terça-feira, 23 de março de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.584 Da Proteção da Pessoa dos Filhos - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.584

Da Proteção da Pessoa dos Filhos - VARGAS, Paulo S. R.

-  Parte Especial –  Livro IV – Do Direito de Família –

Capítulo XI – Da Proteção da Pessoa dos Filhos

– (Art. 1.583 a 1.590) - digitadorvargas@outlook.com  

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 Art. 1.584.  A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser: (Redação dada pela Lei nº 11.698, de 2008).

I – requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar; (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).

II – decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008). 

§ 1º. Na audiência de conciliação, o juiz informará ao pai e à mãe o significado da guarda compartilhada, a sua importância, a similitude de deveres e direitos atribuídos aos genitores e as sanções pelo descumprimento de suas cláusulas. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).

§ 2º. Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor. (Redação da  pela Lei nº 13.058, de 2014).

§ 3º. Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar, que deverá visar à divisão equilibrada do tempo com o pai e com a mãe. (Redação da  pela Lei nº 13.058, de 2014).

§ 4º. A alteração não autorizada ou o descumprimento imotivado de cláusula de guarda unilateral ou compartilhada poderá implicar a redução de prerrogativas atribuídas ao seu detentor. (Redação da  pela Lei nº 13.058, de 2014).

§ 5º. Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, deferirá a guarda a pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de preferencia, o grau de parentesco e a relações de afinidade e afetividade. (Redação da  pela Lei nº 13.058, de 2014).

§ 6º. Qualquer estabelecimento público ou privado é obrigado a prestar informações a qualquer dos genitores sobre os filhos destes, sob pena de multa de R$ 200,00 (duzentos reais) a R$ 500,00 (quinhentos reais) por dia pelo não atendimento da solicitação. (Redação da  pela Lei nº 13.058, de 2014).

Da mesma forma que apontou-se alterações nos comentários de Milton Paulo de Carvalho Filho, feito antes das modificações pelas Leis n. 11.698/2008 que alteraram consubstancialmente o artigo, que passou a regular a guarda unilateral e a compartilhada, introduzindo, pela primeira vez, previsão sobre esta no direito brasileiro; a Lei n. 13.058/2014, alterou os §§ 2º e 3º e incluiu o § 5º com o escopo de dar preferência à adoção da guarda compartilhada. Então, antes das reformas, o artigo em comento se apresentava dessa forma:

Art. 1.584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser: Caput com redação dada pela Lei n. 11.698, de 13.06.2008.

I - requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar; Inciso acrescentado pela Lei n. 11.698, de 13.06.2008.

II - decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe. Inciso acrescentado pela Lei n. 11.698, de 13.06.2008.

§ I° Na audiência de conciliação, o juiz informará ao pai e à mãe o significado da guarda compartilhada, a sua importância, a similitude de deveres e direitos atribuídos aos genitores e as sanções pelo descumprimento de suas cláusulas. Parágrafo acrescentado pela Lei n. 11.698, de 13.06.2008.

§ 2º Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que possível, a guarda compartilhada. Parágrafo acrescentado pela Lei n. 11.698, de 13.06.2008.

§ 3º Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar. Parágrafo acrescentado pela Lei n. 11.698, de 13.06.2008.

§ 4º A alteração não autorizada ou o descumprimento imotivado de cláusula de guarda, unilateral ou compartilhada, poderá implicar a redução de prerrogativas atribuídas ao seu detentor, inclusive quanto ao número de horas de convivência com o filho. Parágrafo acrescentado pela Lei n. 11.698, de 13.06.2008. 

§ 5º Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, deferirá a guarda à pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade. Parágrafo acrescentado pela Lei n. 11.698, de 13.06.2008.

Segundo parecer de Milton Paulo de Carvalho Filho, Como ressaltado no comentário do artigo anterior, a lei visou a assegurar o interesse dos filhos na questão relativa à sua guarda. O artigo trata da guarda dos filhos quando esta tiver de ser definida em ações consensuais e litigiosas. Possui regras de natureza material e processual. O dispositivo legal, assim como o anterior, afasta qualquer relação entre eventual culpa de um dos cônjuges pela dissolução da sociedade e a guarda dos filhos comuns, deixando claro que a guarda deverá ser compartilhada entre os pais, pois é a que mais atende os interesses dos filhos, ou ser atribuída àquele que revelar melhores condições - condição pessoal do guardião: capacidade material e moral para assistência e educação dos filhos - para exercê-la, considerando aqui também sempre prevalente o maior interesse da criança.

A guarda unilateral ou compartilhada pode ser requerida de comum acordo pelos pais, ou por qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar (inciso I). Nesta última hipótese, a ação cautelar de guarda terá por fim assegurar o resultado útil do processo principal, onde ela será decidida de forma definitiva, e se revestirá dos requisitos do fumus boni juris (demonstração do direito à guarda, decorrente, por exemplo, do poder familiar) e do periculum in mora (situação de risco de dano ao menor em caso de não concessão imediata da medida). Há, no entanto, necessidade de que o juiz aja com especial cautela na apreciação do pedido, uma vez que constantes modificações quanto à guarda provisória poderão prejudicar os interesses do menor. 

Não havendo consenso entre os pais sobre a guarda dos filhos, será aplicada pelo juiz, sempre que possível - à vista das circunstâncias do caso concreto - a guarda compartilhada (§ 2º), competindo a ele informar ao pai e à mãe o significado dessa modalidade de guarda, sua importância, a similitude de deveres e direitos atribuídos aos genitores e as sanções pelo descumprimento de suas cláusulas (§ Iº). Como afirmado no artigo anterior, o legislador instituiu a preferência pela guarda compartilhada, que somente deve ser afastada quando o melhor interesse dos filhos recomendar a guarda unilateral, tornando esta subsidiária em relação àquela. Paulo Lobo ensina que a guarda compartilhada tem as seguintes vantagens: “prioriza o melhor interesse dos filhos e da família, prioriza o poder familiar em sua extensão e a igualdade dos gêneros no exercício da parentalidade, bem como a diferenciação de suas funções, não ficando um dos pais como mero coadjuvante, e privilegia a continuidade das relações da criança com seus dois pais. Respeita a família enquanto sistema, maior do que a soma das partes, que não se dissolve, mas se transforma, devendo continuar sua finalidade de cuidado, proteção e amparo dos menores. Diminui, preventivamente, as disputas passionais pelos filhos, remetendo, no caso de litígio, o conflito conjugal para o âmbito original, que é o das relações entre os adultos. As relações de solidariedade e do exercício complementar das funções, por meio da cooperação, são fortalecidas a despeito da crise conjugal que o casal atravesse no processo de separação” (RBDFS 6/33, Magister).

Decidindo a guarda e considerando os interesses do menor, o juiz atentará para as necessidades específicas dele, e para a satisfatória distribuição de tempo necessário para que ele conviva com o pai e com a mãe (inciso II). Quanto à guarda compartilhada, a lei ainda dispõe que o juiz poderá valer-se de orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar (laudos elaborados pela equipe psicossocial do Poder Judiciário) para, convencendo os pais e superando seus conflitos, definir as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência (§ 3º). 

O descumprimento imotivado do deliberado pelo juiz importará restrições, quanto à guarda, ao desobediente (§ 4º). Esta sanção civil estabelecida pelo legislador contraria o princípio do melhor interesse do menor, podendo ampliar a alienação parental, no caso da guarda unilateral, ou comprometer a guarda compartilhada. Daí concluir com acerto o jurista anteriormente citado que a regra deve se restringir “à violação da cláusula de guarda, quando o genitor, sem justificativa razoável e de modo arbitrário, retiver o filho reiteradamente além de seu período de convivência, prejudicando o direito de convivência do outro. Ocorrências isoladas não devem ser consideradas, para que a justiça não se converta em arena de reabertura de conflitos. Em contrapartida, se o genitor reduzir o período de convivência, reiteradamente e sem motivo justificável, incorre em inadimplemento do dever jurídico correspondente, respondendo por danos morais” (LOBO, Paulo. Ob. cit., p. 25).

Sendo desaconselhável a permanência dos filhos em companhia de qualquer dos genitores, autoriza o disposto no § 5º do artigo em comento que o juiz confira a guarda a terceiro. O novo guardião, de notória idoneidade, deverá revelar compatibilidade com a função. Será escolhido pelo juiz, que levará em conta o seu grau de parentesco e a relação de afinidade e afetividade com os menores, consoante determina a lei especial (ECA, arts. 28 e ss.). O encargo, excepcionalmente, poderá recair sobre um terceiro não parente do menor. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.731-33.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 23/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Baseou-se em fonte mais recente os comentários de Marco Túlio de Carvalho Rocha. Direito anterior: O art. 326 do Código Civil de 1916 estabelecia que os filhos menores ficassem com o cônjuge inocente no desquite judicial; art. 10 da Lei n. 6.515/77 (Lei do Divórcio). Na redação original do Código Civil, o dispositivo determinava que a guarda dos filhos menores coubesse a quem tivesse melhores condições para exercê-la; a Lei n. 11.698/2008 alterou o artigo, que passou a regular o modo de determinação da guarda unilateral ou compartilhada; a lei n. 13.058/2014, alterou os §§ 2º, 3º, 4º e 5º e incluiu o § 6º com o escopo de dar preferência à adoção da guarda compartilhada. Quanto às referências normativas: Maior interesse da criança: art. 227 da Constituição da República; parentalidade responsável: art. 227, § 7º, da CEF; igualdade entre homens e mulheres: art. 5º da CEF; direito de visitas: CC 1.589; direito de ter o filho em sua companhia: CC 1.632; art. 33 a 35 da Lei n. 8.069 (Estatuto da Criança e do Adolescente); alienação parental: Lei n. 12.318/10.

1. Critérios para a fixação da guarda. O dispositivo estabelece o modo de se determinar a guarda dos filhos. A matéria encontra-se totalmente sob a incidência do princípio do maior interesse da criança, positivado pelo art. 227 da Constituição da República, que manda que se assegurem à criança e ao adolescente com absoluta prioridade o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Foi nesse sentido que o Código Civil de 2002 estabeleceu, na sua redação original, que a guarda deveria ser atribuída “a quem revelar melhores condições para exercê-la”.

A Lei n. 11.698/2008 alterou o artigo de modo a evidenciar a possibilidade de adoção da guarda compartilhada mediante acordo entre as partes ou por determinação judicial.

A Lei n. 13.058/2014 usou didaticamente a primazia que possui para concretizar preceitos constitucionais e indicou a guarda compartilhada como o modelo que corresponde ao maior interesse da criança. A primazia da lei, no caso, serve como propedêutica ao aplicador do direito. Não recusa amplitude ao princípio fundamental constitucional, mas propõe ao aplicador um procedimento de escolha conforme o estado atual da ciência. Nisto reside a constitucionalidade da indicação legal das espécies de guarda, que operacionalizou o princípio do maior interesse da criança e do adolescente e não o negou. Neste mesmo sentido é a lição de Waldyr Grisard Filho:

“Com o refinamento teórico que lhe é próprio, Carlos Eduardo Pianovski Ruzik assevera que a nova lei adota como premissa abstrata que a guarda compartilhada representa o melhor interesse da criança. Ou seja, o próprio legislador realizou a ponderação entre os modelos de guarda, sopeando suas vantagens e desvantagens, e ao final concluiu que a priori a guarda compartilhada é o modelo com maior aptidão para atender aos interesses dos filhos. Feita essa ponderação em âmbito legislativo, cumpre aos magistrados recebe-la e aplica-la, independentemente de suas concepções pessoais. A guarda compartilhada torna-se assim aprioristicamente obrigatória, justamente por representar o melhor interesse da criança ou do adolescente. Ao revés do que se tem pregado sobre a possível inconstitucionalidade da regra por não atender ao interesse dos filhos, em verdade a regra densifica tal princípio ao impor sua observância aos pais, mesmo que para tanto sejam forçados a um mínimo de diálogo com o outro genitor (Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. 8. Ed. São Paulo: RT, 2016, p. 224).”

O art. 2º do Código de Processo Civil consagra o princípio do dispositivo, que impede ao juiz a iniciativa processual. Seguindo esse princípio, os incisos I e II do CC 1.584 subordinam a regulação da guarda à existência de pedido das partes, mediante proposta de acordo ou processo litigioso. o pedido, consensual ou litigioso, obriga o juiz a buscar o maior interesse da criança ou adolescente nos termos da lei. Vale dizer: se as partes requererem o estabelecimento da guarda unilateral, o juiz deverá deferi-la nos termos do acordo, salvo se o genitor que a pretende não for apto ao exercício do poder familiar, hipótese em que outra solução poderá ser estabelecida; se as partes formularem pedido de guarda compartilhada, o juiz somente poderá negá-la com base em alguma das hipóteses previstas o § 2º do CC 1,584.

2. O caráter preferencial da guarda compartilhada. O § 2º do CC 1.584 estabeleceu uma presunção relativa de aplicabilidade da guarda compartilhada. A preferencia por ela visa a evitar os efeitos negativos frequentemente relacionados à guarda unilateral: a síndrome da alienação parental e o abandono afetivo.

O mesmo parágrafo sintetizou as três situações em que a guarda compartilhada não deve ser adotada:

a) quando houver acordo para o estabelecimento da guarda unilateral;

b) quando um dos genitores declarar que não deseja a guarda do menor; 

c) quando um dos genitores não for apto ao exercício do poder familiar.

A ausência de aptidão deve ser relacionar à prova de que o genitor não é capaz de assegurar o bem-estar do filho, seja por negligenciar os cuidados de que ele necessita, por agir com violência, submeter o menor a situações de isco para sua saúde física ou mental, ou cometer atos que configurem alienação parental, entre outros exemplo. Dificuldades financeiras e carência de recursos materiais somente são empecilho para o exercício da guarda se forem tais que ponham em risco a condição do menor e não exista a possibilidade de serem supridas mediante a fixação de alimentos.

Resta claro que não é mais necessário o acordo dos pais quanto ao exercício da guarda compartilhada. Ela pode ser decretada mesmo se for objeto de litígio ou se as partes litigarem quanto a qualquer outro direito. Tampouco é motivo para não se adotar o modelo o fato de as partes terem domicilio em municípios, estados ou mesmo países distantes. A esse respeito vale lembrar que o compartilhamento tem a função ideológica de incentivar o convívio do filho com o pai e com a mãe e que busca esse resultado por diversos mecanismos que vão além do convívio efetivo permanente com ambos. Além disso, se os pais forem domiciliados em locais distantes e não forem capazes de realizar acordo para o exercício da guarda compartilhada, pode o juiz estabelecer a residência habitual do filho, optando por maior tempo de convívio durante as férias e feriados ao genitor impedido de conviver com o filho nos demais períodos, em busca do equilíbrio possível.

Na falta, portanto, de restrições sérias contra um ou contra ambos os pais devidamente provadas a guarda compartilhada deve prevalecer.

3. Critérios de fixação do modo de exercício da guarda compartilhada. Como visto no número anterior, o § 2º do CC 1.584 estabelece critérios de escolha entre a guarda unilateral e a compartilhada. Uma vez que o caso deva ser submetido a esta, outras importantes opções devem ser tomadas, pois essa modalidade de guarda comporta muitas variações relativamente as atribuições dos pais, aos respectivos período de convivência e ao estabelecimento de uma residência habitual ou de referência para o menor.

Ao regular a guarda compartilhada, pela primeira vez a lei permitiu ao juiz, de ofício ou a requerimento das partes, fixar-lhes atribuições distintas. Na guarda unilateral, cabe precipuamente ao guardião decidir os assuntos de interesse do menor, restando ao não guardião o direito e dever de fiscalização. o CC 1.634 elenca as funções do poder familiar que permitem inferir as atribuições dos pais. Inúmeros são os arranjos dessas atribuições que podem ser estabelecidos no compartilhamento da guarda. O modo mais frequente é a omissão quanto a elas. Se não as regularem, ambos os pais mantêm poderes para realizar sozinhos todos os atos de interesse dos filhos à exceção daqueles para os quais a lei exige o consentimento de ambos os detentores do poder familiar. A decisão pode prever que a um dos pais toque o direito de escolha do estabelecimento de ensino em que o filho será matriculado, que o filho não seja matriculado em determinada escola, que frequente ou não determinada igreja, indicar a quem incumbirá o transporte do filho, autorizar genericamente que ele viaje ao exterior em companhia de apenas um dos pais com a dispensa da autorização específica para cada viagem, anuir genericamente quanto à mudança de residência do filho para outro município. Conferir a um dos pais o direito de administrar determinados bens do filho, obrigar que os genitores mantenham determinados serviços à disposição do filho enquanto este permanecer em sua companhia etc.

A decisão pode ou não regular os períodos de convívio do filho com os pais e, se o fizer, pode ou não estabelecer uma residência habitual ou de referencia. A não fixação é própria de situações amigáveis, consensuais. O litígio faz pressupor a necessidade de fixação judicial de situações amigáveis, consensuais. O litígio faz pressupor a necessidade de fixação judicial dos períodos de convívio e da residência habitual. 

A fixação das atribuições e do tempo de convívio de cada genitor com o filho segue o princípio do maior interesse da criança e do adolescente com a orientação legal de se buscar “divisão equilibrada do tempo com o pai e com a mãe”. A doutrina e a jurisprudência estrangeiras consideram equilibrada a divisão que garante aos pais um tempo de convívio mínimo equivalente a 35% do tempo total de convívio do filho. Para tanto, é natural que a compensação inclua um maior período de convívio nos períodos de férias, em fins de semana e em feriados a um dos guardiães.

Os Enunciados n. 603 e 604 da VII Jornada de direito Civil do Conselho da Justiça Federal alertam que o equilíbrio da divisão do tempo não significa igualdade de tempo nem guarda alternada.

Outros parâmetros são (MADALENO, Rafael; MADALENO, Rolf. Guarda compartilhada: física e jurídica. 2. ed. São Paulo: RT, 2016, p. 236-242): a) Idade: criança em tenra idade, até o início da atividade escolar, deve ficar por mais tempo com a mãe; b) Estado de saúde dos filhos; c) Irmãos de idade próxima devem ser mantidos unidos; d) Opinião dos filhos; e) Idoneidade da conduta dos pais; f) disponibilidade de tempo dos pais (cf. Enunciado n. 606 da VII Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal).

4. descumprimento de cláusulas relativas à guarda. O compartilhamento da guarda foi idealizado como forma de incentivo do contato do filho com ambos os pais, de modo a evitar danos que frequentemente decorrem da separação: a síndrome de alienação parental (SAP) e o abandono afetivo. 

A crítica ao instituto decorre, em sua maior parte, da incompreensão a respeito de seu funcionamento e do esquecimento das sanções que o garantem. O sistema tradicional, fundado na guarda unilateral, incentiva as partes ao litígio, pois estabelece a guarda como um prêmio àquela cuja honra resta menos abalada ao fim do processo. Visando à obtenção da guarda, as partes são induzidas a se atacar mutuamente. Por isso, a guarda unilateral é fonte de litígio, de beligerância, de conflitos e incompreensões. O entendimento doutrinário e jurisprudencial de somente estabelecer a guarda compartilhada na presença de consenso entre as partes é um incentivo ainda maior ao litígio, que passa a interessar sobremaneira a quem tem as maiores chances de obter a guarda unilateral. 

O arcabouço normativo da guarda compartilhada vai no sentido oposto: incentiva o compartilhamento conferindo aos interessados instrumentos jurídicos necessários à sua implementação tais como a possibilidade de divisão de atribuições e de realização de um plano de convivência, o uso da mediação, os conceitos de períodos de convívio, de residência habitual, entre outros. Além disso, estabelece sanções para o genitor que infringe as regras da guarda, ao cometer alienação parental ou abandono afetivo. 

A lei n. 12.318/2010 coíbe a alienação parental, caracterizada como a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente ou outros atos que visem ao repúdio do pai ou da mãe, tais como: desqualificar a conduta do genitor; dificultar o exercício da autoridade parental; dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; omitir informações relevantes sobre o filho, inclusive alterações de endereço; apresentar falsa denúncia contra o genitor ou seus familiares para obstar ou dificultar o convívio deles com os filhos.

Conforme o artigo 6º  da Lei 12.318/2010, o alienador fica sujeito a advertência, multa, submissão a acompanhamento psicológico ou biopsicossocial, alteração da guarda, determinação do domicilio do menor, suspensão da autoridade parental.

O § 4º do CC 1.584, com a redação que lhe deu a Lei n. 13.058/2014, ao prever que o descumprimento de deveres da guarda pode implicar a redução de prerrogativas de seu detentor fixou norma geral que incide sobre atos que configuram alienação parental ou abandono afetivo. 

Desse modo, a lei considera os efeitos práticos das sanções que ela própria estabelece e, ao fixar como padrão o compartilhamento da guarda, penaliza quem age no sentido de corromper os vínculos entre pais e filhos ao invés de premiá-lo como ocorre frequentemente quando se dá preferência à guarda unilateral. Com sabedoria salomônica, a lei incentiva as partes a compartilhar a guarda dos filhos sob pena de perde-la:

27 Respondeu, então, o rei: Dai à primeira o menino vivo, e de modo nenhum o mateis, ela é sua mãe.

28 E todo o Israel ouviu a sentença que o rei proferira, e temeu ao rei; porque viu que havia nele a sabedoria de Deus para fazer justiça.” (1 Reis 3,27-28). 

5. Inaptidão dos pais para o exercício da guarda. O critério para a fixação da guarda é sempre o do maior interesse da criança. Na concretização deste princípio, o legislador estabeleceu que a espécie de guarda que melhor o atende é a guarda compartilhada, quando os pais não coabitem. A guarda de filhos de pais separados somente não será compartilhada:  a) quando houver acordo para o estabelecimento da guarda unilateral; b) quando um dos genitores declarar que não deseja a guardo do menor; c) quando um dos genitores não for apto ao exercício do poder familiar.

Essas situações pressupõem que um dos genitores seja capaz de exercer a guarda. Se nenhum dos genitores for apto ao exercício da guarda, permite o § 5º que ela seja deferida a terceiros. Entre os terceiros, a lei estabelece preferência aos parentes, devendo-se levar em conta, igualmente, o grau de parentesco, a afinidade e a afetividade entre o postulante da guarda e o menor.

6. Dever de fiscalização da guarda unilateral. A destituição da guarda não priva qualquer dos pais do poder familiar, cujo exercício engloba o atributo de fiscalização das atividade do filho. O § 6º evidencia o dever de terceiros de prestar informações aos pais, sob pena de pagamento de multa nos limites estabelecidos. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.584, acessado em 23.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).