Direito Civil
Comentado - Art. 876, 877, 878 - continua
Do Pagamento Indevido - VARGAS, Paulo S. R.
Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art.
233 ao 965) - Título VII – Dos Atos Unilaterais
(Art.
854 a 886) Capítulo III – Do Pagamento Indevido
Art. 876. Todo aquele
que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação que
incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição.
Medindo com a
régua de Hamid
Charaf Bdine Jr, o valor recebido por quem não é credor deve ser restituído, sob
pena de enriquecimento injustificado. Do mesmo modo, se o recebimento se
verifica sob condição – i.é, dependendo de fato futuro e incerto -, caso o
evento condicionante não se verifique, o pagamento efetuado deixa de ser
devido, de modo que deve ser restituído (CC 125).
Carlos Roberto Gonçalves,
ao comentar o presente dispositivo, anota: “Nessa matéria vigora o tradicional
princípio de que todo enriquecimento sem causa jurídica e que acarrete como
consequência o empobrecimento de outrem induz obrigação de restituir em favor
de quem se prejudica com o pagamento” (Direito
civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2004, v. III, p. 580).
Trata-se
de uma modalidade de enriquecimento sem causa, tratado especificamente a partir
do CC 884. Newton de Lucca registra que os requisitos para a configuração do
pagamento indevido são os seguintes: “a)
animus solvendi, ou seja, a intenção de pagar; b) inexistência do débito ou
pagamento endereçado àquele que não seja o credor” (Comentários ao novo Código Civil, Rio de Janeiro, Forense, 2003, v.
XII, P. 79). (Hamid Charaf Bdine Jr., apud
Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de
10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 893
- Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 25/03/2020. Revista e atualizada nesta data
por VD).
No
dizer de Ricardo Fiuza, pagamento indevido é aquele feito voluntariamente, e
por erro, sobre débito inexistente. Quem recebe pagamento indevido (accipiens) deve devolvê-lo, sob pena de
locupletamento. Essa regra também se aplica na hipótese de pagamento de dívida
condicional sem que tenha sido cumprida a condição. Em se tratando de pagamento
de tributos indevidos, a regra a ser aplicada é a mesma (v. art. 165 do CTN). O instrumento hábil para o recebimento do valor
pago indevidamente, não sendo a restituição voluntária ou administrativa, é a
ação de repetição do indébito.
Esse
artigo repete o de n. 964 do Código Civil de 1916, com pequena melhoria de
redação, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. Sobre a
matéria, vide Carlos Alberto Dabus
Maluf. Pagamento indevido e enriquecimento sem causa. Revista da Faculdade de Direito da USP, v. 93, p. 115, 1998, e
Pressupostos do pagamento indevido, RF, 257/379.
(Direito Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 454 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 25/03/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Conforme Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira, o pagamento indevido é a principal espécie de
enriquecimento sem causa (CC 884 a 886).
O pagamento indevido é o
realizado por erro de quem supõe a existência de obrigação inexistente. O
pagamento é indevido nos seguintes casos: a) Desacordo sobre a causa (ex.:
alguém paga empréstimo sem perceber que a prestação que h avia recebido lhe
havia sido paga a título de doação); b) ilicitude (ex.: pagamento realizado por
absolutamente incapaz ou contra proibição legal relativa à forma ou o fundo do
direito); c) Pagamento anterior à realização da condição suspensiva.
O pagamento
anterior ao vencimento do termo não é indevido nem pode ser repetido, porque a
obrigação sujeita a atermo existe desde o momento em que contraída (CC 131). (Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 25.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art.
877. Àquele que voluntariamente pagou o indevido incumbe
a prova de não tê-lo feito por erro.
No dizer de Hamid Charaf Bdine Jr, para que o valor recebido indevidamente
seja restituído, aquele que efetuou o pagamento deverá comprovar que o fez por
erro. A demonstração de que o pagamento foi feito por equívoco acarretará a
conclusão de que não foi espontâneo, consciente e intencional. Vale dizer: foi
feito apesar da consciência de que o valor não era devido. Pois, se o valor não
era conscientemente devido e o pagamento se fez mesmo assim, não há
oportunidade de repetição, na medida em que se equipara a uma liberalidade ou
renúncia de direito.
Como se verifica, o Código Civil
adotou a teoria subjetiva, tornando indispensável a demonstração do erro.
Contudo, se não houve erro, a repetição pode encontrar fundamento no
enriquecimento sem causa (CC 884 a 886).
O ônus da prova do erro, segundo
o presente dispositivo, é daquele que efetuou o pagamento. Acrescente-se, com
amparo na lição de Newton de Lucca, que, caso o pagamento tenha se verificado
involuntariamente – por coação, exemplificativamente -, não será o caso de
incidência do presente dispositivo, mas de defeito do negócio jurídico (CC 171,
II), suscetível de anulação (Comentários
ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. XII, p. 83).
O art. 42, parágrafo único, do
Código de Defesa do Consumidor, estabelece a obrigação de o fornecedor
restituir em dobro ao consumidor aquilo que este pagou indevidamente, com
correção monetária e juros de mora, salvo engano justificável. A disposição tem
natureza distinta do pagamento indevido contemplado no Código Civil, pois não
exige o erro do consumidor, limitando-se a estipular uma única hipótese de
exclusão de responsabilidade do fornecedor: o engano justificável. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud
Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de
10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 895
- Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 25/03/2020. Revista e atualizada nesta data
por VD).
No pensar de Ricardo Fiuza,
para se receber a restituição do pagamento feito indevidamente é necessário que
este tenha sido feito por erro. O ônus da prova do erro incumbe a quem fez o
pagamento indevido voluntariamente (solvens).
Este dispositivo repete o
art. 965 do Código Civil de 1916, com pequena melhoria de redação, devendo a
ele ser dispensado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito
Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 454 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 25/03/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Na pauta de Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira, como
espécie de enriquecimento sem causa, o pagamento indevido exige que haja o
enriquecimento de uma pessoa, o prejuízo de outra pessoa e o nexo causal entre
o enriquecimento de uma e o prejuízo da
outra.
Para que seja indevido o pagamento é necessária a ausência de
íntima justificação para o fenômeno (atribuição patrimonial defectiva de
causa).
Não é necessária a capacidade para o enriquecido e para o
enriquecedor, por se tratar de fato jurídico em sentido estrito.
Se o enriquecedor for capaz e o enriquecimento decorrer de ato
seu, é necessário que tenha agido por erro.
A jurisprudência exclui o
direito à repetição se o pagamento visar ao cumprimento de prestação de cunho
alimentar, se o enriquecido o tiver recebido de boa-fé, com base nos princípios
da segurança jurídica e da confiança (ex.: pensão alimentícia, vencimentos de
servidor público, pensões e benefícios de aposentadoria). (Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 25.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art.
878. Aos frutos, acessões, benfeitorias e deteriorações
sobrevindas à coisa dada em pagamento indevido, aplica-se o disposto neste
Código sobre o possuidor de boa-fé, conforme o caso.
No
entender de Hamid Charaf Bdine Jr, a coisa dada
em pagamento indevido fica em poder daquele que a recebeu sem ter direito ao
bem. Esse falso credor pode ter agido de boa-fé ou de má-fé e poderá ter
percebido frutos do bem ou ter incorporado acessões a ele. Pode ser, ainda, que
o bem recebido tenha se deteriorado.
Caso o credor tenha agido de
boa-fé, a hipótese se regerá pelo disposto no CC 1.214 e seu parágrafo único,
CC 1.217 e CC 1.219. Se tiver agido de má-fé, a questão rege-se pelo disposto
no CC 1.214, parágrafo único, CC 1.216, CC 1.218 e CC 1.220. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud
Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de
10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 897
- Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 25/03/2020. Revista e atualizada nesta data
por VD).
A
doutrina mostra que, aquele que recebeu o pagamento indevido de boa-fé (accipiens
de boa-fé) deverá devolver a
coisa recebida indevidamente, mas terá direito de conservar os frutos
percebidos e de ser indenizado relativamente às benfeitorias úteis e necessárias.
Quanto às voluptuárias, poderá levanta-las, desde que não altere a substância
da coisa. O accipiens de má-fé deverá
devolver tudo que recebeu, juntamente com seus frutos, não tendo direito a
indenização por benfeitorias úteis e necessárias, não podendo, ainda, levantar
as voluptuárias. De resto devem ser aplicadas as regras dos possuidor de boa-fé
e do possuidor de má-fé (v. CC 1.214
a 1.220). O artigo é mera repetição do art. 966 do Código Civil de 1916, com
pequena melhoria de redação, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento
doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 455 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 25/03/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD.
No
parecer de Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira, o possuidor é de boa-fé ou de má-fé conforme
ignore ou não o vício ou obstáculo que impede a aquisição da coisa (CC 1.201).
O dispositivo
manda aplicar esse critério à coisa que é indevidamente entregue ao enriquecido
para o cumprimento de obrigação, relativamente a seus frutos, acessões,
benfeitorias e deteriorações. Ou seja, se o enriquecido recebe a coisa com o
conhecimento de que ela lhe está sendo entregue por erro, será possuidor de
má-fé e responderá por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos
que, por culpa sua, deixou de perceber, desde momento em que se constituiu de
má-fé, conforme o CC 1.216, responde pela perda ou deterioração da coisa, ainda
que acidentais, salvo se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela
na posse do enriquecedor (CC 1.218) e somente pode cobrar ressarcimento pelas
benfeitorias necessárias (CC 1.220). o enriquecido de boa-fé é também possuidor
de boa-fé e, por isso, não responde pela perda ou deterioração da coisa a que
não der causa (CC 1.217), tem direito aos frutos percebidos (CC 1.214) e tem
direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às
voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem
detrimento da coisa e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das
benfeitorias necessárias e úteis (CC 1.219). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 25.03.2020, corrigido e aplicadas
as devidas atualizações VD).