sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 702, 703, 704 - continua - Da Comissão - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 702, 703, 704 - continua
- Da Comissão - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XI – Da Comissão –
(art. 693 a 709) vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 702. No caso de morte do comissário, ou, quando, por motivo de força maior, não puder concluir o negócio, será devida pelo comitente uma remuneração proporcional aos trabalhos realizados.

Na toada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a ideia central do dispositivo, tal como já continha o art. 187 do Código Comercial, é remunerar o comissário pelo serviço que ele tenha prestado, de forma proveitosa, mesmo que não completamente, i.é, mesmo que não ultimado o negócio cuja prática lhe foi cometida, mas sem sua culpa, tudo a fim de evitar, a rigor, indevido enriquecimento do comitente à custa do trabalho alheio.

Segue-se, pois, que a remuneração do comissário, se ele não tiver podido concluir o negócio de que tenha sido incumbido, será devida proporcionalmente ao trabalho que chegou a desempenhar em proveito do comitente. Isso, diz a lei, ocorrerá sempre que, antes de finalizado o encargo, o comissário vier a falecer, transmitindo-se a seus herdeiros o direito à percepção proporcional da comissão, ou quando sobrevier fortuito, em sentido amplo, a impedir a continuidade do serviço a si cometido.

A proporcionalização se fará em função de quanto do contrato de comissão foi cumprido até a morte ou fortuita interrupção. Há que ver que o Código Comercial, no referido art. 187, cuidava também da comissão devida proporcionalmente em caso de despedida do comissário, hoje tratada no CC 703 e 705, conforme haja ou não justa causa para tanto. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 724 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 03/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo a doutrina apresentada por Ricardo Fiuza a remuneração proporcional do comissário, à medida do trabalho por ele desenvolvido, previa-a o Código Comercial, no caso de morte ou despedida do comissário, assegurando-se lhe o ou a seus herdeiros uma quota correspondente aos atos executados. O Código Civil atual contempla dita comissão em negócio inconcluso, acrescentando-se à hipótese o motivo de força maior, o que tem perfeito valimento, porquanto restaria, de outro modo, beneficiado indevidamente o comitente, fartando-se à custa do comissário não remunerado em face daquela causa antes não prevista. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 375 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 03/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, se os trabalhos do comissário tiverem sido iniciados, mas forem interrompidos por caso fortuito ou de força maior, entre os quais a morte do próprio comissário, têm este ou seus herdeiros direito a perceber remuneração proporcional aos trabalhos realizados, a fim de se evitar o “empobrecimento” sem causa dele ou de seus herdeiros. O dispositivo transfere ao comitente a responsabilidade do desfazimento do contrato por caso fortuito ou de força maior. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 03.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 703. Ainda que tenha dado motivo à dispensa, terá o comissário direito a ser remunerado pelos serviços úteis prestados ao comitente, ressalvado a este o direito de exigir daquele os prejuízos sofridos.

No entendimento de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o que, no Código Comercial, se tratava num só artigo, o 187, hoje é fracionado no artigo presente e no imediatamente anterior. Ou seja, o artigo referido da legislação mercantil cuidava da comissão devida ao comissário de forma proporcional aos serviços prestados, mas por causas diversas. Uma, a do negócio inconcluso sem culpa do comissário; outra, a da sua despedida, mas já aí por sua culpa, dado que a despedida sem justa causa era tratada no Código Comercial em artigo diverso, o 188, de resto agora parcialmente reproduzido no CC 705, a seguir examinado. Melhor andou o CC/2002 ao prever, num dispositivo, a proporcionalização da comissão quando não concluído o negócio cometido ao comissário sem sua culpa (CC 702) e, noutro, o ora em comento, a mesma proporcionalização, mas quando se tenha dado a despedida do comissário, veja-se, com justa causa.

Isso, na verdade, porque, embora a proporcionalização se dê de igual maneira em função de quanto se prestou de serviço útil ao comitente, posto que não ultimado, tendo havido despedida do comissário, a ele se impõe, em contrapartida, a respectiva obrigação ressarcitória. Ou seja, havida a despedida do comissário, por ter faltado com qualquer das obrigações que, na execução da comissão, são-lhe afetas, já atrás examinadas no comentário aos artigos precedentes, deverá ele compor os prejuízos que, com sua conduta desidiosa, haja provocado ao comitente. Mas, mesmo assim, fará jus à remuneração pelos serviços que, antes da despedida, tenha prestado de forma útil ao comitente, malgrado não ultimados, pelo mesmo princípio vedatório do enriquecimento sem causa que anima o artigo precedente.

Tem-se então que, a despeito da culpa do comissário pela resolução do ajuste, não se pode aproveitar o comitente de serviços úteis que lhe tenham sido prestados, sem a respectiva remuneração. Apenas que o correspondente importe poderá vir a ser compensado, respeitados os requisitos contidos nos CC 368 e ss, com o montante de indenização que o comissário seja obrigado a pagar, ou de sua fixação abatido. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 725 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 03/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na toada de Ricardo Fiuza, o dispositivo cogita da remuneração por dispensa do comissário fundada em motivo justo, não retirando-lhe o direito de perceber a justa contraprestação, como previa, genericamente, o art. 187 do Código comercial, ao tratar de sua despedida. O CC/2002 introduz, aqui, outro elemento importante em caso da dispensa ocorrida, uma vez verificada, com ela, a causação de prejuízos, cometendo ao comitente o direito de exigir a devida compensação pelos danos ocorridos em face do negócio inacabado. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 375 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 03/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Aprendendo com Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, uma vez que o comissário tenha realizado negócios que lhe foram confiados, o descumprimento posterior do contrato e sua consequente resolução não isenta o comitente de remunerar os serviços que foram prestados e que se converteram, efetivamente, em vantagem para ele. A violação do contrato pelo comissário o obriga a indenizar os prejuízos eventualmente causados ao comitente e, portanto, ambas as obrigações devem ser compensadas. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 03.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 704. Salvo disposição em contrário, pode o comitente, a qualquer tempo, alterar as instruções dadas ao comissário, entendendo-se por elas regidos também os negócios pendentes.

Na balada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o dispositivo presente, que constitui inovação no sistema, consagra a prerrogativa de o comitente, a qualquer tempo, modificar as ordens e instruções dadas ao comissário, o que se aplica desde logo, mesmo aos negócios pendentes. O pressuposto subjacente ao preceito é, de um lado, a consideração de que afinal a comissão se exerce, malgrado em nome do comissário, no interesse e para o proveito do comitente, assim senhor de suas conveniências. De outra parte, não fugiu à percepção do legislador, como salienta Jones de Figueiredo Alves (Novo Código Civil comentado, coord. Ricardo Fiuza. São Paulo, Saraiva, 2002, p. 639), a constante mutação da dinâmica do mercado, que impõe, por vezes, a alteração de instruções dadas ao comissário, destarte adequando-se as circunstâncias da contratação de que foi incumbido às novas exigências da praxe negocial do lugar.

Bem de ver, porém, que, cuidando-se de direito dispositivo, podem as partes ajustar a inalterabilidade das instruções originalmente dadas ao comissário. Todavia, mesmo se não o fizerem e, assim, prevalecer a regra geral da mutabilidade das instruções, sua alteração deve ser feita sempre de modo a preservar o princípio da boa-fé objetiva que marca as relações jurídicas em geral, mercê da eticidade que ilumina toda a nova legislação. Isso significa a exigência de padrão de comportamento leal e solidário que se espera dos contratantes e que impõe ao comitente o exercício de sua potestativa prerrogativa de alterar as instruções, a qualquer tempo, de forma a evitar causar dano ao comissário (dever de cuidado com o cocontratante), ademais informando-o claramente das novas ordens (dever de informação). É, enfim, o exercício do direito de alterar as instruções sem abuso, todavia compreendido não só sob vertente subjetiva, envolvendo deliberado propósito de prejudicar, e sim em razão do standard de conduta de colaboração e cooperação que se reclama nas relações contratuais e, antes, nas relações em geral (CC 187).

 Mas, atendidos esses requisitos, não é dado ao comissário opor-se à modificação de suas instruções, se afinal age no interesse de quem as modificou. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 726 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 03/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Acompanhando a doutrina de Ricardo Fiuza, fica estabelecida, por presunção legal, autoridade ao comitente de modificar as ordens e instruções anteriormente fornecidas ao comissário. Essa mutabilidade de plano negocial na aquisição ou venda de bens é ditada pela dinâmica do mercado, a critério do comitente, cabendo ao comissário recepcionar as alterações ditadas pro ele, como nova e decisiva forma regedora dos futuros negócios e, ainda, daqueles não concluídos. Não pode, ademais, o comissário opor-se às novas diretrizes colocadas, uma vez que embora agindo em seu nome, o faz em favor e no interesse do comitente.

Jurisprudência: “Direito privado. Corretagem de valores. Mandato e comissão mercantil. Uso e costume. Autorização ratificada. É de estilo e uso do comércio a autorização verbal para a realização de negócios por intermédio de empresa corretora de valores, entendendo-se como ratificados os atos negociais, pela continuidade da prática de semelhantes, ao longo do tempo de duração do mandato”. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 376 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 03/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Lembra Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o CC 695 obriga o comissário a agir segundo as instruções do comitente. O CC 704 esclarece o caráter unilateral de tais instruções. Uma vez que elas estejam contidas no âmbito das cláusulas do contrato de comissão elas obrigam o comissário. Não o obrigam, no entanto, se exorbitarem ou contrariarem o contrato. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 03.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).