quarta-feira, 22 de maio de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 356, 357, 358 e 359 Da Dação em Pagamento – VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 356, 357, 358 e 359
Da Dação em Pagamento – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título III – DO ADIMPLEMENTO E EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES
 (art. 304 a 388) Capítulo V – Da Dação em Pagamento –
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 356. O credor pode consentir em receber prestação diversa da que lhe é devida.

Senão, veja-se, seguindo o parecer de Bdine Jr. que, ao contrário do art. 995 do Código revogado, o presente dispositivo admite a dação em pagamento mesmo nas dívidas que não sejam em dinheiro – embora tal providencia já fosse admitida, pois se insere nos limites da autonomia privada. A dação implica extinção da obrigação originalmente contraída pelo devedor mediante concordância do credor em receber outra prestação, distinta da convencionada: por exemplo, aceita receber em serviços prestados pelo devedor, que lhe devia dinheiro ou concorda em dar quitação de dívida de dinheiro ao receber um quadro de um pintor consagrado.

Sob o enfoque de Bdine Jr., não há contradição entre este dispositivo e o art. 313, porque não se trata de obrigar o credor a receber prestação diversa da estipulada, mas sim de contar com seu consentimento na entrega de prestação diversa, o que inclui a dação em pagamento entre negócios jurídicos bilaterais – conjugação das vontades destinada a extinguir direitos de natureza patrimonial. A aceitação do credor é essencial à validade da dação. Distingue-se da novação, porque acarreta o adimplemento da prestação, diversamente desta última, em que nova obrigação ainda não adimplida substitui a anterior, igualmente não cumprida. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 369 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/05/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Seguindo a doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, tem-se que a dação em pagamento, também chamada datio in solutum pelos romanos, é o acordo liberatório feito entre o credor e o devedor, em virtude do qual consente ele em receber coisa que não seja dinheiro, em substituição à prestação que lhe era devida – aliud pro alio.

Também que a dação pode ter por objeto qualquer tipo de prestação, positiva (dar e fazer) e negativa (não fazer), bens móveis e imóveis, direitos reais ou pessoais, cessão de crédito etc., contudo não se pode confundir dação e novação, porque esta substitui a obrigação por outra, enquanto aquela extingue definitivamente a obrigação. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 197, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/05/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Encontra-se em direito.com, em 22/05/2019, o que pose ser considerado uma síntese dos dois comentários acima, que os completa. No site temos que, desde que o credor consinta, pode haver a substituição da coisa a ser entregue por outra, por meio da transferência de propriedade de bem móvel ou imóvel (efeito translatício esse que se dá pela tradição ou pelo registro de título aquisitivo, respectivamente). Esse negócio, então, de caráter translativo oneroso, exige uma dupla capacidade das partes: a capacidade de dispor da coisa pelo devedor (ius disponendi) e a capacidade de dar o consentimento necessário à substituição da coisa a ser entregue pelo credor. São requisitos da dação em pagamento: (i) a existência de uma dívida, (ii) o consentimento do credor; e (iii) a entrega de coisa diversa da devida, visando à extinção da dívida.

Explica que a coisa a ser entregue pode ser tanto um móvel quanto imóvel, corpóreo ou incorpóreo ou até mesmo um direito (ex.: usufruto). A coisa dada em pagamento deve ter uma existência atual, dado que, se versar sobre compromisso de entregar algo no futuro, implicará na criação de uma nova obrigação, configurando a novação da dívida, caso a obrigação original seja extinta e substituída. A coisa também deve ser efetivamente diversa da coisa originalmente devida, não se configurando dação em pagamento a utilização de meios de pagamento (entrega de cheque, crédito em conta corrente).

E que a dação em pagamento pode se dar pela substituição de uma coisa por dinheiro (rem pro pecúnia), de uma coisa por outra coisa (rem pro re), de uma coisa por um fato (rem pro facto), de um fato por outro fato etc.

Finalmente, que a dação em pagamento pode referir-se apenas à quitação parcial da dívida. (Direito.com acesso em 22.05.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 357. Determinado o preço da coisa dada em pagamento, as relações entre as partes regular-se-ão pelas normas do contrato de compra e venda.

Há aqui uma inversão das partes no contrato. Segundo Bdine Jr., são as regras da compra e venda que incidem sobre os casos em que as partes estabelecem o preço do bem dado em pagamento. Assim, o negócio da dação será uma compra e venda, em que o devedor ocupa a posição do vendedor e o credor, a do comprador.

Se não houver indicação de valor específico do bem dado em pagamento, mas houve intenção de dar em pagamento e aceitação do bem, será imperioso o reconhecimento da quitação, só sendo possível prevalecer eventual saldo se as partes convencionarem a respeito. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 371 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/05/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em seguida dois comentários quase desiludidos. Um em relação à equiparação entre a dação em pagamento e a compra e venda após a definição do preço, sem, no entanto, existir identidade. A dação em pagamento, segundo Guimarães e Mezzalina, não é um contrato, mas sim uma modalidade específica de solução, com efeitos liberatórios ao devedor. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 22.05.2019), o segundo comentário, refere-se ao parecer de Ricardo Fiuza, sobre não ter sido o dispositivo em exame, atingido por nenhuma espécie de modificação, seja da parte do Senado Federal, seja da parte da Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto. Trata-se, segundo ele, de mera repetição do art. 996 do Código Civil de 1916, sem qualquer alteração, nem mesmo de ordem redacional. O dispositivo, esclarece, só tem aplicação quando o objeto da dação consistir na entrega da coisa, móvel ou imóvel, corpórea ou incorpórea, e cujo preço se equivalha à coisa contratada inicialmente de acordo com os contratantes. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 198, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/05/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 358. Se for título de crédito a coisa dada ao pagamento, a transferência importará em cessão.

Seguindo a esteira de Guimarães e Mezzalina, há, nesse caso, uma cessão de crédito, dado que, na entrega do título de crédito, há uma transferência da qualidade creditícia do devedor ao credor em determinada relação jurídica (datio in solutum). Assim, o credor poderá exigir de terceiro a prestação incorporada no título.

Observa-se que a entrega de título de crédito ao credor, em que o próprio devedor está no polo passivo da obrigação, não representa uma dação em pagamento, mas simples meio de pagamento (datio pro solvendo – não há sub-rogação de obrigações; a primeira só é extinta com o cumprimento da segunda) ou novação de débito. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 22.05.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Ricardo Fiuza, importando a transferência em cessão do crédito dado em pagamento, resulta a observância do disposto nos arts. 290 a 295 deste Código. Assim, a operação deve ser notificada ao devedor e quem fez a dação fica responsável pela existência do crédito. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 198, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/05/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

O parecer de Bdine Jr., estende-se um tanto mais, ao comentar outros autores, esclarecendo este artigo tratar das hipóteses em que o título de crédito é de emissão do próprio devedor. Citando Renan Lotufo, que, embora pareça, não se trata de uma novação, pois a nova obrigação subsiste ao lado da antiga, “servindo a mais recente como forma mais rápida de realização do crédito” (Código Civil comentado. São Paulo, Saraiva, 2003, v. II, p. 335).

Se o título dado em pagamento houver sido emitido por terceiro, a afirmação de que se trata de cessão de crédito significa que a transferência do título de crédito não se sujeita às regras cambiárias do endosso. Assim, o portador não pode valer-se da inoponibilidade das exceções pessoais ao terceiro de boa-fé, pois, regendo-se a relação jurídica pela cessão de crédito, serão oponíveis ao portador – cessionário do título por força da dação em pagamento -, as mesmas exceções de que ele dispunha contra o credor originário até que venha a ter conhecimento da transferência (art. 294).

Observa ainda Bdine Jr., que isso só se verifica porque a entrega do título pelo devedor ao credor configurou cessão, e não endosso, nos termos do dispositivo ora em exame. O comentário ao art. 294 é pertinente à interpretação e aplicação do presente dispositivo. Maria Helena Diniz observa que, nessa hipótese, o cedido deve ser notificado, de acordo com o disposto no art. 290, e o devedor fica responsável pela existência do débito dado em pagamento (art. 295) (Curso de direito civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2002, v. II, p. 270). A autora conta com a concordância de Judith Martins-Costa (Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. V, t. I, p. 497). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 371-372 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/05/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 359. Se o credor for evicto da coisa recebida em pagamento, restabelecer-se-á obrigação primitiva, ficando sem efeito a quitação dada, ressalvados os direitos de terceiros.

Na visão de Guimarães e Mezzalina, com a anulação da quitação, restabelece-se a obrigação primitiva, inclusive no tocante às respectivas garantias. Tanto a evicção total, como a parcial têm o condão de anular por inteiro a quitação conferida ao débito. Afinal, segundo Pereira, “vindo a perder uma parte dela, não pode o credor ser compelido a aceitar a parte não evicta como solução parcial”. (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, op. cit., p. 238) (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 22.05.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Explica Bdine Jr., que a evicção está disciplinada nos arts. 447 a 457 deste Código. Se ela se verificar quanto ao bem entregue em dação, as consequências não serão as previstas no art. 450, mas sim a sua desconsideração, para que se restabeleça a obrigação primitiva. Com isso, as consequências do inadimplemento desta é que serão impostas aos inadimplentes, e não as que da evicção decorreram.

O autor ensina que a incidência das demais disposições da evicção à dação é reconhecida neste dispositivo, de maneira que o devedor que adimplir sua prestação por intermédio da dação pode pactuar reforço, diminuição ou exclusão da responsabilidade (art. 448), sujeitando-se, nesse caso, ao disposto no art. 449. Também poderá optar entre o restabelecimento da obrigação primitiva e sua quitação parcial, se a evicção for parcial, tendo em vista o disposto no art. 455. Finalmente, poderá proceder à denunciação por saltos aos anteriores proprietários do bem e deixar de resistir à ação do evictor, se o devedor que lhe deu o bem em pagamento não atender à denunciação (arts. 455 e ss). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 373 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/05/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Inicia o maestro Ricardo Fiuza, conceituando Evicção, como a perda da coisa por decisão judicial proferida em ação de reivindicação proposta pelo legítimo dono. Vide comentários aos arts. 447 a 457 deste Código. E menciona Carvalho de Mendonça, citado por Beviláqua, que resume com maestria a situação: “Se a dação é uma forma de pagamento, não se compreende que este se possa fazer senão de modo a libertar o devedor e satisfazer, plenamente, os interesses do credor. Ora, se o que ele prestou não era seu, não se pode ver de que modo ele possa se exonerar. Por outro lado, se o credor pode ser ainda incomodado por terceiro, se aquilo que recebeu como uma prestação, que lhe era devida, deixa de o ser, de fato, a que ficaria reduzido o seu direito creditório” (Código Civil comentado, cit., p. 160). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 198, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/05/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).