domingo, 19 de fevereiro de 2023

Comentários ao Código Penal – Art. 100 Ação pública e de iniciativa privada VARGAS, Paulo S. R. – vargasdigitador.blogspot.com

 

Comentários ao Código Penal – Art. 100
Ação pública e de iniciativa privada
  VARGAS, Paulo S. R.
vargasdigitador.blogspot.com

digitadorvargas@outlook.com –
 Título VII – Da Ação Penal

 

Ação pública e de iniciativa privada (Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/7/1984)

Art. 100. A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido.

§ 1º. A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça.

§ 2º. A ação de iniciativa privada é promovida mediante queixa do ofendido ou de quem tenha qualidade para representa-lo.

§ 3º. A ação de inciativa privada pode intentar-se nos crimes de ação pública, se o Ministério Público não oferece denúncia no prazo legal.

§ 4º. No caso de morte do ofendido ou de ter sido declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou de prosseguir na ação passa ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. 

Conceito de ação - Conforme esclarece Humberto Theodoro Júnior, “modernamente, prevalece a conceituação da ação como direito público subjetivo exercitável pela parte para exigir do Estado a obrigação da tutela jurisdicional, pouco importando seja esta de amparo ou desamparo à pretensão de quem o exerce. É, por isso, abstrato. E, ainda, autônomo, porque pode ser exercitado sem sequer relacionar-se com a existência de um direito subjetivo material, em casos como o da ação declaratória negativa. É, finalmente, instrumental, porque se refere sempre à decisão a uma pretensão ligada ao direito material (positiva ou negativa).” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, v. 1, p. 53).

Condições da ação - São condições necessárias ao regular exercício do direito de ação de natureza penal: a) legitimidade das partes; b) interesse de agir; c) possibilidade jurídica do pedido; d) justa causa. (Em posição contrária, José Barcelos de Souza afirma não ser “a justa causa uma condição autônoma, uma quarta condição da ação” (Direito processual civil e penal, p. 161).

A denúncia deve vir acompanhada com o mínimo embasamento probatório, ou seja, com lastro probatório mínimo (HC 88.601/ CE, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJU de 22/6/2007), apto a demonstrar, ainda que de modo incidiário, a efetiva realização do ilícito penal por parte do denunciado. Em outros termos, é imperiosa existência de um suporte legitimador que revele de modo satisfatório e consistente, a materialidade do fato delituoso e a existência de indícios suficientes de autoria do crime, a respaldar a acusação, de modo a tornar esta plausível. Não se revela admissível a imputação penal destituída de base empírica idônea (INQ 1.978/PR, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, DJU de 17/08/2007) o que implica a ausência de justa causa a autorizar a instauração da persecutio críminis in iudicio (STJ, HC 145748/SP, Rel. Min. Felix Fischer. 5a T., DJe 2/8/2010).

A denúncia (...] não pode ser o resultado de vontade pessoal e arbitrária do acusador. O Ministério Público, para validamente formular a denúncia penal, deve ter por suporte uma necessária base empírica, a fim de que o exercício desse grave dever-poder não se transforme em um instrumento de injusta persecução estatal. O ajuizamento da ação penal condenatória supõe a existência de justa causa, que se tem por inocorrente quando o comportamento atribuído ao réu nem mesmo em tese constitui crime, ou quando, configurada uma infração penal, resulta de pura criação mental da acusação (STJ, Ap. 41.8, Rel. Min. José Delgado, Corte Especial, DJ 3/4/2006, p. 196).

Rejeição da denúncia ou queixa - O art. 395 do Código de Processo Penal, com a redação determinada pela Lei na 11.719, de 20 de junho de 2008, dispõe, verbis: Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: I - for manifestamente inepta; II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou III — faltar justa causa para o exercício da ação penal.

No dizer de Rogério Greco, (Código Penal comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários sobre o Título VII “Da Ação Penal” – “Ação pública e de iniciativa privada – Art. 100 do CP, respectivamente p. 225-229): Quanto às espécies de ação penal - O Código Penal e a legislação processual penal preveem duas espécies de ação penal, a saber: ação penal pública e ação penal privada. A regra prevista no art. 100 do Código Penal diz que toda ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido.

Da iniciativa - Na verdade, todas as ações são públicas, variando, contudo, sua iniciativa, que pode ser pública (quando proposta por órgão oficial) ou privada.

Das espécies de ação de iniciativa pública: a) incondicionada ou b) condicionada à representação do ofendido ou à requisição do Ministro da Justiça.

Dos princípios informadores da ação penal de iniciativa pública: a) obrigatoriedade ou legalidade; b) oficialidade; c) indisponibilidade; d) indivisibilidade; e e) intranscendência.

Na ação penal pública, vigoram os princípios da obrigatoriedade e da indivisibilidade da ação penal, os quais, respectivamente, preconizam que o Ministério Público não pode dispor sobre o conteúdo ou a conveniência do processo. Porém, não é necessário que todos os agentes ingressem na mesma oportunidade no polo passivo da ação, podendo haver posterior aditamento da denúncia {STJ, HC 27119/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª T., DJ 25/8/2003, p. 341).

Das espécies de ação penal de iniciativa privada: a) privada propriamente dita; b) privada subsidiária da pública e c) privada personalíssima.

Ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública: Vide art. 5º, LIX, da CF. Poderá ser intentada nos crimes de ação de iniciativa pública, se o Ministério Público não oferecer denúncia no prazo legal. Se houver manifestação pelo arquivamento levada a efeito pelo Ministério Público, para a maioria da doutrina, não poderá ser proposta a ação penal subsidiária. Em sentido contrário, Hélio Tomaghi, entendendo que será possível a ação penal subsidiária mesmo com o pedido de arquivamento do Ministério Público. (TORNAGHI, Hélio. Compêndio de processo penal, v. 11, p. 490-491).

In casu, tendo havido o arquivamento interno da notícia-crime pelo Procurador[1]Geral de Justiça, e não tendo sido apresentado recurso, não é cabível o ajuizamento posterior de ação penal privada subsidiária da pública, pois a inércia do órgão ministerial não restou caracterizada (STJ, HC 133227/ BA, Rel. Min. Felix Fischer, 5a T., Dje 14/12/2009).

Se o Ministério Público requer o arquivamento de representação, o servidor público representante não pode formular queixa para instauração de ação privada subsidiária. É que em tal circunstância o MP não foi omisso (STJ, CE AgRg na APn 302/DF, DJ 18/12/2006, p. 274).

A ação penal privada subsidiária só tem cabimento nas hipóteses em que configurada a inércia do Ministério Público, ou seja, quando transcorrido o prazo para o oferecimento da denúncia, o Parquet não a apresenta, -não requer diligências, tampouco pede o arquivamento (STJ, HC 64564/GO, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª T., DJ 9/4/2007, p. 259).

A ação penal privada subsidiária da pública, disciplinada nos arts. 29 do Código de Processo Penal e 5º, inciso LIX, da Constituição Federal, pode ser intentada tanto nos crimes que devam ser processados mediante ação penal pública condicionada como incondicionada, desde que configurada a inércia do Ministério Público, ou seja, quando o Parquet deixar de oferecer a denúncia ou de requerer o arquivamento do inquérito ou, ainda, de solicitar diligências, dentro do prazo previsto pelo art. 46 do Código de Processo Penal (STJ, HC 46959/ RJ, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª T., DJ 18/12/2006 p. 415).

Princípios informadores da ação penal de iniciativa privada: a) oportunidade; b) disponibilidade; c) indivisibilidade.

Da Representação Criminal ou requisição do Ministro da Justiça - Tanto a representação criminal como a requisição do Ministro da Justiça são consideradas condições de procedibilidade para o regular exercício da ação penal de iniciativa pública condicionada, sem as quais se toma impossível a abertura de inquérito policial ou o oferecimento de denúncia pelo Ministério Público.

Para a representação destinada à ação pública condicionada, não se exige o consentimento do marido previsto no art. 35 do CPP (STF, RT 618, p. 401).

A Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, concedeu a ordem de habeas corpus, mudando o entendimento quanto à representação prevista no art. 16 da Lei na 11.340/2006 (Lei Maria da Penha). Considerou que, se a vítima só pode retratar-se da representação perante o juiz, a ação penal é condicionada. Ademais, a dispensa de representação significa que a ação penal teria prosseguimento e impediria a reconciliação de muitos casais (STJ, HC 113.60S/MG, Rel. originário Min. Og Fernandes, Rel. para acórdão Min. Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ-SP), julgado em5/3/2009).

O crime de embriaguez ao volante, previsto no art. 306 do Código de Trânsito brasileiro, é de ação penal pública incondicionada, em face do caráter coletivo do bem jurídico tutelado (segurança viária), razão pela qual não depende de representação para a instauração do inquérito policial e início da ação penal. Precedentes desta Corte (STJ, HC 99468/SP, Rel2. Mina. Laurita Vaz, 53 T., DJe 9/3/2009).

Da Lei Maria da Penha e necessidade de representação: A garantia de livre e espontânea manifestação conferida à mulher pelo art. 16 da Lei Maria da Penha, na hipótese de renúncia à representação, que deve ocorrer perante o magistrado e representante do Ministério Público, em audiência especialmente designada para esse fim, justifica uma interpretação restritiva do art. 41 da mesma lei. O processamento do ofensor, mesmo contra a vontade da vítima, não é a melhor solução paia as famílias que convivem com o problema da violência doméstica, pois a conscientização, a proteção das vítimas e o acompanhamento multidisciplinar com a participação de todos os envolvidos são medidas juridicamente adequadas, de preservação dos princípios do direito penal e que conferem eficácia ao comando constitucional de proteção à família (STJ, HC 155057/RJ, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª T., DJe 2/8/2010).

A família é a base da sociedade e tem a especial proteção do Estado; a assistência à família será feita na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. Inteligência do art. 226 da Constituição da República. As famílias que se erigem em meio à violência não possuem condições de ser base de apoio e desenvolvimento para os seus membros, de forma que os filhos daí advindos dificilmente terão condições de conviver sadiamente em sociedade, daí a preocupação do Estado em proteger especialmente essa instituição, criando mecanismos, como a Lei Maria da Penha, para tal desiderato. Somente o procedimento da Lei nº 9.099/1995 exige representação da vítima no crime de lesão corporal leve ou culposa para a propositura da ação penal. Não se aplicam aos crimes praticados contra a mulher, no âmbito doméstico e familiar, os ditames da Lei nº 9.099/1995. Inteligência do art. 41 da Lei n° 11.340/2006. A lesão corporal praticada contra a mulher no âmbito doméstico é qualificada por força do art. 129, § 9º, do Código Penal e se disciplina segundo as diretrizes desse diploma legal, sendo a ação penal pública incondicionada. Ademais, sua nova redação, feita pelo art. 44 da Lei nº 11.340/2006, impondo pena máxima de três anos à lesão corporal qualificada, praticada no âmbito familiar, proíbe a utilização do procedimento dos Juizados Especiais, afastando, por mais um motivo, a exigência de representação da vítima. Ordem denegada. Precedentes citados: HC 84.83 I-RJ, DJe 5/5/ 2008, e REsp. 1.000.222-DF, DJe 24/11/2008 (STJ, HC 106.805/MS, Relª. Minª. Jane Silva (Desembargadora convocada do TJ/MG), DJ 9/3/2009).

Da morte do ofendido ou declaração de ausência - Não se tratando de ação penal de natureza personalíssima, quando houver a morte do ofendido ou de ter sido declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou de prosseguir na ação passa ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.

Quanto ao desarquivamento do inquérito policial e provas novas - Arquivado o inquérito policiai, por despacho do juiz, a requerimento do Promotor de Justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem novas provas (STF, Súmula na 524).

As provas capazes de autorizar o desarquivamento do inquérito e consequente início da ação penal hão de ser substancialmente inovadoras, não bastando sejam formalmente novas (STJ, HC 122328/ SP, Rel. Min. Og Fernandes, 6ª T., DJe 14/12/2009).

A denúncia somente poderá ser aditada (Nos termos do caput do art. 384 do Código de Processo Penal, com a nova redação que lhe foi dada pela Lei na 11.719, de 20 de junho de 2008, encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em consequência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo da 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente), e receber nova capitulação legal com o surgimento de novas provas. Novas provas são as que já existiam e não foram produzidas no momento processual oportuno, ou que surgiram após o encerramento do inquérito policial. Arquivado o inquérito a requerimento do Ministério Público, nova ação penal não pode ser iniciada sem novas provas (STJ, Apn. 31 l/RO, Ação Penal 2000/0043398-5/CE, Corte Especial, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 4/9/2006, p. 198).

Da suspensão condicional do processo e ação penal de iniciativa privada - O benefício processual previsto no art. 89 da Lei n2 9.099/1995, mediante a aplicação da analogia in bonam partem, prevista no art. 32 do Código de Processo Penal, é cabível também nos casos de crimes de ação penal privada. Precedentes do STJ (STJ, RH C17061/ RJ, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, 6“T., DJ 26/6/2006, p. 199).

Nos crimes em que o jus persequendi é exercido por ação de iniciativa privada como tal o crime de injúria, é impróprio o uso do instituto da suspensão condicional do processo, previsto no art. 89 da Lei n2 9.099/95, já que a possibilidade de acordo é da essência do seu modelo, no qual tem vigor os princípios da oportunidade e da disponibilidade (STJ, HC 1743 l/SP, Rel. Min. Vicente Leal, 6ª T., DJ 23/6/2003 p. 444).

Da queixa-crime não assinada pelo querelante - Constituiu óbice ao regular desenvolvimento da ação penal a falta de menção do fato criminoso no instrumento de mandato visando à propositura da queixa-crime, que também não foi assinada pela querelante com o advogado constituído. Segundo os arts. 43, III,5 44 e 568, todos do Código de Processo Penal, a citada omissão só pode ser suprida dentro do prazo decadencial, tendo em vista que a expressão ‘a todo tempo’ significa ‘enquanto for possível’ (STJ, HC 450I7/GO, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, 6ª T., DJ 27/3/2006, p. 339).

Procuração e poderes para queixa-crime - É necessário constar do instrumento procuratório outorgado para o oferecimento da queixa-crime, além dos poderes especiais para o ato, o nome do querelado, a menção ao fato criminoso, ou ao artigo da lei violado, permitida a sanação de eventual defeito da representação do querelante, somente dentro do prazo decadencial conferido peio art. 38 do digesto processual penal (TJMG, Processo 2.0000.00.475739-5/000[l], Rel. Des. Antônio Armando dos Anjos, DJ 9/8/2005).

Em sentido contrário, a jurisprudência desta Corte é no sentido de que eventuais vícios ou irregularidades no instrumento de mandato, os quais se relacionam com a legitimidade do representante da parte e, não, com a legitimidade da própria parte, podem ser sanadas a qualquer tempo, mesmo após o decurso do prazo decadencial, nos termos do art. 569 do Código de Processo Penal. Não há forma rígida para a representação, bastando a manifestação inequívoca do ofendido ou de seu representante legal, no sentido de que sejam tomadas providências, hipótese ocorrida no caso dos presentes autos. A falta de menção do fato delituoso na procuração configura defeito sanável a qualquer tempo, pois não interfere na legimatio ad causam. Precedentes desta Corte (STJ, H C 67830/SC, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª T., DJ 18/6/2007, p. 283).

Da desistência da ação penal de iniciativa privada: A desistência da ação penal privada pode ocorrer a qualquer momento, somente surgindo óbice intransponível quando já existente decisão condenatória transitada em julgado (STF, Tribunal Pleno, HC 83228/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 11/11/2005, p. 6). (Greco, Rogério. Código Penal comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários sobre o Título VII “Da Ação Penal” – “Ação pública e de iniciativa privada – Art. 100 do CP, respectivamente p. 225-229. Ed. Impetus.com.br, acesso em 19/02/2023 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na interessante apreciação do tema, Wagner Muniz, comentários ao art. 100 do CP, em artigo intitulado “Teoria do Crime: Noções Introdutórias”, publicado em maio de 2022, incisivo, ilustra:

Chama-se de Teoria do Crime, à parte da ciência criminal na qual se dispõe a explicar o que é o crime, i.é, a Teoria Geral do Crime. Quais as características de qualquer delito. o delito pode-se interpretá-lo como injusto penal ou como injusto punível. O injusto penal é o fato típico e antijurídico. O conceito de crime pode se dar em três aspectos, sendo eles: formal, material ou analítico. Anteriormente a concepção se dava de duas formas: material ou formal.

O fato típico é a ação humana que se adequa ao tipo penal descrito em lei. Na contramão do fato atípico que é a conduta que não preenche os requisitos descritos no tipo penal. Para que determinado fato seja considerado crime, será necessário caracterizar os outros elementos do crime, pois sem ele não há necessidade de tutela penal. Podemos conceituar segundo o Professor Damásio de Jesus, os elementos necessários: a conduta, o resultado, a relação de causalidade ou nexo causal e a tipicidade.

Na visão de Antonio García-Pablos de Molina (2008, p. 01), a criminologia é uma ciência empírica e interdisciplinar, que se preocupa com o estudo do crime, da pessoa do infrator, da vítima e do controle social do comportamento delitivo, e trata de ministrar uma informação válida e constatada sobre a gênese, dinâmica e variáveis principais do crime, contemplando-o como problema individual e social, assim como sobre os programas para sua prevenção especial, as técnicas de intervenção positiva no homem delinquente e os diversos modelos ou sistemas de resposta ao delito. Zaffaroni (2003, p. 99) destaca que, ocupa-se das circunstâncias humanas e sociais relacionadas com surgimento, a prática e maneira de evitar o crime, assim como tratamento dos criminosos. Para a maioria dos autores, Lombroso foi o fundador da criminologia moderna.

Os sujeitos do crime são as pessoas ou entes que estão relacionados à prática e aos efeitos da empreitada criminosa. Dividindo-se em sujeito ativo – autor/coautor do fato, aquele que realiza direta ou indiretamente a conduta criminosa, seja isoladamente, seja em concurso (dois ou mais agentes), podendo este receber vários nomes bem como: agente (geral), indiciado (no inquérito policial), acusado (com oferecimento da denúncia ou queixa), réu (após o recebimento da inicial acusatória), reeducando (durante a execução penal), condenado (após o trânsito em julgado da condenação), egresso (após o cumprimento da pena), criminoso e delinquente (objeto de estudo das ciências penais, como na criminologia) – e sujeito passivo, aquele que é o titular do bem jurídico protegido pela lei penal violada por meio da conduta criminosa. Este pode-se ser nomenclaturado como vítima ou de ofendido.

O objeto do crime é o bem ou objeto contra o qual se dirige a conduta criminosa. Pode ser jurídico ou material. Objeto jurídico é o bem jurídico, isto é, o interesse ou valor protegido pela norma penal. A título de exemplo, no art. 121 do Código Penal, a objetividade jurídica recai na vida humana. O objeto material, de seu turno, é a pessoa ou a coisa que suporta a conduta criminosa. No homicídio, exemplificativamente, é o ser humano que teve sua vida ceifada pelo comportamento do agente, de acordo com Cleber Masson (2022, p. 174).

 

Para Cleber Masson (2022, p. 161): o conceito de crime é o ponto de partida para compreensão dos principais institutos do Direito Penal. E embora aparentemente simples, a sua definição completa e pormenorizada apresenta questões complexas que acarretam várias consequências ao estudo dos pontos mais exigidos em provas e concursos públicos. Qualquer operador do Direito, iniciante ou avançado, ainda não muito versado na área penal, se considera apto a fornecer o conceito de crime. Diz-se frequentemente: “Crime é o fato típico, ilícito…”, sem maior preocupação científica. Assim, não deve ser. Quando lhe for indagado o conceito de crime, uma resposta mais técnica e minuciosa deve ser apresentada. De fato, o crime pode ser conceituado levando em conta três aspectos: material, legal e formal ou analítico.


De acordo com o critério material ou substancial, crime é toda ação ou omissão humana que lesa ou expõe a perigo de lesão bens jurídicos penalmente tutelados. A presente fórmula leva em consideração a relevância do mal produzido aos interesses e valores selecionados pelo legislador como merecedores da tutela penal. Esse conceito de crime serve como fator de legitimação do Direito Penal em um Estado Democrático de Direito. O mero princípio da reserva legal se mostra insuficiente, ou seja, não basta apenas a lei para que qualquer conduta seja considerada penalmente ilícita.

Quanto ao critério legal, o conceito de crime é o fornecido pelo legislador. O Código Penal não possui nenhum dispositivo conceituando crime, tal tarefa ficou a cargo da Lei de Introdução ao Código Penal (Decreto-lei 3.914, de 9 de dezembro de 1941), em seu artigo 1º, que nos traz a seguinte redação: Art. 1º Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente.

A diferenciação, portanto, é nítida. A distinção entre crime e contravenção penal é de grau, quantitativa (quantidade da pena), e também qualitativa (qualidade da pena) e não ontológica. Quando o preceito secundário cominar pena de reclusão ou detenção, teremos um crime. Por outro lado, se o preceito secundário não apresentar as palavras “reclusão” ou “detenção”, estará se referindo a uma contravenção penal, uma vez que a lei a ela comina pena de prisão simples ou de multa. O Direito Penal brasileiro acolheu um sistema dicotômico, ao fracionar o gênero infração penal em duas espécies: crime ou delito e contravenção penal. Os termos crimes e delito se equivalem, ainda que em determinadas situações a Lei Maior e a legislação ordinária utilizarem a palavra delito, impropriamente, como sinônima de infração penal, bem como o art. 5º, inc. XL, da Carta Magna, e nos arts. 301 e 302 do Código de Processo Penal.

No crime temos: pena de reclusão ou de detenção, isolada, alternativa ou cumulativamente com a pena de multa. Já na contravenção penal: pena de prisão simples ou multa, isolada, alternativa ou cumulativamente. Em outros países como França e Alemanha, adotaram o sistema tricotômico, onde: crimes seriam as infrações mais graves, delitos as intermediarias e por fim, as contravenções penais as de menor gravidade. O Código Penal e a Lei das Contravenções Penais preveem algumas distinções quantitativas e qualitativas entre o crime e contravenção penal. A título de exemplo, quanto a aplicação da lei penal: a lei penal brasileira é aplicável, via de regra, aos crimes cometidos no território nacional (CRFB/88, art. 5º, caput) e a diversos crimes praticados no estrangeiro, em razão da sua extraterritorialidade (CP, art. 7º). Nas contravenções a lei brasileira somente incide no tocante às contravenções penais praticadas no território nacional (LCP, art. 2º).

Tratando-se da tentativa, nos crimes, é punível a tentativa (CP, art. 14, II). Mas, não se pune a tentativa de contravenção (LCP, art. 4º). O elemento subjetivo dos crimes pode ser doloso, culposo ou preterdoloso (CP, arts. 18 e 19), já nas contravenções penais, basta a ação ou omissão voluntária (LCP, art. 3º). Quanto a culpabilidade, nos crimes são compatíveis com o erro de tipo (CP, art. 20) e com erro de proibição (CP, art. 21), mas nas contravenções penais, admitem unicamente a ignorância ou a errada compreensão da lei, se escusáveis (LCP, art. 8º).

No crime, o tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 40 (quarenta) anos (CP, art. 75). Nas contravenções penais, a duração da pena de prisão simples não pode, em caso algum, ser superior a 5 (cinco) anos. Em relação ao período de prova dos sursis, nos crimes, varia entre dois a quatro anos, e, excepcionalmente, de quatro a seis anos (CP, art. 77, caput e § 2º), já nas contravenções penais, o período de sursis é de um a três anos (LCP, art. 11). O prazo mínimo das medidas de segurança, nos crimes, é de um a três anos (CP, art. 97, § 1º), nas contravenções penais, o prazo mínimo é de seis meses (LCP, art. 16). Nos crimes, a ação penal pode ser pública, incondicionada ou condicionada, ou de iniciativa privada (CP, art. 100). Nas contravenções penais, a ação penal é pública incondicionada (LCP, art. 17).

O critério analítico também é chamado de formal ou dogmático, este funda-se nos elementos que compõem a estrutura do crime. Basileu Garcia sustentava ser o crime composto por quatro elementos: fato típico, ilicitude, culpabilidade e punibilidade. Tal posição quadripartida é minoritária e, portanto, deve ser afastada, pois a punibilidade não é elemento do crime, mas uma consequência de sua prática. A título de exemplo, vamos imaginar um crime que prescreveu, não é porque operou-se o instituto da prescrição que o crime deixou de existir no mundo fático, dessa forma, o crime independe da punibilidade. Outros autores como Nélson Hungria, Aníbal Bruno, E. Magalhães Noronha, Francisco de Assis Toledo, Cezar Roberto Bittencourt e Luiz Regis Prado perfilham do entendimento da posição tripartida, onde os elementos do crime seriam: fato típico, ilicitude e culpabilidade. Hans Welzel, criador do finalismo penal, definia o crime como fato típico, ilícito e culpável: “O conceito de culpabilidade acrescenta ao de ação antijurídica – tratando-se de uma ação doloso ou não dolosa – um novo elemento, que se transforma em delito”.

A distinção entre os perfis clássico e finalista, onde a sua alocação do dolo e da culpa, reside principalmente, não em um sistema tripartido ou bipartido relativamente à estrutura do delito. No sistema clássico: crime é um fato típico e ilícito, praticado por agente culpável. No sistema finalista temos duas vertentes: crime como um fato típico e ilícito, praticado por agente culpável e também o conceito de crime como um fato típico e ilícito. Há doutrinadores que entendem o crime como fato típico e ilícito, são eles: René Ariel Dotti, Damásio E. de Jesus e Júlio Fabbrini Mirabete e outros. Os seguidores da teoria bipartida, a culpabilidade deve ser excluída da composição do crime, uma vez que se trata de pressuposto de aplicação de pena. Para a configuração do crime bastam o fato típico e a ilicitude, a culpabilidade importará na possibilidade (ou não) de imposição de pena.

Por fim, em sua redação original, o Código Penal de 1940 acolheu o conceito tripartido do crime, onde este é relacionado ao sistema clássico. Eram, portanto, elementos do crime o fato típico, a ilicitude e a culpabilidade. Acontece que, houve uma mudança com o advento da Lei 7.209/1984, onde o responsável pela redação da nova Parte Geral do Código Penal, a deixou a impressão de ter sido adotado um conceito bipartidário de crime, ligado obrigatoriamente à teoria finalista da conduta, segundo Masson (2022). (Wagner Muniz, comentários ao art. 100 do CP, em artigo intitulado “Teoria do Crime: Noções Introdutórias”, publicado em maio de 2022, no site wagnermunizk.jusbrasil.com.br, acesso em 19/02/2023 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Encerrando os comentários Flávio Olímpio de Azevedo. Comentários ao artigo 98 e 99 do Código Penal, ao falar sobre o Título VII “Da ação penal, resumindo o assunto em cinco parágrafos:

O direito de ação é exercício de provocar o Judiciário para um pronunciamento diante de uma ocorrência de uma infração penal é expressão constitucional de exigir a prestação jurisdicional aplicando o jus puniendi em nome do Estado, mediante um processo justo é garantido o sagrado direito de defesa.

Da Ação penal quanto à titularidade – pode ser pública ou Ação penal pública incondicionada à representação e Ação pública condicionada à representação, distinção que atende a critério de conveniência político-criminal.

Da Ação penal pública incondicionada – sem necessidade de queixa é iniciada por meio de petição denominada denúncia apresentada pelo Ministério Público, legitimado por atribuição constitucional (art. 129) provoca o Juiz para prestação jurisdicional.

Dependendo quando a lei exigir, pode ser representação do ofendido ou requisição do Ministro da Justiça ao Ministério Público que ao receber o pedido que lhe é dirigida, havendo elementos suficientes de tipificação penal apresentar a denúncia ou solicitar novos documentos, requisitar abertura de inquérito policial, ainda arquivar a requisição, enfim não é obrigado a iniciar a persecução penal.

Ação penal privada condicionada: “é a transferência do direito de acusar do Estado para particular, pois o interesse eminentemente privado.” Note-se que não é transferido o direito de punir, mas tão somente, o direito de agir. (Código Penal comentado, Guilherme de Souza Nucci, Editora RT, p. 101).

Por ser sujeita a representação do ofendido inicia-se com petição intitulada de queixa com os mesmos requisitos da denúncia (art. 41 do CPP).

A vítima maior de 18 anos tem legitimidade de representar, ou representante legal, no caso de impedimento da vítima mentalmente enferma ou ainda não tendo, será nomeado pelo Juiz um curador.

Em caso de morte da vítima, tem legitimidade os familiares, cônjuge, descendente ou irmão na forma do parágrafo quarto. (Flávio Olímpio de Azevedo. Comentários ao artigo 98 e 99 do Código Penal, ao falar sobre o Título VII “Da ação penal, publicados no site Direito.com, acessado em 19/02/2023, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).