sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.444, 1.445, 1.446 Do Penhor Pecuário –- VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.444, 1.445, 1.446

Do Penhor Pecuário –- VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro III – Capítulo II – DO PENHOR

Seção V – Do Penhor Rural – Subseção III – Do Penhor Pecuário

(Art. 1.444 a 1.446) - digitadorvargas@outlook.com

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 Art. 1.444. Podem ser objeto de penhor os animais que integram a atividade pastoril, agrícola ou de lacticínios.

 

Com relevante importância de Loureiro, o artigo em exame abre a subseção que disciplina o penhor pecuário. Além dos animais que integram a atividade pastoril, agrícola ou de laticínios a que se refere este artigo, pode também ser empenhado o maquinário utilizado na produção.

 

A posse direta dos animais permanece com o devedor ou prestador da garantia, que transfere ao credor apenas a posse indireta e jurídica. Não há necessidade de descrição do local onde se encontram os animais empenhados. Isso porque, segundo decidiu o STJ, “a norma do art. 2º, § 2º, VI, da Lei n. 492, de 30.08.1937, foi derrogada pelo art. 14, V, do Decreto-lei n. 167, de 14.02.1967. Basta, assim, a menção do local em que os bens empenhados podem ser encontrados. Requisito satisfeito no caso” (REsp n. 109.280/RS, rel. Min. Barros Monteiro).

Gladston Mamede acentua, com razão, ser “comum que o financiamento seja concedido para a aquisição dos animais, empenhando-se as cabeças que sejam adquiridas” com o crédito garantido. Em tal caso, o desvio do crédito e sua aplicação em finalidade diversa constitui infração penal prevista no art. 20 da Lei n. 7.492/86 (Código Civil comentado. São Paulo, Atlas, 2003, v. XIV, p. 218). (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.546.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 15/01/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em rápida atenção, como apontam Guimarães e Mezzalira, o penhor pecuário recai sobre o gado em geral, não abrangendo os animais utilizados no serviço ordinário, que devem ser objeto de penhor agrícola, pois são acessórios dos estabelecimentos. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.444, acessado em 15.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Na sustentação de sua Tese de Pós-Graduação ao título de Mestre em Direito Privado, Maísa Conceição Gomes Gontijo com o título “Análise do principio da boa-fé objetiva estatuído no artigo 422 do Código Civil Brasileiro, na PUC/MG, em 2009, traz à tona uma importante consideração. No revogado Código Civil – fruto do Estado Liberal, em que predominava o dogma da autonomia  da  vontade  como  princípio  basilar  das  relações  contratuais  –,  a  regra  geral  de interpretação  dos  negócios  jurídicos  estava  disciplinada  no  artigo  85,  que  assim  dispunha: “nas  declarações  de  vontade  se  atenderá  mais  à  sua intenção  que  ao  sentido  literal  da linguagem”. Tendo  em  vista  a  importância  que  se  dava  à  vontade,  adotou-se,  nesse dispositivo, a teoria da vontade, que visava proteger o interesse dos declarantes e sua vontade real, em detrimento da teoria da declaração. 

O  atual  Código  Civil  tratou  da  interpretação  dos  negócios  jurídicos  em  alguns artigos, dois  dos  quais    os  artigos  112  e  113    são  objeto do  presente  trabalho.  Dispõe  o artigo 112 que “nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”. 

Em sua exposição de motivos sobre a Parte Geral do Código Civil, afirma José Carlos Moreira  Alves  que  em  tal  artigo  se  determina  o  atendimento  à  intenção  consubstanciada  na declaração,  e  não  ao  pensamento  íntimo  do  declarante.  O  ministro  esclarece,  em  nota  de rodapé,  que  não  adotou  a  teoria  objetiva,  preferindo  a  concepção  subjetiva  por  considerá-la mais consentânea com a realidade, entretanto se afastou na maioria das vezes dos exageros do dogma da vontade e recorreu aos princípios da responsabilidade do declarante e da confiança da parte a que se dirige tal declaração. (FARIAS; ROSENVALD, 2006).

Mediante o exposto na redação de tal artigo, o legislador procurou evitar a adoção de uma das duas teorias extremas de interpretação do negócio jurídico – a teoria da vontade ou a teoria  da  declaração  –,  preferindo  adotar  a  teoria da  confiança,  que  guarda  estreita  relação com a boa-fé, traduzindo-se no dever de cada parte agir com respeito e lealdade, não lesando o outro contratante ou frustrando suas expectativas.

Não    que  se  falar,  na  vigência  do  atual  Código  Civil,  de  prevalência  da  teoria  da vontade (subjetiva) ou da declaração (objetiva), como defendido por Orlando Gomes (2002, p. 202),  para  o  qual  “a  interpretação  objetiva  é  subsidiária,  pois  suas  regras    se  invocam  se falharem  as  que  comandam  a  interpretação  subjetiva”.  Ao  se  eleger  a  teoria  da  confiança, torna-se  necessária  uma  releitura  da  interpretação negocial,  em  que  a  boa-fé  objetiva  ganha um papel de destaque.

Tal papel de destaque está positivado no artigo 113, que dispõe: “os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração”. Esse artigo representa a regra geral de interpretação dos negócios jurídicos. Os  artigos  112  e  113  devem  ser  interpretados  em  complementaridade,  uma  vez  que ambos têm a boa-fé como cláusula geral. O artigo 112, ao adotar a teoria da confiança, elegeu,  (além  do  referido  artigo,  o  artigo  1090  tratava  dos contratos  benéficos,  que  deveriam  ser  interpretados estritamente. Também tratam de dispositivo específico sobre interpretação os artigos 110, 111, 114, 423 e 819), também a boa-fé como princípio norteador da interpretação contratual, uma vez que a boa-fé tem como pressuposto a lealdade e a confiança despertada no destinatário da declaração.

Segundo  Miguel  Reale,  “em  todo  ordenamento  jurídico há  artigos-chave,  i, é, normas  fundantes  que  dão  sentido  às  demais,  sintetizando  diretrizes  válidas  ‘para  todo  o sistema’”.   Para   ele,   “nenhum   dos   artigos   do   novo   Código   Civil   parece   tão   rico   em consequências como o artigo 113”, que fixa a “eticidade de sua hermenêutica, em função da boa-fé, bem como a sua socialidade, ao se fazer alusão aos usos do lugar de sua celebração”. (REALE, 2003, p. 1).

Tal  artigo  demonstra  a  incidência  dos  três  princípios  fundamentais  do  novo  Código Civil:   a   eticidade,   a   socialidade   e   a   operabilidade.   Eticidade,   pois   nos   dias   atuais   é “indeclinável a participação dos valores éticos no ordenamento jurídico”, sendo a boa-fé o seu cerne. Socialidade, no sentido de superação do caráter individualista presente no Código Civil de 1916. E, por fim, a operabilidade, pela adoção da cláusula  geral de boa-fé,  cujo conteúdo será preenchido in concreto, permitindo a solução de casos que antes não eram regulados pelo ordenamento jurídico. (REALE, 2002).

No  atual  Código  Civil,  a  boa-fé  objetiva  foi  consagrada  como  regra  geral  de interpretação  do  negócio  jurídico.  É  uma  norma  de  conduta  a  ser  observada  por  todos  os contratantes,  que  devem  agir  de  forma  leal  e  honesta.  Não  representa  apenas  um  conceito ético, mas um princípio jurídico que, como qualquer norma jurídica, gera consequências pela sua não-observância.

O   dever   de   interpretar   segundo   a   boa-fé   objetiva   encontra-se   informado   pelos princípios  constitucionais  da  dignidade  da  pessoa  humana,  do  valor  social  da  livre  iniciativa privada,  da  solidariedade  social  e  da  igualdade  substancial.  Interpretar  segundo  a  boa-fé  é garantir  a  funcionalidade  do  negócio  jurídico,  e  a boa-fé  objetiva,  na  atual  perspectiva  civil-constitucional,    é    regra    fundamental    de    qualquer    atividade    negocial.    (FARIAS; ROSENVALD, 2007).

A função limitativa ou de controle da boa-fé objetiva guia a conduta dos contraentes, reduzindo-lhes  a  liberdade  de  atuação  e  definindo  algumas  condutas  e  cláusulas  como abusivas,  em  observância  à  função  social  do  contrato.  Dessa  forma,  a  autonomia  privada  é limitada pela boa-fé no momento em que esta exerce uma função de controle dos contratos. Aqui se encontra a figura do abuso do direito, presente no artigo 187 do atual Código Civil  brasileiro,  segundo  o  qual  “também  comete  ato ilícito  o  titular  de  um  direito  que,  ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”. (BRASIL, 2005, p. 209).

A  expressão  “abuso  do  direito”  deve-se,  segundo  Antônio  Menezes  Cordeiro  (2007), ao  autor  belga  Laurent.  Ele  a  criou  para  nominar  situações  jurídicas  em  que  os  tribunais franceses, reconhecendo  na questão de fundo o direito do réu, condenaram-no em virtude de irregularidades  no  exercício  desse  direito.  As  primeiras  decisões  acerca  do  abuso  do  direito datam  de  1808,  fase  inicial  da  vigência  do  Código  Napoleão.  Eis  algumas  decisões  dos tribunais de apelação franceses selecionadas por Antônio Menezes Cordeiro (2007):

1808    Condenação  do  proprietário  de  uma  fábrica  de chapéus  que  provocava evaporações desagradáveis para a vizinhança;

1820      Condenação   de   um   construtor   de   forno   que,   por   falta   de   precauções, prejudicava um vizinho;

1853 – Condenação de um proprietário que, por desavenças com o vizinho, construiu uma   falsa   chaminé   para   vedar   a   luz   à   janela   do   vizinho.   Tal   decisão   ficou universalmente conhecida;

1854    Condenação  de  um  proprietário  que  bombeava  para  um  rio  a  água  do  seu próprio poço, para baixar o nível do poço do vizinho;

1861      Condenação   de   proprietário   que   efetuou   perfurações   no   seu   prédio, provocando desabamentos no prédio do vizinho, por falta de cuidados;

1913 – Condenação de proprietário que ergueu em seu terreno um dispositivo dotado de espigões de ferro para danificar os dirigíveis construídos por seu vizinho.

Em 1915 a  condenação  foi  confirmada  pela  Cassação.  Esta  decisão  é  amplamente  citada  como exemplo ao se tratar da teoria do abuso do direito. É o famoso caso Clement Bayard.

Na justificação da decisão no caso da falsa chaminé, considerou-se que o exercício do direito  de  propriedade,  ainda  que  absoluto,  autorizando  ao  seu  dono  usar  e  abusar  da  coisa, deve ter por limite a satisfação de um interesse sério e legítimo, e ainda, que os princípios da moral e equidade se opõem a que a justiça sancione uma ação inspirada pela “malquerença” e provoque um prejuízo grave a outrem. (CORDEIRO, 2007).

Cita Antônio Menezes Cordeiro (2007) que, desde 10 de janeiro de 1908, é orientação do RG que aquele que violar o contrato e colocar em perigo o escopo contratual não terá, no caso  de  violação  posterior  pela  contraparte,  direito  à  indenização  por  não-cumprimento  ou rescisão  contratual,  como  se  não  tivesse  sido  ele  o responsável  por  violações  antecedentes  e por não ter se portado de maneira leal no contrato.

Para o referido autor, poder-se-ia classificar como exceção do contrato não cumprido, o  qual  é  uma  concretização  histórica  da  boa-fé,  e  não  como  apelo  imediato  à  boa-fé  para justificar seu fundamento. A boa-fé, neste caso, teria dois papéis: o de determinar os deveres de cada parte ao firmar a estrutura real do sinalagma e o de exigir que a exceção seja movida apenas por modificações sinalagmáticas materiais e não formais, sob pena de abuso. Estão aqui delineadas, em poucas linhas, algumas das figuras decorrentes do abuso do direito,  sendo  todas  elas  fundamentadas  na  confiança  despertada  no  parceiro  contratual, elemento caracterizador da boa-fé objetiva. 

Segundo Mario Júlio de Almeida Costa, Antunes Varela e Carlos Alberto da Motta Pinto. Na classificação de Couto   e   Silva   (2006),   os   deveres   sofreram   divisão   em   deveres   principais   e   secundários   (anexos   ou instrumentais), e estes  últimos em dependentes e independentes pelo fato de alguns  ultrapassarem o término da obrigação principal, assumindo, assim, vida própria. Em virtude disso, podem ser acionados independentemente da  prestação  principal.  Em  sua  origem, dependem  da  obrigação  principal,  por  isso  são  secundários.  Os  deveres secundários  ou  obrigações  anexas  dependentes  são  aqueles  que  pertencem  às  obrigações  principais.  Seu descumprimento  implica  descumprimento  do  dever  principal,  não  podendo,  dessa  forma,  serem  acionados independentemente.

Segundo Martins-Costa (2000), a doutrina indica que, em toda relação contratual, há deveres de prestação principais, secundários e laterais (anexos ou instrumentais). Os deveres principais  ou  primários  da  prestação  constituem  o  núcleo  da  relação  contratual  e  definem  o contrato:  a  obrigação  de  dar,  restituir,  fazer  e  não  fazer.  Os  deveres  secundários  são subdivididos em deveres secundários meramente  acessórios da obrigação  principal e deveres secundários  com  prestação  autônoma,  sendo  os  do  primeiro  tipo  aqueles  que  se  destinam  a assegurar  ou  preparar  o  cumprimento  da  obrigação  principal  e  os  do  segundo  tipo,  as prestações  autônomas  ou  coexistentes  com  a  principal  (que  podem  até  vir  a  substituir  a obrigação  principal).  E  por  fim,  os  deveres  laterais,  anexos  ou  instrumentais    para  citar apenas algumas de suas várias denominações – são aqueles derivados de  cláusula contratual, de dispositivo da lei ad hoc ou da boa-fé objetiva, que interessa destacar neste trabalho. Os  deveres  anexos  são  impostos  tanto  ao  credor  quanto  ao  devedor,  não  estando diretamente  relacionados  com  o  adimplemento  da  obrigação  principal,  como  é  o  caso  dos deveres  secundários.  Estão  relacionados  ao  processamento  da  relação  obrigacional  como  um todo, desde o primeiro contato social até após o adimplemento da obrigação principal. São os chamados deveres de cooperação e proteção dos interesses recíprocos. Os  deveres  anexos  não  são  enumerativos,  são  apenas exemplificativos,  pois  não  é possível estabelecê-los previamente. São aferidos no decorrer da relação contratual, de acordo com as especificidades do caso concreto. 

O  problema  que  se  apresenta  em  relação  à  função  integrativa  do  princípio  da  boa-fé objetiva é saber quais são as consequências jurídicas advindas da não-observância dos deveres anexos impostos pelo princípio da boa-fé objetiva, positivado no artigo 422 do Código Civil, que  assim  dispõe:  “os  contratantes  são  obrigados  a guardar,  assim  na  conclusão  do  contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e boa-fé”. (Maísa Conceição Gomes Gontijo na sustentação de sua Tese de Pós-Graduação ao título de Mestre em Direito Privado, com o título “Análise do principio da boa-fé objetiva estatuído no artigo 422 do Código Civil Brasileiro, na PUC/MG, em 2009, acessado em 15.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.445. 0 devedor não poderá alienar os animais empenhados sem prévio consentimento, por escrito, do credor. 

Parágrafo único: Quando o devedor pretende alienar o gado empenhado ou, por negligencia , ameace prejudicar o credor, poderá este requerer se depositem os animais sob a guarda de terceiro, ou exigir que se lhe pague a divida de imediato. 

A verdade nua e crua atestada por Guimarães e Mezzalira, é a que a alienação pelo devedor de animais empenhados depende do consentimento escrito do credor, dispositivo que objetiva evitar negociações clandestinas e que estabelece sanções ao devedor negligente, como a obrigação de depositar o animal ou a de efetuar o pagamento da dívida.

Embora o devedor seja equiparado ao depositário, não se sujeita à pena de prisão, nos termos da Súmula Vinculante nº 25 do Supremo Tribunal federal: “É ilícita a prisão civil do depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.445, acessado em 15.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Conceituando, Talita Pozzebon Venturini, o art. 1445, CC/02 assegura expressamente a proibição à alienação dos animais dados em penhor. Somente poderá ocorrer com a concordância, por escrito, do credor. O parágrafo único do mesmo resguarda ao credor a possibilidade de exigir que sejam depositados os animais empenhados ou que fique sob a guarda de terceiros, quando o devedor ameaçar prejudicar aquele ou quando pretender vender os animais. 

A Lei 492/37 em seu art. 10, parágrafo único prevê sob pena de nulidade, a especificação máxima possível na escritura pública ou em instrumento particular dos animais empenhados, como por exemplo, lugar onde se encontram espécie, destino de cada um, denominação comum ou científica, raça, grau de mestiçagem, marca, sinal e nome (se este último caso exista). Há essa exigência para que valha contra terceiros e estes possam identificar os animais dados em penhor. (Talita Pozzebon Venturini, artigo intitulado “Direitos reais de garantia: breve análise sobre penhor, hipoteca e anticrese”, publicado em outubro de 2015 no site Jus.com.br, acessado em 15.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Estendendo-se em seus comentários para Loureiro, veda a lei a alienação dos animais empenhados, sem prévio consentimento do credor, por escrito. O consentimento do credor é formal e anterior à venda. Se não houver qualquer ressalva quanto à persistência da garantia, ou sua sub-rogação, ou substituição, a anuência à venda provoca a extinção do penhor. Pode a anuência se referir a apenas parte dos animais, caso em que a garantia se concentra no remanescente, em razão do princípio da indivisibilidade. 

Embora haja controvérsia na doutrina, a alienação dos animais sem tal consentimento é nula e não produz efeitos frente ao credor, que pode promover sua excussão, ainda que se encontrem em poder de terceiros. A alienação de qualquer bem dado em garantia real é ineficaz frente ao credor garantido, em razão da sequela. Os bens empenhados em geral são alienáveis, porque não afetam a garantia, em razão do vínculo real que os prende à obrigação. No penhor pecuário, porém, dadas suas peculiaridades, com o risco de perda dos animais, o legislador foi além. No dizer de Pontes de Miranda, “as alienações sem o consentimento do titular do direito de penhor não tem eficácia. Tudo se passa como se fossem alienações de coisa alheia. Daí a vindicabilidade do titular do direito de penhor, sem necessidade de qualquer ação” (Tratado de direito privado, 3. ed. São Paulo, RT, 1984, v. XXI, p. 48).

A inalienabilidade dos animais empenhados acarreta também sua impenhorabilidade e a impossibilidade de dá-los em nova garantia, sem consentimento do credor original. Apenas se ressalva que, segundo entendimento do STJ, cabe a penhora em execução movida por credores com privilégio legal superior ao do credor pignoratício. Parte da jurisprudência vai além e admite a penhora por outros credores, quando não advier qualquer prejuízo ao credor pignoratício, preservando sua prelação.

O parágrafo único deste artigo disciplina duas hipóteses em que a garantia é colocada em risco pelo devedor: a) quando pretende alienar os bens por atos inequívocos, como anúncios ou leilões; b) quando por negligência ameace a perda, deterioração ou desvalorização dos animais, em razão de maus tratos, insuficiência de pastagens de água ou falta de vacinas adequadas.

A consequência para ambos os casos é a faculdade alternativa de o credor requerer o pagamento imediato da dívida garantida, em vista de seu vencimento antecipado por disposição legal, ou o depósito dos animais, sob a guarda de terceiros. Cabe ao credor o ônus da prova do risco de deterioração da garantia, ou da pretensão de alienação, por parte do devedor. 

Na lição de Pontes de Miranda, cabem as seguintes ações ao credor pignoratício, nas hipóteses contempladas por este artigo: a) a ação cautelar de depósito, cm caso de intenção de alienar, ou de ameaça de prejuízo ao titular do direito de penhor, por negligência, com a alternativa de pagamento imediato da dívida; b) a ação de vindicação pignoratícia contra o outorgado da alienação, por força do art. 622 do Código Civil de 1916 e art. 12 da Lei n. 492; c) a ação possessória do titular do penhor, por ser-lhe ofendida, com a posse de terceiro, a posse mediata de titular do direito de penhor (Pontes de Miranda. Op. cit., p. 48-9). (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.546-47.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 15/01/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 1.446. Os animais da mesma espécie, comprados para substituir os mortos, ficam sub-rogados no penhor.

Parágrafo único. Presume-se a substituição prevista neste artigo, mas não terá eficácia contra terceiros, se não constar de menção adicional ao respectivo contato, a qual deverá ser averbada.

Sem muito se estender Venturini em seu comentário, conceitua o CC 1.446 estabelece que os animais comprados para substituir os mortos, ficam sub-rogados no penhor, mas que o mesmo não ocorrerá com os animais nascidos ou comprados se não houver desfalque no montante dado em penhor. Todavia, aduz o parágrafo único do mesmo, que só valerá contra terceiros se constar de menção adicional no contrato e estiver averbada à margem do registro. (Talita Pozzebon Venturini, artigo intitulado “Direitos reais de garantia: breve análise sobre penhor, hipoteca e anticrese”, publicado em outubro de 2015 no site Jus.com.br, acessado em 15.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Valorizando o trabalho, Loureiro cita na lição de Carvalho Santos, que o penhor pecuário tem a peculiaridade de aumento com as crias e diminuição com a morte ou extravio dos animais empenhados. No caso de penhor de um rebanho - animais da mesma espécie -, a natureza da universalidade de fato continua a mesma com os acréscimos e diminuições, porque é considerado como um todo. Claro que os novos animais devem ser da mesma espécie e qualidade dos originais, para integrar o rebanho (Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1953, v. X, p. 187). A regra vale somente para os animais fungíveis, jamais para os animais infungíveis e empenhados como tais, como campeões ou reprodutores. A regra é a de que o penhor se estende, independentemente de convenção expressa entre as partes, sobre os novos animais comprados ou nascidos para substituir os mortos ou extraviados.

Há sub-rogação real presumida dos animais originais para os novos animais. A presunção é relativa e pode ser destruída por prova em sentido contrário, a cargo do devedor pignoratício, ou terceiro prestador da garantia real. A presunção da sub-rogação real se limita às partes, mas não tem eficácia frente a terceiros, antes de aditado o contrato, a ser averbado no registro imobiliário. Indaga-se a razão pela qual deve ser o contrato aditado, diante da presunção de eficácia entre as partes. Isso se dá porque o registrador imobiliário não pode efetuar a averbação sem título escrito. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.548.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 15/01/2021. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Sem maior comentário, Ricardo Fiuza propõe a sub-rogação somente se dar em relação aos animais mortos. Na hipótese de substituição , esta deverá constar do registro para ter validade erga omnes. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 738, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 15/01/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Da mesma forma, simplificando o comentário, para os autores Guimarães e Mezzalira, a sub-rogação no penhor dos animais comprados para substituir os mortos ocorre de forma automática, sendo que a eficácia contra terceiros depende de aditamento ao contrato, que deverá ser averbado, o que evita a ocorrência de fraude. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.446, acessado em 15.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).