quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 645, 646 - Do Depósito Voluntário- VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 645, 646
- Do Depósito Voluntário- VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo IX – Do Depósito -
(art. 627 a 652) Seção I – Do Depósito voluntário –
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Art. 645. O depósito de coisas fungíveis, em que o depositário se obrigue a restituir objetos do mesmo gênero, qualidade e quantidade, regular-se-á pelo disposto acerca do mútuo.

Para Rosenvald, o depósito voluntario é o negócio jurídico resultante da autonomia privada, sendo dividido em duas espécies: regular ou ordinário, e irregular. Até agora examinamos o depósito regular, cujo objeto é coisa infungível, perfeitamente individualizada. Nada obstante, é possível que as partes convencionem um contato de depósito sobre coisas fungíveis, que podem ser substituídas por outras da mesma espécie, qualidade e quantidade (CC 85).

No contrato de depósito irregular, poderá o depositário dispor da coisa fungível, sendo exonerado da obrigação de restituir a mesma coisa que recebeu, pois ao termo do contrato, ou quando lhe for solicitada a devolução (nos contratos sem termo), simplesmente entregará coisa equivalente.

O legislador fez questão de afirmar que tal modalidade de depósito voluntário será regida pelas normas relativas do contrato de mútuo (CC 586 a 592), em razão da grande aproximação entre os dois modelos, eis que o depositário não será um guardião por excelência da coisa, pois poderá alienar ou consumir o que recebeu, sendo fundamental a devolução de igual quantidade e qualidade. Contudo, extrai-se a diferença da própria teleologia dos institutos. O mútuo é realizado no interesse do mutuário e o depósito no interesse do depositante. Enquanto o mutuário tem o seu patrimônio acrescido pelo empréstimo, com a obrigação de restituir no prazo contratado ou, supletivamente no termo legal (CC 592), o depositário não poderá incluir os bens fungíveis em seu ativo, pois deverá restituir a qualquer tempo, mantendo o equivalente permanentemente à disposição do depositante (CC 633).

Tradicional exemplo de depósito irregular pode ser extraído do depósito bancário, no qual a instituição financeira é depositária de quantia em dinheiro (bem fungível), utilizando-a em suas transações, podendo o depositante retirar ou movimentar os valores depositados a qualquer tempo. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 670 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 04/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

A doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, grassa no Direito. É certo que o depósito é o contrato pelo qual uma pessoa (depositário) recebe de uma outra (depositante) um bem necessariamente móvel, fungível ou infungível, para guarda provisória. Assim, tendo em conta a fungibilidade, o depósito poderá ser regular ou irregular, disciplinados um e outro por disposições específicas.

Nesse passo, afirma o eminente Silvio Rodrigues: “a doutrina chama de irregular o depósito de coisas fungíveis, no qual o depositário não precisa devolver exatamente a coisa que lhe foi confiada, podendo restituir coisas da mesma espécie, quantidade e qualidade” (Direito civil, 27. ed., São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3 – Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, p. 268).

Pela semelhança com o contrato de mútuo, o depósito irregular será regulado pelas disposições aplicáveis àquele; porém, jamais poderá ser chamado de empréstimo, “pois visa assegurar a disponibilidade da coisa”; o depositário, ao guardá-la, não aumentará o seu patrimônio, visto que do seu ativo sempre será excluído o valor representativo do quantum depositado, sujeito a restituição a qualquer momento, o que não ocorrerá com o empréstimo, uma vez que o bem mutuado se incorporará ao patrimônio do devedor” (Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro, 16. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, v. 3 – Teoria das obrigações contratuais e extracontratuais, p. 294).

A recusa do depositário a restituir em substituição à coisa fungível objeto do depósito irregular, coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade, quando reclamada pelo depositante, autoriza que este último promova em face daquele a competente ação de cobrança. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 345 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 04/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Para o entendimento de Marco Túlio de Carvalho Rocha objetos do contrato de depósito são, exclusivamente, bens móveis. O depósito de coisas fungíveis é conhecido como “depósito irregular”. Embora seja depósito, por ter como finalidade a atribuição da guarda de um bem ao depositário, rege-se pelas regras do mútuo. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 04.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 646. O depósito voluntário provar-se-á por escrito.

Segundo Rosenvald, a redação da norma não deixa dúvidas. A forma escrita é necessária ad probationem, mas não é solenidade essencial, a ponto de influir na validade do contrato de depósito voluntário (CC 104, III). Outrossim, admite-se as formas pública e particular, independentemente de valor.

É interessante que as partes reduzam o contrato a escrito, pois será possível demonstrar sua onerosidade (CC 628), bem como a fixação de um termo para a restituição (CC 633). Porém, tratando-se de contrato real, a prova testemunhal será admitida com cautelas pelo magistrado para atestar o ato físico da entrega do objeto, observando-se o CC 227.

Ademais, para o ajuizamento de ação de depósito, a inicial será instruída com a prova literal da relação jurídica (CC 902), o que abrange tanto o contrato escrito – mesmo que essa forma não seja da essência do negócio jurídico – como outro documento escrito, como um tíquete ou cupom que demonstrem a ocorrência da tradição. A ausência do instrumento retira do depositante a ação especial, devendo se contentar com o rito ordinário.

O preceito ora comentado não se aplica à modalidade do depósito necessário, que será certificado por qualquer meio de prova, considerando-se a premência de sua efetivação (CC 648, parágrafo único). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 670 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 04/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina de Ricardo Fiuza, o depósito voluntário não exige, para a sua celebração, forma especial ou, mais especificamente, solenização contratual. Entretanto, em matéria de prova, a lei reclama que haja apoio em instrumento escrito.

Silvio rodrigues muito contribuiu para o esclarecimento da questão ao afirmar o seguinte: “Acho que a ideia do legislador, ao reclamar prova por escrito do depósito voluntário, foi apenas a de impedir a prova exclusivamente testemunhal, capaz de conduzir às maiores iniquidades. Assim, embora o depósito se aperfeiçoe independentemente de qualquer documento, mister se faz, para provar-se, um começo de prova escrita. Nesse sentido tem reiteradamente decidido a jurisprudência brasileira (cf. Dimas R. Almeida, Repertório de Jurisprudência, julgados n. 1.112, 1.113 e 1.114)” (Direito civil, 27. ed., São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3 – Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, p. 260). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 345 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 04/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Sob o prisma de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o depósito voluntário é contrato real (CC 627) e somente pode ser provado por escrito, que pode consistir em documento simples: “Aliás, os cartões entregues ao depositante, como é de uso, constituem prova bastante, desde que permitam a perfeita identificação do objeto depositado” (Agostinho Alvim. Direito das obrigações: exposição de motivos. Revista do Instituto dos Advogados Brasileiros, 1972, n. 24, p. 70). Deve ser levado a registro para valer contra terceiros (Lei n. 6.015, art. 129, 2º) (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 04.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).