sexta-feira, 13 de janeiro de 2023

Comentários ao Código Penal – Art. 83 Requisitos do livramento condicional – VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com –

 Comentários ao Código Penal – Art. 83
Requisitos do livramento condicional
– VARGAS, Paulo S. R.
vargasdigitador.blogspot.com –
digitadorvargas@outlook.com –

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Parte Geral –Título V – Das Penas –
Capítulo V – Do Livramento Condicional

 

Requisitos do livramento condicional (Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/7/1984)

Art. 83. O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que:

I – cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes;

II – cumprida mais da metade se o condenado for reincidente em crime doloso;

III – comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe for atribuído e aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto;

IV – tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração;

V – cumprido mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza.

Parágrafo único. Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir. (Todos os itens com Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/7/1984).

Segundo apreciação de Greco, Rogério. Código Penal comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao: “Requisitos do livramento condicional – Art. 83 do CP, p. 201-205.

Do livramento condicional - Como medida de política criminal, o livramento condicional permite que o condenado abrevie sua reinserção no convívio social cumprindo parte da pena em liberdade, desde que presentes os requisitos de ordem subjetiva e objetiva, mediante o cumprimento de determinadas condições.

A lei não exige que os reeducandos somente possam ser beneficiados com o livramento condicionai após passarem pelo regime prisional aberto. Portanto, ausente a previsão legal, não há como negar a benesse ao recuperando que se encontre na modalidade semiaberta, com base neste simples motivo (TJMG, Processo 1.0000.08. 486414-9/001, Rel. Des. Judimar Biber, DJ 10/7/2009).

Negar o livramento condicional ao condenado estrangeiro em situação irregular no país, pelo simples fato de estar impedido de exercer atividade remunerada no mercado formal, impõe condição discriminatória que veda a concessão do benefício apenas por sua própria condição pessoal. A lei penal não exige que o condenado estrangeiro tenha uma promessa efetiva de emprego, com carteira registrada, mas, sim, que tenha condição de exercer qualquer trabalho honesto e lícito para prover sua subsistência e de sua família, ainda que na informalidade da qual sobrevive expressiva parte da população brasileira (STJ, REsp. 662567/PA, Relª. Minª. Laurita Vaz, 5ª T DJ  26/9/2005 p. 441).

Da competência para concessão - O pedido de livramento condicional deverá ser dirigido ao juiz da execução, que, depois de ouvidos o Ministério Público e o Conselho Penitenciário, deverá concedê-lo se presentes os requisitos do art. 83, incisos e parágrafo único do Código Penal, pois trata-se de direito subjetivo do condenado, e não uma faculdade do julgador, como induz a redação contida no caput do art. 83 do estatuto repressivo.

O § 2º do art. 112 da LEP determina, ainda, que a decisão será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor (Lei nº 10.792, de 12 de dezembro de 2003).

Consoante o art. 131 da LEP, o livramento condicional pode (ou deve? Nota VD) ser concedido pelo juiz da execução, desde que presentes os requisitos do art. 83 do CPB, ouvidos o Ministério Público e o Conselho Penitenciário. A presença dos requisitos objetivos

não é suficiente à concessão do livramento condicional se, analisados os requisitos subjetivos, restar constatada prática de faltas graves pelo reiterado descumprimento das condições impostas no regime aberto (TJMG, Processo 1.0000.05.425346-3/001 [1], Rel. Des. Armando Freire, DJ 29/11/2005).

O Juízo da Execução pode reconhecer a ocorrência da reincidência específica não reconhecida na sentença penal condenatória para o fim de negar ao condenado o livramento condicional (TJMG, Processo 1.0000.03.402725-0/001 (1), Rei. Des. José Antonino Baía Borges, DJ 3/8/2004).

Dos requisitos do livramento condicional - São os previstos no art. 83 do Código Penal.

Não é possível o deferimento do livramento condicional ao sentenciado sem a análise dos requisitos subjetivos previstos nos incisos III e IV, e parágrafo único, do art. 83 do CP, não bastando o cumprimento dos requisitos objetivos (TJMG, HC 0199686-87.2010.8.13. 0000, Rel. Des. Ediwal Jose de Morais, 1ª Câmara Criminal, DJEMG 11/8/2010).

Para a concessão do benefício do livramento condicional, deve o acusado preencher os requisitos de natureza objetiva (lapso temporal) e subjetiva (bom comportamento carcerário), nos termos do art. 112 da LEP, com redação dada pela Lei nº 10.792/2003, podendo o Magistrado, excepcionalmente, determinar a realização do exame criminológico, diante das peculiaridades da causa, desde que o faça

em decisão concretamente fundamentada (cf. H C 88052/DF, Rel. Ministro Celso de Mello, DJ de 28/4/2006) (Precedentes) (STJ, HC 149623/SP, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., DJe 2/8/2010).

Da pena privativa de liberdade igual ou superior a dois anos – Para que seja viabilizado o livramento condicional é preciso que o total das penas privativas de liberdade aplicadas seja igual ou superior a 2 (dois) anos, mesmo que, para se chegar a esse quantum, sejam somadas todas as penas correspondentes às diversas infrações penais praticadas, nos termos do art. 84 do Código Penal.

Cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes - Se o agente tiver sido condenado anteriormente por um crime culposo ou por contravenção penal, tal fato não impedirá a concessão do benefício após cumpridos mais de um terço da pena, uma vez que a lei penal, nessa hipótese, somente veda o livramento condicionai se for ele reincidente em crime doloso.

Outro ponto que merece destaque diz respeito, aos maus antecedentes. Tanto a reincidência em crime doloso como os maus antecedentes impedem a concessão do livramento condicional com o cumprimento de apenas mais de um terço do total das penas aplicadas. Contudo, a interpretação de maus antecedentes feita no mencionado artigo deve limitar-se somente àquelas condenações anteriores com trânsito em julgado que não se prestem a forjar a reincidência em crime doloso.

O cumprimento de mais de um terço da pena é o requisito objetivo exigido pelo inciso I, sendo a não reincidência em crime doloso e os bons antecedentes os de natureza subjetiva.

Nos termos do art. 83, I-IV, e parágrafo único do CP, para a concessão do livramento condicional não basta apenas o cumprimento de mais de 1/3, restando necessário o preenchimento de requisitos subjetivos, entre eles comprovação do comportamento satisfatório durante a execução da reprimenda (TJMG, Processo 1.0000.06. 437958-9/001 [1], Rel. Des. Walter Pinto da Rocha, DJ 6/2/2007).

 

Ao condenado primário, com maus antecedentes, incide o inciso I do art. 83 do Código Penal, razão pela qual sobressai o direito do paciente ao livramento condicional simples, exigindo-se, além dos requisitos objetivos e subjetivos, o cumprimento de 1/3 da pena. Precedentes. A limitação à liberdade do cidadão deve vir sempre expressa

em lei, não se podendo dar interpretação ampla às regras restritivas de direitos, em detrimento do réu. Deve ser cassado o acórdão a fim de conceder ao paciente o benefício do livramento condicional, mediante as condições, previstas na Lei de Execução Penal, a serem estabelecidas pelo Juízo de 1º grau (STJ, HC 57300/SP, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª T., DJ5/2/2007 p. 275).

 

Em cumprida mais da metade da pena, se o condenado for reincidente em crime doloso – A segunda hipótese do livramento condicional está destinada aos condenados reincidentes em crimes dolosos.

 

Entende-se, também, que o portador de maus antecedentes, em face da redação do inciso anterior, deve cumprir mais da metade da pena, a fim de poder requerer a concessão do livramento condicional.

 

O cumprimento de mais da metade da pena é o requisito objetivo, no caso do reincidente em crime doloso ou portador de maus antecedentes.

 

Cumprindo o sentenciado portador de maus antecedentes mais da metade da pena, atende ao requisito objetivo previsto no art. 83, II, CP, para concessão do livramento condicional (TJMG, Processo 2.0000.00.44979ó-7/000[l], Rel. Des. Ediwal josé de Morais, DJ 05/ 10/2004).

 

Comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto – O condenado deverá comprovar que durante a execução de sua pena cumpriu as obrigações que lhe são determinadas pelo art. 39 da Lei de Execução Penal, bem como ter tido um comportamento disciplinado, obedecendo aos servidores responsáveis pelo serviço de carceragem e respeitando-os, opondo-se aos movimentos, individuais ou coletivos de fuga ou subversão da ordem ou da disciplina, executando os trabalhos, as tarefas e as ordens recebidas, enfim, demonstrando que a pena estava cumprindo sua função ressocializadora.

 

Embora se exija do condenado a observação de suas obrigações legais, também deve-se considerar o modo como o condenado estava sendo cuidado pelo Estado. Muitas vezes, servidores públicos despreparados tratam os condenados de forma desumana e degradante, gerando revoltas no meio carcerário. A corrupção é ainda um mal presente em quase todo o sistema penitenciário. Assim, se um preso se revolta porque está sendo tratado de forma humilhante, contrária àquilo a que o Estado se propôs a fim de ressocializá-lo, não podemos considerar esse fato em seu prejuízo. Para tanto, embora, não raras as vezes, os juízes se valham de meras certidões emitidas pelo sistema penitenciário, que têm por finalidade certificar sobre esse requisito de natureza subjetiva, dependendo do caso, deverá o juiz, antes de negar o livramento condicional, ouvir as razões pelas quais o condenado deixou de cumprir as obrigações que lhe eram exigidas, a fim de não produzir uma revolta ainda maior.

 

O condenado deverá, também, comprovar sua aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto. Não se está exigindo, aqui, que o condenado tenha, por exemplo, uma promessa de

trabalho na qual terá a sua carteira devidamente registrada. Há no país um percentual considerável correspondente àqueles que trabalham no chamado “mercado informal”. São camelôs, vendedores ambulantes, artesãos etc., que, embora não tenham registro em sua carteira profissional, conseguem se manter, recebendo, muitas vezes, importâncias superiores às da classe assalariada. Dessa forma, não está a lei exigindo que o condenado comprove que terá sua carteira registrada quando estiver em liberdade, mas, sim, que, mediante um trabalho honesto, lícito, seja ele qual for, poderá subsistir.

 

A fuga e o mau comportamento carcerário impedem a concessão do livramento condicional, revelando a inaptidão do apenado para reingressar no convívio social (TJMG, Processo 2.0000.00.511666-5/000 [1], Rel. Des. William Silvestrini, DJ 22/5/2006).

 

A abordagem de sentenciado com visíveis sintomas de embriaguez, o qual estava a trazer consigo, outrossim, uma garrafa de aguardente, durante o tempo em que cumpria pena em regime fechado, traduz hipótese de comportamento insatisfatório, nos termos do que dispõe o art. 83, III, do CP, a impedir, por conseguinte, a concessão do benefício do livramento condicional, pelo não atendimento de requisito subjetivo (TJMG, Processo1.0000.04.404946-8/001[1], Rel. Des. Reynaldo Ximenes Carneiro, DJ 4/5/2004).

 

Se tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração – A reparação do dano causado pela infração penal levada a efeito pelo agente é um dos requisitos de ordem subjetiva elencados pelo art. 83 do Código Penal. Segundo as lições de Mirabete, “não pode postular o benefício o sentenciado que, não demonstrando haver satisfeito as obrigações civis resultantes do crime, igualmente não faça a prova da impossibilidade de reparar o

dano causado pelo delito". (MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de direito penal - Parte geral, p. 336).

 

A simples ausência de propositura de ação de indenização por parte da vítima não supre a necessidade de o condenado comprovar que não reparou o dano por absoluta impossibilidade de fazê-lo. Nesse sentido, decidiu o STF: Livramento condicional - Condições de admissibilidade - Prova - Reparação do dano ou impossibilidade de fazê-lo - Ônus que incumbe ao réu e que não pode ser suprido com a apresentação de certidão negativa de ação indenizatória promovida pela vítima - Omissão que implica indeferimento do pedido — Inteligência dos arts. 83, IV, do CP, 710, V, do CPP, e 131 da Lei nº 7.210/84 (MC, MS, Rel. Min. Francisco Rezek, R T 649, p. 361).

 

Não tendo o condenado condições de reparar o dano causado pela infração penal, deverá comprovar essa situação nos autos. Se assim o fizer, poderá ser-lhe concedido o benefício, preenchidos os demais requisitos.

 

Se cumpridos mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza – O inciso V foi introduzido no art. 83 do Código Penal pela Lei na 8.072/90, aumentando o tempo de cumprimento de pena para fins de livramento condicional para os crimes por ela previstos. Trouxe-nos de volta, ainda, o instituto da reincidência específica, que terá o condão de impedir a concessão do livramento condicional.

 

Cuidando sobre o tema, Alberto Silva Franco assevera: “O segundo requisito é tratado, no texto legal, de forma negativa. Não basta que tenha fluído, na fase executória, lapso temporal superior a dois terços da duração da pena privativa de liberdade para que possa ser aplicada, ao condenado, a medida penal do livramento condicional. É mister ainda que o apenado não seja ‘reincidente específico’. No baú dos trastes penais, num canto de entretecidas teias de aranha, o legislador de 90 descobriu o conceito já tão dilapidado de ‘reincidência específica’ e cuidou de reanima-lo. Ao dar-lhe nova vida, não se preocupou, contudo, em redefini-lo para efeito de alargar ou de restringir sua conhecida área de significado”. (SILVA FRANCO. Alberto. Crimes hediondos, p. 148).

 

O que significa a expressão reincidência específica em crimes dessa natureza – Antônio Lopes Monteiro preleciona que “o texto diz que o condenado não deve ser reincidente específico ‘em crimes dessa natureza’, referindo-se aos anteriormente mencionados: ‘crime hediondo, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo’. De modo que reincidente específico, para efeito da lei, é o sujeito que comete crime hediondo, terrorismo, de drogas ou tortura depois de transitar em julgado sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por um desses mesmos crimes. E dentro do elenco pode haver diversificação: o primeiro delito pode referir-se a drogas; o segundo pode ser hediondo; o anterior pode ser a tortura; o segundo, terrorismo”. (MONTEIRO, Antônio Lopes. Crimes hediondos, p.116-117).

 

Colocando-se contrariamente à posição anterior, Alberto Silva Franco assevera: “A interpretação da locução ‘em crimes dessa natureza’, por apresentar um feitio literal, de caráter puramente gramatical, não se acomoda à noção comum, correntia, de reincidência específica. Não se trata, no caso, de uma reincidência qualquer, i. é, do cometimento pelo agente de um novo crime, indiferentemente de seus caracteres fundamentais, depois do trânsito em julgado da sentença que o tenha condenado por crime anterior. A reincidência que deve ser levada em coma tem características próprias, exclusivas: tem sua especificidade. E tal especificidade reside, exatamente, na comunicabilidade dos dados de composição típica dos dois delitos [...] O que relaciona o estupro, simples ou qualificado, ao delito de terrorismo - O que há de comum entre o crime de epidemia com resultado morte e o delito de tortura - Evidentemente, nada. Em ponto

algum de relevo, os referidos tipos suportam um juízo aproximativo. Onde buscar, então, a conotação específica dessa reincidência?” (SILVA FRANCO, Alberto. Crimes hediondos, p. 149).

 

Entende-se que a expressão reincidência específica em crimes dessa natureza deve ser analisada sob dois aspectos: 1º) somente se fala em reincidência específica nas infrações previstas pela Lei na 8.072/90; 2ª) o bem juridicamente protegido deve ser idêntico, não havendo necessidade de ser, exatamente, o mesmo tipo penal, seja na modalidade simples ou qualificada.

 

Assim, se tiver sido condenado anteriormente por um estupro e, depois, cometer um latrocínio, como os bens juridicamente protegidos são diversos, embora todos estejam previstos na Lei nº 8.072/90, acreditamos não haver a reincidência específica em crimes dessa natureza, possibilitando, portanto, a concessão do livramento condicional.

 

O livramento condicional, em se tratando de crime alinhado na Lei nº 8.072/90, só pode ser concedido após cumpridos 2/3 (dois

terços) da pena (...) (STJ, REsp. 875867/RS, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., DJ 20/8/2007, p. 304).

 

O que configura a reincidência é justamente a repetição do cometimento de crime. Portanto, tendo sido o último cometido na vigência da Lei dos Crimes Hediondos e sendo também classificado como tal - tráfico de drogas -, deve ser levada em conta a visível reincidência específica, tudo impedindo a concessão do livramento condicional, tal como determina o art. 83, inciso V, do Código Penal brasileiro (TJMG, Processo 1.0000.04.406132-3/001 [1] Rel. Des. Sérgio Braga, DJ 3/9/2004).

 

Dos crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa – O parágrafo único do art. 83 do Código Penal diz, textualmente: Parágrafo único: Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará

também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir.

 

Pela redação do mencionado parágrafo, estão dispensados desse prognóstico de que não voltarão a delinquir os condenados por crimes culposos, bem como por aqueles cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa. Sendo dolosa a infração penal e havendo, ainda, como elemento do tipo a violência ou a grave ameaça à pessoa, embora a lei penal não exija formalmente qualquer exame, seria de bom alvitre a realização do exame criminológico, previsto pelo art. 8° da Lei de Execução Penal, visando constatar as condições pessoais do condenado que façam presumir que, se concedido o livramento condicional, não voltará a delinquir.

 

A jurisprudência tem se orientado no sentido de que a nova redação do art. 112 da Lei de Execução Penal, conferida pela Lei nº 10.792/03, deixou de exigir a submissão do condenado a exame criminológico, anteriormente imprescindível para fins de livramento condicional, sem, no entanto, retirar do juiz a faculdade de requerer sua realização quando, de forma fundamentada e excepcional, entender absolutamente necessária sua confecção para a formação de seu convencimento. O exame criminológico - cujo parecer, antes da nova legislação, era determinante para se estimar o atendimento do requisito subjetivo exigido para a concessão de benefícios além de ser um recurso excepcionai, não pode ser considerado isoladamente como fator para a denegação do benefício. Se o Magistrado singular não considerou necessário o exame criminológico, entendendo presentes os requisitos indispensáveis ao livramento condicional, não pode o Tribunal a quo sujeitar a concessão do benefício justamente à realização do referido exame. Precedentes (STJ, HC 77209/SP, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª T., DJ 6/8/2007, p. 585).

 

A nova redação do art. 112 da Lei de Execução Penal afastou a exigência de parecer da Comissão Técnica de Classificação e a submissão do condenado a exame criminológico para a concessão de benefícios como o livramento condicional, bastando para a concessão da benesse que o condenado tenha cumprido o requisito objetivo temporal e que possua bom comportamento, atestado pelo diretor do estabelecimento prisional (STJ, HC 74245/RJ, Relª. Minª. Laurita Vaz, 5ª T. DJ 6/8/2007, p. 574).

 

Do livramento condicional e execução provisória da sentença – O Supremo Tribunal Federal, na sessão plenária de 24 de setembro de 2003, aprovou a Súmula nº 716 que, embora dirigida aos casos de progressão de regime e aplicação de regime menos severo do que o determinado na sentença, pode, mediante um raciocínio analógico, ser ampliada para as hipóteses de livramento condicional, quando ainda não houver o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

 

Diz a referida Súmula na 716: Súmula na 716. Admite-se a progressão de regime de cumprimento de pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória.

 

Em sentido contrário, não é possível que pena aplicada por sentença penal condenatória não transitada em julgado venha a integrar cálculo do total da pena a ser cumprida, para efeito de concessão de livramento condicional (STJ, HC 48269/RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., DJ 14/5/2007, p. 399).

 

Súmula n. 439 do STJ – Exame criminológico - Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada.

 

Súmula nº 441 do STJ - A falta grave não interrompe o prazo para obtenção de livramento condicional. (Greco, Rogério. Código Penal comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao: “Requisitos do livramento condicional – Art. 83 do CP, p. 201-206. Ed. Impetus.com.br, acessado em 13/01/2023 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

O Curso Estratégia, aqui representado pelo professor Michael Procópio, em suas apreciações dobre as alterações do Código Penal Lei n. 13.964/2019, com o artigo intitulado: “Pacote Anticrime: as alterações do Código Penal pela Lei 13.964/2019, pertinente aos comentários ao art. 83 do CP, publicado há 3 anos explana em trabalho completo o seguinte:

 

Recentemente, foi aprovada a Lei 13.964/2019, proveniente de um projeto do Governo denominado de Pacote Anticrime.

 

Com a sua aprovação pelo Congresso Nacional, o Código Penal sofre alterações a partir do início de sua vigência, fixada para 30 dias após a publicação oficial.

 

Trago, então, breves comentários acerca das modificações sofridas pelo Código Penal. Não é demais relembrar que toda alteração que não for benéfica se sujeita ao princípio da irretroatividade, só se aplicando aos crimes cometidos após o início de vigência da lei.

 

Esses comentários foram atualizados com a derrubada do veto parcial a dispositivos da Lei 13.964/2019, em apreciação pelo Congresso encerrada apenas em abril de 2021.

 

Legítima defesa - Legítima defesa é a causa excludente de ilicitude que acoberta a conduta de repelir, de si mesmo ou de outrem, uma injusta agressão, atual ou iminente. Neste caso, há uma injusta agressão, a qual torna lícita a conduta que visa a neutralizar tal agressão.

 

Segundo Giuseppe Maria Bettiol, político e jurista italiano, é uma exigência natural a previsão da legítima defesa como excludente de ilicitude. Como o Estado não pode sempre garantir a segurança dos seus cidadãos, necessita permitir que se defendam de agressão injusta se não houver outro meio de se salvar.

 

O Código Penal trata da legítima defesa no artigo 25:

 

Art. 25 – Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.

 

A Lei 13.964/2019 inseriu o parágrafo único ao artigo 25 do Código Penal, de seguinte teor:

 

Parágrafo único. Observados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes.

 

Buscou-se destacar uma situação, por razões eminentemente políticas, que já estava obviamente abrangida pela legítima defesa, que se configura justamente quando há a necessidade de se repelir injusta agressão, atual ou iminente, a direito de outrem.

 

Parece, então, uma manifestação pura do Direito Penal Simbólico, já que possui uma mensagem política (apoio aos agentes de segurança pública) e nenhuma mudança efetiva na disciplina normativa (a legítima defesa de reféns já estava incluída no caput do artigo 25 e o novo dispositivo exige expressamente que os requisitos do caput sejam atendidos).

 

Execução da pena de multa - O Código Penal trata da execução da pena de multa no seu artigo 50:

 

Art. 50 – A multa deve ser paga dentro de 10 (dez) dias depois de transitada em julgado a sentença. A requerimento do condenado e conforme as circunstâncias, o juiz pode permitir que o pagamento se realize em parcelas mensais.


§ 1º – A cobrança da multa pode efetuar-se mediante desconto no vencimento ou salário do condenado quando: a) aplicada isoladamente; b) aplicada cumulativamente com pena restritiva de direitos; c) concedida a suspensão condicional da pena.

 

§ 2º – O desconto não deve incidir sobre os recursos indispensáveis ao sustento do condenado e de sua família.

 

A Lei de Execução Penal, por sua vez, cuida do tema em seu artigo 164:

 

Art. 164. Extraída certidão da sentença condenatória com trânsito em julgado, que valerá como título executivo judicial, o Ministério Público requererá, em autos apartados, a citação do condenado para, no prazo de 10 (dez) dias, pagar o valor da multa ou nomear bens à penhora.

 

§ 1º Decorrido o prazo sem o pagamento da multa, ou o depósito da respectiva importância, proceder-se-á à penhora de tantos bens quantos bastem para garantir a execução.

 

§ 2º A nomeação de bens à penhora e a posterior execução seguirão o que dispuser a lei processual civil.

 

Dada a diferença entre os dispositivos, tem prevalecido que o prazo para pagamento é aquele do artigo 164 da LEP, que prevê o seu início apenas após a “citação” do condenado para pagar o valor da pena de multa ou nomear bens à penhora.

 

É importante observar que o tema passou por uma grande mudança com a Lei 9.268/96 que, dando nova redação ao artigo 51 do Código Penal, passou a determinar o tratamento da pena de multa, imposta por sentença transitada em julgado, como dívida de valor da Fazenda Pública. A atual redação foi dada pela Lei 13.964, de 24 de dezembro de 2019, que passou a prever a competência do Juízo da Execução Penal:

 

Art. 51. Transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será executada perante o juiz da execução penal e será considerada dívida de valor, aplicáveis as normas relativas à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição.

 

O STF decidiu, no dia 13 de agosto de 2018, modificando seu próprio entendimento, que a legitimidade para cobrança da pena de multa é do Ministério Público, sem prejuízo de, subsidiariamente, a Fazenda Pública promover sua execução:

 

 “O Tribunal, por maioria, resolveu a questão de ordem no sentido de assentar a legitimidade do Ministério Público para propor a cobrança de multa, com a possibilidade subsidiária de cobrança pela Fazenda Pública, nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Marco Aurélio e Edson Fachin. Ausentes, justificadamente, os Ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes. Presidência do Ministro Dias Toffoli. Plenário, 13.12.2018”.

 

Entretanto, mesmo após a modificação do entendimento do STF, o STJ tem decidido de forma oposta:

 

“(…) Conforme o entendimento da Terceira Seção desta Corte, a pena pecuniária é considerada dívida de valor e, assim, possui caráter extrapenal, de modo que sua execução é de competência exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública. (…)” (STJ, AgRg no HC 441809/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª Turma, DJe 04/06/2019).

 

Para tornar o assunto mais complexo, a Lei 13.964/2019 modificou o artigo 51 do Código Penal, passando a prever que a execução deve se processar no Juízo da Execução Penal, o que parece reforçar a legitimidade do Ministério Público e afastar a da Procuradoria da Fazenda, ao menos após o início da sua vigência, prevista para 30 dias após a publicação:

 

Art. 51. Transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será executada perante o juiz da execução penal e será considerada dívida de valor, aplicáveis as normas relativas à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição.

 

Do Limite de cumprimento de pena - As penas de reclusão e detenção possuem seus limites estabelecidos no artigo 75, que possuía a seguinte redação:

 

Art. 75 – O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 (trinta) anos.

 

§ 1º – Quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 30 (trinta) anos, devem elas ser unificadas para atender ao limite máximo deste artigo.

 

§ 2º – Sobrevindo condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena, far-se-á nova unificação, desprezando-se, para esse fim, o período de pena já cumprido.

 

Assim, o limite fixado pela lei foi de 30 anos para as penas de reclusão e de detenção. É uma exigência constitucional, dada a vedação de penas de caráter perpétuo, nos termos do artigo 5º, inciso XLVII, alínea b, da Lei Maior.

A Lei 13.964, de 24 de dezembro de 2019, modificou a redação do caput e do parágrafo primeiro do artigo 75 do Código Penal, para modificar o limite de 30 para 40 anos:

Art. 75. O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 40 (quarenta) anos.

 

§ 1º Quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 40 (quarenta) anos, devem elas ser unificadas para atender ao limite máximo deste artigo.

 

A alteração era esperada por vários penalistas, dada a alteração na própria expectativa de vida desde a fixação do limite de 30 anos, não havendo que se falar em violação da vedação a penas perpétuas. Cuida-se de adaptação da norma, dada a modificação da realidade social, dentro dos limites permitidos pela Constituição.

Portanto, com a modificação legislativa, o limite fixado pela lei passou a ser de 40 anos para as penas de reclusão e de detenção, sendo que, se houver a fixação de penas em montante superior ao máximo, elas devem ser unificadas pelo juiz da execução, adequando-as ao teto.

Entretanto, as penas devem ser consideradas no todo, sem o corte do teto de 40 anos, para a finalidade de cômputo dos benefícios da execução penal, como a progressão de regime, as saídas temporárias, o indulto, a comutação (indulto parcial) e o livramento condicional. 

Cumpre mencionar que o limite modificado só pode ser aplicado para os crimes cometidos após o início de vigência da Lei 13.964/2019, por se tratar de lei penal posterior que prejudica o réu.


Livramento condicional - O livramento condicional (LC) é o benefício que consiste na soltura antecipada do executado, mediante o preenchimento de determinadas condições. Sua natureza jurídica, conforme entendimento que prevalece, é o de direito subjetivo do acusado. Busca-se a ressocialização, possibilitando ao executado, que ostenta bom comportamento carcerário, a liberação antecipada, sendo que, durante o restante da pena, deverá se comportar de forma a não ter o benefício revogado e cumprir determinadas condições. Está regulado pelo artigo 83 do Código Penal, de seguinte teor:

Art. 83 – O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que: 

 

I – cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes;

 

II – cumprida mais da metade se o condenado for reincidente em crime doloso;

 

III – comprovado: a) bom comportamento durante a execução da pena; b) não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses; c) bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído; e d) aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto;

 

IV – tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração;

 

V – cumpridos mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza.

 

Parágrafo único – Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir.

 

Cumpre destacar que o artigo 83 foi modificado, em seu inciso III, pela Lei 13.964/2019, cabendo comparar ambas as redações:

Portanto, o livramento condicional é cabível nos casos de pena privativa de liberdade igual ou superior a dois anos. É necessário que tenha sido comprovado o seu bom comportamento durante a execução da pena; o não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses; o bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e a aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto. Exige-se, ainda, que o executado tenha reparado o dano, salvo se comprovada a impossibilidade de fazê-lo.

 

No caso de condenado por crime doloso, praticado com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do benefício fica subordinada à demonstração de condições pessoais do executado que levem à presunção de que ele não voltará a delinquir. O juiz pode, para tanto, determinar a realização de exame criminológico.

Em todos os casos, exige-se o cumprimento de determinado lapso temporal da pena, isto é, de determinada fração da pena privativa de liberdade imposta ao condenado. No caso de réu não reincidente em crime doloso e bons antecedentes, o lapso é de um terço. Na hipótese de condenado que seja reincidente em crime doloso, a fração é de metade da pena.


Por fim, no caso de condenados por crime hediondo ou equiparado (tráfico de drogas, tortura e terrorismo) e de tráfico de pessoas, a fração é de dois terços, desde que não seja reincidente específico.


Cumpre mencionar, ainda, que a Lei 13.964/2019, ao modificar o artigo 112, inciso VI, alínea a, e inciso VIII, da Lei de Execução Penal, passou a vedar o livramento condicional para os condenados por crime hediondo ou equiparado, com resultado morte.

 

O artigo 2º, § 9º, da Lei 12.850/2013, introduzido pela Lei 13.964/2019, passou a vedar o livramento condicional para o condenado expressamente em sentença por integrar organização criminosa ou por crime praticado por meio de organização criminosa, se houver elementos probatórios que indiquem a manutenção do vínculo associativo.

 

Perda do produto ou proveito do crime - Apesar de ainda não ter havido discussão doutrinária, entendo que o artigo 91-A, acrescido pela Lei 13.964, de 24 de dezembro de 2019, trouxe mais hipóteses de efeitos específicos da condenação:

Art. 91-A. Na hipótese de condenação por infrações às quais a lei comine pena máxima superior a 6 (seis) anos de reclusão, poderá ser decretada a perda, como produto ou proveito do crime, dos bens correspondentes à diferença entre o valor do patrimônio do condenado e aquele que seja compatível com o seu rendimento lícito.

 

§ 1º Para efeito da perda prevista no caput deste artigo, entende-se por patrimônio do condenado todos os bens:

 

I – de sua titularidade, ou em relação aos quais ele tenha o domínio e o benefício direto ou indireto, na data da infração penal ou recebidos posteriormente; e II – transferidos a terceiros a título gratuito ou mediante contraprestação irrisória, a partir do início da atividade criminal.

 

§ 2º O condenado poderá demonstrar a inexistência da incompatibilidade ou a procedência lícita do patrimônio.

 

§ 3º A perda prevista neste artigo deverá ser requerida expressamente pelo Ministério Público, por ocasião do oferecimento da denúncia, com indicação da diferença apurada.

 

§ 4º Na sentença condenatória, o juiz deve declarar o valor da diferença apurada e especificar os bens cuja perda for decretada.

 

§ 5º Os instrumentos utilizados para a prática de crimes por organizações criminosas e milícias deverão ser declarados perdidos em favor da União ou do Estado, dependendo da Justiça onde tramita a ação penal, ainda que não ponham em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem pública, nem ofereçam sério risco de ser utilizados para o cometimento de novos crimes.

 

O legislador restringiu a aplicação dos regramentos incluídos pela Lei 13.964/2019 aos crimes cuja pena máxima seja superior a 6 anos de reclusão. Portanto, não cabe a decretação da perda de bens, com base no artigo 91-A do CP, em todos os delitos.

 

A perda é decretada com fundamento na existência de produto ou proveito do crime. A ideia é alcançar bens do condenado sem exigência de comprovação de que ele decorre diretamente da atividade criminosa (produto) ou deriva dela, por conversão dos bens (proveito).

 

Nesta hipótese, o legislador exige apenas a demonstração de que o condenado possui patrimônio incompatível com aquele que poderia ter sido amealhado com seu rendimento lícito. Para tal comparação, o Código determina a consideração dos bens de titularidade do agente e daqueles sobre os quais ele tenha o domínio e o benefício direto ou indireto, tanto na data da infração quanto após o seu cometimento, ou seja, os bens recebidos após a data do delito.

 

Consideram-se, ainda, como patrimônio do agente aqueles que forem transferidos a terceiros a título gratuito (como uma doação) ou mediante uma contraprestação irrisória (como um negócio de compra e venda simulado, em que o preço só serve para ocultar a natureza gratuita da alienação), a partir do início da atividade criminal. Entendo que, neste ponto, devemos considerar o início dos atos executórios, quando o agente já pode ser punido pela prática do delito, a título de tentativa.

 

O parágrafo segundo do artigo 92-A do CP permite, ao condenado, que demonstre que o patrimônio é compatível com sua renda lícita, o que afasta tal efeito da condenação. Possibilita, ainda, que o condenado demonstre a procedência lícita do patrimônio, como uma doação de um familiar ou o recebimento de uma herança.

 

A lei exige o pedido expresso do Ministério Público, que deve ser feito por ocasião da denúncia, inclusive com a indicação da diferença apurada entre o patrimônio que o condenado possui e o que seria compatível com sua atividade profissional e/ou econômica lícita.

 

Na sentença, o juiz deverá declarar a diferença efetivamente apurada, após o exercício do contraditório e da ampla defesa, com a especificação dos bens que terão a perda decretada.

 

Por fim, o parágrafo quinto do artigo 91-A do Código prevê uma regra específica para os instrumentos utilizados para a prática de crimes por organizações criminosas e milícias. Nestes casos, serão declarados perdidos em favor da União ou do Estado, dependendo da Justiça onde tramita a ação penal. Ainda se especifica que deve haver a perda ainda que tais instrumentos não ponham em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem pública, nem ofereçam sério risco de ser utilizados para o cometimento de novos crimes.

 

Se for caso de competência da Justiça Estadual, a perda dos instrumentos do crime será em favor do Estado. Sendo de competência da Justiça Federal, os instrumentos do crime devem ser perdidos em favor da União.

 

Apesar de não haver menção a ser esse efeito automático ou não, a redação indica a necessidade de decretação judicial (“deverão ser declarados perdidos”), além de sua previsão estar em um artigo que menciona a necessidade de determinação na sentença. Deste modo, entendo ser também um caso de efeito não automático, que deve ser decretado pelo juiz de forma expressa.

 

Causas suspensivas da prescrição - A prescrição possui causas suspensivas. A suspensão determina que o prazo deixe de fluir, ficando paralisado. Com o fim da suspensão, a prescrição volta a correr de onde parou.

 

Deste modo, se o prazo prescricional é de 10 anos e, ao completar 4 anos do prazo, sobrevém uma causa suspensiva, o prazo ficará congelado nos 4 anos já corridos. Cessada a causa de suspensão do prazo, este voltará a fluir, reiniciando-se nos 4 anos em que havia sido suspenso e correndo pelos 6 anos restantes.

 

As causas suspensivas da prescrição estão previstas no artigo 116 do Código Penal, com a redação dada pela Lei 13.964, de 24 de dezembro de 2019:

 Art. 116 – Antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição não corre: I – enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime; II – enquanto o agente cumpre pena no exterior; III – na pendência de embargos de declaração ou de recursos aos Tribunais Superiores, quando inadmissíveis; e IV – enquanto não cumprido ou não rescindido o acordo de não persecução penal.

 

Parágrafo único – Depois de passada em julgado a sentença condenatória, a prescrição não corre durante o tempo em que o condenado está preso por outro motivo.

 

Entendo que as modificações só podem ser aplicadas para os crimes cometidos após o início da vigência da Lei, já que a prescrição tem natureza penal, por limitar o poder de punir. Deste modo, as hipóteses dos incisos III e IV do artigo 116 só podem ser aplicadas aos crimes cometidos a partir de 23 da janeiro de 2020. Vale mencionar que o inciso II só teve sua redação modificada, sem alteração de conteúdo da norma que dele se extrai.

Da leitura do dispositivo, percebe-se que a prescrição não corre enquanto, em outro processo, não for resolvida questão de que depende a existência do crime. Também há suspensão do prazo prescricional no caso de o agente estar cumprindo pena no exterior.

A prescrição não corre durante a pendência de embargos de declaração, bem como de recursos aos Tribunais Superiores, quando inadmissíveis. Ou seja, deve-se analisar a não admissibilidade dos recursos para que haja a suspensão do prazo prescricional.


Celebrado o acordo de não persecução penal, que foi instituído, sem base legal, por uma resolução do CNMP e, posteriormente, efetivamente criado pela Lei 13.964/2019, fica suspensa a prescrição enquanto ele não for cumprido ou rescindido.


Por fim, a prisão do indivíduo, por outro motivo, é uma causa suspensiva da prescrição. Enquanto o agente estiver preso por delito diverso, a prescrição não corre. Só voltará a correr quando ele for posto em liberdade, enfatizando que ele deveria estar preso por motivo diverso, ou seja, não em razão do delito cujo prazo prescricional estava suspenso.


A suspensão do curso do prazo prescricional não possui, na legislação, um limite expresso. A este respeito, o Superior Tribunal de Justiça editou o enunciado 415 da sua Súmula, entendendo que se deve respeitar o máximo da pena cominada ao delito para delimitação do período de suspensão da prescrição:

O período de suspensão do prazo prescricional é regulado pelo máximo da pena cominada. (Súmula 415, STJ). Deste modo, superado o tempo que corresponda ao máximo da pena cominada, o prazo prescricional deve voltar a fluir, estando ou não superada a causa suspensiva. Isto porque o STJ pacificou o entendimento de que a suspensão do prazo prescricional não é ilimitada, devendo ter como limite de duração a própria pena em abstrato cominada ao delito, em seu máximo.

 

Roubo - A Lei 13.964/2019 passou a prever mais uma majorante, que incide no caso de emprego de arma branca:

 

Art. 157 – Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: Pena – reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

 

§ 1º – Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro.

 

§ 2º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade:

 

I – (revogado);               

II – se há o concurso de duas ou mais pessoas;

III – se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância.

IV – se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior;  

V – se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade; 

VI – se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego.

VII – se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma branca Vale recordar que o emprego de arma de fogo faz incidir a majorante do artigo 157, § 2º-A, com fração de 2/3.

 

No caso da arma branca, a causa de aumento será de um terço até metade. A alteração só vale para os crimes cometidos a partir do início da vigência da Lei 13.964/2019, definido para 30 dias após a sua publicação. Não se deve considerar a arma de brinquedo para a incidência do dispositivo, já que não se trata propriamente de arma, mas apenas de um objeto que pode enganar a vítima, configurando a grave ameaça, elementar do tipo penal.

 

O que é considerado arma branca - Antes da lei 13.654/2018, a majorante apenas se referia ao emprego de arma. Sem especificação, haveria a majorante no caso de emprego de arma de fogo (como um revólver), de arma branca (como um punhal) ou de arma imprópria (como uma garrafa utilizada para tal fim). Referida Lei revogou tal majorante e passou a prever apenas a majorante de emprego de arma de fogo.

Com o advento da Lei 13.964/2019, buscou-se a correção da alteração legislativa anterior, incluindo-se mais uma majorante, a do emprego de arma branca. A questão é: se podemos incluir apenas as armas que não sejam de fogo (como um punhal, uma adaga ou uma espada) ou também as armas impróprias (como a garrafa, o pedaço de espelho ou uma pedra pontiaguda).

 

Apenas como referencial doutrinário, vamos analisar a legislação portuguesa (Lei 5/2006, artigo 2º, I, m) que trata do regime jurídico das armas e munições. Referido texto define arma branca como “todo o objeto ou instrumento portátil dotado de uma lâmina ou outra superfície cortante, perfurante ou corto-contundente, de comprimento superior a 10 cm, as facas borboleta, as facas de abertura automática ou de ponta e mola, as facas de arremesso, as estrelas de lançar ou equiparadas, os cardsharp ou cartões com lâmina dissimulada, os estiletes e todos os objetos destinados a lançar lâminas, flechas ou virotões”.

Deste modo, entendo que as armas impróprias, que antes da Lei 13.654/2018 tornavam o delito majorado, não permitem a incidência da majorante do artigo 157, § 2º, VII. Só há causa de aumento de pena no caso de emprego de arma branca, ou seja, de objetos fabricados para utilização como arma, como um punhal ou canivete, ou, pelo menos, que tenham lâmina ou superfície cortante, como uma faca de cozinha. De todo modo, será necessário acompanhar a interpretação a ser dada pelo Judiciário.

 

É importante esquematizarmos as confusas mudanças legislativas, sobre a majorante de emprego de arma, para melhor visualização:

Portanto, a partir de 23 de janeiro de 2020, com o início de vigência da Lei 13.964/2019, passa a ser majorado o crime cometido com emprego de arma branca. Anteriormente, o crime deve ser considerado simples, seja por ter sido cometido no intervalo entre o advento da Lei 13.654/2018 ao início de vigência da Lei 13.964/2019, seja por ter a Lei 13.654/2018 retroagido para beneficiar os crimes cometidos anteriormente. É porque neste interstício só havia previsão de majorante para o emprego de arma de fogo, mas não de arma branca.

 

Ademais, o parágrafo 2º-B do artigo 157, do Código Penal, foi introduzido pela Lei 13.964/2019:

§ 2º-B.  Se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido, aplica-se em dobro a pena prevista no caput deste artigo.

 

Portanto, só pode ser aplicado o dispositivo para os delitos cometidos a partir do início de sua vigência.

A pena do caput, de reclusão, de quatro a dez anos, e multa, deve ser aplicada em dobro. Pode-se interpretar como qualificadora, com pena de 8 a 20 anos de reclusão, se houver emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido. A melhor interpretação parece ser, entretanto, a de que o crime praticado com essas armas torna o crime majorado, com a duplicação da pena na terceira fase da dosimetria.

Cuida-se de norma penal em branco, de modo a depender da definição dada atualmente pelo Decreto 9.847/2019, que regulamenta a Lei 10.826/2003. Referido decreto foi alterado recentemente pelo Decreto 10.630/2021.

Estelionato - A Lei 13.964, de 24 de dezembro de 2019, introduziu o parágrafo quinto ao artigo 171 do Código Penal, que, portanto, se aplica ao estelionato e a todas as modalidades equiparadas (como a defraudação de penhor). Traz o dispositivo hipóteses em que a ação penal passa a ser pública incondicionada:

§ 5º Somente se procede mediante representação, salvo se a vítima for:


I – a Administração Pública, direta ou indireta;

II – criança ou adolescente;

III – pessoa com deficiência mental; ou

IV – maior de 70 (setenta) anos de idade ou incapaz.

 

Portanto, a regra é a ação penal pública condicionada à representação. A ação penal passa a ser incondicionada se o delito for praticado contra a Administração Pública, direta ou indireta; contra criança ou adolescente; contra pessoa com deficiência mental; contra maior de 70 (setenta) anos de idade ou contra incapaz.

Concussão - A pena, na forma do caput, era de reclusão, de 2 a 8 anos, e multa. Isso se mostrava nitidamente desproporcional com a pena da corrupção passiva, em que a conduta do agente é menos grave e a pena máxima chega aos 12 anos. A título de comparação, a corrupção passiva pune o agente que solicita vantagem, enquanto a concussão pune o que a exige (conduta mais grave do que solicitar), razão pela qual não havia sentido em uma pena mais baixa para a concussão.

Com o advento da Lei 13.964/2019, a pena passou a ser de 2 a 12 anos de reclusão, e multa, o que, por ser alteração mais gravosa, só se aplica aos crimes cometidos após o início de sua vigência.

 

Homicídio qualificado: arma de fogo de uso restrito ou proibido - Com a derrubada do veto, pelo Congresso Nacional, a alguns dispositivos da Lei 13.964/2019, apenas na data de 19/04/2021, foi inserida uma nova qualificadora ao homicídio. O inciso VIII trata do homicídio praticado com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido:

§ 2° Se o homicídio é cometido:


(…)

VIII – com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido

Pena – reclusão, de doze a trinta anos.

 

Cuida-se de norma penal em branco, pois depende de norma que defina o que é a arma de fogo de uso restrito ou proibido. As normas que atualmente complementam o dispositivo estão no Decreto 9.847/2019, que regulamenta a Lei 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento).

Crimes contra a honra: redes sociais - Com a derrubada do veto do Pacote Anticrime, foi inserido o parágrafo segundo ao artigo 141. Se o crime for cometido ou divulgado em quaisquer modalidades das redes sociais da rede mundial de computadores, aplica-se em triplo a pena.

§ 2º Se o crime é cometido ou divulgado em quaisquer modalidades das redes sociais da rede mundial de computadores, aplica-se em triplo a pena.

Chama a atenção o quantum de pena que, apesar de se justificar na ampla e rápida difusão desses delitos quando praticados em redes sociais, como Twitter, Facebook e Instagram, leva a uma punição maior do que o crime de lesão corporal. Por isso, questiona-se a sua proporcionalidade, razão que justificava o veto, derrubado posteriormente pelo Congresso. (Michael Procópio, em suas apreciações sobre as alterações do Código Penal Lei n. 13.964/2019, pertinente aos comentários sobre o art. 83 do CP, publicado no site do Curso Estratégia.com.br, acessado em 13/01/2023 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).