terça-feira, 13 de outubro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.269, 1.270, 1.271 Da Aquisição da Propriedade Móvel – Da Especificação - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - Art. 1.269, 1.270, 1.271

Da Aquisição da Propriedade Móvel – Da Especificação

- VARGAS, Paulo S. R. - Parte Especial - Livro IIITítulo III – Da Propriedade (Art. 1.269 a 1.271) Capítulo III – Da Aquisição da Propriedade Móvel - Seção V –Da Especificação –  digitadorvargas@outlook.com vargasdigitador.blogspot.com

 

Art. 1.269. Aquele que, trabalhando em matéria-prima em parte alheia, obtiver espécie nova, desta será proprietário, se não se puder restituir à forma anterior.

Encabeçando a lista de comentários, Francisco Eduardo Loureiro, com a especificação, na lição de Caio Mário “é a transformação definitiva da matéria-prima em espécie nova, mediante trabalho ou indústria do especificador” (Pereira, Caio Mário da Silva, Instituições de direito civil, 18. ed. Rio de Janeiro, v. IV, p. 166). Exige a figura da especificação dois requisitos: a transformação de matéria-prima em coisa nova, substancialmente distinta da anterior, não bastando singela modificação; e que essa transformação seja resultante de trabalho ou indústria humana do especificador, não podendo resultar de mero fato acidental. A regra do preceito, que reproduz em substância o que continha art. 611 do Código Civil de 1916, apenas melhorando a redação, é simples: prevalece o trabalho, o lavor, sobre o material. A coisa nova criada pela especificação pertence ao transformador, ainda que a matéria-prima pertença em parte a outrem. O dono da matéria-prima, todavia, é indenizado por seu valor, evitando, assim, o enriquecimento sem causa do transformador. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.271-72. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 13/10/2020. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Historicamente o artigo não foi alvo de nenhuma espécie de alteração, seja por parte do Senado Federal, seja por parte da Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto. A redação atual é a mesma do projeto. 

Segundo Ricardo Fiuza em sua Doutrina • Podemos conceituar a especificação como o modo particular de adquirir a propriedade de bem móvel que não pode voltar ao status quo ante, subsistindo apenas a espécie nova. O dispositivo é idêntico ao art. 611 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 653-54, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 13/10/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).


Buscando no unisalesiano.edu.br,Formas De Aquisição Da Propriedade Móvel Formas Originárias E Derivadas”, da especificação (CC 1.269 a 1.271) adentrando nas formas derivadas de aquisição da propriedade móvel, a especificação consiste na transformação da coisa em uma espécie nova, diante do trabalho do especificador, não sendo mais possível o retorno à forma anterior (CC 1.269). A forma de aquisição é derivada, pois há, em certo sentido, uma relação pessoal entre o dono da coisa anterior e o especificador, aquele que efetua o trabalho. De toda sorte, como aponta Maria Helena Diniz, há quem entenda se tratar de forma de aquisição originária, como espécie de acessão, corrente seguida por José Fernando Simão em edições anteriores desta obra, quando em coautoria: “Há quem a considera como uma espécie de acessão, porém, não se pode acolher esse entendimento porque acessão requer união ou incorporação de uma coisa a outra, o que não ocorre na especificação, que é a transformação definitiva da matéria-prima em espécie nova, por meio de ato humano” (DINIZ, Maria Helena. Curso..., 2009, v. 4, p. 327). Feito tal esclarecimento, a título de exemplos, há especificação nos casos da escultura em relação à pedra, da pintura em relação à tela, da poesia em relação ao papel. A modificação é substancial, pois surgiu espécie nova: a pedra agora é uma linda estátua, a tela é um belo quadro, o papel uma importante obra literária. As regras de especificação também têm relação com a vedação do enriquecimento sem causa (CC 884 a 886). (unisalesiano.edu.br,Formas De Aquisição Da Propriedade Móvel Formas Originárias E Derivadas” acesso ao site em 13.10.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.270. Se toda a matéria for alheia, e não se puder reduzir à forma precedente, será do especificador de boa-fé a espécie nova. 

§ Iº Sendo praticável a redução, ou quando impraticável, se a espécie nova se obteve de má-fé, pertencerá ao dono da matéria-prima. 

§ 2º Em qualquer caso, inclusive o da pintura em relação à tela, da escultura, escritura e outro qualquer trabalho gráfico em relação à matéria-prima, a espécie nova será do especificador, se o seu valor exceder consideravelmente o da matéria-prima.

 Visto sob o prisma de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame reproduz o conteúdo do art. 612 do Código Civil de 1916, fazendo apenas alterações pontuais de redação em seus dois parágrafos. Traça regra no caso do material ser inteiramente alheio, em vez de parcialmente alheio, disciplinado no artigo anterior. Novamente prevalece o lavor sobre o material, acrescentando-se, porém, dois requisitos suplementares, um de natureza objetiva e outro de natureza subjetiva. Assim, para que adquira o transformador a propriedade da coisa nova, concorrem os seguintes requisitos cumulativos: a transformação de matéria-prima em coisa nova, substancialmente distinta da anterior, não bastando singela modificação; impossibilidade de se reduzir a nova coisa à forma primitiva; a transformação resultar de trabalho ou indústria humana do especificador, não podendo resultar de mero fato acidental; e boa-fé do transformador, consistente na ignorância, no desconhecimento de que a matéria-prima pertence a outrem, ou de que a utiliza indevidamente. O especificador, mais uma vez, adquire a propriedade da coisa nova, mas indeniza o dono do material por seu valor. O § Iº traça exceção à regra de que o trabalho prevalece sobre o material inteiramente alheio, ocorrendo uma das hipóteses alternativas: possibilidade de redução da coisa à forma anterior, caso em que se desfaz a coisa nova, tornando a matéria-prima, em seu estado bruto, às mãos de seu dono; ou má-fé do especificador, caso em que perde este a favor do dono da matéria-prima a coisa nova, sem direito à indenização pelo trabalho feito. Finalmente, o § 2º disciplina casos nos quais o valor do trabalho supera consideravelmente o valor da matéria-prima. Ainda que possível a redução ao estado anterior, havendo ou não má-fé do especificador, a coisa nova a este pertence, em detrimento do dono da matéria-prima. Independentemente da malícia do transformador, optou o legislador por prestigiar a função social do trabalho e da nova coisa criada, escolha já trilhada em casos semelhantes, como o do CC 1.258. O legislador exemplificou casos típicos em que o valor do trabalho supera de modo significativo o da matéria-prima, como o da pintura em relação à tela, o da escultura, escritura ou qualquer outro trabalho gráfico em relação ao material usado. É importante lembrar que o especificador, ainda que de má-fé, adquire a propriedade da coisa nova, mas indeniza o dono do material por seu valor, acrescido de perdas e danos. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.273. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 13/10/2020. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Na doutrina de Ricardo Fiuza, a aquisição pela criação de uma espécie nova pressupõe sempre a boa-fé do especificador, senão estaria ele praticando apropriação indébita da coisa, ou mesmo furto, hipóteses em que não poderia gerar direitos. Não se perquire a boa-fé do especificador se o valor da obra, em comparação ao da matéria-prima, for muito maior, não se indagando se ela pode ou não ser reduzida à forma anterior. Adquire ela, assim, para sempre, a transformação, devendo o especificador indenizar o valor do material.  A norma é idêntica à do art. 612 do Código Civil de 1916, devendo a ela ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 654, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 13/10/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Embasados no unisalesiano.edu.br,Formas De Aquisição Da Propriedade Móvel Formas Originárias E Derivadas”, veja-se, 1) Regra: A espécie nova surgida será de propriedade do especificador, se não for possível retornar à situação anterior (CC 1.269). Essa é a regra fundamental e geral da especificação. A norma se justifica, pois há uma alteração substancial da coisa, o que faz com que, por uma reação física, surja outra. Em reforço, pode-se afirmar que o trabalho de alteração é considerado principal, enquanto que a matéria-prima é acessória, razão pela qual a atuação do especificador deve prevalecer. De qualquer maneira, pelo que consta do CC 1.271, o especificador deverá indenizar o valor da matéria-prima ao seu dono; 2) Regra: Se toda a matéria-prima for alheia e não se puder reduzir à forma precedente, será do especificador de boa-fé a espécie nova (CC 1.270). Imagine-se o exemplo de um escultor que encontra uma pedra sabão em uma das ruas 3.ª, 4.ª, 3.8.4. a) b) c) 1.ª 2.ª de Ouro Preto, elaborando uma linda escultura de um profeta de Aleijadinho. Após elaborar o trabalho, o escultor (especificador) vem a descobrir que a pedra é de terceiro. Nesse caso, a escultura será sua, pois agiu de boa-fé. Entretanto, o escultor deverá indenizar o dono da pedra pelo seu valor, o que veda o enriquecimento sem causa, em relação à matéria-prima; 3) Regra: Sendo praticável, ou melhor, possível a redução ao estado anterior; ou quando impraticável, se a espécie nova se obteve de má-fé, pertencerá ao dono da matéria-prima (CC 1.270, § 1.º). Como a má-fé induz à culpa, não poderá o especificador que age por ela guiado adquirir a propriedade do produto da transformação. Desse modo, o dono da coisa nova será o proprietário da matéria-prima. Em complemento, para o caso em que é impraticável a volta ao estado anterior, prevê o CC 1.271 que o especificador de má-fé não terá direito sequer à indenização pelo trabalho. A punição em relação à má-fé, portanto, não é branda; 4) Regra: Em qualquer caso, inclusive no da pintura em relação à tela, da escultura, escritura e outro qualquer trabalho gráfico em relação à matéria-prima, a espécie nova será do especificador, se o seu valor exceder consideravelmente o da matéria-prima (CC 1.270, § 2.º). Esse excesso considerável deve ser analisado caso a caso, levando-se em conta o valor de mercado da matéria-prima (que também pode ser relevante) e a grandiosidade do trabalho efetuado. Também aqui, pelo que consta do CC 1.271, o especificador que adquire a coisa nova deverá indenizar o dono da matéria-prima pelo seu valor. (unisalesiano.edu.br,Formas De Aquisição Da Propriedade Móvel Formas Originárias E Derivadas” acesso ao site em 14.10.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.271. Aos prejudicados, nas hipóteses dos CC 1.269 e 1.270, se ressarcirá o dano que sofrerem, menos ao especificador de má-fé, no caso do § Iº do artigo antecedente, quando irredutível a especificação.

 Ainda levando em conta o comentário de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame traça a regra final sobre o instituto da especificação, determinando o prejudicado ter direito ao ressarcimento das perdas e danos, salvo o especificador de má-fé, quando irredutível a especificação. Assim, o dono parcial ou integral da matéria-prima a perde em favor do especificador de boa-fé, mas tem direito à indenização de seu valor, para que não haja o enriquecimento sem causa deste último. De igual modo, o especificador de má-fé que adquirir a propriedade da coisa nova, em razão da disparidade de valores entre a matéria bruta e a mão de obra, na hipótese do § 2° do artigo anterior, deve indenizar cabalmente o dono da matéria-prima, compondo perdas e danos. Somente não faz jus à indenização o especificador de má-fé, quando perde a coisa nova irredutível para o dono da matéria-prima. Não deseja o legislador, em tal caso, premiar a malícia do especificador, estimulando sua conduta ilícita com a remuneração do trabalho. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.273-74. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 13/10/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 Fiuza ressalva em sua doutrina que mesmo havendo na especificação o trabalho de um e o material de outro, eles não se tornam condôminos; deve sempre ser indenizado o especificador. Ocorrendo má-fé por parte do especificador, o dono do material nada terá a indenizar.  O artigo é idêntico ao art. 613 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. Cabe aqui observar que foi suprimido o art. 614 do Código Civil de 1916, que fazia menção ao Art. 62 do mesmo estatuto, o qual cuidava das benfeitorias. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 654, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 13/10/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 Finalizando com o comentário de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira o dispositivo determina o ressarcimento dos danos sofridos, ressalvando-se os casos em que o especificador estiver de má-fé e o valor da especificação exceder em muito o da matéria-prima. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 13.10.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).