quarta-feira, 14 de setembro de 2022

Direito Civil Comentado - Art. 636, 637, 638 - Do Depósito Voluntário – VARGAS, Paulo S. R. - vargasdigitador.blogspot.com digitadorvargas@outlook.com

 

Direito Civil Comentado - Art. 636, 637, 638
- Do Depósito Voluntário – VARGAS, Paulo S. R.
- vargasdigitador.blogspot.com
digitadorvargas@outlook.com

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações

Título VI – Das Várias Espécies de Contrato

Capítulo IX – Do Depósito – Seção I –

Do depósito voluntário

 (Art. 627 a 646)

 

Art. 636. O depositário, que por força maior houver perdido a coisa depositada e recebido outra em seu lugar, é obrigado a entregar a segunda ao depositante, e ceder-lhe as ações que no caso tiver contra o terceiro responsável pela restituição da primeira.

Segundo a apreciação do relator, baseado no Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 636, p. 340-341 apud Maria Helena Diniz Código Civil: Apoiado na regra do art. 642 do NCC, que isenta o depositário de responder pelos casos de força maior, o artigo sob exame prevê que, se “a coisa depositada se perdeu por fato inimputável ao depositário” (Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro, 1ª ed., São Paulo, Saraiva, 2001, 3 — Teoria das obrigações contratuais e extracontratuais, p. 296), este é obrigado a entregar a segunda ao depositante, “pois que não pode locupletar-se com a sua retenção indevida” (Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de direito civil, 10. ed., Rio de Janeiro. Forense, 1996, v. 3, p. 232). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 636, p. 340-341 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 14/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na lógica de Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 636, p. 655: O depositário não responderá pelos casos de força maior, quando o fato for devidamente comprovado (art. 642 do CC). Aqui, segue-se a regra geral do direito das obrigações, pela qual o devedor se exonerará de tal responsabilidade, exceto quando expressamente tenha convencionado que assumiria os riscos do evento a ele inimputável (art. 393 do CC).

Força maior é o evento externo ao agente, de caráter inevitável. Não mais avulta a distinção com o fortuito, pois o art. 393, parágrafo único, assemelha-os em suas consequências, na diretriz da operabilidade. A título ilustrativo, haveria força maior na perda do objeto depositado em razão de uma catástrofe natural; de uma patologia incontrolável ou de uma guerra.

Ocorrendo a perda da coisa em virtude do imponderável, caso tenha sido entregue outro objeto em reposição - quando for possível -, obviamente caberá ao depositário o dever de guarda e diligência ordinários com a obrigação de restituir ao tempo avençado.

Mas não é só. Segundo a parte final do dispositivo, confere-se ao depositante a posição de sub-rogado nos créditos obtidos pelo depositário em face de terceiros responsáveis pela restituição dos valores relacionados ao objeto originário, que se perdeu.

Portanto, traçando um paralelo com as hipóteses formuladas para a perda do objeto no usufruto (arts. 1.407 a 1.409 do CC), temos que o depositante fará jus ao valor do seguro contratado pelo depositário, bem como à quantia consequente à desapropriação do bem depositado e à indenização paga pelo terceiro que culposamente destruiu o objeto. (Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 636, p. 655, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 14/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo apreciação de Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 636: O fato de terceiro, inevitável e imprevisível que leva à perda da coisa é considerado fato de força maior. Pode ser furto, roubo, acidente. Em qualquer desses casos, pode o depositário receber outra coisa em caráter indenizatório, notadamente, dinheiro, como ocorre se o evento estiver acobertado por contrato de seguro. Qualquer que seja o evento e a coisa dada em substituição à que se havia sido depositada, faz jus o depositante a recebê-la. O recebimento da coisa dada em substituição não exonera nem o terceiro nem o depositário pelos prejuízos sofridos pelo depositante, para cuja apuração deve-se levar em conta o valor do bem que recebeu em substituição. (Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 636, acessado em 14/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 637. O herdeiro do depositário, que de boa-fé vendeu a coisa depositada, é obrigado a assistir o depositante na reivindicação, e a restituir ao comprador o preço recebido.

Na lídima apreciação do Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 637, p. 341 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: “Sucedendo o falecimento do depositário, é transmitida aos seus herdeiros a obrigação de restituir a coisa depositada quando reclamada pelo depositante. Entretanto, se qualquer deles, estando de boa-fé, alienar a coisa a terceiro, será aquele obrigado a assistir o depositante na ação demandada contra o adquirente, além de restituir a este o preço por ela pago, ‘o que é evidente, pois não lhe pertencendo bem alisado, não há justificativa para conservar o preço’ (Silvio Rodrigues, Direito civil, 27. ed. São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3. Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, p. 263).

O dispositivo tem incidência sobre o herdeiro de boa-fé, que agiu sem qualquer intenção de prejudicar o depositante, porquanto unicamente a ele se refere, logo, se o ato praticado estiver eivado de má-fé, além de assistir ao depositante na ação judicial restituir o preço acolhido, o herdeiro do depositário responderá pelas perdas e danos decorrentes da alienação por ele efetuada’.

Finalmente, ‘se a coisa depositada já não mais existe, por ter sido consumida de boa-fé pelo comprador, o herdeiro indenizará o depositante, o mesmo ocorrendo se a tiver consumido em seu uso pessoal’” (José Lopes de Oliveira, Contratos, 1. ed. Recife, Livrotécnica, 1978, p. 172). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 637, p. 341 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 14/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Confronta-se com a doutrina a apreciação de Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 637, p. 655-656, quando, verazmente: A morte acarreta a transmissão do patrimônio do de cujus (art. 1.784 do CC), provocando a assunção pelos herdeiros de todas as obrigações que não detenham caráter intuitu personae. Assim, por mais que o contrato de depósito possua origem personalíssima, a obrigação de restituir recai sobre os herdeiros do depositário. Raciocínio contrário esvaziaria o instituto, com total aniquilação do princípio da segurança jurídica e lesão à confiança e legítima expectativa do depositante, além de implicar apropriação indébita.

Todavia, muitas vezes o depósito poderá ser celebrado sem publicidade ou apenas verbalmente, não havendo possibilidade de o herdeiro saber que a coisa que lhe fora transmitida a título de sucessão era proveniente do referido contrato. Em tais casos, qualquer ação que realize será pautada pela boa-fé - aqui em sua acepção subjetiva posto ser ela praticada na ignorância quanto à real titularidade da coisa negociada.

Como saída para o impasse criado entre a lesão ao patrimônio do depositante e a tutela da boa-fé do herdeiro alienante, o legislador propõe uma solução intermédia que não penalize excessivamente o alienante e possibilite ao depositante a recuperação da coisa.

Assim, o herdeiro do depositário deverá assistir o depositante no processo de reivindicação da coisa perante o terceiro. Nessa modalidade de intervenção de terceiros (art. 119 do CPC), o assistente (herdeiro) terá interesse jurídico em que o assistido (depositante) vença a demanda, pois a relação jurídica da qual aquele é parte (compra e venda com o réu) será atingida pela sentença que vier a ser proferida entre o assistido e a parte contrária. O assistente produzirá provas e praticará atos processuais que sejam benéficos ao assistido.

Se a presumida boa-fé subjetiva não for elidida pelo depositante, será o herdeiro apenas compelido a restituir ao adquirente o preço que este pagou pelo bem alheio, pois a coisa foi recuperada pelo real proprietário e o ordenamento não admite o enriquecimento injustificado. Apesar da omissão do Código Civil, provada a má-fé do herdeiro, ou seja, se sabia que a coisa era alheia e mesmo assim a negociou com terceiro, será responsabilizado eventualmente por perdas e danos, tanto pelo depositante como perante o adquirente, além de eventualmente sofrer as sanções do depositário infiel.

Tendo o herdeiro doado o bem ao terceiro, constatada a sua boa-fé, nada indenizará ao adquirente, lembrando-se de que não se pode reclamar a evicção nos contratos gratuitos (art. 447 do CC), pois o donatário não sofre prejuízo, mas apenas deixa de obter uma vantagem.

Por fim, caso o bem alienado tenha se perdido ou inutilizado, sem culpa do terceiro adquirente, caberá ao herdeiro indenizar o depositante pelo seu valor. Evidentemente, conhecendo o adquirente a real situação do bem, também se responsabilizará pela indenização. (Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 637, p. 655-656, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 14/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Mudando a vernácula, contudo mantendo-se, brilhantemente, dentro do assunto em comento, Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 637, subjaz que o dispositivo cuida da venda a non domino feita de boa-fé, pelo herdeiro do depositário que, sem ter conhecimento de que o bem é objeto de contrato de depósito, julga que o mesmo é parte de sua herança e o aliena a terceiro. O negócio é, a princípio, nulo.

Deve-se observar, no entanto, o art. 1.268, caput, do Código civil, que valida a tradição a adquirente de boa-fé, que se segue à oferta pública de acordo com a teoria da aparência.

Assim, desde que a venda a non domino da coisa depositada não esteja acobertada pela teoria da aparência, deve o alienante de boa-fé assistir o depositante da reivindicação e restituir ao comprador o preço que recebeu pela alienação. Por ter agido de boa-fé na alienação e sendo o erro escusável, isso estará o herdeiro obrigado ao pagamento outros prejuízos do depositante. (Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 637, acessado em 14/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 638. Salvo os casos previstos nos arts. 633 e 634, não poderá o depositário furtar-se à restituição do depósito, alegando não pertencer a coisa ao depositante, ou opondo compensação, exceto se noutro depósito se fundar.

Ora, de acordo com o Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 638, p. 341 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: Uma vez reclamado o depósito, deverá o depositário restitui-lo ao depositante. As exceções a este comando encontram-se expressa e taxativamente previstas no art. 633 do CC, de modo que nenhum outro motivo permitirá ao depositário recusar-se a devolver o bem.

Desse modo, a lei proíbe ao depositário subtrair-se à restituição da coisa, pelas razões enunciadas: 1. Não pode isentar-se pela escusa de não pertencer o bem ao depositante “porque ele não tem poderes para defender direitos de terceiros” (Washington de Barros Monteiro, Curso de direito civil, 4. ed. São Paulo, Saraiva, 1965, v. 2 — Direito das obrigações, p. 235). Porém, se o depositário tiver motivos razoáveis para suspeitar de que a coisa depositada foi dolosamente obtida pelo depositante, pertencendo a outrem, não será obrigado a restitui-la, como observado pelo art. 633, infine. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 638, p. 341 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 14/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

De modo habitual, na visão de Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 638, p. 656-657, e na erudição do aparato: Quando cogitamos dos requisitos subjetivos para dar ou receber em depósito, devemos pensar na capacidade de fato para a prática de negócios jurídicos, ou na superação da incapacidade, pelos institutos da representação e assistência. Todavia, não se exige do depositante a qualidade de proprietário da coisa dada em depósito, sendo suficiente que a sua posse seja legítima.

Portanto, um locatário, comodatário ou usufrutuário são pessoas legitimadas a realizar o contrato de depósito, quando necessitem que o bem recebido em razão de uma relação de direito obrigacional ou real seja custodiado por um depositário. Em tais situações, haverá uma ampliação no desdobramento da posse, na medida em que o depositário será o possuidor direto e o depositante e o proprietário serão possuidores indiretos.

Sendo assim, não poderá o depositário negar a restituição a pretexto da eventual falta de titularidade sobre a coisa por parte do depositante. O dispositivo abre exceção para as hipóteses em que o depositário tenha conhecimento da pendência de execução sobre a coisa ou for ela judicialmente embargada. Certamente, são situações em que não seria aconselhável a restituição, sob pena de ser responsabilizado pelo credor do depositante (art. 312 do CC).

Outrossim, não poderá o depositário elidir a obrigação de restituir sob o argumento da existência de um crédito que lhe é devido pelo depositante, insinuando o instituto da com­pensação. Ora, o art. 373, II, do Código Civil, é explícito ao vedar a compensação quando um dos débitos seja proveniente de contrato de depósito. De fato, justifica-se a inadmissibilidade da compensação por ser fundamental que o depositário restitua a coisa, além do que inexiste aqui a fungibilidade das dívidas - não só fungíveis individualmente, mas entre si -, requisito para qualquer compensação, a teor do art. 369 do Código Civil. (Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 638, p. 656-657, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 14/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Translúcida a visão de Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 638 quando alude ao fato: O depositante não precisa ser o proprietário da coisa, por esta razão, não pode o depositário recusar-se a devolver-lhe o bem somente por não ser ele o proprietário ou sob a alegação de compensação por eventuais créditos que possuir junto ao depositante, exceto se os referidos créditos sejam relativos ao depósito, quando ele, depositário passa a ter o direito de retenção (art. 644 do CC). O direito de retenção pode ser exercido por dívidas do mesmo depositante relativas a outro objeto. (Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 638, acessado em 14/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Direito Civil Comentado - Art. 633, 634, 635 - Do Depósito Voluntário – VARGAS, Paulo S. R. - vargasdigitador.blogspot.com digitadorvargas@outlook.com

 

Direito Civil Comentado - Art. 633, 634, 635
- Do Depósito Voluntário – VARGAS, Paulo S. R.
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Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações

Título VI – Das Várias Espécies de Contrato

Capítulo IX – Do Depósito – Seção I –

Do depósito voluntário

 (Art. 627 a 646)

 

Art. 633. Ainda que o contrato fixe prazo à restituição, o depositário entregará o depósito logo que se lhe exija, salvo se tiver o direito de retenção a que se refere o art. 644, se o objeto for judicialmente embargado, se sobre ele pender execução, notificada ao depositário, ou se houver motivo razoável de suspeitar que a coisa foi dolosamente obtida.

Em sua doutrina, o relator Ricardo Fiuza, comentários ao art. 633, p. 339-340 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado aponta que: “Em regra, ainda que celebrado por prazo determinado, o depositário deverá restituir o objeto depositado assim que reclamado pelo depositante, mesmo antes do vencimento do prazo estipulado. Isto pontua se o depósito é realizado, como já referido, sempre em favor deste último, cabendo-lhe, pois, escolher o momento certo em que se extinguirá o aludido contrato”.

Entretanto, a esta obrigação do depositário, admitem-se algumas exceções: primeiro, se o depositário tiver o direito de retenção a que se refere o art. 644, o qual será examinado oportunamente; segundo, se o objeto estiver judicialmente embargado, “assim entendida qualquer forma de apreensão judicial, como o arresto, sequestro ou a penhora” (Ad Peneira de Queiroz, Direito civil; direito das obrigações, Goiânia, Editora Jurídica IIEPC, 1999, p. 163); terceiro, se sobre o objeto depositado pender execução, “tendo o depositário sido notificado para não abrir mão do bem” (Amoldo Wald, Curso de direito civil brasileiro; obrigações e contratos, 14. ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000, p. 449); quarto, se houver razoável e fundamentada suspeita de que o objeto foi obtido por meio criminoso pelo depositante; e quinto, se noutro depósito a coisa depositada se fundar (art. 638 do CC).

O NCC, além de alterar a redação do art. 1.268, acrescentou a esse dispositivo mais uma hipótese de exonerar-se o depositário em caso de sua recusa a restituir a coisa depositada. Tal hipótese consiste no fato de ele possuir o direito de retenção do bem até o pagamento dos encargos devidos pelo depositante. Embora não previsto no art. 1.268 do CC de 1916, este já constituía um motivo de recusa à restituição, sendo que referido pelo art. 1.279 daquele diploma.

Agora, com a complementação do dispositivo em exame, note-se que tal enumeração pretendeu ser taxativa, de modo que, fora os casos aqui expressamente previstos, não pode o depositário recusar-se a devolver a coisa que lhe foi confiada. Essa é a premissa. Entretanto, há ainda a ressalva à restituição do depósito prevista no art. 638, quando noutro depósito se fundar. Para a melhor compreensão sistêmica, cremos conveniente a remissão a este último dispositivo, tal como feita em relação ao art. 644. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 633, p. 339-340 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Em sua apreciação Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 633, p. 653-654 diverge em parte, quando alerta: “Mais uma vez o legislador afirma que nos contratos de depósito o prazo é assinalado em favor do credor, excetuando-se a regra geral do art. 133 do Código Civil. Destarte, mesmo que o contrato possua termo, nada impedirá a pretensão antecipada à restituição da coisa ao depositante, pois nem sempre a exigibilidade do crédito coincide com o vencimento normal da obrigação”.

 

Todavia, o dispositivo descreve quatro situações excepcionais - que na verdade se resumem a três -, em que justificadamente o depositário poderá manter a posse direta da coisa:

 

Primeiro, quando seja titular de direito de retenção da coisa em razão de dispêndio com valores líquidos de conservação do bem depositado ou prejuízos que dele advierem (arts. 643 e 644 do CC).

 

Segundo, quando o bem depositado se tornar litigioso, em razão de constrição sobre ele efetuada. Nesse caso, o depositário que foi interpelado a respeito do fato ficará atento à lição do art. 312 do Código Civil, evitando a restituição da coisa ao depositante, sob pena de se responsabilizar perante os credores de seu credor.

 

Terceiro, nos casos em que houver suspeitas da origem ilícita do bem depositado, caberá ao depositário comunicar à autoridade policial o fato, pois os seus deveres indisponíveis perante a sociedade se sobrepõem ao atendimento das obrigações contratuais perante o depositante.


De forma positiva, o legislador inovou ao alterar a redação da norma, adotando a expressão “dolosamente obtida”, em vez de “ furtada, ou roubada”, pois é possível a prática de outras modalidades de ilícito a partir de uma conduta dolosa (v. g., estelionato, apropriação indébita). (Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 633, p. 653-654, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 13/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na lógica de Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 633, o depósito pressupõe a confiança do depositante na devolução da coisa pelo depositário. Em regra, o depósito é realizado no interesse do depositante e, por essa razão, mesmo que o contrato seja por prazo determinado, pode o depositante reclamar a coisa depositada a qualquer tempo. Em tal caso, havendo interesse do depositário no depósito a prazo fixo, faz jus ao recebimento por todo prejuízo que sofrer em razão do contrato.

 

O depositário somente pode negar-se a devolver a coisa ao depositante se este não lhe pagar qualquer quantia que lhe deva (art. 644 do Código Civil), se houver embargo judicial, inclusive execução notificada ao depositário, ou se houver fundada suspeita de que a coisa foi dolosamente obtida.


A não restituição da coisa pelo depositário sujeita-o ao pagamento de perdas e danos (art. 652). Embora a Constituição da República a permita (art. 5º, LXVII), a prisão do depositário infiel foi considerada revogada pelo STF, em razão da adesão do Brasil ao Pacto de San José da Costa Rica (RE 466343, HC 87585, julgados em 3.12.08). (Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 633, acessado em 13/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 634. No caso do artigo antecedente, última parte, o depositário, expondo o fundamento da suspeita, requererá que se recolha o objeto ao Depósito Público.

 

Na visão da doutrina de Ricardo Fiuza – comentários ao art. 634, p. 340 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: No caso de o depositário possuir razoável e fundamentada suspeita de que o objeto depositado fora obtido dolosamente pelo depositante, a lei confere àquele o poder-dever de recusar-se a restituí-lo a este último e requer, após expor os fatos que fundamentem a sua desconfiança, seja providenciado o recolhimento do objeto ao Depósito Público.

 

É importante salientar que, “embora a lei não exija prova indubitável de que a coisa foi subtraída a seu dono, ela requer, pelo menos, que a suspeita seja razoável” (Silvio Rodrigues, Direito civil; dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, 27. ed. São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3, p. 264), buscando, assim, evitar a submissão do depositante a constrangimentos injustos e desnecessários. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 634, p. 340 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No parecer de Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 634, p. 654, nessa norma o legislador complementa o exame do dispositivo pregresso. Assim, se o depositário suspeitar objetivamente da origem ilícita da coisa móvel depositada, não apenas se recusará a restituí-la ao depositante como também solicitará o recolhimento do objeto ao depósito público.

 

Vê-se que o depositário deverá expor o fundamento da suspeita perante o magistrado, não só para demonstrar com certa segurança a veracidade de suas alegações como ainda para se exonerar de eventual responsabilidade criminal e cível por coautoria ou participação.


A nosso viso, a propositura de ação de consignação em pagamento (arts. 335 do CC e 539 do CPC) será a melhor forma de o devedor se desvincular de responsabilidade, tanto na hipótese em apreço como nas situações alinhavadas no artigo antecedente. Para tanto, basta conjugar os arts. 633 e 634 com o art. 635, principalmente pela inclusão do termo “outrossim”. (Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 634, p. 654, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 13/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Reticente o comentário do professor Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 634: “Se o depositário suspeitar que a coisa foi obtida pelo depositante por meios ilícitos, o depositário requererá seu depósito em estabelecimento público”.  (Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 634, acessado em 13/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 635. Ao depositário será facultado, outrossim, requerer depósito judicial da coisa, quando, por motivo plausível, não a possa guardar, e o depositante não queira recebê-la.

Segundo a apreciação do Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 635, p. 340 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: Em regra, deve o depositário devolver o objeto assim que reclamado, mesmo que o prazo fixado ainda não se tenha ultrapassado. Porém, a lei faculta ao depositário, desde que haja motivo plausível para não mais continuar com a guarda da coisa, devolvê-la ao depositante e, no caso de sua recusa em recebê-la, requerer seja providenciado o seu depósito judicial.

Anote-se, porém, indispensável a razoabilidade do motivo determinante que leve o depositário a pretender exonerar-se das responsabilidades pelo depósito antes admitido, “como, por exemplo, moléstia grave, viagem que ele tenha de empreender, serviço militar etc.” (Washington de Barros Monteiro, Curso de direito civil; direito das obrigações, 4. ed. São Paulo, Saraiva, 1965, v. 2, p. 236). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 635, p. 340 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Analogamente Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 635, p. 654-655: “Além das hipóteses do art. 633, será viável o exercício da ação de consignação em pagamento pelo depositário nos contratos sem prazo, quando houver justificativa razoável no sentido da impossibilidade de guardar a coisa em razão de evento superveniente à contratação. Outrossim, exige-se a prova da recusa do credor à devolução antecipada.

 

Outrossim, exige-se a prova da recusa do credor à devolução antecipada. Seriam casos de onerosidade excessiva perante o depositário que acarretariam a resolução antecipada, porém justificada, da relação contratual, sem que se possam exigir perdas e danos do devedor. Ilustrativamente, uma grave doença do depositário ou de familiar; a necessidade de uma viagem urgente; algum dano ao local em que se deu o depósito, impossibilitando a adequada conservação do bem móvel.

 

O artigo é necessário, pois a desconstituição da obrigação pelo devedor mediante consignação seria restrita às hipóteses do art. 335 do Código Civil. Porém, nada menciona o referido dispositivo acerca da impossibilidade superveniente do devedor em realizar o pagamento.


Mesmo nos contratos de depósito com termo, nos quais o prazo é assinalado em favor do credor, e qualquer restituição antecipada implica inadimplemento absoluto, será possível ao depositário demonstrar a ocorrência do evento superveniente que justifique a resolução antecipada do contrato. (Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 635, p. 654-655, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 13/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Concluindo Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 635: se o depositante não requerer a coisa ao término do prazo ou, não havendo prazo, quando intimado pelo depositário, este poderá requerer o depósito judicial da mesma se não for do seu interesse mantê-la sob sua custódia. (Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 635, acessado em 13/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).