segunda-feira, 9 de agosto de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.860, 1.861 Da Capacidade de Testar - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.860, 1.861
Da Capacidade de Testar - VARGAS, Paulo S. R.
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m.me/DireitoVargas – Parte Especial –Livro V – Do Direito das Sucessões -
Título III – Da Sucessão Testamentária – Capítulo II
– Da Capacidade de Testar - (Art. 1.860 a 1.861)

 

Art. 1.860. Além dos incapazes, não podem testar os que, no ato de fazê-lo, não tiverem pleno discernimento. 

Parágrafo único. Podem testar os maiores de dezesseis anos. 

Este mecanismo, na voz do relator, diz neste artigo que, além dos incapazes, não podem testar os que, no ato de fazê-lo, não tiverem pleno discernimento. No parágrafo único antecipa para os dezesseis anos o começo da capacidade especial para outorgar testamento. Note-se: o que completou dezesseis anos está autorizado a fazer testamento, e não precisa da assistência do representante legal. O menor, no caso, age direta e pessoalmente (cf. BGB, art. 2.029, Art. 2).

Mencionando os incapazes, sem distinguir, estão abrangidos os absolutamente incapazes (art. 32) e os relativamente incapazes (art. 42). Trata-se de um equívoco, que precisa ser corrigido, sabendo-se que o testamento outorgado por incapaz é nulo de pleno direito. Não há razão para afirmar que os ébrios habituais, os viciados em tóxicos e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido sejam proibidos de testar, se, apesar de reduzido, tenham entendimento ou compreensão suficiente para saber o que estão fazendo no momento em que outorgam a disposição de última vontade. É uma questão de fato, a ser apurada em cada caso concreto.

O mesmo se pode dizer dos excepcionais, sem desenvolvimento mental completo. A fortiori, não há motivo para que o pródigo não possa testar. Aliás, entre os atos que o pródigo interditado não pode praticar sem assistência do curador, enumerados no CC 1.782, não figura o testamento. Carlos Maximiliano aponta que, pelo direito anterior (Ordenações, liv. 42, tít. 81, 4), o pródigo estava inibido de fazer disposições causa mortis, e que o projeto de Clóvis Beviláqua “não manteve uma tal velharia, que a ciência moderna repele”, concluindo que, embora interdito o perdulário, pode fazer testamento (Direito das sucessões, 5. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1964. v. 1, n. 331, p. 376).

O CC 1.860 precisa ser revisto, para evitar graves inconvenientes. O Código Civil de 1916, art. 1.627, indica, claramente, em quatro incisos, os incapazes de testar. O BGB, art. 2.229, diz que o menor de dezesseis anos tem capacidade testamentária, e que não pode testar quem, por causa de doença ou deficiência mental, ou perturbação da consciência, não estiver em condições de compreender o significado da declaração de vontade por ele emitida, ou de proceder de acordo com essa compreensão. O art. 591, aI. 2, do Código Civil italiano considera incapazes de testar os que não completaram a maioridade (dezoito anos), os interditados por enfermidade mental e os que, embora não interditados, provar-se que estão, por qualquer causa, mesmo transitória, incapacitados de entender e de querer no momento em que fizeram o testamento. O art. 2.189 do Código Civil português expõe que são incapazes de testar os menores não emancipados e os interditos por anomalia psíquica, acrescentando o art. 2.199, sob a rubrica “incapacidade acidental”, que é anulável o testamento feito por quem se encontrava incapacitado de entender o sentido da sua declaração ou não tinha o livre exercício da sua vontade por qualquer causa, ainda que transitória (ver, ainda, art. 663 do Código Civil espanhol; arts. 3.614 e 3.615 do Código Civil argentino e art. 467 do Código Civil suíço).

Com base na longa tradição de nosso direito, e com respaldo no direito comparado, conclui-se, com toda a segurança, que o que se requer, fundamentalmente, em matéria de capacidade testamentária ativa, é que o indivíduo possa exprimir livremente a sua vontade, que tenha compreensão , discernimento, que saiba, enfim, o que está fazendo. Em consequência de enfermidade ou doença mental, ou de moléstia que repercuta no cérebro, a pessoa pode ficar com a razão comprometida, o espírito intensamente debilitado, sem possibilidade de querer autonomamente, de perceber as situações, de avaliar o que ocorre no mundo exterior, não tendo liberdade para deliberar, não exercendo espontaneamente o seu querer, e este é pressuposto essencial em sede de testamentos. 

Todavia, não é qualquer enfermidade mental que provoca tão devastador efeito. Não é qualquer anomalia cerebral, não é qualquer psicopatia que exclui do indivíduo a capacidade testamentária. Se não tiver ocorrido interdição (CC 1.767, §§ 1º e 2º ), que implica presunção juris et de jure da incapacidade, cada situação concreta precisa ser analisada, avaliada e comprovada, para se concluir se, no momento em que fez o testamento, era o outorgante capaz, ou não (CC 1.861).

As causas que determinam a incapacidade são permanentes (doença mental grave, surdo-mudez que obsta totalmente a manifestação da vontade, anomalia psíquica que exclui o discernimento) ou transitórias (embriaguez completa, efeito de drogas, estado hipnótico).

Sugestão legislativa: Pelas razões antes expostas, ofereceu-se ao Deputado Ricardo Fiuza a seguinte sugestão legislativa: Art 1.860. Além dos absolutamente incapazes, não podem testar os que, no ato de fazê-lo, não tiverem o necessário discernimento. Parágrafo único (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 967-968, CC 1.860, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 09/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Eduarda Sousa Ferreira, em artigo publicado em maio de 2021, intitulado “Tudo o que você precisa saber sobre Testamentos”, dá uma panorâmica em rápidas pinceladas apontando o artigo em comento, CC 1860, esclarecendo o assunto com questões evidentes.

Afinal o que é um testamento? Testamento é o instrumento pelo qual uma pessoa capaz pode dispor de seus bens, ou de parte deles para depois de sua forma, ou seja, é o ato de última vontade do "de cujus", porém como no direito nada é extremo, devem ser obedecidas algumas disposições legais para a realização de um testamento.

 

Segundo disposição legal do CC 1860 a capacidade para testar se inicia aos dezesseis anos completos, outras disposições legais que devem ser obedecidas para a elaboração de qualquer testamento são: a legítima dos herdeiros necessários deve ser preservada, o que isso que dizer? se o testador possuir herdeiros necessários (descendentes, ascendentes e cônjuge) só poderá dispor de 50% de seus bens em testamento, sendo o outros 50% obrigatoriamente herança de seus herdeiros necessários.

 

E se não houverem herdeiros necessários, neste caso sim, o testador poderá dispor da totalidade de seus bens em testamento. Ainda sobre a capacidade para testar é importante ressaltar que devem ser maiores de dezesseis anos relativamente capazes, se um indivíduo disser um testamento na véspera de completar dezesseis anos este será inválido, aqui trabalhamos com a teoria das nulidades onde aqueles que são absolutamente incapazes produzem atos nulos, e aqueles que são relativamente capazes produzem atos anuláveis.

 

E os deficientes, com a aprovação da Lei n 12.146 /15, que trata do estatuto da pessoa com deficiência, a pessoa com deficiência é completamente capaz, inclusive pode fazer testamento. Outro critério legal a ser observado é que o testamento é ato personalíssimo, ou seja, só pode ser praticado pelo próprio indivíduo que fará o testamento, sendo expressamente proibidos testamentos em conjunto, ou em benefício comum por exemplo. O testamento só produz efeitos se o testador (aquele que o fez) de fato morrer, caso contrário não produz efeitos jurídicos.

 

O testamento não é irrevogável. Ele pode ser revogado, tanto por estar em desconformidade com os critérios legais, ou pela elaboração de um novo testamento, que revoga o anterior, também pode ser revogado por ato de própria vontade do testador por meio de instrumento público.

Testamento também não tem prazo de validade. Enquanto não for revogado será considerado válido.

 

O testamento abrange somente disposições de caráter patrimonial. O testamento abrange todas as disposições de vontade para após a morte do testador, sejam elas de caráter patrimonial, disposições sobre seus bens, reconhecimento de filhos, doações, dentre outras. Mas só ressaltando, não se pode testar sobre matérias ilícitas e matérias que não respeitem a legítima dos herdeiros necessários.

 

Quanto às espécies de testamento, isso é matéria para outro artigo, mas já adianta-se existirem diversas formas de testamento: testamento público, testamento cerrado, testamento particular, testamento nucunputativo, codicilo e testamentos especiais como o testamento marítimo e aeronáutico.


O melhor testamento para se fazer e mais seguro, é o testamento público, feito em cartório, por um tabelião na presença de duas testemunhas que não podem ser amigos íntimos ou inimigos capitais do testador. (Eduarda Sousa Ferreira, em artigo publicado em maio de 2021, intitulado “Tudo o que você precisa saber sobre Testamentos”, dá uma panorâmica em rápidas pinceladas apontando o artigo em comento, CC 1860, acessado em 09/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Lecionando Guimarães e Mezzalira, toda e qualquer pessoa, que tenha pleno discernimento, com mais de 16 (dezesseis) anos, poderá fazer seu testamento. A incapacidade aqui enfocada é diferente da incapacidade geral do Direito Civil. O testador casado pode fazê-lo, sem aquiescência do cônjuge; o filho com mais de 16 anos pode redigir seu testamento, sem pedir autorização da mãe ou do pai; o ancião, com cem (100) anos, pode fazer seu testamento, desde que esteja em pleno discernimento na prática para os atos da vida civil.

Por segurança, repete-se, se o testador suspeitar que algum herdeiro pode vir a impugnar sua manifestação de vontade, deve consultar seu médico, pedir-lhe uma declaração de sua capacidade de discernir, antes da redação do testamento. Há costumeira disputa entre os sucessores pelo patrimônio e buscam, em juízo, ou meios fraudulentos, invalidar o testamento.

Jurisprudência: Ação anulatória. Testador pródigo. Interdição provisória decretada. Testamento. Nulidade caracterizada. Voto vencido. Não podem testar os que, no ato de fazê-lo, não dispuserem do pleno discernimento. Tendo sido decretada a interdição provisória do testador, não há como prevalecer o testamento por ele produzido, mormente à revelia do curador, nos termos da lei civil. Sujeita-se à interdição a pessoa que comprovadamente demonstre não possuir aptidão para gerir atos de sua vida civil. Ausentes provas suficientes acerca da suposta prodigalidade do testador, de rigor a manutenção da revogação da interdição provisória, mormente em face da inexistência de perícia e do fato de a cassação da providência acautelatória ter se dado após interrogatório com o interditando, procedimento previsto no art. 1.180 e ss. do CPC/1973, (correspondendo no CPC/2015 ao art. 749 e ss.). A sentença que declara a interdição gera efeitos a partir de sua publicação, sendo os atos anteriormente praticados, sujeitos à anulação desde que cabalmente demonstrada a incapacidade à época de sua realização. Havendo alegação de excesso nas disposições testamentárias, e diante da impossibilidade de se aferir se o adiantamento da legítima praticado anteriormente se refere ao quinhão reservado aos herdeiros necessários, haverá apuração em liquidação de sentença, consoante previsão ao artigo 475-C, do estatuto processualista. Caso comprovada, impõe-se a aplicação da redução das determinações, nos termos do CC 1.967. (TJMG – AC 1.0137.06.000436-3/001. Relator: des. Fernando Caldeira Brant, 11ª CV. J 16/04/2008. Publicação em 17/05/2008). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.860, acessado em 09/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.861. A incapacidade superveniente do testador não invalida o testamento, nem o testamento do incapaz se valida com a superveniência da capacidade.

Documentadamente, este  corresponde ao art. 1.912 do Projeto de Lei n. 634/75. Ver art. 1.628 do Código Civil de 1916.

No entendimento do Relator, a capacidade ou a incapacidade do testador deve ser verificada na data em que foi outorgado o testamento, aplicando-se a regra tempus regit actum. No caso do testamento cerrado, deve ser considerada a data da aprovação da cédula pelo tabelião e não a data em que foi escrita pelo testador (CC 1.868).

Se era capaz o testador no momento em que testou, se estava são de espírito, apresentando o discernimento necessário para saber e compreender o que fazia, o testamento não ficará prejudicado na sua validade se, depois, o testador vier a sofrer de uma doença mental, perdendo completamente a razão. Noutra hipótese, se o testador tinha apenas quinze anos quando fez o testamento, embora venha a falecer o seu autor dezenas de anos mais tarde, o testamento não vale. O Código Civil português adota a mesma solução — que é universal—, enunciando, no art. 2.191: “A capacidade do testador determina-se pela data do testamento”. (cf. Clóvis Beviláqua, Direito das sucessões, 5. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1964, v. 1.) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 968, CC 1.861, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 09/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Na defesa de Mirella Lins Bezerra, em 2019, intitulada “Diretrizes Antecipadas de vontade: Testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro”, publicada no site jusbrasil.com.br, pertinente, onde, segundo a autora, com a existência de novas biotecnologias permitindo o prolongamento da vida por meio artificial há uma reafirmação do princípio da autonomia da vontade. Como forma de efetivar os desejos do indivíduo sobre a sua vida e a sua saúde surgiram as DAVs, que correspondem a negócios biojurídicos nos quais a pessoa deixa expressa a sua vontade sobre tratamentos médicos. No Brasil há uma carência de regulamentação jurídica sobre o assunto, resultando na existência de demandas judiciais requerendo uma decisão sobre a possibilidade de respeitar ou não o disposto nas diretivas.

De acordo com Luciana Dadalto, o Testamento Vital é um documento por meio do qual um indivíduo capaz “manifesta seus desejos sobre suspensão de tratamentos, a ser utilizado quando o outorgante estiver em estado terminal, em estado vegetativo persistente - EVP ou com uma doença crônica incurável, impossibilitado de manifestar livre e conscientemente sua vontade”. Com base nesse conceito, diz-se que o Testamento Vital tem sua aplicação limitada a casos médicos específicos. Dá-se ao paciente a possibilidade de analisá-los de forma predecessora e de decidir sobre o seu destino.

O objetivo principal do Testamento Vital é a percepção do real desejo do paciente em relação à sua própria vida; da convicção com a qual o documento foi firmado. Trata-se de um subsídio importantíssimo para as decisões que recaiam sobre médicos ou familiares, no que se refere à recusa de tratamentos invasivos desproporcionais, considerados absolutamente inválidos em termos de recuperação do status quo ante do paciente. O limite estabelecido para a declaração do paciente é, como já referido, a comprovação da prescindibilidade do tratamento.

 

O testamento vital não possui forma prescrita pelo Conselho Federal de Medicina, não havendo um padrão a ser respeitado, e, sendo assim, seus requisitos e formalidades são avaliados com base na legislação estrangeira, e também pelo Código Civil nas exigências do testamento particular. Pontua-se, portanto, a maior necessidade para validade do testamento, sendo a capacidade – conforme critérios da lei civil –, ou seja, que o paciente tenha atingido 16 anos e que não se enquadre em nenhuma situação de incapacidade prevista no Código Civil. 

A eutanásia e o suicídio assistido são práticas proibidas pela legislação brasileira e previstas como crimes, conforme disposição do Código Penal. Contudo, admite-se a ortotanásia, que corresponde ao um direito à morte natural, sem intervenção de métodos extraordinários para o prolongamento da vida. Neste caso, o paciente não está optando em não receber nenhum medicamento, mas em morrer sem ser submetido a intervenções médicas que não lhe fazem mais sentido.

Neste contexto, a Resolução 1.995/12 do Conselho Federal de Medicina define a chamada “diretivas antecipadas de vontade” como o “conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente, sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade.

Desse modo, passou-se a utilizar no Brasil o chamado Testamento Vital, conferindo à pessoa de formalizar sua vontade como pretende ser tratada em caso de ficar incapacitada de se expressar livremente. É considerado um documento jurídico válido e eficaz, sendo uma declaração de vontade, sendo esta uma vontade última que deve ser atendida, respeitando sempre a legislação vigente e a ética médica. 

O Testamento Vital é o documento previamente elaborado pelo paciente, com as estipulações de sua vontade médica (métodos aos quais deseja ou não ser submetido quando em estado terminal de saúde, em estado vegetativo persistente ou afetado por doença crônica incurável), referentes a tratamentos considerados infrutíferos para a melhora do estado de saúde em que se encontra. É a manifestação explícita da vontade do paciente, que posiciona: “Quais as providências a serem tomadas para um paciente incapacitado de exercer a autonomia, mas que em estado anterior de lucidez manifestou-se a respeito por meio de documento escrito”.

 

A necessidade da inclusão do Testamento Vital em nosso ordenamento jurídico é o respeito à autonomia do paciente perante a possibilidade de suspensão dos tratamentos médicos. Ressaltando que a decisão não é do médico, ele tem a obrigação de informar ao paciente seu prognóstico, que lhe faculta procurar outras opiniões ou meios de tratamento. Ao médico cabe o dever de informar ao paciente, garantido na CF/88, em seu artigo 5º, inciso XIV, onde dispõe que: “É assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo de fonte, quando necessário ao exercício profissional.”.

 

O Testamento Civil é um negócio jurídico unilateral, personalíssimo e indelegável, pelo qual o testador expressa sua última vontade em relação ao seu patrimônio. Trata-se de um instrumento com funções acautelatórias, na medida em que, tendo o agente capacidade para fazê-lo, e fazendo-o dentro dos limites legais, considera-se perfeito independentemente da ocorrência do óbito. Admite-se tanto a revogação ad nutum do testamento, quanto a alteração das disposições nele contidas.

 

A validade do Testamento é condicionada à morte, evento que rompe o domínio dos bens do testador e transfere a outra pessoa os direitos que lhe pertenciam. É a prática representativa do significado real da palavra “suceder”, qual seja, “vir após; seguir-se; substituir”. Com a morte, extingue-se a personalidade do falecido, ao qual não mais serão atribuídos direitos e obrigações.

 

Não obstante a previsão taxativa das figuras testamentárias pelo Código Civil, a doutrina, com base no direito de autodeterminação da pessoa, defende a utilização de Diretivas Antecipadas de Vontade. Por efeito da tradução literal da expressão americana Living Will, foi adotada no Brasil a terminologia “Testamento Vital” para designar as disposições acerca da vida e da morte, em termos médicos, preexistentes ao momento de incapacidade do paciente/testador, gerando efeitos ainda em vida.

 

Em observância aos ditames constitucionais brasileiros, sua validade é defendida com base em princípios constitucionais que podem ser aplicados diante de casos concretos. Assim, tem-se na Constituição Federal a proteção a direitos fundamentais, com base nos princípios da Dignidade da Pessoa Humana e da Autonomia da Vontade.

 

É possível afirmar que uma pessoa, em pleno gozo de suas capacidades mentais, tem o direito de dispor de sua vida segundo a própria vontade. Também o tem aquele que se encontre em um momento de impossibilidade de manifestação e, para tanto, utilizam-se as Diretivas Antecipadas de Vontade.

 

Art. 1º, CF/88: A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...);  III - a dignidade da pessoa humana; (...). Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

 

Tratando-se especificamente do Testamento Vital, o objetivo é o registro da vontade do paciente para que prevaleça sobre toda e qualquer opinião contrária. Corresponde a um documento de efeitos erga omnes, cujas disposições devem preexistir à manifestação da patologia, vedada a referência a procedimentos terapêuticos contraindicados ao caso ou já superados pelos estudos da Medicina, bem como a contrariedade ao ordenamento jurídico vigente.

 

Usufrui-se, por analogia, dos arts. 1.858; 1.860, caput; 1.861, do Código Civil para o Testamento Vital, que se caracteriza como negócio jurídico existencial, unilateral, personalíssimo e gratuito. O CC 107, aduz que “a validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir”. Não havendo previsão legislativa própria ao tema, a forma com que o Testamento Vital for realizado não é passível de declaração de nulidade, sendo a incerteza acerca de sua forma superada apenas pela precaução do testador em conformá-las às regras aplicáveis aos negócios jurídicos (em que pese seja livre a sua escolha).

 

O Testamento Vital busca encontrar o equilíbrio entre a prática médica e as demandas bioéticas dos pacientes, alcançando, assim, efeitos lícitos. Se ao indivíduo é dada a possibilidade de disposição patrimonial, e há o reconhecimento de que a vida é o seu bem maior e condição essencial para todos os outros direitos, o entendimento aplicado ao Testamento Civil é extensível ao Testamento Vital, oportunizando ao paciente o direito de escolha sobre sua vida, ainda em vida.

 

As DAV nunca foram especificamente regulamentadas no âmbito jurídico, mas apesar da pouca atenção dada ao tema, há diversas referências ao direito à recusa de tratamento na nossa legislação.

 

O Código Civil ainda afirma, em seu artigo 15, que ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica. Este dispositivo traduz clara expressão da autonomia do paciente frente aos tratamentos a serem administrados. A interpretação destes conceitos pode embasar a defesa da validade das DAV no nosso ordenamento jurídico.

 

O tema específico das diretivas antecipadas de vontade ganhou visibilidade no país após a promulgação da Resolução CFM 1.995/2012, que dispõe sobre o assunto visando adequar a conduta médica. Consta no artigo 2º da citada resolução que nas decisões sobre cuidados e tratamentos de pacientes que se encontram incapazes de comunicar-se, ou de expressar de maneira livre e independente suas vontades, o médico levará em consideração suas diretivas antecipadas de vontade .


As diretivas antecipadas de vontade são realizadas com base no princípio da autonomia dos particulares, sendo realizadas na forma de negócios biojurídicos, nos quais o indivíduo deixa registrada a sua vontade no tocante ao seu corpo e sua saúde para que seja respeitada quando estiver impossibilitado de manifestar seus desejos. Então, por meio das diretivas há o conhecimento dos desejos da pessoa, podendo ser sobre negativa a determinado tratamento ou autorização. [...] (Defesa de Mirella Lins, em 2019, intitulada “Diretrizes Antecipadas de vontade: Testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro”, publicado no site jusbrasil.com.br, acessado em 09/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Na sequência, Guimarães e Mezzalira, se a pessoa faz seu testamento com 15 (quinze) anos, mesmo que se torne Presidente da República, o ato não convalidará; da mesma forma, estado capacitado para testar, sofrendo, em seguida ou tempos depois, um acidente que o torne inteiramente inválido, esse testamento continuará a vigorar e produzirá seus efeitos, com a morte do testador. 

Regra absoluta, deve o testador buscar opinião de quem entenda, desejoso de transmitir sua vontade depois de sua morte. O profissional capacitado poderá ajuda-lo, afastando os não beneficiados de sua maldade. O juiz deve fazer prevalecer a vontade do testador, porque repetir o ato não é mais possível.

Jurisprudência: Apelação cível. Ação de nulidade de testamento. Alegação de incapacidade civil. Ausência de prova. A posterior interdição da testadora, por si só, não demonstra a sua incapacidade, que deve ser identificada no momento do testamento, pois, “a incapacidade superveniente do testador não invalida o testamento” (CC 1.861). Nas hipóteses em que se pretende desconstituir um ato cuja validade é presumida por força da lei, deve restar demonstrado de forma cabal o vício alegado, especialmente porque a expressão da vontade, que é genérica por si só, é o que constitui a essência do ato. recurso conhecido mas não provido. (TJMG – AC 10342129967646001 MG, relator: Albergaria costa, DJ 14.09.2015, 3ª  CV, DP 18.09.2015). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.861, acessado em 09/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).