segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 639, 640, 641 - Continua - Do Depósito Voluntário- VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 639, 640, 641 - Continua
- Do Depósito Voluntário- VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo IX – Do Depósito -
(art. 627 a 652) Seção I – Do Depósito voluntário –
vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 639. Sendo dois ou mais depositantes, e divisível a coisa, a cada um só entregará o depositário a respectiva parte, salvo se houver entre eles solidariedade.

No dizer de Nelson Rosenvald, a regra é desnecessária, pois as suas conclusões emanam de diretrizes da Teoria Geral das Obrigações, sem que exista nenhuma adaptação que justifique disciplina pormenorizada no contrato de depósito.

Destarte, quando o objeto do depósito for divisível por natureza, i.é, aquele que possa ser fracionado sem perda da substância ou do valor, o depositário restituirá a respectiva parte a cada um dos depositantes. Por mais que o artigo adote a expressão “e divisível a coisa”, não é possível restringir a dicção do texto aos casos de indivisibilidade por natureza, pois deverá o depositário atentar às hipóteses de indivisibilidade em razão da lei ou da convenção (CC 88), fatos que impedirão o fracionamento do débito.

Há que recordar que em qualquer hipótese de indivisibilidade da obrigação, com pluralidade de credores (depositantes), o devedor não poderá entregar o objeto a um só – pois poderá ser novamente cobrado pelos demais -, mas a todos conjuntamente, exceto se aquele que recebeu oferecer caução de ratificação dos outros credores (CC 260).

Caso exista a solidariedade, seja por convenção, seja por imposição da norma, o devedor somente se exonerará se restituir a integralidade da coisa a um só, ou conjuntamente. Não se esqueça de que na dúvida sobre o significado de cláusulas contratuais inexiste solidariedade, pois ela não se presume, já que impõe um agravamento de responsabilidade do devedor (CC 265). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 665 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 02/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Apresenta-se na doutrina de Ricardo Fiuza, segundo Naúfel, existindo pluralidade de depositantes e podendo a coisa depositada “partir-se em porções reais e distintas formando cada qual um todo perfeito (José Naúfel. Novo dicionário jurídico brasileiro, 7. ed., São Paulo, Parma, 1984, p. 485), o depositário terá a obrigação de restituir a cada um dos credores a respectiva cota, “salvo se houver entre eles solidariedade (...) ~ segundo a qual cada um dos credores solidários tem direito a exigir do devedor o cumprimento da prestação, por inteiro” (José Lopes de Oliveira. Contratos, 1. ed., Recife, Livrotécnica. 1978, p. 111).

O artigo trata de coisa divisível. Se, porém, indivisível for a coisa depositada, leciona, ainda, Lopes de Oliveira, no sentido de que os depositantes devem acordar no modo de recebe-la e, não havendo acordo, defere-se a solução do juiz” (ob. cit., p. 171). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 342 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 02/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Marco Túlio de Carvalho Rocha, no caso de duas ou mais pessoas realizarem depósito de bem divisível, em consonância com o CC 257, presume-se a obrigação de restituir dividida em tantas obrigações, iguais e distintas, quantos os depositantes, salvo se entre estes houver solidariedade, o que depende de cláusula expressa. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 02.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 640. Sob pena de responder por perdas e danos, não poderá o depositário, sem licença expressa do depositante, servir-se da coisa depositada, nem a dar em depósito a outrem.

Parágrafo único. Se o depositário, devidamente autorizado, confiar a coisa em depósito a terceiro, será responsável se agiu com culpa na escolha deste.

Complementando o enunciado do CC 627, na visão de Nelson Rosenvald, temos aqui uma especificação da própria natureza desse negócio jurídico. Não se confunda custódia com exploração econômica. Ao contrário do comodato e da locação, no depósito o possuidor recebe a coisa para guardar e não para usar e fruir, sob pena de responsabilidade contratual (CC 389). Naqueles contratos, a relação jurídica é estabelecida no interesse precípuo de quem recebe a coisa, portanto a guarda da coisa é pressuposto para a sua utilização; já no depósito o interesse é do credor, que exige cuidados de proteção e conservação da coisa. A guarda não é um meio, mas a própria finalidade do negócio jurídico.

Todavia, se houver licença expressa do depositante, permite-se ao depositário a fruição da coisa e mesmo a possibilidade de estipulação (espaço excedente) de subcontratação com terceiro, sem que se desnature o depósito. Cuida-se de medida excepcional, eis que desafia a natureza intuitu personae inerente à relação de confiança que justificou a realização do contrato com a pessoa do depositário.

Como adverte o parágrafo único, tanto os danos causados ao objeto pelo terceiro como a sua recusa em restituir a coisa implicarão responsabilidade do depositário. De fato, pune-se a lesão à legítima expectativa e à confiança do depositante quanto à diligência do depositário ao incumbir a guarda da coisa a quem não oferecia condições para tanto. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 665-666 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 02/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo a percepção na doutrina do Ricardo Fiuza, diversamente do contrato de comodato, pelo qual móvel ou imóvel infungível, para que dele se utilize temporariamente, o contrato de depósito caracteriza-se simplesmente pela entrega de certo objeto móvel pelo depositante ao depositário, para que este temporariamente o guarde e o conserve.

De tal ordem, a norma impede ao depositário o uso e gozo da coisa depositada, salvo prévia e expressa autorização do depositante. Essa licença, todavia, não desnatura a sua qualidade de depositário. Afrontando o caráter volitivo negativo do depositante, responderá o depositário por perdas e danos oriundos de seu ato de servir-se do depósito.

É vedado ao depositário dar a coisa depositada em depósito a terceiro. o contrato de depósito voluntário é intuitu personae, i.é fundado na confiança de que o depositante confere a certo depositário, e disso decorre o óbice legal. Porém, permitindo expressamente o depositante, poderá o depositário confiar a coisa a outrem, ficando responsável, entretanto, se agiu com culpa na escolha deste. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 342 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 02/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o contrato de depósito de coisa infungível visa à guarda da coisa. A guarda não inclui o direito de uso. A utilização da coisa infungível pelo depositário depende de autorização expressa do depositante.

O contrato de depósito é intuitu personae, pois pressupõe a confiança do depositante no depositário. Não pode, por isso, o depositário se fazer substituir por terceiro, salvo autorização expressa do depositante. Se for autorizado a confiar a guarda da coisa a terceiro, ficará responsável o depositário por culpa in elegendo, i.é, se escolher mal a pessoa a quem confiou a guarda da coisa. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 02.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 641. Se o depositário se tornar incapaz, a pessoa que lhe assumir a administração dos bens diligenciará imediatamente restituir a coisa depositada e, não querendo ou não podendo o depositante recebe-la, recolhê-la-á ao Depósito Público ou promoverá nomeação de outro depositário.

Na esteira de Nelson Rosenvald, cuida a norma em epigrafe da incapacidade superveniente do depositário. Caso ele seja absoluta, ou relativamente incapaz (CC 3º e 4º) ao tempo da contratação, a sanção será a invalidade do negócio jurídico, por nulidade ou anulabilidade, conforme o grau de incapacidade (CC 104).

Pelo fato de não existir no ordenamento a figura da “invalidade superveniente” – pois a validade do negócio é aferida ao tempo de sua origem -, a perda da capacidade pelo depositário acarretará a resolução do negócio jurídico, afetando o plano de eficácia da relação contratual, eis que haverá a ineficácia superveniente do negócio jurídico.

Sendo a capacidade a regra e a incapacidade a exceção, haverá necessidade de prolação de sentença em processo de interdição, com imposição de curatela, a teor do CC 1.767. por mais que os limites da curatela sejam variáveis em função da concretude do caso (CC 1.772), a norma em comento não opera nenhuma distinção entre a extinção do contrato pelo maior ou menor grau da interdição, pois ambos conduzem à resolução.

Quanto aos efeitos do contrato produzidos antes da interdição, parece-nos que apenas serão cancelados se o depositante já sabia do estado do interditado e este sofreu prejuízo com o negócio jurídico. Explico: a sentença de interdição é constitutiva, pois não é ela que cria a doença, mas altera o status da pessoa. Assim, para evitar insegurança jurídica, só operará efeitos retroativos quando da leitura das cláusulas contratuais for possível observar que o contratante agiu de má-fé para tirar proveito da especial situação da outra parte.

A consequência da interdição para o presente contrato será a imediata restituição da coisa ao depositante pelo curador do depositário, pois a função deste é personalíssima e não poderá ser exercitada pela pessoa nomeada pelo magistrado para administrar o seu patrimônio. Porém, sendo inviável a restituição, pela impossibilidade voluntária ou fática do depositante de aceitar a coisa antes do prazo, não haverá outra saída a não ser a consignação em pagamento, mediante recolhimento da coisa ao depósito público ou, se não houver, a nomeação judicial de depositário.

Contudo, abre-se ainda ao curador do interditado a opção de nomear um novo depositário. I.é, detém o curador o direito potestativo de desconstituir a relação jurídica mediante devolução do objeto ou a possibilidade de eleição de uma pessoa capacitada a assumir o contrato, com as consequências dispostas na parte final do parágrafo único do CC 640, mesmo que não necessite o curador de autorização do depositante para designar o sucessor do incapaz. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 666 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 02/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

No comentário de Ricardo Fiuza, pela norma prevista, se durante a vigência do contrato de depósito, o depositário se tornar incapaz, cumprirá ao administrador dos seus interesses restituir, imediatamente, a coisa ao depositante. Darcy Arruda Miranda, comentando o artigo, afirma que “a incapacidade superveniente resolve o contrato de depósito” (Anotações ao Código Civil brasileiro. 4. <1. São Paulo, Saraiva, 1995, v. 3, p. 365). É que, sobrevindo-lhe a incapacidade, o depositário incapaz não mais poderá “responder como o depósito” (Washington de Barros Monteiro, Curso de direito civil, 4. ed., São Paulo Saraiva, 1965, v. 2 – Direito das obrigações, p. 237). Ademais, assiste tal determinação o fato de ser o depósito voluntário intuitu personae.

Numa variante, diante da recusa do depositante em receber a coisa, por não querer ou por não poder, competirá ao administrador dos bens providenciar o seu imediato recolhimento ao Depósito Público ou a nomeação de outro depositário. Vale considerar, no segundo caso, que não há previsão de culpa do depositário, na hipótese aqui versada, diferentemente do ato de confiar a coisa em depósito a terceiro, por licença expressa do depositante, conforme estabelece o parágrafo único do CC 640. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 342 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 02/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Como leciona Marco Túlio de Carvalho Rocha, por ser contrato personalíssimo, o intuitu personae, a incapacidade ou a morte do depositário extinguem o contrato, devendo a coisa ser restituída ao depositante. Se este não puder ou não quiser recebê-la, o representante ou sucessor do depositário a recolherá ao depósito público ou promoverá a nomeação de outro depositário. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 02.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).