Direito Civil Comentado – Art.
1.599, 1.600, 1.601
Da Filiação - VARGAS, Paulo S. R.
-
Parte Especial – Livro
IV – Do Direito de Família –
Subtítulo
II – Das Relações de Parentesco – Capítulo II
Da
Filiação - (Art. 1.596 a 1.606) –
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Em sua obviedade, mostra-se contundente o autor Milton Paulo de Carvalho Filho ao afirmar: Se na época provável da concepção o cônjuge estava impotente para gerar, não pode prevalecer a presunção de que era pai da criança nascida de sua esposa. A impotência coeumdi acarreta presunção da impossibilidade para gerar, pois se caracteriza pela impossibilidade de cópula. Métodos científicos modernos, porém, permitem que seja extraído sêmen do homem para fins de inseminação artificial. A impotência denominada generandi é a que impede a inseminação de modo absoluto. Ela pode resultar da cirurgia de vasectomia ou de fatores físicos, mas não é incompatível com a realização do ato sexual. O dispositivo contempla, portanto, toda hipótese em que se demonstrar a absoluta impossibilidade de gerar na época da concepção, sem distinguir entre uma e outra espécie de impotência (Chinelato, Silmara Juny. Comentários ao Código Civil. São Paulo, Saraiva, 2004, v. XVIII, p. 63). Não se aplica a disposição aos casos em que o marido registra filho em seu nome sabendo que não é pai biológico, pois nesse caso não poderá, posteriormente, contestar a paternidade assumida espontaneamente (op. cit., p. 63). (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.759. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 31/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).
Historicamente, a primeira versão deste artigo aprovada pela Câmara dos Deputados mantinha praticamente o mesmo texto do projeto, e dizia: “a prova da impotência do cônjuge para gerar, à época da concepção, ilide a presunção da legitimidade do filho”. Foi posteriormente emendado pelo Senado Federal, não sofrendo, a partir dali, qualquer outra modificação.
Em sua Doutrina aquiesce que a substituição da expressão “legitimidade” por “paternidade” está adequada à Constituição Federal, cujo Art. 227, § 6º, veda as designações discriminatórias no âmbito da filiação.
• A impotência coeundi é a “incapacidade para o coito”, e a impotência generandi é a “infecundidade ou incapacidade para gerar” (v. Maria Helena Diniz, Código Civil anotado, São Paulo, Saraiva, 1995, p. 288).
• No Código Civil anterior, seu Art. 342 estabelecia que somente a impotência absoluta valia como alegação contra a legitimidade do filho, de modo que para ser alegada em contestação de paternidade deveria ser total; se relativa, não poderia ser aceita como alegação contrária à paternidade do filho (v. Maria Helena Diniz, Código Civil anotado, cit., p. 288). No artigo em análise a impotência generandi ilide a presunção da paternidade, não sendo mais necessário que seja absoluta, o que reflete o avanço das provas técnicas existentes para a demonstração da filiação, dentre as quais se destaca o exame de DNA. O artigo não refere a impotência coeundi porque, em razão das novas técnicas de reprodução artificial, pode ela existir sem que haja a impotência generandi. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 815, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 31/03/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
No comentário de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o direito reconhece dois tipos de impotência: impotentia coeundi e impotentia generandi. A primeira é a impotência para a prática do ato sexual e corresponde ao que contemporaneamente e na linguagem natural se reconhece como impotência. A impotentia generandi é correnspondente ao que se denomina usualmente infertilidade.
O dispositivo de origem antiga pressupõe que a pessoa infértil na época da concepção não pode ter sido responsável por ela, ilidindo o vínculo biológico. A regra perdeu eficácia, uma vez que modernamente inventaram-se métodos que permitem a conservação de gametas, tanto masculinos quanto femininos, a fim de possibilitar que o doador possa gerar mesmo quanto venha a se tornar infértil, mediante reprodução assistida. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud Direito.com, comentários ao CC 1.599, acessado em 31.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 1.600. Não basta o adultério da mulher, ainda que confessado, para ilidir a presunção legal da paternidade.
Pouco a ser comentado, nas palavras de Milton Paulo de Carvalho Filho o adultério não exclui a presunção de paternidade em qualquer circunstância, pois, a despeito de sua ocorrência, subsiste a possibilidade de o cônjuge ser o pai da criança gerada pela esposa adúltera. Contudo, não se questiona que o adultério comprovado lança dúvidas sobre a paternidade do marido. Haverá, sempre, que se verificar se a mulher mantinha dupla vida sexual. Do contrário, se a mulher estiver separada de fato do marido, o adultério exclui a presunção de paternidade deste, embora, no caso de rompimento do primeiro relacionamento, não se possa falar, a rigor, em adultério. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.759. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 31/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).
Historicamente, no texto original do projeto, o artigo fazia referência à “legitimidade da prole”. Durante a tramitação no Senado o artigo foi alterado, substituindo-se “legitimidade” por “paternidade” e não sofrendo, a partir dali, qualquer outra modificação.
Doutrinariamente, buscando o comentário de Ricardo Fiuza • Não faz qualquer sentido, diante de adultério da mulher, manter-se a presunção da paternidade do marido, no sistema atual, em que a ação contestatória da paternidade pode ser interposta a qualquer tempo pelo marido (CC 1.601), prestigiando-se a verdade real nas relações de filiação. Restringir a impugnação à paternidade, mantendo a presunção de que o filho nascido é do marido, diante de prova do adultério da mulher, importa em violação ao ideal constitucional de que as relações de parentesco baseiem-se na verdade e não mais em ficções jurídicas (v. Regina Beatriz Tavares da Silva, Reflexões sobre o reconhecimento da filiação extramatrimonial, Revista de Direito Privado, coord. Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, São Paulo, Revista dos Tribunais, v. 1, jan./mar. 2000, p. 73-6). Cite-se, a propósito, acórdão do STJ, rel. M. Eduardo Ribeiro, Dl de 14-6-1999, p. 188, segundo o qual “As normas jurídicas hão de ser entendidas, tendo em vista o contexto legal em que inseridas e considerando os valores tidos como válidos em determinado momento histórico.
Não há como interpretar-se uma disposição, ignorando as profundas modificações por que passou a sociedade, desprezando os avanços da ciência e deixando de ter em conta as alterações de outras normas, pertinentes aos mesmos institutos jurídicos”. Refira-se outro julgado do STJ, em Lex — Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, 32/159, segundo o qual, “Na fase atual da evolução do Direito de Família, é injustificável o fetichismo de normas ultrapassadas em detrimento da verdade real, sobretudo quando em prejuízo de legítimos interesses de menor. Deve-se ensejar a produção de provas sempre que ela se apresentar imprescindível à boa realização da justiça”. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 815-16, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 31/03/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Segundo Marco Túlio de Carvalho Rocha, esta é outra regra antiga, que diz respeito à fixação da paternidade segundo o vínculo biológico e, tanto quanto outras regras que visam a solucionar dúvidas quanto à atribuição da paternidade com base no vínculo biológico, perdeu significado com a facilitação da prova do vínculo biológico.
Os filhos nascidos do casamento são, presumivelmente, do marido da mulher. Somente a prova técnica ilide essa presunção. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud Direito.com, comentários ao CC 1.600, acessado em 31.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 1.601. Cabe ao marido o direito de contestar a paternidade dos filhos nascidos de sua mulher, sendo tal ação imprescritível.
Parágrafo único. Contestada a filiação, os herdeiros do impugnante têm direito de prosseguir na ação.
Segundo estudos de Milton Paulo de Carvalho Filho, restringe-se ao marido o direito de contestar a paternidade dos filhos nascidos de sua mulher, mas, uma vez contestada judicialmente, seus herdeiros podem prosseguir na demanda. Como registra Paulo Luiz Netto Lobo, “ninguém, nem mesmo o filho ou a mãe, poderá impugnar a paternidade. A norma, assim lida em conformidade com a Constituição, desloca a paternidade da origem genética para a paternidade socioafetiva” (Código Civil comentado. São Paulo, Atlas, 2003, p. 73). Silmara Juny Chinelato anota que o pai que espontaneamente reconhece filho que sabe não ser seu não poderá contestar a paternidade (Comentários ao Código Civil. São Paulo, Saraiva, 2004, v. XVIII, p. 66), salvo se comprovar que foi induzido em erro ou se agiu mediante dolo ou coação. Acrescente-se que também não basta a demonstração de que o marido não é o pai biológico: deve-se, ainda, provar que não se estabeleceu a paternidade socioafetiva (Lobo, Paulo Luiz Netto. Op. cit., p. 76-7).
Por outro lado, o presente dispositivo estabelece a imprescritibilidade da ação de contestação de paternidade, na medida em que envolve direitos da personalidade. Sobre a matéria, Silmara Chinelato pondera: “Tratando-se de estabelecimento de paternidade, é curial que a socioafetiva prevaleça em relação à biológica, determinando que o pai socioafetivo não tenha interesse algum em contestá-la. Os outros filhos - se houver - podem ter interesse patrimonial em fazê-lo, ao excluir um herdeiro, aumentando o quinhão na herança. Porque não sou contra o conteúdo do CC 1.601 e apenas lhe dou interpretação restrita, penso que o legislador andou bem ao estabelecer como personalíssimo o direito de ingressar com a ação negatória de paternidade, quando cabível. Resta aos herdeiros apenas prosseguir como autores, se falecer o impugnante no curso da ação. Não têm, no entanto, legitimidade para interpô-la em nome próprio e por direito próprio” (op. cit., p. 68).
A III Jornada de Direito Civil do Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal firmou o entendimento no sentido de que “não cabe a ação prevista no CC 1.601 se a filiação tiver origem em procriação assistida heteróloga, autorizada pelo marido nos termos do inciso V do CC 1.597, cuja paternidade configura presunção absoluta” (Enunciado n. 258).
A ação de contestação da paternidade é imprescritível, tanto quanto a de investigação de paternidade, como consignado na Súmula n. 149 do STF. Os herdeiros do marido não estão autorizados a propor a ação de contestação, mas apenas a prosseguir na que ele já houver proposto, o que significa que só poderão fazê-lo em caso de óbito daquele, pois “o direito brasileiro não admite herança ou herdeiros de pessoas vivas” (Lobo, Paulo Luiz Netto. Op. cit., p. 74-5). Levando em conta que a paternidade biológica pode inexistir, mas, em virtude de se estabelecer a paternidade socioafetiva - e sendo a questão vinculada a aspecto íntimo da família -, a contestação da paternidade não é admitida para o pai biológico (idem). A concepção do filho que se fizer por uma das formas previstas no CC 1.597 não admite a contestação da paternidade, a não ser que fique comprovado que o profissional ou o hospital utilizaram sêmen que não era do marido.
Na lição de Paulo Luiz Netto Lobo, o estado de filiação nada tem a ver com o direito ao conhecimento da origem genética, questão ligada ao direito da personalidade (op. cit., p. 78). Para a tutela do direito de conhecer a origem genética não há necessidade de alterar a paternidade que resulta da relação social e afetiva estabelecida entre pai e filhos ou filhas.
O dispositivo em exame não se aplica às uniões estáveis, nas quais o reconhecimento da paternidade resulta do ato espontâneo de cada companheiro. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.760. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 31/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).
No histórico que acompanha os comentários a respeito do artigo, o presente dispositivo, no texto original do projeto, mantido inicialmente pela Câmara dos Deputados, correspondia a dois artigos: “Art. 1.610. Cabe ao marido o direito de contestar a legitimidade dos filhos nascidos de sua mulher. § 1º Decairá desse direito o marido que, presente à época do nascimento, não contestar, dentro em dois meses, a filiação. § 2º Se o marido se achava ausente, ou lhe ocultaram o nascimento, o prazo para repúdio será de três meses, contado do dia de sua volta à casa conjugal, no primeiro caso, e da data do conhecimento do fato, no segundo”. E “CC 1.611. Contestada a filiação, na forma do artigo precedente, passa aos herdeiros do marido o direito de tornar eficaz a contestação”. Durante a passagem pelo Senado Federal foi acrescentado um parágrafo ao então art. 1.610 e transformado o então art. 1.611 em parágrafo do 1.610, passando a redigir-se o dispositivo fundido da seguinte forma: “Art. (...) Cabe ao marido o direito de contestar a paternidade dos filhos nascidos de sua mulher. § lº Decairá do direito o marido que, presente à época do nascimento, não contestar a filiação no prazo de sessenta dias. § 2º Se o marido se achava ausente ou lhe ocultaram o nascimento, o prazo para repúdio será de noventa dias, contado do dia de sua volta ao lar conjugal, no primeiro caso, e do de conhecimento do fato, no segundo. § 3º Contestada a filiação, os herdeiros do impugnante têm direito de prosseguir na ação”. Retornando, em seguida, o projeto à Câmara, promoveu o Deputado Ricardo Fiuza completa reformulação no dispositivo, tornando a ação negatória de paternidade imprescritível, proposta que restou acolhida em definitivo.
Defendeu o Relator Parcial, Deputado Antonio Carlos Biscaia, que “as inovações constitucionais sobre o reconhecimento da filiação têm como suporte a busca da verdade real, motivando o entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido da imprescritibilidade das ações relativas à filiação, incluindo nestas a negatória de paternidade. Tal entendimento leva à tese de que estariam revogados os dispositivos legais que estabeleciam prazos para o exercício desses direitos. Neste sentido, compreende-se a natureza do estado de família, no qual se enquadra J da filiação, como de ordem pública, não devendo comportar relações fictícias, salvo na hipótese de adoção.
• A legislação anterior (Código Civil, arts. 340 e 178, § 4º) estabelecia regras limitativas à contestação da paternidade dos filhos pelo marido, tanto no que se referia às causas dessa contestação como no que dizia respeito ao prazo prescricional, extremamente exíguo, de dois a três meses. Na última fase de tramitação, o novo Código recebeu relevante modificação, baseada nas inovações constitucionais sobre as relações de filiação, que têm como suporte a busca da verdade real e não mais relações fictícias, salvo na hipótese da adoção. Somente com esse sentido compreende-se a natureza do estado de filiação. Sob á égide da legislação anterior, foi editada a Súmula 149: “É imprescritível a ação de investigação de paternidade, mas não o é da petição de herança”. Então, se é imprescritível a investigação de paternidade, também deve sê-lo a ação negatória da paternidade. A regra deveria, como sugeriu-se, ser adaptada à legislação superveniente, que reconhece o direito ao reconhecimento da paternidade como direito personalíssimo, indisponível e imprescritível (Lei n. 8.069/90, art. 27).
• Embora o direito à contestação da relação de filiação não possa caber, indiscriminadamente, a qualquer pessoa, se o filho é oriundo de casamento esse direito não deve ser tido como privativo do marido. Observe-se que, com a proteção à união estável, não tem cabimento estabelecer tamanha restrição à legitimidade da ação contestatória no casamento e não realizar as mesmas restrições na união estável. Esse direito, seja a relação oriunda ou não de casamento, além de ser imprescritível, deve caber não só àquele que consta do registro de nascimento como pai, mas, também, ao próprio filho e ao verdadeiro pai, em acatamento aos princípios constitucionais da absoluta igualdade entre os filhos e da verdade real nas relações de filiação. Por essas razões a norma sugerida diz respeito à relação de filiação, independentemente de sua origem. A única exceção disposta no artigo sugerido a seguir diz respeito à filiação oriunda de adoção, que não pode ser contestada, por força de seu caráter irrevogável.
Constitui violação aos direitos da personalidade constranger alguém a fornecer material para a realização de um exame biológico? A questão coloca-se com certa frequência em nossos tribunais na investigação da paternidade, como adiante será visto, mas também tem lugar na ação contestatória . Realmente não é possível constranger alguém à retirada de parte de seu corpo, no caso o sangue, sob pena de violação a direito da personalidade. Mas também não se pode deixar de proteger os interesses do contestante, que dependem da realização da prova para o reconhecimento de suas alegações. A Única forma de conciliar o direito da personalidade do demandado, que é o direito às partes separadas do corpo, com o direito do autor da ação contestatória, diante da recusa do primeiro à coleta de material para realização da prova pericial, é presumir-se, se a recusa for injustificada, a inexistência da relação de filiação. Já que a recusa pode ocorrer quanto a qualquer das provas médico-legais, que não se limitam ao exame de DNA, o dispositivo aplica-se a todos esses meios de prova.
• Sugestão legislativa: Em face dos argumentos acima aludidos, encaminhou-se ao Deputado Ricardo Fiuza sugestão para alteração deste artigo, o qual, uma vez aprovada a proposta pela Câmara dos Deputados, passaria a redigir-se:
Art. 1.601. O direito de contestar a relação de filiação é imprescritível e cabe, privativamente, às seguintes pessoas:
I — ao
filho;
II —
àqueles declarados como pai e mãe no registro de nascimento;
III — ao pai e à mãe biológicos.
1º
Contestada a filiação, os herdeiros do impugnante têm direito de prosseguir na
ação.
2º A
relação de filiação oriunda de adoção não poderá ser contestada.
3º A
recusa injustificada à realização das provas médico-legais acarreta a presunção
da inexistência da relação de filiação. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 816-17, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed.,
São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 31/03/2021, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Extenso e profundo é o comentário do Mestre Marco Túlio de Carvalho Rocha: 1. Desde o Código Civil de 1916, a técnica utilizada pelo legislador brasileiro para equilibrar os elementos que constituem a filiação (biológico, social e afetivo) consiste na limitação do direito de impugnar o vínculo de filiação ao estabelecer (a) prazos decadenciais para o exercício do direito, (b) restringir a legitimidade para o ajuizamento da ação, (c) restringir os meios de prova.
Há consenso no sentido de que as restrições relativas a elementos probatórios foram revogadas pela Constituição de 1988 e pela legislação posterior; as mantidas pelo Código de 2002 devem ser consideradas arbitrárias e, portanto, inconstitucionais, em razão do surgimento da técnica de exame do DNA. São elas: CC 1.598, CC 1.599 (impotência), CC 1.600 (adultério), CC 1.602 (confissão da mulher).
Incidem na impugnação as técnicas do Direito Privado. Em outras palavras, vedada a retratação (o reconhecimento é irrevogável), a impugnação significa a possibilidade de se anular o ato de reconhecimento. A anulação do registro é mera consequência da referida nulidade.
A intervenção judicial é sempre necessária, nos termos do art. 113 da Lei n. 6.015/73, embora haja julgados em contrário.
Ação rescisória contra sentença que julgou procedente ação de investigação: “O exame de DNA realizado após a prolação da sentença é documento hábil a aparelhar a AR, como documento novo, considerando que os autos não revelaram desídia ou desinteresse total do réu-investigado na feitura do dito exame durante o curso regular do processo. A coisa julgada submete-se aos próprios comandos emergentes da lei, não sendo capaz de inibir o pedido rescisório, ancorado em exame de DNA realizado por ambas as partes e que afasta a paternidade anteriormente reconhecida” (TJMG – AR 352925-2/000, 3º G.C. Civ., Rel. Des. Célio Cesar Paduani, por maioria, DJMG, 08.10.2004, RBDFam 27/137).
Relativização da coisa julgada: “I – Não excluída expressamente a
paternidade do investigado na primitiva ação de investigação de paternidade,
diante da precariedade da prova e da ausência de indícios suficientes a
caracterizar tanto a paternidade como a sua negativa, e, considerando que,
quando do ajuizamento da primeira ação, o exame pelo DNA ainda não era
disponível e nem havia notoriedade a seu respeito, admite-se o ajuizamento de
ação investigatória, ainda que tenha sido aforada uma anterior com sentença
julgando improcedente o pedido.
II – (...)
III – A coisa julgada, em se tratando de ações de estado, como no caso de investigação de paternidade, deve ser interpretada modus in rebus. Nas palavras de respeitável e avançada doutrina, quando estudiosos hoje se aprofundam no reestudo do instituto, na busca sobretudo da realização do processo justo, ‘a coisa julgada existe como criação necessária à segurança prática das relações jurídicas e as dificuldades que se opõem à sua ruptura see explicam pela mesmíssima razão. Não se pode olvidar, todavia, que numa sociedade de homens livres, a Justiça tem de estar acima da segurança, porque sem Justiça não há liberdade” (STJ, 4ª T. REsp 226.436, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 28.06.2001). No mesmo sentido: TJMG, 5ª C. Cív., Ap. n. 0611.03.003.214-2, Rel. Des. Dorival Guimarães Pereira, j. 16.009.2004, por maioria, p. 08.10.2004, Minas Gerais.
“Na primitiva ação de investigação de paternidade proposta, a improcedência do pedido decorreu de confissão ficta pelo não-comparecimento da mãe do investigando à audiência de instrução designada. Considerando, assim, que a paternidade do investido não foi expressamente excluída por real decisão de mérito, precedida por produção de provas, impossível se mostra cristalizar como coisa julgada material a inexistência do estado de filiação, ficando franqueado ao autor, por conseguinte, o ajuizamento de nova ação. É a flexibilização da coisa Julgada” (STJ, REsp 427.117-MS, 3ª T., Rel. Min. Castro Filho, DJU, 16.02.2004).
“1. Tem-se por admissível ação negatória de paternidade, nada obstante tenha sido esta reconhecida mediante acordo realizado nos autos de investigatória proposta pelo investigante. Precedente. 2. Apelo provido. Maioria” (TJDF, Ap. Cív. N. 2002.07.1.005175-3, 3ª T., Rel. p/o ac. Des. Estevan Maia, DJU 12.05.2005, RBDFam 32/131).
“O direito do filho de buscar a paternidade real, com pedido de anulação retificação de registro de nascimento em caso de falsidade praticada pela mãe é imprescritível, não se aplicando o disposto no art. 178, § 9º, VI, do CC” (STJ) AgRg-REsp 440.472-RS, 3ª T., Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeira, DJU 19.05.2003; RBDFam 20/146).
“A regra que impõe ao perfilhado o prazo de quatro anos para impugnar o reconhecimento só é aplicável ao filho natural que visa a afastar a paternidade por mero ato de vontade, a fim de desconstituir o reconhecimento da filiação, sem buscar constituir nova relação” (STJ, REsp n. 242.486-MG, 3ª T., Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, DJU 25.02.2004; STJ, REsp. n. 259.768-RS, 4ª T., Rel. p/ o ac. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU 22.03.2004, RBDFam 23/123).
“A ação de investigação de paternidade, que significa o direito do filho a obter o verdadeiro pai, sempre foi imprescritível. Deferente é a situação de se impugnar o reconhecimento de paternidade, pura e simplesmente, sem envolver o direito de investigar o verdadeiro pai, ou seja, quando a impugnação não é instrumento ou decorrência da investigação. E, neste caso, a prescrição para a ação em que o filho nega o assentimento ao reconhecimento sempre foi de quatro anos” (TJMG, Ap. Cív., n. 1.0009.03.900.011-3/001, Rel. Des. Almeida Melo, j. 11.12.2003).
“Aplica-se o prazo decadencial previsto no Código Civil revogado, se o
direito do filho de impugnar o reconhecimento já estava extinto quando do
surgimento do Estatuto da Criança e do Adolescente (TJMG, Ap. Cív.,
1.000.00.348.900-2/00, Rel. Des. Dorival Guimarães Pereira, j. 16.10.2003).
2. Legitimidade ativa na ação para impugnar a paternidade de filhos
matrimoniais. Na vigência do Código Civil de 1916 a impugnação da paternidade dos
filhos matrimoniais era uma prerrogativa exclusiva do marido. A partir do
Estatuto da Criança e do Adolescente, entendeu-se que o próprio filho tornou-se
legitimado a impugnar sua paternidade, com base no artigo 27 do Estatuto. Não
se reconhece legitimidade a terceiros, ainda que possuam interesse econômico na
causa, como é o caso de herdeiros. O parágrafo único permite que os herdeiros
continuem, no entanto, a ação iniciada pelo próprio impugnante seja ele o pai
ou o filho. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e
Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud Direito.com,
comentários ao CC 1.601, acessado em 31.03.2021, corrigido e aplicadas as
devidas atualizações VD).