quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 161, 162, 163 - Da Fraude Contra Credores – Legitimidade passiva VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 161, 162, 163 -
Da Fraude Contra Credores – Legitimidade passiva
VARGAS, Paulo S. R.
Livro III – Dos Fatos Jurídicos (art. 104 a 184)
Título I – Do Negócio Jurídico – Capítulo IV –
Dos Defeitos do Negócio Jurídico – Seção VI–
Da Fraude Contra Credores - vargasdigitador.blogspot.com

Art 161. A ação, nos casos dos arts 158 e 159, poderá ser intentada contra o devedor insolvente, a pessoa que com ele celebrou a estipulação considerada fraudulenta, ou terceiros adquirentes que hajam procedido de má-fé. 1

1.        Legitimidade passiva da ação pauliana

Como regra geral, toda ação deve ser movida contra as pessoas que potencialmente terão sua esfera de direitos afetada pelo provimento jurisdicional pleiteado. A ação pauliana não escapa dessa regra. Tendo em vista que a declaração de ineficácia pleiteada pelo credor terá aptidão de fazer com que o bem alienado em fraude responda pelo adimplemento de seu crédito, tanto o devedor alienante quanto o adquirente, bem como eventuais outros terceiros que tenham concorrido com a fraude serão afetados por essa sentença, tendo, pois, legitimidade passiva para figurarem como réus da ação pauliana. Note-se, inclusive, que segundo já reconhecido pela doutrina e pela jurisprudência, a hipótese é de litisconsórcio passivo necessário, o   que significa que a ação deverá ser necessariamente movida contra o devedor e o adquirente em fraude. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 21.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Da legitimidade passiva

De acordo com o art 161, do Código Civil, a ação pauliana, (ação anulatória), deve, pois, ser intentada (legitimação passiva) contra o devedor insolvente e também contra a pessoa que com ele celebrou a estipulação considerada fraudulenta, bem como, se o bem alienado pelo devedor já houver sido transmitido a outrem, contra os terceiros adquirentes que hajam procedido de má-fé.

Embora o supratranscrito dispositivo legal use o verbo poderá, que dá a impressão de ser uma faculdade de o credor propor ação contra todos, na verdade ele assim deverá proceder para que a sentença produza efeitos em relação também aos adquirentes. De nada adianta acionar somente o alienante se o bem se encontra em poder dos adquirentes.

O art 472 do Código de Processo Civil de 1973, estabelece, com efeito, que “a sentença faz coisa julgada ás partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros”, replicada em sua versão no CPC/2015, com o art 506, com a   mesma redação.

A doutrina em geral consolidou-se no sentido de que o devedor e o terceiro adquirente ou beneficiário devem figurar necessariamente no polo passivo da relação processual na revocatória, estabelecendo-se entre eles o litisconsórcio necessário de que trata o art 47 do Código de Processo Civil/1973, Correspondendo ao art 115 no CPC/2015 “Art. 115. ... Parágrafo único. Nos casos de litisconsórcio passivo necessário, o juiz determinará ao autor que requeira a citação de todos que devam ser litisconsortes, dentro do prazo que assinar, sob pena de extinção do processo. No mesmo sentido desenvolveu-se, em termos incontroversos, a jurisprudência de nossos tribunais. (RT, 498/183, 511/161, 559/113(Washington de Barros Monteiro, Curso, cit., v. 1, p.223; Yussef Said Cabali, Fraudes, cit., p. 358; Ferdinando Puglia, Dell’azione pauliana, 1886, p. 47, apud, Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – p. 461 - pdf – parte geral, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Desde que, pela natureza da relação jurídica, instaura-se um litisconsórcio necessário, envolvendo alienantes-devedores e adquirentes, considera-se que, quando o credor não tiver chamado a juízo o devedor ou o adquirente, deve o juiz, de ofício, ordenar a integração da lide, pois é nulo o processo em que não foi citado litisconsorte necessário. (RTJ, 80/611, 95/742; RT, 508,202, apud, Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – p. 461 - pdf – parte geral).

Art 162. O credor quirografário, que receber do devedor insolvente o pagamento da dívida ainda não vencida, ficará obrigado a repor, em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores, aquilo que recebeu. 1, 2

1.        Concurso universal de credores do devedor insolvente

Entrando o devedor em estado de insolvência, todos os seus bens devem ser arrecadados e instaura-se um concurso entre seus credores (CPC/1973, art 741, III; CPC/2015, art 910). Declarada a insolvência, o juiz mandará expedir edital, convocando todos os credores para apresentar a declaração do crédito, acompanhada do respectivo título (CPC/1973, art 761, II; sem correspondência no   CPC/2015). Finda a fase de impugnações, e verificada a regularidade dos créditos apresentados, o juiz remeterá os autos ao contador judicial para organizar o quadro geral dos credores, que deverá observar a classificação dos créditos e dos títulos legais de preferência (CPC/1973, art 769, sem correspondência no CPC/2015). Organizado o quadro geral de credores, proceder-se-á ao rateio do patrimônio do devedor para quitação de seus débitos.

2.        Fraude contra a sistemática do concurso universal de credores do devedor insolvente

Visando a fraudar a sistemática legal instituída para o rateio e pagamento dos credores do devedor insolvente, usualmente ocorre que o devedor queira privilegiar um ou uns de seus credores com o pagamento antecipado da dívida, livrando-o do concurso universal em detrimento dos demais credores. Para evitar tal tipo de fraude aos demais credores, dispõe o artigo 162 do Código civil que: “o credor quirografário, que receber do devedor insolvente o pagamento da dívida ainda não vencida, ficará obrigado a repor, em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores, aquilo que recebeu”. DIREITO CIVIL COMENTADO (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 22.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).


Do pagamento antecipado de dívida

Como sustenta Roberto Gonçalves, credor quirografário, etimologicamente, é o que tem seu crédito decorrente de um título ou documento escrito. A ele se refere o estatuto civil como aquele que tem como única garantia o patrimônio geral do devedor, ao contrário do credor privilegiado, que possui garantia especial.

O objetivo da lei é colocar em situação de igualdade todos os credores quirografários. Todos devem ter as mesmas oportunidades de receber seus créditos e de serem aquinhoados proporcionalmente. Se a dívida já estiver vencida, o pagamento não é mais do que uma obrigação do devedor e será considerado normal e válido, desde que não tenha sido instaurado o concurso de credores.

Se o devedor, todavia, salda débitos vincendos, comporta-se de maneira anormal.  Presume-se, na hipótese, o intuito fraudulento e o credor beneficiado ficará obrigado a repor, em proveito do acervo, o que recebeu, instaurado o concurso de credores. (Sílvio Rodrigues, Direito civil, cit., v. 1, p. 234; Francisco Amaral, Direito civil, cit., p. 502-503, apud, Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – p. 455 - pdf – parte geral).

Essa regra não se aplica ao credor privilegiado, que tem o seu direito assegurado em virtude da garantia especial de que é titular. Como o seu direito estaria sempre a salvo, o pagamento antecipado não causa prejuízo aos demais credores, desde que limitado ao valor da garantia (Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – p. 455 - pdf – parte geral).

Art 163. Presumem-se fraudatórias dos direitos dos outros credores as garantias de dívidas que o devedor insolvente tiver dado a algum credor. 1

1.        Outorga de garantia real em fraude

Além de efetuar o pagamento antecipado da dívida, livrando determinado credor do concurso universal, a outorga de garantias reais pelo devedor insolvente a um credor, criando-lhe um privilégio em relação aos demais credores quirografários é outra forma usual de fraudar a sistemática do concurso universal. Trata-se, contudo, de uma presunção apenas relativa, podendo o devedor e o credor beneficiado pela outorga da garantia provar a ausência da fraude. DIREITO CIVIL COMENTADO (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 22.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Segundo Washington de Barros Monteiro, as garantias a que se refere o dispositivo do CC, art 163, são as reais, pois a fidejussória não prejudica os credores em concurso. A paridade que deve reinar entre os credores ficará irremediavelmente comprometida se houver outorga, a um deles, de penhor, anticrese ou hipoteca. A constituição da garantia vem situar o credor favorecido numa posição privilegiada, ao mesmo tempo que agrava a dos demais, tornando problemática a solução do passivo pelo devedor. (Washington de Barros Monteiro, Curso, cit., v. 1, p. 230, apud, Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – p. 455 - pdf – parte geral).

A garantia dada de certo modo sai parcialmente do patrimônio do devedor, para assegurar a liquidação do crédito hipotecário, pignoratício ou anticrético. Os demais credores, em consequência, receberão menos, para que o beneficiário da garantia receba mais. É essa desigualdade que a lei quer evitar, presumindo fraudulento o procedimento do devedor. A presunção, in casu, resulta do próprio ato, uma vez demonstrada a insolvência do devedor, sendo juris et de jure. (Silvio Rodrigues, Direito civil, cit., v. 1, p. 235, apud, Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – p. 455 - pdf – parte geral).

O que se anula, na hipótese, é somente a garantia, a preferência concedida a um dos credores. Continua ele, porém, como credor, retornando à condição de quirografário. Preceitua, com efeito, o parágrafo único do art 165 do Código Civil que, se os negócios fraudulentos anulados “tinham por único objeto atribuir direitos preferenciais, mediante hipoteca, penhor ou anticrese, sua invalidade importará somente na anulação da preferência ajustada”.

Anote-se que somente na fraude cometida nas alienações onerosas se exige o requisito do consilium fraudis ou má-fé do terceiro adquirente, sendo presumido ex vi legis nos demais casos, ou seja, nos de alienação a título gratuito e remissão de dívidas, de pagamento antecipado de dívida e de concessão fraudulenta de garantia. (Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – p. 455 - pdf – parte geral).