sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 795, 796, 797 - continua - DO SEGURO DE PESSOA - VARGAS, Paulo S. R.

Direito Civil Comentado - Art. 795, 796, 797 - continua
- DO SEGURO DE PESSOA - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XV – DO SEGURO DE PESSOA
 – Seção III - (art. 789 a 802) - vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 795. É nula, no seguro de pessoa, qualquer transação para pagamento reduzido do capital segurado.

Na menção de Claudio Luiz Bueno de Godoy, em primeiro lugar, é preciso não olvidar que, no seguro de pessoa, por qualquer de suas modalidades, sobressalta uma especial função previdenciária, mais que ou mesmo sem um caráter indenitário, como no seguro de dano (ver comentário ao CC 789). A particularidade dessa finalidade do seguro de pessoa determina a regra vedatória de qualquer transação que tenha por objeto diminuir o valor do seguro a ser pago. Lembre-se que no seguro de pessoa a fixação do valor segurado se faz de forma apriorística, por estimativa das partes, com base na qual, frise-se, se calcula o prêmio a ser pago. Não se cuida, pois, de estabelecer apenas um teto máximo para indenização do efetivo prejuízo experimentado, como no seguro de dano. Por isso é que a nova lei reputa não se compadecer com a sistemática do seguro de pessoa a transação que reduza o importe do capital segurado a ser pago. Muito menos haveria de se cogitar dessa transação, com o beneficiário, nos seguros de pessoa em que o sinistro é o evento morte, quando o contratante, que é o segurado, responsável pelo pagamento dos prêmios fixados, já não mais sobrevive.

De qualquer maneira, porém, descaberá, em qualquer das formas de seguro de pessoa, dada sua própria natureza e finalidade, a transação que induza o pagamento de capital segurado menor que o contratado. Fulmina a lei tal ajuste com a sansão da nulidade, quando melhor, na observação de Sílvio de Salvo Venosa (Direito civil, 3. ed. São Paulo, Atlas, 2003, v. III, p. 385), será reputá-lo ineficaz, de resto como já se inferia na jurisprudência, levando em conta que o importe pago a menor não extingue a obrigação, cabendo sempre a cobrança da diferença em relação à quantia total do segurado. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 823 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 14/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Aponta Fiuza em sua doutrina que, pelo art. 1.442 do CC de 1916, se às partes seria lícito ficar entre si a taxa do prêmio e, na hipótese, de seguro feito em companhia que adote tabela de prêmio, presume-se que o valor do seguro esteja na conformidade do com ela proposto e aceito. Nesse caso, as tabelas integram o próprio contrato e, celebrado este, entende-se que as partes aceitaram e aderiram, voluntariamente, às respectivas taxas.

Observa-se daí que o segurado e o segurador estão obrigados a preservar a boa-fé, a lealdade e a veracidade, assim a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes; todos os contratos, desenganadamente, devem respaldar-se na boa-fé e na honestidade, mas, no de seguro, sobreleva a importância desse elemento, porque, em regra, funda-se precipuamente nas mútuas afirmações das próprias partes contratantes.

Nessas condições, não é legítimo à seguradora transacionar com o beneficiário visando à diminuição do capital segurado, pois seria juridicamente inconcebível substituir a vontade do segurado, a esta altura já falecido, conferindo interpretação ampliativa ao contrato, ou melhor, mudando-lhe o alcance ou oferecendo-lhe destinação diversa daquela que resulta do seu texto originário, máxime quando esta puder efetivamente traduzir intenção diversa da que almejava o segurado. Justamente por se tratar de verdadeiro direito indisponível do segurado, é vedado qualquer tipo de transação para diminuir o pagamento do capital segurado. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 419 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 14/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No balanço de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, se houver litígio quanto ao direito à indenização, o dispositivo veda que as partes transacionem quanto ao valor desta. A proibição visa a desestimular o não pagamento da indenização quando devida. A nulidade é absoluta, fundada em razão de ordem pública e se a transação, não obstante, vier a ocorrer, a nulidade dela garante ao beneficiário reclamar diferença. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 14.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 796. O prêmio no seguro de vida, será conveniado por prazo limitado, ou por toda a vida do segurado.

Parágrafo único. Em qualquer hipótese, no seguro individual, o segurador não terá ação para cobrar o prêmio vencido, cuja falta de pagamento, nos prazos previstos, acarretará, conforme se estipular, a resolução do contrato, com a restituição da reserva já formada, ou a redução do capital garantido proporcionalmente ao prêmio pago.

Recorda Claudio Luiz Bueno de Godoy que, mesmo sem a explicitação contida no art. 1.471 do Código Civil de 1916, continua a se admitir que o segura de pessoa sobre a vida do segurado compreenda, basicamente, duas hipóteses: os seguros em caso de morte e os seguros em caso de sobrevida. No primeiro caso, obriga-se o segurador a pagar um capital ou uma renda, ou ambos, ao beneficiário, por ocasião do evento morte do segurado; no segundo, ao segurado, se a vida ultrapassar um termo fixado no contrato.

O Código de 2002, no artigo em pauta, mencionou apenas o seguro de vida, propriamente, deixando de aludir ao chamado seguro de sobrevivência, como o fazia o antigo Código, na parte final do art. 1.471. entretanto, isso não significa excluir a possibilidade, ainda, de sua contratação, nunca vedada pelo CC/2002, não olvidando que a matéria é de autonomia privada (v.g., Caio Mário Silva Pereira. Instituições de direito civil, II. ed., atualizada por Regis Fichtner, Rio de Janeiro, Forense, 2004, v. III, p. 464). O que faz o atual Código, no caput do artigo em discussão, é estabelecer a possibilidade de, nos seguros de vida, se convencionar o pagamento do prêmio por certo prazo ou pela vida do segurado, sem a adstrição à anualidade, como constava do art. 1.471 do Código de 1916. O parágrafo único do mesmo artigo determina como que uma potestativa prerrogativa de desistência para o segurado, quando o seguro de vida seja contratado de forma individual.

A propósito é bom lembrar que os seguros de vida podem ser em grupo, ou seja, em que um estipulante age como mandatário dos segurados, instituindo cobertura do evento morte para pagamento do capital ou renda a um beneficiário indicado; em regra, é contratado de forma temporária, com renovações ao cabo de períodos previamente ajustados. Já os seguros individualmente contratados, ao revés, em geral voltam-se a períodos de longa duração, mesmo para os casos de sobrevida, tanto mais para os casos de morte, como observa João Marcos Brito Martins (O contrato de seguro. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2003, p. 143), a se ver prevendo-se, então, verdadeira possibilidade de desistência do segurado quando se subtrai do segurador, em caso de não pagamento do prêmio, a ação de cobrança, deferindo-lhe a lei, tão somente, e conforme o estipulado, ação de resolução do ajuste, com devolução da provisão de capital já formado, e abatidas as perdas causadas ao fundo constituído (ver, a respeito, comentário ao artigo seguinte), ou redução do capital garantido, proporcionalmente ao prêmio pago. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 824 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 14/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Ricardo Fiuza aponta os ensinamentos de Orlando Gomes, “o seguro de vida propriamente dito é o contrato mediante o qual o segurador se obriga a, por morte do segurado, pagar determinada quantia a quem este designar” (Contratos. 8. ed., Rio de Janeiro, Forense, 1981, p. 438). A par dessa conceituação, tem-se que, tanto o seguro pode ser concebido tendo em vista a morte do segurado, como também para o caso de sua sobrevivência.

Dessa maneira, podem-se distinguir duas espécies de seguro de vida: a) quando o segurado morrer, o segurador assume a obrigação de pagar determinada quantia ao beneficiário; e b) o que tem como evento eclotivo a sobrevida do segurado a uma data prefixada, ou seja, trata-se de uma condição suspensiva, sendo certo que o pagamento do prêmio fica condicionado a um evento futuro e incerto, qual seja o de o segurado ultrapassar determinada faixa etária. Na primeira hipótese, estamos diante do seguro de vida stricto sensu, que pode constituir-se por lapso temporal determinado, ou prolongar-se por toda a vida do segurado; na segunda, perfaz-se o chamado “seguro de sobrevivência”, cujo risco reside na sobrevida do segurado a uma data-limite. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 419 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 14/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Para Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o valor do prêmio e sua forma de pagamento são livremente estipulados pelas partes. O seguro de vida pode ser contratado por prazo determinado ou indeterminado e, neste caso, pode ser estabelecido pelas partes que o prêmio seja pago em parcelas periódicas, durante toda a vigência do contrato.

A falta de pagamento do prêmio acarreta a perda do direito à indenização e a resolução do contrato que opera ex lege, independentemente de notificação do devedor.

É possível que o seguro seja acompanhado da formação de reserva a ser resgatada pelo próprio segurado em certas condições. O contrato deve prever o destino a ser dado a tal reserva, se será restituída ao segurado, se será perdida em favor da seguradora ou se garantirá ao segurado a continuidade da garantia com a redução da indenização. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 14.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 797. No seguro de vida para o caso de morte, é lícito estipular-se um prazo de carência, durante o qual o segurador não responde pela ocorrência do sinistro.

Parágrafo único. No caso deste artigo o segurador é obrigado a devolver ao beneficiário o montante da reserva técnica já formada.

No raciocinar de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o dispositivo, diga-se em primeiro lugar, refere, dentre as hipóteses de seguro sobre a vida do indivíduo (veja comentários ao CC 794 e ao artigo anterior), aquele em que se cobre o evento morte, real ou presumida, na forma do CC 7º (quanto à ausência, veja referencia no CC 794). Nesse caso, estabelece a possibilidade de instituição de um prazo de carência, ou seja, interregno dentro do qual, persistente a obrigação de pagamento do prêmio, e mesmo havido o sinistro, não haverá pagamento do capital segurado. É certo que tal contingência depende, fundamentalmente, de ajuste das partes. A lei não impôs, obrigatoriamente, prazo de carência, nem esse prazo pode ser fixado de maneira excessiva, de moro a, configurando abuso, desnaturar a garantia que se quer contratar com o seguro. Pense-se, por exemplo, na hipótese de entabulação por pessoa já idosa e fixação de longo prazo de carência, então quase a afastar, de antemão, a cobertura de sinistro que se venha a dar. Trata-se, porém, de questão casuística, a ser apreciada pelo juiz na hipótese concreta.

Fato é, todavia, que, havido o sinistro do prazo da carência, e embora desobrigado o segurador de pagar o capital estipulado, deverá reembolsar ao segurado o montante da reserva técnica já formada. Essa reserva ou provisão técnica, também mencionada no parágrafo único do artigo anterior, vem prevista nos arts. 28 e 84 do Decreto-Lei n. 73/66, definindo-se, nos seguros de vida individuais, e não nos de grupo, conforme a lição de João Marcos Brito Martins (O contrato de seguro. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2003, p. 143-4), como uma parcela do prêmio, um plus que, fora do cálculo do risco em si, se destina a constituir um depósito garantidor não só do cumprimento das obrigações da seguradora, mas, antes, uma provisão que permite nivelar o prêmio a ser pago, sem permanente e constante alteração de seu valor, correspondente ao aumento de idade do segurado, ampliando-se, assim, o risco de sinistro. Quer dizer, seria uma forma de viabilizar o plano com prêmios nivelados, equilibrados, com reajustes episódicos, sem sucessivos aumentos diante do crescimento da idade do segurado. A questão, porém, é a devida informação ao segurado sobre esse montante, sem o que a devolução deverá se fazer pelo cálculo dos prêmios pagos, abatido quanto se provar despendido à gestão do fundo que o seguro encerra. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 824 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 14/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, o reportado dispositivo vem proteger a figura do segurador, colocado, não raras vezes, em posição inferior à do segurado. Como uma forma de possibilitar àquele um espaço de tempo para se reorganizar financeiramente, a lei faculta às partes interessadas estipularem um prazo de carência, isentando-o, nesse ínterim, de pagar a indenização pela ocorrência do sinistro. Somente ao cabo desse período é que o beneficiário poderá acionar o segurador para o cumprimento da obrigação. Nesse caso excepcional estará o segurador, todavia, obrigado a devolver ao beneficiário toda a quantia da reserva técnica já formada. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 420 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 14/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a fim de se precaver contra riscos já existentes na época da contratação, que o segurado já conhecia ou não, e que acarretam a prematura ocorrência do sinistro, pode a seguradora estabelecer prazo de carência que, como termo inicial, impede a eficácia da obrigação de indenizar até que seja ultrapassado.

Se o contrato contiver previsão de formação de reserva técnica essa deverá ser devolvida ao estipulante ou a seus herdeiros caso o óbito do segurado ocorra antes de ultrapassado o referido prazo. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 14.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).