quarta-feira, 4 de março de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 830, 831, 832 - continua - DOS EFEITOS DA FIANÇA - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 830, 831, 832 - continua
- DOS EFEITOS DA FIANÇA - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XVIII – Da Fiança
 – Seção II – Dos Efeitos da Fiança (art. 827 a 836) –
vargasdigitador.blogspot.com –

Art. 830. Cada fiador pode fixar no contrato a parte da dívida que toma sob sua responsabilidade, caso em que não será por mais obrigado.

Na clareza de Claudio Luiz Bueno de Godoy, diferente do benefício de divisão, cogitável quando a fiança seja prestada em conjunto, cuida o artigo em tela da limitação da responsabilidade de cada fiador, quando vários existam, quer tenha sido prestada a fiança em conjunto, quer separadamente. A regra encerra corolário da própria disposição dos CC 822 e 823, que permitem que se estabeleça uma fiança limitada, tal qual aqui ocorre, só que se cogitando da concorrência, à garantia, de mais de um fiador.

Tem-se, pois, que cada fiador restringe a garantia que presta a um valor-limite que se contém no total da dívida principal. E por mais não se obriga. Nem mesmo há necessidade de que a limitação imposta à extensão da responsabilidade de cada qual dos fiadores seja igual. Podem os fiadores responder cada um por parte diversa da dívida total.

Havendo essa limitação, nada além do valor estabelecido poderá ser exigido do fiador que, ademais, e de novo diversamente do que se dá no benefício de divisão, não responde pela eventual insolvência ou falência de outro fiador. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 854 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 04/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Interessante histórico, para quem deseja tornar mais robusto um artigo: CC 830. Pode também cada fiador taxar, no contrato, a parte da dívida que toma sob sua responsabilidade, e, neste caso, não será obrigado a mais”. Esta era a redação original do dispositivo que a partir de emenda senatorial passou a adotar o texto atual. A intenção buscada e efetivamente alcançada pelo eminente Senador Josaphat Marinho foi, ao substituir a forma verbal taxar por fixar, dar maior clareza, tecnicidade e precisão ao dispositivo com a ordem direta adotada. Demais disso, a substituição veio a compatibilizar a redação do CC 830 com os arts. 485, 486, 487, 488 e 489 do próprio projeto, que utilizam sempre o termo “fixação”. Sem falar que taxação é expressão mais afeita à seara do direito público. No mais a emenda aperfeiçoou a redação. Corresponde ao art. 1.494 do CC/1916, tendo havido mudança redacional apenas quanto ao aspecto formal da norma, restando intacto seu conteúdo.

Na doutrina apresentado por Ricardo Fiuza, revela-se aí, hipótese de limitação da responsabilidade individual dos fiadores, que emerge em razão de pacto por eles próprios empreendido no bojo do contrato. Assim como o fiador único pode limitar a garantia a apenas uma parte da dívida (art. 1487 do CC de 1916), não é menos certo, também, que, sendo vários os fiadores, cada qual especifique, no contrato, a parte da dívida a ser tomada por sua responsabilidade, e, nesse caso, jamais será obrigado a responder por quantia superior.

Aqui a responsabilidade de cada fiador deixará de ser fixada em relação proporcional aos demais, passando a limitar-se, expressamente, a um montante, certo e individualizado. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 436 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 04/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na luz de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, conforme o CC 823, o contrato de fiança pode estabelecer limites para a garantia que não alcançam toda a amplitude da obrigação principal. Os limites mais frequentes dizer respeito ao valor garantido e ao prazo da garantia nos contratos de trato sucessivo. Se houver mais de um fiador, cada qual poderá estabelecer os limites de sua responsabilidade. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 04.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 831. O fiador que pagar integralmente a dívida fica sub-rogado nos direitos do credor; mas só poderá demandar a cada um dos outros fiadores pela respectiva quota.

Parágrafo único. A parte do fiador insolvente distribuir-se-á pelos outros.

Na visão de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o artigo em questão versa sobre outro dos efeitos da fiança: é o benefício de sub-rogação. Isso significa que, pagando o fiador o débito afiançado, fica sub-rogado nos direitos do credor originário, de modo a exercitar sua pretensão regressiva contra o devedor mediante as mesmas preferencias e privilégios que acaso beneficiassem o crédito garantido.

Como sabido, o caso do fiador que adimple a obrigação afiançada é exemplo típico de pagamento de um débito feito por terceiro juridicamente interessado. Trata-se de quem não é o devedor originário mas paga a sua dívida porquanto potencialmente afetado, em sua esfera jurídica, pelo respectivo inadimplemento. É, de resto, o que soa da disposição genérica do CC 346, III. Qualquer terceiro juridicamente interessado que paga o débito pelo qual podia vir a ser obrigado sub-roga-se, de pleno direito, diz a lei, nos direitos, ações, privilégios e garantias que tinha o primitivo credor contra o devedor e, explicita o CC 349, também contra os fiadores. Tem-se então que o fiador que paga o débito cobra, em regresso, o devedor principal e, como se verá adiante, os cofiadores, munido dos mesmos direitos, ações, privilégios e garantias que tinha o credor pago, a si transferidos por foça da sub-rogação legal.

Além disso, no artigo ora em comento, refere-se a sub-rogação – malgrado sem excluir o regresso, mas sem transferência dos direitos e ações do credor – tão somente ao fiador que paga integralmente o débito. Já o explicava Clóvis Bevilaqua com a preocupação, da lei, de ressalvar a situação do credor originário, de quem, por sub-rogação, apenas transferidos os direitos e ações quando quitado (Código Civil comentado. Rio de janeiro, Francisco Alves, 1939, v. V. p, 262). É de ver, porém, que já na regra geral do pagamento por sub-rogação se prevê a possibilidade de sua ocorrência diante de um adimplemento parcial consumado pelo terceiro interessado, mas então limitado o exercício regressivo dos direitos e ações do credor ao quanto tiver sido desembolsado pelo terceiro, e preservando-se, pelo saldo ainda em aberto, a preferência do credor originário (CC 350 e 351).

Já se disse que o fiador que paga pode exercer, sub-rogado da mesma forma antes examinada, o direito regressivo também contra os cofiadores. Apenas que, nessa hipótese, só poderá fazê-lo até o limite da cota que seja devida por cada qual deles, portanto não pelo valor total do que pagou em benefício, não seu próprio, mas exclusivo do devedor primitivo, este sim, contra quem, por isso, possui regresso total. Nada mais, a rigor, senão a aplicação da regra geral contida no CC 283, que prevê o regresso entre devedores solidários quando um deles paga o débito.

Estabelece ainda o parágrafo único do dispositivo em tela que, nesse caso, se houver cofiador insolvente, a quota a ele cabente será distribuída entre os demais. A ideia é que o fiador que pagou não arque, sozinho como o prejuízo decorrente dessa insolvência, assim dividida com os demais fiadores, na proporção da quota de cada qual. É evidente que toda a sistemática da segunda parte do presente artigo, e de seu parágrafo, pressupõe que não tenha o fiador sido demandado nem pago parte determinada do débito, inclusive por ter havido o benefício da divisão.

Por fim, diz-se inocorrer o efeito da sub-rogação para o exercício de direito regressivo quando a fiança tiver sido prestada com animus donandi, por exemplo de pai a filho, quando o pagamento se faz como doação; quando o fiador não comunicar o pagamento ao devedor, ensejando que ele também o faça, e de forma prevalente, mesmo que a posteriori, mas sem ciência do adimplemento do fiador, cabendo a este, então, repetição contra o credor; quando, também sem ciência do devedor, ou com sua oposição, deve-se acrescentar, na esteira do CC 306, o pagamento se faça pelo fiador malgrado a existência de causa extintiva da obrigação por aquele oponível, de novo ao garante cabendo apenas a mesma repetição contra o credor (v.g., Pereira, Caio Mário da Silva, Instituições de direito civil, 11 ed. Rio de Janeiro, Forense, 2004, v. III, p. 501).

Especificamente no que concerne ao contrato de locação, garantido por fiança, não se considera que o fiador que paga a dívida do locatário fique livre, na cobrança regressiva, da impenhorabilidade que beneficia o bem de família do devedor, porquanto nem mesmo o locador disso se livraria, eis que concedida a penhorabilidade excepcional de bem dessa natureza apenas na cobrança dirigida contra ele, fiador, pelo senhoria (art. 3º da Lei n. 8.009/90, considerando constitucional mesmo diante do disposto no art. 6º da CF/88, com redação dada pela EC n. 26/2000). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 854-55 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 04/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina de Ricardo Fiuza, pelo instituto da “sub-rogação legal”, o fiador que paga a dívida, total ou parcialmente, sub-roga-se, pleno iure, nos direitos do credor, na proporção do pagamento, podendo cobrar dos outros fiadores as respectivas cotas, ou do devedor principal o todo, reembolsando-se por tudo que despendeu em razão do pagamento da garantia.

Se o fiador, que pagou a dívida, acionar os outros fiadores, e um destes for insolvente ou falido, a parte de sua responsabilidade na dívida será distribuída entre os demais cofiadores solváveis, por ocasião da exigibilidade da prestação. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 437 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 04/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o fiador que pagar integralmente a dívida sub –roga-se nos direitos do credor e pode cobrar do devedor, além da quantia paga, perdas e danos (CC 832) e juros (CC 833). A sub-rogação dos direitos do credor inclui as garantias reais que tenham sido oferecidas pelo afiançado.

Não há sub-rogação nos direitos do credor, se o pagamento não for integral.

O fiador não poderá demandar outro fiador por valor superior à cota devida pelo demandado ainda que este tenha assumido a responsabilidade em caráter solidário junto ao devedor. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 04.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 832. O devedor responde também perante o fiador por todas as perdas e danos que este pagar, e pelos que sofrer em razão da fiança.

Tem-se com Claudio Luiz Bueno de Godoy, complementando a regra do artigo anterior, e da mesma forma tal qual já procedia o Código Civil de 1916, garante a lei ao fiador, na esteira da preocupação de lhe permitir o integral exercício de direito regressivo perante o devedor afiançado, que, inexistente limitação a respeito, deste venha a cobrar não só o que houver pago pelo principal do débito garantido como, também, qualquer outra acessório dele decorrente, assim entendidas as perdas e danos com que tenha arcado. Mais, faculta-se-lhe o ressarcimento de acréscimos tais como cláusula penal, honorários advocatícios ou atualização monetária que tenha se visto na contingência de pagar.

Da mesma forma, desde que o comprove, pode o fiador cobrar, do afiançado, prejuízos que ele próprio tenha sofrido com o pagamento da fiança. Por exemplo, o retardo no pagamento de suas próprias dívidas, assim acrescidas, a necessidade de se desfazer de algo de seu patrimônio, às vezes por valor depreciado, enfim qualquer dano que tenha sofrido em razão do pagamento do débito afiançado, portanto de que terá o direito de ser reembolsado.

A ideia fundamental é ressarcir o fiador, integralmente, pelo quanto haja despendido para pagar a fiança, sem que se lhe atribua, então, algum decréscimo patrimonial em razão da garantia prestada em favor de terceiro, ainda que gratuitamente, de forma benéfica, o que, diferentemente da doação, não pressupõe que lhe advenha um desfalque, uma diminuição em seu patrimônio (cf. Rodrigues, Sílvio. Direito civil. 28 ed. são Paulo, Saraiva, 2002, v. III, p. 360). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 856 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 04/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

De acordo com a Doutrina de Ricardo Fiuza, consabido que a obrigação essencial do fiador é pagar a dívida do devedor principal, se este assim não proceder no tempo e no modo acordados. Na hipótese de ser compelido a pagar a dívida, caberá ao fiador, contudo, ação regressiva em face do afiançado, de cunho indenizatório, para dele reclamar não apenas a importância desembolsada a esse título, mas também todos os prejuízos eventualmente sofridos em razão da garantia prestada (despesas processuais, cláusula penal etc.), inclusive indenização por dano moral, desde que cabível na espécie. Silvio Rodrigues, Direito civil: dos contratos e declarações unilaterais da vontade. 15 ed. São Paulo. Saraiva. 1986, v. 3 (p. 399). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 437 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 04/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na pauta de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo obriga o devedor principal a indenizar ao fiador prejuízos que este vier a sofrer em razão da fiança. Concretizando, em relação à fiança o princípio da reparação integral previsto no CC 944.

Desse modo, se o fiador vier a ser desapossado de bem necessário ao desempenho de atividades econômicas, jaz jus à percepção de lucros cessantes, que poderá cobrar do afiançado. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 04.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).