quarta-feira, 25 de novembro de 2020

Direito Civil Comentado - 1.359, 1.360 Da Propriedade Resolúvel – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - 1.359, 1.360

Da Propriedade Resolúvel – VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro IIITítulo III – Capítulo VIII – Da Propriedade Resolúvel - (Art. 1.359 a 1.360) digitadorvargas@outlook.com

  - vargasdigitador.blogpot.com

 

Art. 1.359. Resolvida a propriedade pelo implemento da condição ou pelo advento do termo, entendem-se também resolvidos os direitos reais concedidos na sua pendência, e o proprietário, em cujo favor se opera a resolução, pode reivindicar a coisa do poder de quem a possua ou detenha.

Na definição de Clóvis Beviláqua, “propriedade resolúvel, ou revogável, é a que, no próprio título de sua constituição, encerra o princípio, que a tem de extinguir, realizada a condição resolutória, ou advindo o termo extintivo, seja por força de declaração da vontade, seja por determinação da lei” (Código Civil dos Estados Unidos do Brasil, 9. ed., Rio de Janeiro, Livr. Francisco Alves, 1953, v. 3, p. 195). Nessa hipótese, dá-se o efeito ex tunc (desde então), por exemplo, no caso de pacto de retrovenda, de fideicomisso e de venda de coisa comum indivisível a estranho em detrimento do condômino que tem o direito de preferência. O dispositivo é idêntico ao art. 647 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 696, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 25/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No comentário de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo cm exame corresponde ao art. 647 do Código Civil de 1916, com alterações apenas formais de redação. Substituiu-se o termo domínio por propriedade, mantendo-se, no mais, incólume o preceito, que disciplina a propriedade resolúvel. Na lição clássica de Clóvis Bevilaqua, “propriedade resolúvel, ou revogável, é a que, no próprio título de sua constituição encerra o princípio, que a tem de extinguir, realizada a condição resolutória, ou advindo o termo, seja por força de declaração, seja por determinação da lei” (Direito das coisas. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1951, p. 243).

A propriedade, como já visto no comentário ao CC 1.228, tem como uma de suas características a perpetuidade. Adverte Orlando Gomes, porém, que “a ordem jurídica admite situações nas quais a propriedade torna-se temporária. Quando sua duração se subordina a uma condição resolutiva, ou termo final, previsto no título constitutivo do direito, diz-se que há propriedade resolúvel. Quando não é adquirida para durar certo tempo, mas se apresenta potencialmente temporária, podendo seu titular perdê-la por força de certos acontecimentos, diz-se que há propriedade ad tempus” (Direitos reais, 19. ed., atualizada por Edson Luiz Fachin. Rio de Janeiro, Forense, 2004, p. 265). Ainda segundo Orlando Gomes, “o traço característico da propriedade resolúvel reside na previsão de sua extinção no próprio título que a constitui. A causa da revogação há de ser estabelecida, em cláusula informativa de condição ou termo. Necessária será a declaração de vontade nesse sentido. Do contrário, não será propriedade resolúvel, como, por exemplo, se a revogação decorre de causa superveniente” (op. cit., p. 267). Em termos diversos, a propriedade resolúvel é temporária, e o proprietário, ao adquiri-la, sabe que a perderá com o advento do termo ou da condição. A resolução da propriedade produz efeitos parcialmente retroativos ao momento de sua aquisição. Ingressa-se, aqui, no controverso tema da retroatividade da condição resolutiva. São parcialmente retroativos, pois aquele investido do direito de proprietário resolúvel usa e frui licitamente a coisa, até o advento do termo e da condição. É proprietário pleno quanto à extensão do domínio, embora temporário. Logo, não restitui frutos e rendimentos recebidos, muito menos indeniza aquele em favor de quem se opera a restituição pelo uso temporário da coisa. Preservam-se, assim, os atos de administração. Quanto aos atos de disposição ou oneração, a resolução tem efeitos ex tunc, retrooperante ao momento da aquisição. A resolução acarreta a ineficácia desses atos, que são revogados. Ninguém pode dispor de mais direitos do que tem. Logo, se a propriedade está sob condição ou a termo, o adquirente a perde no momento em que se verifica o fato extintivo, porque adquiriu propriedade resolúvel. De igual modo, essa revogação retroativa alcança não só a propriedade, mas todos os direitos reais sobre ela constituídos pelo proprietário resolúvel, como, por exemplo, servidão, usufruto, hipoteca, penhor etc. O proprietário resolúvel não está inibido de alienar ou gravar de ônus reais a coisa. Apenas a aquisição desses direitos levará a marca congênita da resolutividade, ou, no dizer de Pontes de Miranda, “atribui-se à cláusula eficácia real, tanto que se admite direito de reivindicação” (Tratado de direito privado, 4. ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1983, v. XIV, p. 119).

O Código Civil brasileiro contempla diversos casos de propriedade resolúvel: fideicomisso, retrovenda, venda a contento sob condição resolutiva, doação com cláusula de reversão, propriedade fiduciária, cláusula comissória expressa levada ao registro imobiliário. Quando a causa da resolução é a vontade da parte, a norma é dispositiva, admitindo-se que o título preveja o respeito do alienante a eventuais direitos criados a favor de terceiros (Beviláqua, Clóvis. Op. cit., p. 244). A resolução pode operar-se tanto a favor do alienante, como no caso da retrovenda ou do pacto de melhor comprador, como de terceiro, como no caso do fideicomisso. Em relação à resolução do contrato por inadimplemento e seus efeitos em relação a terceiros, invoca-se a lição de Ruy Rosado de Aguiar Júnior: “Sendo a resolução negocial (ou convencional) porque inserida no contrato cláusula resolutória por incumprimento, levado o contrato ao registro de imóveis, incide o CC 1.359; nesse caso, a resolução produz efeitos reais quanto à contraparte e também relativamente ao terceiro subadquirente; i. é, desfaz-se o negócio também quanto a terceiro” (Extinção dos contratos por incumprimento do devedor, 2. ed. Rio de Janeiro, Aide, 2003, p. 262). Caso, porém, não haja cláusula resolutiva expressa e constante do título, mas mera cláusula resolutiva tácita (art. 475 do CC), a solução é outra, porque desfaz o negócio inter partes, mas é inoponível a terceiros de boa-fé. A parte final do preceito diz que o proprietário em favor do qual se opera a resolução pode reivindicar a coisa em poder de quem a possua ou detenha. Exige-se, porém, que a posse seja injusta, sem uma causa que a justifique. Em determinados casos, não caberá ação reivindicatória, v.g., em face do locatário cujo contrato foi celebrado durante o período de propriedade resolúvel, caso em que é cabível apenas a ação de despejo. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.401-02. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 25/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em estudo comparativo acerca da propriedade resolúvel e da propriedade fiduciária diante das garantias que essas contêm, Mariana de Oliveira, publicado em novembro de 2017, no site da Jus.com.br., leciona ser o direito das coisas, bens corpóreos sujeitos à apropriação. Esses são úteis, raros e contém valor econômico. Para Maria Helena Diniz, em seu Curso de Direito Civil brasileiro, vol. 4, o direito real “infere-se deste conceito que o direito das coisas visa regulamentar as relações entre homens e coisas, trançando normas tanto para a aquisição, o exercício, a conservação e a perda de poder dos homens sobre esses bens como para os meios de sua utilização econômica”. Deste modo, no presente artigo visa-se estudar duas propriedades regidas, pela palavra garantia. As propriedades fracionam em propriedade fiduciária e propriedade resolúvel. Ambas optam por fundamentos jurídicos para assegurar bens reais, para quem supre e para quem os recebe, porém, cada uma seguindo seus padrões. Contudo, esses estudos iniciam-se a seguir, com uma breve análise comparativa sob essas duas propriedades, de acordo com a apresentação de seus conteúdos e de seus efeitos.

Primeiramente, a terminologia alienação fiduciária aparece no brasil por meio do decreto-lei n. 911/1969. Todavia, com a vigência em 2002 da Lei n. 10.406, que também reúne esse assunto, inova a essa matéria outra nomenclatura, qual seja, propriedade fiduciária. Haja vista, por fundamentação jurídica do CC 1.361, compreende-se esse novo vocábulo a transferência de bem móvel ou imóvel do devedor ao credor como forma de garantia, sempre que sobrevier obrigação pendente entre ambos, a ser realizada. Essa transferência situa ao devedor a garantia de pagamento, e, também, a posse direta sob o bem em discussão. E ao credor o domínio sobre a coisa será indireta e resolúvel, para melhor compreensão é relevante o que dispõe a citação de Carlos Roberto Gonçalves em Direito Civil da Coisa, V. 5, “O domínio do credor é resolúvel, pois se resolve automaticamente em favor do devedor alienante, sem necessidade de outro ato, uma vez paga a última parcela da dívida”. Para extinguir esse vínculo é preciso que a obrigação principal do devedor seja quitada. Ademais, o credor poderá devolver o bem à outra parte, apenas mediante termo de quitação. Vale ressaltar que, a partir do momento em que for manifestado esse termo de quitação, cabe ao oficial do competente Registro de Imóvel realizar o cancelamento do registro da alienação fiduciária.

Aproveitando a exposição acima, essa obrigação será assegurada pela firmação de contrato ou instrumento, que serve a título de alienação fiduciária em garantia. Deste modo, é exordial que o mesmo consagre os requisitos do CC 1.362, para que se esse negócio se torne sólido. Primordialmente, é preciso a estipulação do débito integral, ou sua estimativa; em seguida, ser aplicado o prazo para realização da prestação; e, ter expressado a taxa de juros, se houver. Ademais, para que prove esse, é necessário o seu registro no cartório de títulos e documentos, sendo no domicilio do devedor. Conforme dispõe Flavio Tartuce em seu livro de Direito Civil, V. 4: “O art. 23 da Lei 9514/1997, estabelece que esta propriedade fiduciária seja constituída mediante registro, no competente Registro de Imóveis do contrato que lhe serve de título. Isso para gerar efeitos como verdadeiro direito real de garantia”.

Contudo, em se tratando de veículo a coisa alienada, o seu registro terá que ocorrer mediante contrato documental registrado junto ao DETRAN, para que seja validada a eficácia. Caso tal documento não seja entregue ao credor, voluntária ou involuntariamente pelo devedor ou terceiros, cabe ao credor por livre vontade propor a ação de busca e apreensão do bem móvel alienado. Ademais, importante esclarecer, que será nula a aplicação de cláusula, em contrato, que permita ao credor ficar com o bem móvel ou imóvel alienado em garantia, caso o devedor não realize sua obrigação de pagamento, salvo exceção do parágrafo único do CC 1.365.

O segundo tipo de propriedade gira em torno de uma cláusula extintiva de direito, estipulada por seus envolvidos no próprio título aquisitivo. Sendo assim, o seu término opera-se no caráter das condições de evento futuro e incerto ou de termos de evento futuro e certo. Entretanto, essa propriedade ocorre em torno da lei privada, que dispõe sobre os CC 1.359 e 1.360. o primeiro aufere o referido entendimento, o qual compreende que a resolução acontece pela aplicação da condição ou advento do termo, i. é, nesse caso a resolução ocorrerá mediante o que estiver definido no título constitutivo. No mais, em caso de rompimento do termo resolutivo opera-se uma revogação ex tunc. Estendendo a compreensão desse efeito, Maria Helena Diniz, em seu Curso de Direito Civil brasileiro, Direito das Coisas, v. 4, dispõe: “A partir do momento que surgir o evento terminativo condicional rompe-se, de modo automático, todos os vínculos reais de garantia, bem como a alienação que o proprietário resolúvel fez com terceiro, voltando assim o bem ao seu antigo dono, como se nunca tivesse havido qualquer mudança de proprietário”. E o CC 1.360, fundamenta essa propriedade resolúvel por causa superveniente, i. é, alheia ao título e após a transmissão do domínio. Ainda, para melhor percepção desse entendimento legal, o seu efeito será ex nunc, assim sendo caracterizada a presente propriedade como temporária. A respeito, o Enunciado CJF do Enunciado n. 508, aprovado na V Jornada de Direito Civil: “A resolução da propriedade, quando determinada por causa originária, prevista no título, opera ex tunc e erga omnes; se decorrente de causa superveniente atua ex nunc e inter partes”. (Mariana de Oliveira, em: “Estudo comparativo acerca da propriedade resolúvel e da propriedade fiduciária diante das garantias que essas contêm, publicado em novembro de 2017, no site da Jus.com.br., Acessado 25/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 1.360. Se a propriedade se resolver por outra causa superveniente, o possuidor, que a tiver adquirido por título anterior à sua resolução, será considerado proprietário perfeito, restando à pessoa, em cujo benefício houve a resolução, ação contra aquele cuja propriedade se resolveu para haver a própria coisa ou o seu valor.

O artigo em exame corresponde ao art. 648 do Código Civil de 1916, com mínimas alterações. Trocou-se o termo domínio por propriedade, mantendo-se, no mais, o conteúdo do preceito, que disciplina a propriedade ad tempus.

Segundo comentário de Francisco Eduardo Loureiro, na propriedade ad tempus não há condição nem termo apostos ao título constitutivo da propriedade. No dizer de Orlando Gomes, não é ela adquirida para durar certo tempo, mas se apresenta potencialmente temporária, podendo seu titular perdê-la por força de certos acontecimentos futuros (Direitos reais, 19. ed., atualizada por Edson Luiz Fachin. Rio de Janeiro, Forense, 2004, p. 265). A causa da revogação é superveniente e estranha ao título. Tome-se como exemplo a doação revogada por ingratidão do donatário, ou por descumprimento de encargo. Reconhecido judicialmente o ato de ingratidão, ou o descumprimento do encargo, a coisa doada retorna ao patrimônio do donatário. A ingratidão, todavia, é mero fato eventual e futuro, diverso de uma condição ou termo que, desde o nascimento, já subordinam a eficácia do ato ou negócio jurídico por cláusula contratual. De igual modo, a cláusula resolutiva tácita, implícita em todo contrato bilateral, que não se confunde com a condição, porque não expressa no título causal, não opera de pleno direito. É por isso que tais situações previstas em lei não vão ao registro imobiliário juntamente com o título aquisitivo da propriedade, tal como ocorre na propriedade resolúvel ou a cláusula resolutiva expressa, disciplinadas no artigo antecedente.

Assim, se Antônio doou imóvel a João, que o vendeu a Carlos, a posterior revogação da doação não resolve a venda ou a constituição de direitos reais a terceiro de boa-fé, gerando apenas direito ao doador de exigir o equivalente em dinheiro do donatário. É uma resolução sem eficácia real. Gera direito pessoal e não direito real de reivindicar a coisa em poder de terceiro. Ainda no dizer de Orlando Gomes, na propriedade ad tempus “o  fato extintivo acarreta a transmissão do domínio no estado em que se encontra: diminuído, modificado, aumentado, juridicamente ou materialmente. Sua eficácia é para o futuro” (op. cit., p. 267). Tanto a resolução como a revogação por causas supervenientes pressupõem negócio válido. A anulação e a nulidade têm origem em ausência de requisitos, vícios de consentimento ou outras causas previstas em lei, que afetam a própria formação do negócio. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.402-03. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 25/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 Segundo os autores Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, há entendimento doutrinário no sentido de que o artigo trata da propriedade ad tempusdistinta da propriedade resolúvel (Cristiano Chaves de Faria e Nelson Rosenvald, Direitos Reais, 2007), em que não existe cláusula contratual limitando os efeitos do negócio jurídico, sendo que a extinção do direito de propriedade decorre de evento superveniente, motivo pelo qual serão preservados todos os atos praticados pelo proprietário (efeitos ex nunc). O entendimento majoritário, contudo, é no sentido de que se trata de propriedade resolúvel, pois o fato se insere no âmbito de eficácia do negócio jurídico. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com acesso em 25.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).