quinta-feira, 2 de abril de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 893, 894, 895 - continua Dos Títulos de Crédito - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 893, 894, 895 - continua
Dos Títulos de Crédito - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título VIII – Dos Títulos de Crédito
(Art. 887 a 903) Capítulo I – Disposições Gerais
– vargasdigitador.blogspot.com

Art. 893. A transferência do título de crédito implica a de todos os direitos que lhe são inerentes.

Na esteira de Marcelo Fortes Barbosa Filho, em todo título de crédito, uma ou mais obrigações são incorporadas, agregando-se a um suporte físico para possibilitar sua ágil circulação. Tais obrigações, chamadas cartulares, apresentam, na posição de credor, o proprietário do documento como coisa móvel. Persiste uma sobreposição entre duas relações jurídicas de natureza distinta, uma derivada de uma obrigação cartular e outa relativa ao direito real de propriedade incidente sobre o documento, o que resulta numa coincidência inevitável, pois o titular da propriedade do documento é, simultaneamente, titular do crédito incorporado ao documento. Trata-se da conhecida teoria da propriedade, defendida, entre outros e desde muito, por Ageo Arcangeli (“Sulla teoria dei titoli di credito”. In: Rivista di Diritto Comerciale, anos 1910, p. 351-2) e Tullio Ascarelli (“Titularità e costituizione del diritto cartolare”. In: Rivista di Diritto Comerciale, anos 1932, t. I, p. 520-2), bastante divulgada e albergada pelo texto do presente artigo, deixando-se de lado outras explicações para a circulação cambiária (créditos sucessivos, delegação, pendência, personificação do título etc.), que com o passar do tempo tiveram sua fragilidade e imperfeição apontadas. Frisa-se, aqui, pura e simplesmente, que a titularidade da propriedade do documento implica a titularidade dos créditos incorporados, uma seguindo a outra quando efetuada uma transmissão; o direito sobre o título e o direito nascido do título caminham sempre juntos. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 909 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 02/04/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Enquanto para Ricardo Fiuza, a cessão ou transferência dos direitos incorporados em título de crédito realizasse mediante endosso ou simples tradição, no caso dos títulos ao portador. O endosse permite que o crédito correspondente a um título circule independentemente da criação ou emissão de um novo documento de dívida. O cedente do crédito, denominado endossante, transfere ao cessionário, chamado endossatário todos os direitos que são inerentes a obrigação cambial representada no título respectivo operando-se a sub-rogação dos direitos até então detidos pelo credor em sua integralidade. O devedor não pode opor-se à transferência do crédito, que é uma faculdade do credor, devendo ele realizar o pagamento ao endossatário que realizar a cobrança da dívida: Endosso será sempre total, transferindo, na integralidade, os direitos emergentes do título de crédito, sendo vedado o endosso parcial ou de parte da importância da dívida. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 460, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 02/04/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na toada de Wille Duarte Costa, se o título for ao portador, sua transferência para terceiros se faz por simples tradição. Sendo título a ordem, sua transferência se faz por endosso. Sendo nominativo, sua transferência se faz a termo lavrado em livro próprio de transferência. Em qualquer dos casos, o direito existente se transfere com o título, sem ocorrer qualquer limitação. É que, até nos chamados títulos atípicos, o direito incorpora-se ao papel e, por consequência, não há possibilidade de modificar o direito decorrente, a não ser mediante fraude. (Wille Duarte Costa, Títulos de crédito no Novo Código Civil) extraída da Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, p. 293, Acesso 02/04/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 894. O portador do título representativo de mercadoria tem o direito de transferi-lo, de conformidade com as normas que regulam a sua circulação, ou de recebe aquela independentemente de quaisquer formalidades, além da entrega do título devidamente quitado.

Lecionando Marcelo Fortes Barbosa Filho, afirma que os títulos representativos de mercadorias outorgam a seu portador legitimado direitos reais incidentes sobre bens móveis literalmente especificados, os quais, em virtude de uma relação contratual antecedente (depósito empresarial ou transporte de cargas), são exercidos ao final, pelo esgotamento desse mesmo contrato. Tais títulos apresentam total causalidade, compondo essa categoria o conhecimento de transporte, o conhecimento de depósito e o warrant. De ordinário, eles são transmissíveis por endosso e, seguindo a regra proposta pelo artigo anterior, sua transmissão implica, também, a transmissão dos direitos incorporados, os quais, nesse caso particular, dizem respeito a mercadorias depositadas em armazém geral ou em trânsito, ou seja, no curso do transporte de uma localidade para outra. De toda maneira, será necessária sempre, em homenagem ao princípio da cartularidade, a exibição do documento e, com isso, a demonstração da legitimidade material de seu portador, a fim de que, ao final, sejam exercidos os direitos reais incidentes sobre as mercadorias enfocadas. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 910 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 02/04/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina apresentada por Fiuza, são títulos representativos de mercadorias aqueles emitidos em razão de operação de transporte e de depósito de bens móveis. No contrato do transporte, sob qualquer modalidade deve ser emitido pela empresa transportador o conhecimento de transporte, título que indica e relaciona as mercadorias que serão transportes, sendo entregue a seu proprietário. Na hipótese de mercadorias serem levadas para depósito em um armazém-geral, a empresa depositária emitirá um título denominado conhecimento de depósito, que conterá a especificação qualitativa e quantitativa das mercadorias depositadas. Nesses dois tipos de dívida do seu proprietário diante de terceiro, que é o credor pignoratício, a propriedade plena sobre as mercadoras somente se exerce mediante a apresentação simultânea desses dois títulos, do conhecimento, de transporte ou de depósito e do warrant caso tenha sido emitido em garantia do pagamento de crédito. Como títulos de crédito que são, o conhecimento de transporte o conhecimento de depósito e o warrant são títulos que podem ser transferidos medial endosso. O último endossatário ou portador do título é que se encontra legitimado perante o transportador ou a empresa de armazéns-gerais, para retirar ou receber as mercadorias constantes do respectivo conhecimento.

Temos com Wille Duarte Costa que, o artigo aponta duas situações não encontradas, semelhantes às que temos nos títulos típicos dos armazéns-gerais. No entanto, faltou regulamentação bastante para atender a segunda situação. (Wille Duarte Costa, Títulos de crédito no Novo Código Civil) extraída da Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, p. 293, Acesso 02/04/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Tem-se com Maria Bernadete Miranda ter este artigo também por fonte o disposto no Código Civil italiano, em seu artigo 1.996, que dispõe: “Títulos representativos. Os títulos representativos de mercadorias atribuem ao possuidor o direito à entrega das mercadorias neles especificadas, a posse das mesmas e o poder de dispor delas mediante transferência do título” (Código Civil Italiano, artigo 1.996 – “Títoli rappresentativi. I Titoli rappresentativi di merci attribuiscono al possessore il diritto allá consegna delle merci Che sono in essi specificate, il possesso delle medesime e il potere di disporne mediante trasferimento Del titolo”).

Trata-se de título atípicos que poderão livremente surgir no mercado, tomando como paradigma o conhecimento de depósito e o warrant.

São títulos de crédito que representam mercadorias e que poderão circular normalmente através do endosso. Quanto às mercadorias, elas poderão ser retiradas, independe de quaisquer formalidades, desde que o título seja apresentado devidamente quitado. Devemos lembrar que o portador do conhecimento de depósito, cujo warrant foi negociado, não poderá receber a mercadoria sem que deposite, no armazém geral, principal e juros devidos ao portador do warrant. Comentários aos Títulos de Crédito no Código Civil Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 Maria Bernadete Miranda – Revista Virtual Direito Brasil – Volume 2 – nº 1 – 2008, acessado em 02/04/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 895. Enquanto o título de crédito estiver em circulação, só ele poderá ser dado em garantia, ou ser objeto de medidas judiciais, e não, separadamente, os direitos ou mercadorias que representa.

No pensar de Marcelo Fortes Barbosa Filho, em se tratando de títulos representativos de mercadorias, já referidos no artigo anterior, qualquer constrição judicial (penhora, arresto, sequestro etc.), assim como a instituição de direito real de garantia (penhor), só poderá ser efetivada por meio do próprio título, eis que, enquanto for possível a circulação do documento dispositivo, não se saberá, com total exatidão, quem é o titular dos direitos relativos à mercadoria representada e, portanto, não se poderá aferir a legitimidade para a constituição de ônus sobre os bens móveis. Na hipótese proposta, a efetivação de uma constrição judicial só é viabilizada pela apreensão do t´titulo de crédito, assim como a instituição de um direito real de garantia depende de um simples endosso, negócio jurídico consumado mediante a oposição de um simples sinal gráfico sobre a cártula. O art. 17 do Decreto n. 1.102/2003 já contém regra idêntica e que pretende evitar que um terceiro de boa-fé seja atingido por um ato ou uma declaração extracartular. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 910 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 02/04/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Para a doutrina de Ricardo Fiuza, o título de crédito fica em circulação até a data de seu respectivo vencimento u da data prevista para a retirada das mercadorias nos casos dos contratos de transporte ou de depósito. Como no título de crédito encontram-se incorporados os direitos a ele inerentes, sobre o crédito ou sobre as mercadorias, qualquer garantia que vier a ser constituída pelo credor ou portador, ou no caso de penhora judicial, deverá recair sobre o título em si, e não sobre o crédito ou sobre as mercadorias nele especificadas. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 461, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 02/04/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Para Wille Duarte Costa, se o direito incorpora-se no título, só o título pode mesmo ser objeto da garantia ou de medidas judiciais. A não ser assim o título perde seu valor e efeitos. Fica esclarecido que o direito não se separa do título. Por isto, o direito e a mercadoria correspondem a um depósito legal que, só com a devolução do título, poderão ser liberados. (Wille Duarte Costa, Títulos de crédito no Novo Código Civil) extraída da Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, p. 294, Acesso 02/04/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Insiste Maria Bernadete Miranda, a norma continuar inspirada no Código Civil italiano, em seu artigo 1.997, entretanto o Código Civil italiano faz a devida distinção entre o direito mencionado no título e as mercadorias por este representadas, isso não ocorre no nosso Código Civil, pois o legislador se refere neste artigo a direitos ou mercadorias que (o título) representa. (Código Civil Italiano, artigo 1.997 – “Efficacia dei vincoli sul credito. Il pegno (2.784), il sequestro (671 C.P.C.), il pignoramento (491 C.P.C.) e ogni altro vincolo sul diritto menzionato in um titolo di credito o sulle merci da esso rappresentate non hanno effetto se non si attuano sul titolo”).

Trata-se de um título de crédito causal e que representa o crédito e o valor de determinadas mercadorias, constituindo uma promessa de pagamento. O título de crédito será emitido acopladamente àquele que representa as mercadorias, destinando-se a eventuais operações de crédito cuja garantia seja o penhor sobre as mercadorias, destinando-se a eventuais operações de crédito cuja garantia seja o penhor sobre as mercadorias.

O título de crédito é um documento autônomo, pois quando este é transferido, o que é objeto de transferência é o título e não o direito contido nele.

Como o direito cartular não pertence, em rigor, a pessoa determinada, mas a sujeito indeterminado, e só determinável pela sua relação real com o título, cada possuidor é titular do direito autônomo e originário afirmado no título e não de um direito derivado e a ele transferido pelos seus antecessores na posse do título. Sendo assim, o direito de cada legítimo possuidor do título se repassa por inteiro no próprio título, que destinado a circular, se desprende da relação fundamental que lhe deu origem, que foi a causa de sua emissão. O que circula é exclusivamente o título, no qual cada possuidor ao adquiri-lo se investe, de modo originário, autônomo e independente.

A autonomia é a desvinculação da causa do título em relação a todos os coobrigados. Se o título de crédito estiver em circulação, somente ele, e não os direitos ou mercadorias que representa, constituirá objeto de medida judicial e poderá ser dado em garantia. (Comentários aos Títulos de Crédito no Código Civil Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 Maria Bernadete Miranda – Revista Virtual Direito Brasil – Volume 2 – nº 1 – 2008, acessado em 02/04/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).