo a quantidade de moeda inscrita em seu título de dívida e em curso no lugar do pagamento, seja qual for a alteração no valor intrínseco da moeda” (Rodrigues, Silvio. Direito civil. São Paulo, Saraiva, v. II, 2002, p. 143) (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 301. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26.04.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em relação ao artigo 315, Dívidas em dinheiro, Ricardo Fiuza explica serem aquelas cujo objeto da prestação é a própria na moeda, ou seja, o dinheiro em si, como se dá no mútuo. Diferem das dívidas de valor, aquelas em que o dinheiro serve apenas em medir ou valorar o objeto na prestação. Exemplos típicos de dívida de valor, citados por Álvaro Villaça Azevedo, são a pensão alimentícia, na qual “o devedor deve ao credor não determinada soma de dinheiro, mas a que for necessária à subsistência do credor dessa pensão”, e a indenização devida nas desapropriações, em que será “paga ao expropriado não uma soma em dinheiro, simplesmente mas uma importância que corresponda ao valor da coisa desapropriada” (Teoria geral das obrigações, cit., p. 132) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 180, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 29/04/2019, VD).

segunda-feira, 29 de abril de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 311, 312 Daqueles a Quem Se Deve Pagar – VARGAS, Paulo S. R.


                  DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 311, 312
                           Daqueles a Quem Se Deve Pagar – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título III – DO ADIMPLEMENTO E EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES
 (art. 304 a 388) Capítulo I – DO PAGAMENTO – Seção II –
Daqueles a Quem Se Deve Pagar - vargasdigitador.blogspot.com

Art. 311. Considera-se autorizado a receber o pagamento o portador da quitação, salvo se as circunstâncias contrariarem a presunção daí resultante.

Atenta Ricardo Fiuza para o fato de o artigo ter sido praticamente copiado do Código Civil alemão (art. 370). A presunção é juris tantum (presume-se que o credor autorizou o portador a receber a dívida, caracterizando verdadeiro mandato tácito). O portador da quitação deve, no entanto, aparentar a qualidade pela qual se apresenta, a ponto de induzir o devedor a erro, tal qual a hipótese do credor putativo. Havendo controvérsia sobre o portador da quitação, não terá eficácia o pagamento. Caberá, no entanto, ao credor provar que o devedor sabia ou tinha motivos para saber que o portador não podia usar a quitação. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 178, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 28/04/2019, VD).

Lecionando a respeito do artigo 311, Bdine Jr alerta que o instrumento de quitação faz prova de que seu portador pode receber o pagamento, o que implica exoneração do devedor. no entanto, as situações específicas podem contrariar essa presunção. O instrumento de quitação pode ter sido furtado do escritório do credor. Caso tiver conhecimento do furto, mas sem saber que o instrumento de quitação estava entre os bens subtraídos, o devedor, ao ser procurado por um desconhecido que quiser receber o débito vencido oferecendo-lhe quitação, deve suspeitar desse comportamento, acautelando-se para não pagar a eventual autor do crime de furto. O exame das circunstâncias de cada caso concreto é que autorizará a inversão da presunção de que o portador do instrumento não está autorizado a receber. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 292. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26.04.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo Pereira, presume-se que o portador do instrumento de quitação está autorizado pelo credor (representante convencional) a receber a prestação em seu nome. Pereira fala ainda que tal presunção aplicar-se-ia outrossim às hipóteses de “forma sumária de mandato não completamente formalizado” ou mesmo àqueles que apresentem títulos cuja posse seja representativa da obrigação. (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, op. cit., p. 177).
A presunção de autorização trazida no dispositivo é relativa e admite prova em contrário, caso as circunstâncias gerem dúvidas quanto à validade da representação, ilustrativamente, poderão gerar dúvidas quanto à representação os casos de furto ou extravio do instrumento de quitação ou mesmo de notificação ao devedor cancelando a autorização.  (Direito.com acesso em 28.04.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 312. Se o devedor pagar ao credor, apesar de intimado da penhora feita sobre o crédito, ou da impugnação a ele oposta por terceiros, o pagamento não valerá contra estes, que poderão constranger o devedor a pagar de novo, ficando-lhe ressaltado o regresso contra o credor.

No entender de Guimarães e Mezzalina, nos casos em que o devedor houver sido intimado de penhora ou de impugnação oposta por terceiro sobre o crédito por ele devido, o pagamento que venha efetuar ao credor será considerado ineficaz. Em ambos os casos (penhora e impugnação), o credor tem expropriado o poder de receber o crédito, em favor do juízo. Desse modo, uma vez intimado o devedor de referidos atos, a solutio ficará condicionada à consignação em pagamento ou ao depósito perante o Juízo da execução.

Caso o devedor, por negligência ou malícia, efetue o pagamento ao credor, continuará ele obrigado pelo pagamento perante o terceiro exequente ou embargante, dado que terá efetuado pagamento a credor que, ainda que momentaneamente, não detém poder de receber e quitar e, logo, a solutio não será considerada eficaz.

A impugnação, para obstar o pagamento ao credor, deverá ser realizada pela via judicial ou por intermédio do Cartório de Títulos e Documentos.

Caso o devedor seja obrigado, a despeito de pagamento realizado, diretamente, ao credor, a efetuar o pagamento a terceiro exequente ou embargante por dívida do credor, terá ele direito de regresso contra este, evitando, assim, hipótese de enriquecimento sem causa do titular original do crédito. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 28.04.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No diapasão de Bdine Jr., uma vez intimado de que o valor que deve ao credor foi penhorado por dívida deste último, o devedor não deve efetuar o pagamento diretamente a ele, mas sim depositá-lo em juízo, nos autos da ação movida em face do credor. Caso efetue o pagamento diretamente ao credor, estará fraudando a execução (art. 593 do CPC/1973, correspondendo ao art. 792 do CPC/2015). A regra tem equivalente no art. 298 do Código Civil, segundo o qual o devedor que desconhece a penhora e efetua o pagamento exonera-se da obrigação.

Também não é eficaz o pagamento efetuado após impugnação de terceiros. A ineficácia só é oponível aos terceiros que notificam o devedor, que poderão obriga-los a pagar novamente se o pagamento ao credor ocorrer após a notificação. Nessa hipótese, o devedor poderá postular o reembolso daquilo que pagou ao credor. Renan Lotufo pondera que essa impugnação deve ser judicial, sedo que a extrajudicial não produz o mesmo efeito (Código Civil comentado São Paulo, Saraiva, 2003, v. II, p. 211). No entanto, Caio Mário da Silva Pereira admite que a impugnação se faça por intermédio do Cartório de Títulos e Documentos (Instituições de direito civil, 20.ed., atualizada por Luiz Roldão de Freitas Gomes. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. II, p. 182) e Judith Martins-Costa considera suficiente o simples protesto (Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, forense, 2003, v. V, t. I, p. 157). Se as impugnações forem várias, o devedor deve consignar o valor em uma das ações e comunicar os demais Juízos (art. 335, IV, do CC). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 301. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26.04.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Seguindo a esteira de Ricardo Fiuza, o artigo versa sobre a hipótese em que o pagamento é feito ao verdadeiro credor mas, mesmo assim, não tem eficácia, vez que o credor estava impedido legalmente de receber. A penhora retira o crédito da esfera de disponibilidade do credor, razão por que ele não pode recebe-lo. Se o devedor é intimado de penhora incidente sobre o crédito ou de impugnação judicial oposta por terceiros e, ainda assim, paga ao credor, estará pagando mal, e corre o risco de vir a ser compelido a pagar novamente. Em tais casos, como observa Franzen de Lima, “o exequente e o oponente substituem o credor por ação judicial e o pagamento deverá ser feito a eles no momento oportuno, ou por depósito judicial, livrando-se o devedor da obrigação” (João Frazen de Lima, Curso de direito civil brasileiro, Rio de Janeiro, forense, 1958, v. 2, p. 126).

O objetivo do dispositivo é proteger os direitos dos credores do credor, uma vez que os créditos fazem parte de seu patrimônio e este é a garantia dos credores. O devedor, ciente da penhora ou da oposição judicial que paga o débito diretamente ao credor, será cobrado novamente pelos credores daquele nada lhe restando fazer senão procurar reaver do seu credor o que havia pago. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 178, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 28/04/2019, VD).

sexta-feira, 26 de abril de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 308, 309, 310 Daqueles a Quem Se Deve Pagar – VARGAS, Paulo S. R.


                                DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 308, 309, 310
Daqueles a Quem Se Deve Pagar – VARGAS, Paulo S. R.
 
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título III – DO ADIMPLEMENTO E EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES
 (art. 304 a 388) Capítulo I – DO PAGAMENTO – Seção II –
Daqueles a Quem Se Deve Pagar - vargasdigitador.blogspot.com

Art. 308. O pagamento deve ser feito ao credor ou a quem de direito o represente, sob pena de só valer depois de por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em seu proveito.

Segundo entendimento de Bdine Jr. os pagamentos devem ser efetuados ao próprio credor ou a seu representante. Se isso não se verificar, a validade do pagamento dependerá da ratificação do credor ou da prova que reverteu em proveito dele. São hipóteses diversas. O pagamento pode ser feito ao representante do credor, desde que prove essa condição (art. 118 do CC), ou dependendo de ratificação futura, expressa ou tácita.

Também pode ser válido, independentemente da ratificação ou da prova da representação, o pagamento que reverte em proveito do credor, o que dependerá de prova a ser produzida pelo devedor, ou pelo terceiro que efetuou o adimplemento. É o exemplo do devedor que deve determinada importância ao credor e quita um débito dele. Não há hipótese de representação, mas há reversão do pagamento da dívida em proveito do credor, que obterá a quitação.

Também se verifica a situação tratada neste dispositivo quando determinada quantia é entregue pelo locatário de um imóvel a uma pessoa que conhece os dados da conta corrente do locador (antigo empregador seu). Essa pessoa efetua o depósito do valor do aluguel nessa conta, com o propósito de quitar a dívida, mas sem que exista vínculo de representação entre aquele que efetuou depósito e o credor. Porém, o pagamento terá sido feito corretamente, na medida em que reverteu em proveito do locador. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 307-8. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26.04.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

A posição de Ricardo Fiuza citando Clóvis Beviláqua, é a de que o pagamento só produzirá eficácia liberatória da dívida quando feito ao próprio credor (aqui incluídos os concredores de dívida solidária, os cessionários, os portadores de título de crédito, entre outros), seus sucessores ou representantes. Essa é a regra geral. Será eficaz também se, feito a um estranho, vier a ser posteriormente ratificado pelo credor, expressa ou tacitamente. Ou ainda se converter-se em utilidade ao credor. Se o pagamento, mesmo feito a um estranho não credor, ainda assim “refletiu, favoravelmente, sobre o credor, proporcionando-se as mesmas vantagens, que poderia haurir se pessoalmente funcionasse cumprimento da prestação, é perfeitamente equitativo que se considere como realmente desacato o elo da cadeia obrigacional, que jungia o devedor (Beviláqua, Clóvis. Direito das obrigações, cit., p. 88). Cabe ao devedor provar que o pagamento verteu em benefício do credor. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 177, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/04/2019, VD).

Acessado o site Direito.com em 26/04/2019, tem-se que, em regra, o pagamento deve ser realizado, diretamente ao credor ou quem a ele represente. Nesses casos, o representante, vale dizer, não recebe como terceiro, mas sim na qualidade de alter ego do credor, o qual pode ser constituído, ilustrativamente, por meio de instrumento de mandato com poderes especiais para receber e quitar (representação convencional), pela gestão de negócios (representação oficiosa), por decorrência da lei (representação legal), por determinação judicial, tal qual se dá nos casos de depositário legal ou administrador designado pelo juiz, entre outros.

Eventual ratificação posterior do pagamento pelo credor, a despeito do pagamento ter sido realizado a quem não estava autorizado a receber, torna o pagamento eficaz. Será ainda eficaz o pagamento, caso o devedor prove que montante pago foi entregue ao credor, até o limite que este houver se beneficiado. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 26.04.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 309. O pagamento feito de boa-fé ao credor putativo é válido, ainda provado depois que não era credor.

Credor putativo é aquele que confere aos demais a aparência de ser o titular do crédito. Ilustrativamente, pode-se mencionar o credor primitivo se o devedor não tomou conhecimento da cessão de crédito, o portador do título de crédito, o herdeiro aparente, o legatário cujo legado não prevaleceu ou caducou. Obviamente que a análise da aparência do credor deverá ser feita casuisticamente, sempre averiguando a boa-fé do devedor e existência de uma suposição razoável da qualidade creditícia.

O pagamento feito ao credor putativo, conforme ilustração acessada no site Direito.com, em 26/04/2019, por devedor de boa-fé, é eficaz e exonera o devedor. nesses casos, o credor original não poderá exigir a prestação do devedor sequer nos casos em que tenha demonstrado em juízo sua qualidade de titular do crédito.

Conforme jurisprudência ainda em direito.com: “pagamento a credor putativo. IPTU. Impossibilidade de o Município de Bertioga exigir novo pagamento de IPTU por parte do sujeito passivo, uma vez estar efetivamente demonstrado que o contribuinte já efetuou anteriormente o recolhimento do tributo ao Município de Santos, de onde o primeiro foi desmembrado e com quem manteve disputa por limites territoriais. O sujeito passivo se encontra de boa-fé e protegido pela norma CC 309. A obrigação tributária deve ser dada por extinta, cabendo ao Município que se entende titular do crédito buscar o seu recebimento frente ao outro que realizou a tributação que reputa indevida” (JTACivSP 176/139). (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 26.04.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Bdine Jr. o artigo cuida da hipótese em que o pagamento é feito de boa-fé a alguém que se comporta de modo a fazer com que o devedor acredite ser ele o próprio credor, ou seu representante. O pagamento será válido, ainda que essa pessoa não seja o credor ou seu represente. O credor putativo é aquele que, em razão de seu comportamento, parece ser o próprio credor. Essa aparência não deve ser avaliada apenas em relação ao próprio devedor, mas em face de todos, de modo objetivo. Para admitir a putatividade do credor, não basta a convicção pessoal do devedor de que aquele é o verdadeiro credor (LOTUFO, Renan. Código civil comentado. São Paulo, Saraiva, 2003, v. II, p. 203).

Uma vez realizado o pagamento válido ao credor putativo, resta ao verdadeiro credor perseguir o crédito daquele que indevidamente o recebeu, pois o devedor originário está exonerado da obrigação. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 298 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26.04.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na definição de Ricardo Fiuza, Credor putativo é aquele que, não só à vista do devedor, mas nos olhos de todos, aparenta ser o verdadeiro crédito o seu legítimo representante.

Título da obrigação. Uma variante bastante interessante desse caso é a do pagamento feito ao possuidor de título litigioso, que vem posteriormente a perder a propriedade do crédito. A hipótese é descrita por Beviláqua: “o pagamento ao possuidor do crédito é válido em juízo sobre a propriedade da dívida. Aparentemente era esse o credor, e o direito lhe reconhecia e garantia essa qualidade, enquanto se não demonstrasse que, em verdade, lhe não cabia ela por lei; por isso é chamado credor putativo. Até que chegue esse momento, não há outro a quem pagar. E, feito o pagamento durante o decurso de tempo, em que o indivíduo era, juridicamente, o sujeito ativo da obrigação, sem ânimo doloso, sem outra intenção, é óbvio que o pagamento está válido e irrevogavelmente feito. Ao possuidor, porém, que assim recebeu o que se veio a verificar não lhe pertencer, cumpre restituir o que, por equívoco, lhe foi às mãos” (Beviláqua, Clóvis. Direito das obrigações, cit., p. 87). Outra situação interessante é a relatada por Sílvio Venosa: “Suponhamos o caso de alguém que, ao chegar a um estabelecimento comercial, paga a um assaltante, que naquele momento se instalou no guichê de recebimentos, ou a situação de um administrador de negócio que não tenha poderes para receber, mas aparece aos olhos de todos como efetivo gerente. Não se trata apenas de situações em que o credor se apresenta falsamente com o título ou com a situação, mas de todas aquelas situações em que se reputa o accipiens como credor” (Sílvio de Salvo Venosa, Direito civil, cit., p. 170).

A condição de eficácia do pagamento feito ao credor putativo é a boa-fé do devedor, caracterizada pela existência de motivos objetivos que o levaram a acreditar tratar-se do verdadeiro credor. Não basta a crença subjetiva. Efetivado o pagamento nessas condições, fica o devedor exonerado, só cabendo ao verdadeiro credor reclamar o seu débito do credor putativo, que o recebeu indevidamente. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 177-8, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/04/2019, VD).

Art. 310. Não vale o pagamento cientemente feito ao credor incapaz de quitar, se o devedor não provar que em benefício dele efetivamente reverteu.

A respeito, Fiuza comenta que o pagamento, como todo e qualquer ato jurídico, exige plena capacidade das partes. Se feito ao absolutamente incapaz, é nulo de pleno direito. Se feito ao relativamente incapaz, poderá ser ratificado posteriormente, quer pelo seu representante legal, quer pelo próprio incapaz, após cessada a incapacidade. Em ambos os casos, será válido o pagamento, provando o devedor que foi proveitoso ao incapaz.

O dispositivo, apesar de transplantado do Código civil de 1916, afigura-se, até certo ponto, dispensável, uma vez que suas hipóteses de incidência podem ser compreendidas como abrangidas pelo art. 308 deste Código. Se o credor é incapaz de quitar, não pode receber o pagamento, que deve ser feito ao seu representante legal. Equipara-se ao pagamento feito ao não-credor, sobre o qual já discorremos. Vide nossos comentários ao art. 308.

Se o devedor, por justificada razão, desconhecia a incapacidade do credor, aplica-se o mesmo princípio do artigo anterior, reputando-se válido o pagamento, independentemente de comprovação de que trouxe proveito ao incapaz. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 178, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/04/2019, VD).

Temos com Guimarães e Mezzalina, que, caso o devedor prove que eventual pagamento realizado ao incapaz ou àquele que não estava autorizado a receber reverteu em favor do credor, terá seu pagamento considerado eficaz e estará exonerado da obrigação, até o limite em que o credor houver se beneficiado. Afinal, do contrário, estar-se-ia a admitir a locupletação sem causa do devedor.

O pagamento feito a incapaz, em razão de idade, poderá ser considerado válido e eficaz, caso, após o cumprimento da prestação e sobrevindo a maioridade, haja a quitação retroativa da obrigação. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 26.04.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

A posição de Bdine Jr. é que, se o devedor tiver a consciência da incapacidade de seu credor e, apesar disso, efetuar o pagamento, sua exoneração ficará condicionada à prova de que o benefício – ou seja, o pagamento -, reverteu em proveito do credor incapaz. Sílvio Rodrigues adverte que se o devedor não tiver ciência da incapacidade, o pagamento será válido, prestigiando-se a boa-fé daquele que paga ou punindo-se a malícia do credor: “Note-se que o texto do art. 310 usa o advérbio cientemente, ao se referir ao pagamento feito ao incapaz de quitar. Beviláqua insiste no fato de ser condição de ineficácia do pagamento a ciência pelo solvens, da incapacidade do accipiens. Nesse sentido, se o devedor tinha razão suficiente para supor que tratava com pessoa incapaz, ou se, dolosamente, foi induzido a crer que desaparecera a incapacidade existente, prevalecerá o pagamento desde que se prove o erro escusável do devedor ou dolo do credor” (Rodrigues Silvio. Direito civil. São Paulo, Saraiva, v. II, 2002, p. 132).

O pagamento é ato jurídico (ou ato-fato jurídico, na lição de Pontes de Miranda. Tratado de direito privado, 1.ed., atualizada por Vilson Rodrigues Alves. Campinas, Bookseller, 2003, v. XXIV, p. 114), de modo que a vontade só pode produzir um resultado: a quitação. Dessa forma, o recebimento pelo incapaz pode ser eficaz se efetivamente o beneficiou. A regra aplica-se tanto aos absolutamente quanto aos relativamente incapazes, como observa Caio Mário da Silva Pereira, ponderando, no que se refere aos primeiros, que, embora o ato praticado pelo devedor seja mulo, nada justifica que o credor enriqueça em prejuízo de quem paga, se o pagamento reverteu em seu proveito (Instituições de direito civil, 20.ed., atualizada por Luiz Roldão de Freitas Gomes. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. II, p. 181). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 310-11. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26.04.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

quinta-feira, 25 de abril de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 307 Do Pagamento – VARGAS, Paulo S. R.


                                         DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 307
Do Pagamento – VARGAS, Paulo S. R. 

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título III – DO ADIMPLEMENTO E EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES
 (art. 304 a 388) Capítulo I – DO PAGAMENTO – Seção I –
De Quem Deve Pagar - vargasdigitador.blogspot.com

Art. 307. Só terá eficácia o pagamento que importar transmissão da propriedade, quando feito por quem possa alienar o objeto em que ele consistiu.

Parágrafo único. Se se der em pagamento coisa fungível, não se poderá mais reclamar do credor que, de b ao-fé, a recebeu e consumiu, ainda que o solvente não tivesse o direito de aliená-la.

Acompanhando Bdine Jr., o pagamento que acarretar a transmissão da propriedade só será eficaz quando quem o fizer tiver condições de alienar o objeto sobre o qual o negócio recai. É que o pagamento feito com o que não pode ser alienado por quem o transmite não poderá ser aperfeiçoado, de maneira que o credor não se tornará titular da propriedade e, consequentemente, não haverá adimplemento.

Porém, se o bem transmitido for fungível (art. 85 do CC) e quem o recebeu, de boa-fé, o tenha consumido, aquele que o entregou não pode mais reclamá-lo, mesmo que não tivesse o direito de aliená-lo. Nessa hipótese, o terceiro titular do bem deverá cobrar eventual prejuízo daquele que pagou indevidamente. É que, em se tratando de bem consumível, não haverá possibilidade de o terceiro reivindica-lo, o que, como se viu, é possível em relação aos bens ainda encontráveis em poder do credor.

Renan Lotufo registra que a boa-fé deve estar presente desde a recepção do bem até seu consumo (Código Civil comentado. São Paulo, Saraiva, 2003, v. II, p. 197). Nada impede, no entanto, que aquele que transmitiu sem estar em condições de alienar o bem venha a adquiri-lo posteriormente, convalidando o pagamento (op. cit., p. 196).

A eficácia de que trata este dispositivo depende da conjugação entre a capacidade negocial e a legitimação, ou o poder de dispor sobre o bem entregue em pagamento. Poderá haver capacidade de efetuar a entrega – obrigação de dar -, sem que haja possibilidade de transferir o domínio, hipótese em que o pagamento não será eficaz (MARTINS-COSTA, Judith. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. V, t. I, p. 123). Silvio Rodrigues menciona a hipótese de negócio validamente constituído, mas no qual o pagamento se faz ao tempo em que o devedor era incapaz, e o autor conclui que o adimplemento é válido se o credor tiver agido de boa fé e consumido o bem entregue em pagamento (Direito civil. São Paulo, Saraiva, v. II, 2002, p. 130). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 307-8. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 25.04.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

No entendimento de Ricardo Fiuza, a única inovação relevante do dispositivo em relação ao direito anterior foi a substituição da palavra “validade” por “eficácia”. Sobre o assunto, vide nota ao art. 288.

O pagamento que importar em alienação (obrigação de dar) não terá eficácia se feito por quem não era dono da coisa (alienação a non domino). Se porém era fungível a coisa e o credor a recebeu e a consumiu de boa-fé, reputa-se eficaz o pagamento e do credor nada se poderá reclamar, cabendo ao terceiro, que era o verdadeiro proprietário, buscar as reparações cabíveis do devedor que entregou o que não lhe pertencia. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 175, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 25/04/2019, VD).

No entendimento de Pereira, as prestações que visarem à transferência de propriedade somente poderão ser realizadas por terceiros que tenham a capacidade para alienar determinado bem. Desse modo, se o pagamento, por exemplo, se der por terceiro que não era dono do bem, o ato será ineficaz. (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, op. cit., p. 176).

No entanto, se for dada coisa fungível e o credor já lhe houver consumido, não poderá ser-lhe requerida a restituição do produto, exceto nas hipóteses em que estiver de má-fé. Em casos tais, o prejudicado terá a prerrogativa de cobrar do terceiro solvente as perdas e danos sofridas com a disposição de bem que lhe pertencia. Todavia, caso o bem ainda não tenha sido consumido, seu real proprietário poderá reivindicar sua posse, ainda que o credor tenha o recebido de boa-fé. De acordo com Pereira, a diferença de tratamento entre a hipótese de já ter havido ou não o consumo do bem não decorre exatamente do direito do dono, mas sim da apuração de sua existência e, logo, da impossibilidade ou possibilidade de ser reavido. (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, op. cit., p. 176, apud Direito.com acessado em 25.04.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 24 de abril de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 304, 305, 306 Do Adimplemento e Extinção das Obrigações – VARGAS, Paulo S. R.


                      DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 304, 305, 306
Do Adimplemento e Extinção das Obrigações – VARGAS, Paulo S. R.
 
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título III – DO ADIMPLEMENTO E EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES
 (art. 304 a 388) Capítulo I – DO PAGAMENTO – Seção I –
De Quem Deve Pagar - vargasdigitador.blogspot.com

Art. 304. Qualquer interessado na extinção da dívida pode pagá-la, usando, se o credor se opuser, dos meios conducentes à exoneração do devedor.

Parágrafo único. Igual direito cabe ao terceiro não interessado, se o fizer em nome e à conta do devedor, salvo oposição deste.

Em se tratando de obrigação Intuito personae debitoris, somente ao devedor cumpre efetuar o adimplemento do débito (obrigações infungíveis). Excetuado esse caso, qualquer outro interessado na extinção da dívida poderá quitá-la. Estas são informações passadas segundo entendimento de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina (Direito Civil Comentado, apud Direito.com acessado em 23.04.2019). são considerados terceiros interessados, na dicção da norma, todo aquele que esteja vinculado à obrigação ou em quem esta venha a repercutir. Não há ao credor, nesses casos, o direito de rejeitar o pagamento, havendo, em realidade, até mesmo o dever de recebe-lo. Assim, na recusa do credor no recebimento da prestação, terá o terceiro interessado as prerrogativas de se valer da consignação em pagamento, na colocação da coisa à disposição do credor ou até mesmo na simples abstenção. Na hipótese de pagamento por terceiro a ordem do devedor, ou por terceiro interessado, há a sub-rogação da que efetuou o pagamento na posição do credor, com todas as suas qualidades, privilégios e vantagens. No pagamento efetuado por terceiro interessado, não haverá espaço para a recusa do devedor.

“Civil. Mutuo Hipotecário. Pagamento Por Terceiro. aquele que adquire o imóvel hipotecado é interessado, para os efeitos do artigo 930, caput, do Código Civil, no pagamento das prestações de resgate do mútuo, porque a respectiva falta implica a execução do gravame. Ao credor é defeso recusar o recebimento, porque o pagamento não tem o efeito de integrar o comprador do imóvel na relação de financiamento. Recurso especial não conhecido” (STJ, 3ª Turma, REsp 154.457, Rel. Min. Ari Pargendler, j. 6.12.2003).

O terceiro não interessado (aquele que não está vinculado à obrigação, nem sofre os seus efeitos, mas que tem interesse de ordem moral no seu cumprimento – exemplificativamente, o amigo ou parente do devedor) poderá pagar em nome por conta do devedor, caso este não se oponha ao ato. Nesse caso, o credor também não poderá recusar a prestação. Havendo oposição do credor, o terceiro não interessado disporá dos mecanismos para compeli-lo a receber. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina Direito Civil Comentado, apud Direito.com em 23.04.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo a orientação de Bdine Jr. e de acordo com o ensinamento de Caio Mário da Silva Pereira, “o pagamento é o fim normal da obrigação”, mas não o único, já que ela também pode se extinguir de outras maneiras: “a) pela execução forçada, seja em forma específica, seja pela conversão da coisa devida no seu equivalente; b) pela satisfação direta ou indireta do credor, por exemplo, na compensação; c) pela extinção sem caráter satisfatório, como na impossibilidade da prestação sem culpa do devedor, ou na remissão da dívida” (Instituições de direito civil, 20.ed., atualizada por Luiz Roldão de Freitas Gomes. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. II, p. 168).

Ao ser constituída a obrigação, o credor pode exigir o cumprimento da prestação e o devedor fica obrigado a cumpri-la no tempo e do modo devidos. O Capítulo III do Livros das Obrigações do novo Código Civil cuida do adimplemento e da extinção das obrigações. Disciplina, portanto, os meios necessários e aptos a extinguir a obrigação. O Código Civil de 1916 denominava como “Dos efeitos das obrigações o capítulo que tratava das hipóteses de adimplemento”.

Normalmente, a obrigação nascida de qualquer de suas fontes extingue-se pelo pagamento, ou seja, pelo cumprimento da prestação devida ao credor, no prazo e do modo estabelecidos. Pagamento, portanto, representa o cumprimento da prestação devida em qualquer de suas modalidades – fazer, não fazer ou dar -, e não apenas a correspondente à entrega de dinheiro. Na definição de Clóvis, “pagamento é execução voluntária da obrigação” (LOTUFO, Renan. Código Civil comentado. São Paulo, Saraiva, 2003, v. II, p. 185). Caio Mário da Silva Pereira registra que o pagamento deve coincidir com a coisa devida e tem como efeito essencial a extinção da obrigação (op. cit., p. 183).

O adimplemento pode ser direito, indireto ou anormal. No primeiro caso, corresponde à própria prestação originalmente prevista (pagamento, portanto); no segundo, resulta de outro fenômeno (consignação, novação, compensação etc.); no terceiro, ocorre quanto a obrigação extingue-se sem cumprimento, como nos casos de perecimento do bem sem culpa do devedor, prescrição, invalidade etc. O pagamento será voluntário quando efetuado espontaneamente pelo devedor e forçado, quando resultar da intervenção judicial.

No entanto, além do pagamento, expressão que corresponde ao adimplemento, há outras formas de extinção das obrigações – confusão, remissão, compensação etc. -, que, no entanto, não equivalem ao adimplemento. Renan Lotufo pondera que a doutrina distingue as hipóteses de extinção satisfativa e não satisfativa do crédito (op. cit., p. 183). Se qualquer desses requisitos não se verificar, não haverá pagamento, embora seja possível que se reconheça a extinção da obrigação em decorrência de outro fato (dação em pagamento, por exemplo). Além disso, o pagamento supõe a existência de obrigação anterior, pois dá lugar à repetição do indébito, i.é, a restituição do objeto do pagamento àquele que o efetuou por erro (RIZZARDO, Arnaldo. Direito das obrigações. Rio de Janeiro, Forense, 2004, p. 297).

O artigo em exame cuida de disciplinar a possibilidade de interessados e não interessados efetuarem o pagamento. Para a exata compreensão desse artigo, é preciso compreender o sentido da expressão “interessado na extinção da dívida”. Serão interessados os que, juridicamente, estiverem obrigados a efetuar o pagamento, ou seja, a dar cumprimento à prestação assumida – como é o caso dos garantidores em geral. A responsabilidade já assumida por eles no momento em que a obrigação foi constituída os autoriza e os legitima a pagar o débito e a utilizar todos os meios necessários para a exoneração. Até mesmo um credor do devedor pode ter interesse em quitar sua dívida para evitar a penhora, preservando, assim, sua garantia. Ou um inquilino do imóvel pode decidir quitar a dívida do locador para que o bem não seja arrematado, evitando assim a legitimação do despejo. Nessas duas hipóteses, haverá terceiros juridicamente interessados na extinção da dívida, que, segundo o dispositivo em exame, poderão valer-se de todos os meios destinados à exoneração da dívida (como a consignação em pagamento).

O interesse jurídico referido não contempla somente os que integrarem a relação jurídica estabelecida entre credor e devedor, mas também os que nela não figuram, embora possam suportar as consequências do inadimplemento. No parágrafo único deste dispositivo, assegura-se ao terceiro não interessado o direito de valer-se dos mesmos meios necessários de que o devedor para extinguir a obrigação, desde que o faça em nome e à conta deste. O terceiro não interessado é o que não integra a relação jurídica a que o devedor se vincula e também não tem qualquer espécie de interesse jurídico no pagamento. Neste parágrafo, admite-se a oposição do devedor ao pagamento a ser efetuado por terceiro não interessado em nome do próprio devedor. significa dizer, portanto, que o devedor só pode opor-se ao pagamento que o terceiro não interessado pretende efetuar em nome daquele, mas não ao terceiro vinculado juridicamente a sua obrigação ou ao não interessado que pague em seu próprio nome, i.é, em nome dele, terceiro, hipótese contemplada no dispositivo seguinte. O devedor poderá se opor a este pagamento pretendido pelo terceiro não interessado em nome dele, devedor, já que este é o titular do direito subjetivo de cumprir pessoalmente a obrigação.

O pagamento efetuado pelo terceiro interessado implica sub-rogação, i.é, transmissão do crédito do credor originário ao terceiro interessado de cumpre a obrigação do devedor (art. 346, III, do CC). O devedor não cumpriu sua obrigação, embora o credor tenha recebido a satisfação de seu crédito. Deste modo, a dívida não foi extinta, mas transferida ao terceiro que a saldou. A oposição que o devedor pode apresentar ao pagamento do terceiro não interessado pode decorrer de seu interesse em quitar a dívida, mas também de razoes íntimas pelas quais considere inadmissível que alguém, por qualquer motivo, decida dar cumprimento à sua obrigação. É o caso do fiscal de rendas, ou de outro servidor público, que não tenha condições de cumprir determinada obrigação, mas pretende impedir que o terceiro não interessado o faça em seu lugar, pretendendo assegurar o respeito à sua reputação – imagine-se que o terceiro não interessado que deseja pagar sua dívida seja um conhecido contraventor.

A possibilidade de oposição ao pagamento ofertado pelo terceiro não interessado em nome do devedor remete à seguinte reflexão: o credor é impedido de receber o crédito a que faz jus em decorrência da oposição do devedor? A resposta deve ser negativa, pois o credor não pode ver-se impedido de receber o que lhe é devido, ainda que terceiro não interessado pretenda pagá-lo. Aliás, a aceitação da quitação do débito por terceiro não interessado – ainda que contrariando a oposição do devedor – seria possível por sub-rogação convencional do crédito (art. 347 do CC). O negócio seria válido e bastaria que o devedor original fosse notificado para que a cessão fosse eficaz em relação a ele (arts. 290 e 348 do CC).

Quais os efeitos, portanto, da oposição do devedor, se o credor pode recebe-lo a despeito de sua oposição? O primeiro deles, extraído da conjugação do parágrafo único com o caput do artigo em exame, corresponde à impossibilidade de o terceiro não interessado valer-se dos meios conducentes à exoneração do devedor: caso o credor não queira receber e o devedor se oponha ao pagamento, o terceiro não interessado não pode valer-se dos meios conducentes à exoneração, ainda que o faça em nome do devedor. o segundo efeito se verificará se o credor aceitar do terceiro não interessado o pagamento oferecido em nome do devedor que a ele se opõe. Desse modo, o pagamento será eficaz para desobrigar o devedor em relação ao credor, mas afastará o reconhecimento da liberalidade que a doutrina identifica nesses casos (MARTINS-COSTA, Judith. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. V, t. I, p. 107. RODRIGUES Sílvio. Direito Civil. São Paulo, Saraiva, 2002, v. II, p. 127. ROSENVALD, Nelson. Direito das obrigações. Niterói, Impetus, 2004, p. 138).

Registre-se, porém, que a presunção de liberalidade não é a regra, pois o comum não é a doação, mas sim a onerosidade. A doutrina, porém, reconhece no parágrafo único em exame uma presunção de liberalidade em razão de dois fatos; a) o art. 305 do Código Civil só se refere ao direito de ressarcimento do terceiro não interessado que paga em seu próprio nome, de modo que no caso do pagamento feito em nome do próprio devedor não haveria direito ao ressarcimento (RODRIGUES, Sílvio. op. cit., p. 127); e b) as liberalidades dependem de aceitação (arts. 385 e 539 do CC). Assim, a possibilidade de o devedor opor-se ao pagamento que o terceiro não interessado pretende efetuar em nome do primeiro – acréscimo do parágrafo em exame com relação ao art. 930, parágrafo único, do Código Civil de 1916 – destinou-se a evidenciar o caráter de liberalidade desse caso de pagamento.

Contudo, insista-se que as liberalidades não se presumem, porque excepcionais, de modo que o terceiro não interessado poderá postular o recebimento do que pagou em benefício do devedor, ainda que tenha havido oposição deste, como esclarece Renan Lotufo: “É evidente que houve uma vantagem econômica para o devedor, que não sofreu qualquer diminuição em seu patrimônio, o que ocorreria com o adimplemento por sua conta. Pelo contrário, o devedor originário teve um benefício patrimonial, um enriquecimento sem causa, à custa da atuação do terceiro. nesse caso, portanto, o terceiro só poderá exercer pretensão em face do devedor, comprovando que este obteve vantagem patrimonial sem motivo determinante prestigiado pelo Direito, i.é, enriquecimento sem causa” (op. cit., p. 189).

Destarte, a oposição do devedor se prestará a dois efeitos: impedir tanto que o terceiro se valha de meios conducentes à exoneração como o reconhecimento de uma liberalidade, se, porventura, o terceiro manifestar seu propósito de fazê-la, porque esta não se presume. Judith Martins-Costa, que admite a presunção de liberalidade nesse caso, sustenta que ela é relativa, não absoluta (op. cit., p. 108). Mas, ao se admitir que a liberalidade não se presume, ela só ocorrerá se o devedor aceitar o pagamento do terceiro, sem oposição, e se ele manifestar seu propósito de efetuar a liberalidade. Mário Júlio de Almeida Costa conclui neste mesmo sentido: se existe doação, há necessidade de estar presente o elemento intencional na conduta do terceiro e a aceitação do devedor. do contrário, mesmo quando o pagamento é feito em nome do devedor, o terceiro não interessado pode postular o reembolso sob pena de enriquecimento sem causa (Direito das obrigações. Coimbra, Almedina, 2000, p. 925).

A existência do art. 305 do Código Civil, ao que parece, decorre da impossibilidade de o terceiro valer-se dos meios conducentes à exoneração da dívida se pretender pagar em nome próprio, e não à presunção de liberalidade, que estaria presente no art. 304, parágrafo único. Ademais, no caso do artigo seguinte, não haverá liberalidade.

Todavia, o devedor não pode opor-se ao pagamento do terceiro vinculado juridicamente à obrigação ou ao não interessado que pague em seu próprio nome, hipótese contemplada no dispositivo seguinte. O pagamento efetuado pelo terceiro interessado implica sub-rogação, i.é, transmissão do crédito do credor originário ao terceiro que cumpre a obrigação do devedor (art. 346, III, do CC). O devedor não cumpre sua obrigação, embora o credor tenha recebido a satisfação de seu crédito. Desse modo, a dívida não foi extinta, mas transferida ao terceiro que a saldou. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 278-280 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 23.04.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Pouco fala Ricardo Fiuza em sua doutrina a respeito do artigo 304. A seu ver, resumidamente, são interessados no pagamento da dívida o fiador, o avalista, o devedor solidário, o sublocatário, o sócio, o terceiro que prestou hipoteca ou penhor, o herdeiro. Todos eles podem pagar independentemente do consentimento do devedor ou do credor e mesmo contra a sua vontade. Já o terceiro não interessado só pode pagar pelo devedor e, em consequência desse pagamento, sub-rogar-se nos direitos de credor do devedor, se este não se opuser. Havendo oposição do devedor, o terceiro só poderá pagar em nome próprio, aplicando-se a regra do art. 305.

Observe-se que a única inovação trazida no bojo desse art. 304 foi justamente a inserção dessa cláusula final no parágrafo único, privilegiando as hipóteses em que, por razões de ordem moral, religiosa ou jurídica, não seja conveniente ao devedor que determinada pessoa realize o pagamento. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 174, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 23/04/2019, VD).

Art. 305. O terceiro não interessado, que paga a dívida em seu próprio nome, tem direito a reembolsa-se do que pagar; mas não se sub-roga nos direitos do credor.

Parágrafo único. Se pagar antes de vencida a dívida, só terá direito ao reembolso no vencimento.

No dizer de Guimarães e Mezzalina, diversamente do que se dá na hipótese do artigo 304, o terceiro não interessado que pagou a obrigação devida pelo devedor não se sub-roga na posição do credor original. Nesse caso, haverá apenas e tão somente ao terceiro o direito de pleitear o reembolso do que despendeu em favor do devedor. afinal, do contrário, haveria o enriquecimento sem causa do devedor.  caso o terceiro não interessado pague a dívida antes do seu vencimento, ele deverá aguar o seu termo para cobrar o reembolso do devedor. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 23.04.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Bdine Jr., no caso deste dispositivo, o terceiro não interessado paga a dívida em seu próprio nome, não em nome do devedor, como no caso referido no parágrafo único do dispositivo anterior. No caso presente, o ordenamento não autoriza o terceiro a valer-se de todos os meios necessários ao adimplemento, ao contrário do que ocorre nos casos do art. 304. Apesar disso, o pagamento pode ocorrer, de modo que o dispositivo em exame assegura ao terceiro que seja reembolsado daquilo que pagou, cobrando a importância do devedor que se beneficia com o ato. Mas nesse caso não se opera a sub-rogação. A distinção é relevante. Ora, se a sub-rogação não ocorrer, o terceiro não faz jus ao ressarcimento da integralidade do débito que liquidou, mas apenas ao montante que entregou ao credor. Aplica-se essa regra às obrigações de pagar em dinheiro; por exemplo, no caso de terceiro que resgata uma dívida de R$ 1.000,00 por R$ 900,00, pois recebe um desconto de 10% do credor, só poderá cobrar do devedor os R$ 900,00 que pagou. Além disso, se a dívida estava garantida por fiança ou hipoteca, tais garantias não beneficiarão o terceiro, já que ele não se sub-roga na obrigação original, podendo, de acordo com o disposto no artigo em exame, apenas recuperar aquilo que efetivamente gastou (art. 349 do CC).

O parágrafo único deste artigo proíbe o terceiro não interessado de cobrar o reembolso mencionado no caput antes da data do vencimento da dívida, caso tenha procedido ao pagamento antes desse prazo. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 303-4 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 23.04.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

No intervir de Ricardo Fiuza, mesmo havendo oposição do devedor, pode o terceiro não interessado quitar a dívida, desde que o faça em nome próprio, ainda que em benefício do devedor. em respeito à regra geral de vedação ao enriquecimento sem causa, pode o terceiro reembolsar-se, junto ao devedor, pelo que houver pago, sem, no entanto, sub-rogar-se nos direitos do primitivo credor. Como não lhe seria possível onerar a posição do devedor, pagando valor superior ao devido ou em data anterior ao vencimento, o reembolso estará limitado ao valor do débito e só poderá ser cobrado na data do vencimento. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 175, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 23/04/2019, VD).

Art. 306. O pagamento feito por terceiro, com desconhecimento ou oposição do devedor, não obriga a reembolsar aquele que pagou, se o devedor tinha meios para ilidir a ação.

Segundo parecer de Ricardo Fiuza, promoveu-se aqui substanciosa alteração no correspondente art. 932 do Código Civil de 1916, para prever hipótese em que o devedor se eximirá da obrigação de reembolsar o terceiro que houver pago o débito, independentemente do benefício que tinha experimentado, sempre que o pagamento se dê sem o seu consentimento ou com a sua oposição, quanto tinha, ele, devedor, meios ou instrumentos de evitar a cobrança do débito pelo credor, como se dá, por exemplo, nas hipóteses em que o devedor dispõe de defesas pessoais, só oponíveis ao primitivo credor.

Na antiga redação do art. 932, do Código Civil de 1916, pondera Fiuza, o devedor, mesmo opondo-se ao pagamento pelo terceiro não interessado, estava obrigado a reembolsá-lo, ao menos até a importância em que o pagamento lhe foi útil. O art. 306 do novo Código promove importante modificação na regra de reembolso, passando a dispor que o devedor, mesmo aproveitando-se, aparentemente, do pagamento feito pelo terceiro, não estará mais obrigado a reembolsá-lo, desde que dispusesse, à época, dos meios legais de ilidir a ação do credor, vale dizer, de evitar que o credor viesse a exercer o seu direito de cobrança. Na verdade, se o devedor tinha meios para evitar a cobrança, e ainda assim, com a sua oposição ou seu desconhecimento, vem um terceiro e paga a dívida, sofreria prejuízo se tivesse que reembolsar àquele, significando inaceitável oneração de sua posição na relação obrigacional por fato de terceiro. merece, portanto, os maiores elogios a inovação do art. 306. A sua redação, no entanto, talvez não tenha sido a mais feliz, como ressalta Álvaro Villaça Azevedo: “A redação do texto analisado deixa a desejar, principalmente, quanto a esta última expressão, muito generalizada. Tem-0se a impressão de estarem os mesmos dispositivos referindo-se à ação do terceiro, mas isso não seria possível, mormente se o devedor desconhecesse o pagamento por ele realizado. No caso a referência é aos meios de defesa do devedor junto ao credor, ilidindo a ação deste, na cobrança de seu crédito” (Teoria geral das obrigações, cit., p. 119). Entendemos assistir parcial razão ao mestre Villaça.  (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 175, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 23/04/2019, VD).

Concordando com o até aqui exposto, Bdine Jr. aquiesce que o devedor não está obrigado a reembolsar o terceiro que pagou sua dívida, se tinha meios para ilidir a ação, desde que desconhecesse o pagamento ou se opusesse a ele. A disposição se aplica tanto ao terceiro interessado quanto ao não interessado, uma vez que o dispositivo não os distingue e em ambas as hipóteses é possível vislumbrar prejuízo ao devedor, que tem argumentos para exonerar-se da obrigação indevidamente paga pelo terceiro.

No entanto, há hipóteses em que o devedor apresenta argumentos não convincentes para ilidir a ação de cobrança. Importa saber se, nesses casos, o terceiro interessado fica impedido de efetuar o pagamento. Parece que o dispositivo deve ser interpretado como uma espécie de cláusula aberta, que permite ao juiz examinar em cada caso a consistência do argumento apresentado pelo devedor. assim, se o locatário deseja impedir o fiador de quitar seu débito, sob o fundamento de que o direito à moradia é assegurado constitucionalmente – de maneira que o locador não pode cobrá-lo, tendo em vista a inconstitucionalidade e a natureza residencial da locação -, a fragilidade do argumento não impede o fiador de pagar a dívida. Contudo, se o argumento apresentado pelo devedor principal é sério e sua admissibilidade provável, ele tem direito de se eximir da obrigação de reembolso em relação ao terceiro. é interessante observar que, em todas essas hipóteses, a discussão só se estabelecerá se o terceiro efetivamente pagar o credor; do contrário a discussão não será viável. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 286 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 23.04.2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Endossando os dois primeiros comentários, Guimarães e Mezzalina, faz rápida alusão ao art. 306, completando que nos casos em que o devedor desconhecer ou se opuser a que o pagamento seja efetuado por terceiro, a este será dado ser reembolsado apenas da porção que, efetivamente beneficiar-lhe. Afinal, pode haver casos em que o devedor, por meio de exceções pessoais ou extintivas da obrigação, poderia se elidir da cobrança do credor (ex.: prescrição da dívida) e, logo, não terá auferido vantagens reais com o pagamento efetuado pelo terceiro. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina (Direito Civil Comentado, apud Direito.com em 23.04.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).