terça-feira, 31 de março de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 887, 888, 889 - continua Dos Títulos de Crédito - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 887, 888, 889 - continua
Dos Títulos de Crédito - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título VIII – Dos Títulos de Crédito
(Art. 887 a 903) Capítulo I – Disposições Gerais
– vargasdigitador.blogspot.com

Dos Títulos de Crédito – Créditos à introdução da doutrina de Ricardo Fiuza, a matéria relativa aos títulos de crédito, originariamente, no ordenamento jurídico brasileiro, segundo Ricardo Fiuza, era tratada pelo Código Comercial de 1850 (arts. 354 a 427). Essas disposições foram revogadas e substituídas pelo Decreto n. 2.044/1908 e pelo Decreto n. 57.663/1966, que introduziu em nosso direito a Lei Uniforme de Genebra em matéria de letra de câmbio e nota promissória. Por expressa previsão do Regulamento n. 737/1850, o regime jurídico dos títulos de crédito era de natureza mercantil, inclusive porque os negócios e operações relativos a esses títulos eram considerados como atos de comércio por força de lei. A disciplina jurídica dos títulos de crédito está reunida e integra um ramo especializado do direito comercial denominado direito cambial, também chamado por alguns doutrinadores direito cartular. A partir de agora, o CC/2002 passa a regular os títulos de crédito, neste Título VIII, dentro do Livro I da Parte Especial, como parte do direito das obrigações, cujo projeto foi elaborado pelo Prof. Mauro Brandão Lopes. Todavia, mesmo sendo reunificadas as normas gerais do direito das obrigações em um único Código, a matéria relativa aos títulos de crédito não perde sua natureza mercantil e as características da comercialidade, e continuará integrando a disciplina comercial como direito especial, tal como, inclusive, reconhecido pelo emérito Prof. Sylvio Marcondes, responsável pela elaboração do anteprojeto na parte relativa ao direito de empresa (cf. Rubens Requião. Curso de direito comercial, São Paulo, Saraiva, 1977, v. I, p. 19). As normas relativas aos títulos de crédito constantes do CC/2002 são regras gerais que estabelecem a disciplina da matéria, não revogando as diversas leis e convenções internacionais adotadas pelo Brasil que regulam esse assunto. A legislação brasileira anterior ao Código Civil de 2002 sobre títulos de crédito é específica para cada tipo de título. O Código atual, nesta parte, também é inovador por conter normas gerais que definem os títulos de crédito e enunciam suas características básicas. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 457-458, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 31/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

capítulo I - Disposições Gerais

Art. 887. O título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei.

Replicando Marcelo Fortes Barbosa Filho, o Código Civil de 2002 cuidou de disciplinar, em separado, os títulos de crédito, construindo, conforme sugestão formulada pelo professor Mauro Brandão Lopes, no início da década de 1970, após elaboração e entrega do anteprojeto de autoria de comissão elaboradora designada pelo Ministério da Justiça, um regramento geral, aplicável aos títulos atípicos e às lacunas da disciplina de cada título típico. O presente artigo reproduz a conhecida definição de Cesare Vivante (Trattato di diritto commerciale, 5 ed. Milano, Vallardi, 1924, v. III, p. 123), indicativa da natureza documental e dos três predicados comuns a todos os títulos de crédito: cartularidade, autonomia e literalidade.

Todo título de crédito é, portanto, um documento, ou seja, uma coisa destinada a manter a memória permanente acerca do advento de determinado fato jurídico. Emerge de tal coisa, de sua interpretação, um juízo de existência com respeito a um dado evento produtor da incidência de normas jurídicas. Ademais, não se trata de um documento qualquer, igual a todos os outros. Ao ser criado, o título de crédito passa a conter uma promessa unilateral formulada pelo emitente ou sacador, seu criador. Tal promessa, como declaração negocial, não se dirige ao público, i.é, a um número de pessoas indeterminado, porém a uma pessoa determinada, ou seja, de início, ao credor original e, em sequência, a cada um dos eventuais e novos portadores, a quem for transferido o próprio documento. É a vontade do emitente ou sacador que determina a função especial do título de crédito, fazendo que nele se contenha uma declaração unilateral, a qual “tem por objeto a promessa de uma prestação ou o reconhecimento de uma posição jurídica derivada de uma dada relação jurídica de caráter patrimonial” (Ferri, Fiuseppe. “Le promesse unilaterali – I titoli di credito”. In: Trattato di diritto civile direto da Giuseppe Grosso e Francesco Santoro – Passarelli. Milano, Vallardi, 1972, v. IV, fasc. III/I, p. 53). Essa declaração unilateral é cartular, ou seja, encontra-se inserida num suporte documental, e se vincula a uma relação antecedente, extracartular, nascida de um primeiro negócio jurídico, chamado subjacente. Os títulos de crédito constituem, ainda, documentos que dispõem de uma função dispositiva, ou seja, são ferramentas indispensáveis ao exercício de determinado direito, no que se distinguem, fundamentalmente, dos documentos probatórios e constitutivos. Eles não apenas servem para atestar a ocorrência de um fato jurídico, não somente solidificam direitos subjetivos, mas, sobretudo, mantêm permanente conexão com os direitos subjetivos constituídos, legitimando, com sua circulação, o portador designado na própria cártula. Há uma clara coligação, apartado o exame do negócio subjacente, entre o título de crédito e a declaração negocial que o criou, derivando daí a impropriamente chamada incorporação dos direitos subjetivos ao documento.

A definição adotada frisa, também, persistirem três predicados comuns a toda essa categoria de documentos. A primeira dessas características é a literalidade, entendida como o fato de só serem extraídos efeitos do título daquilo que nele estiver escrito. os direitos subjetivos conferidos ao portador designado de um título de crédito decorrem do que está escrito na cártula. Daí decorre, em reverso, uma simultânea vinculação formal, a qual significa que o que não está escrito também não pode ser alegado. A segunda característica é a autonomia, consubstanciando-se na independência da obrigação assumida individualmente pelas pessoas cuja firma foi exarada no título. A terceira característica e a cartularidade, a qual representa a absoluta necessidade, tal como consta da já mencionada definição de Vivante, de apresentar o título de crédito para o exercício dos direitos decorrentes da promessa unilateral feita por seu emitente. De um ângulo inverso, se um documento é apto, por si só, ao exercício dos direitos subjetivos apresentados literalmente, dispõe de cartularidade. Consideram-se, também, os títulos como documentos formais, mesmo que dotados com diferentes graus de rigidez, devendo um documento, para ser ungido a tal categoria, respeitar com exatidão as prescrições legais. (Marcelo Fortes Barbosa Filho., apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 905-906 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 31/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, analogamente ao acima mencionado Marcelo Fortes Barbosa Filho, o enunciado por este dispositivo, ao definir título de crédito, reproduz, fielmente, de modo inédito no direito positivo brasileiro, o consagrado conceito doutrinário pelo célebre jurista italiano Cesare Vivante. Título de crédito é um documento que vale por si só, i.é, autônomo, que não depende de qualquer outro documento ou contrato para o exercício de um direito de crédito nele contido e literalmente expresso.

São títulos de crédito a letra de câmbio, a nota promissória, o cheque, a duplicata, bem como todos os demais títulos criados por lei que adotem as características básicas da cartularidade, da autonomia e da literalidade, como títulos sujeitos a protesto e que podem ser exigidos e cobrados pela via judicial da ação executiva. No âmbito da vigente legislação brasileira, são ainda definidos e especificados como títulos de crédito: o conhecimento de transporte (Decreto n. 19.473/1930, Decreto-Lei n. 116/1967); o conhecimento de depósito e warrant (Decreto n. 1.102/1903); a cédula de crédito industrial e a nota de crédito industrial (Decreto-Lei n. 413/1969); a cédula de crédito à exportação e nota de crédito à exportação (Lei n. 6.313 fl.15); a cédula de crédito comercial e a nota de crédito comercial (Lei n. 6.840/1980); a cédula rural e a nota de crédito rural (Decreto-Lei n. 167/67); a cédula de produto rural (Lei n. 8.929/94); as letras hipotecárias (Lei n. 7.684/1988); a cédula hipotecária (Decreto-Lei n. 70/1966); o certificado de depósito bancário (Lei n. 4.728/1965); a cédula de crédito bancário (MP n. 2.160-25/2001); a letra de crédito imobiliário e a cédula de crédito imobiliário (MP n. 2.223/2001). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 457-458, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 31/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo trabalho de Thais F. Vasconcellos, no site Jusbrasil.com, denominado Princípios do Título de Crédito, acessado em 31/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). O título de crédito é conceituado pelo artigo em comento, como “o documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei”. Para Fábio Ulhoa Coelho (2012), o título de crédito é o documento que comprova a existência de uma relação jurídica (de crédito), no qual uma pessoa ou mais se apresentam como credoras de outras.

Ainda segundo as lições de Luiz Emygdio da Rosa Junior (2006, p. 52), o título de crédito “é o documento formal capaz de realizar imediatamente o valor nele contido e necessário ao exercício do seu direito literal e autônomo”. Para André Luiz Santa Cruz ramos (2015) os títulos de crédito são documentos formais de apresentação, que constituem títulos executivos extrajudiciais e representam obrigações quesíveis, na medida em que caberá a credor ir de encontro ao devedor para receber a importância devida.

O conceito de título de crédito mais aceito pela doutrina foi o concedido por Cesare Vivante que definiu como “o documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo, nele mencionado” (Vivante, apud Rams. 2015, p. 445).

No ordenamento jurídico brasileiro existem diferentes espécies de títulos de crédito sendo que para cada espécie de título tem-se a necessidade de se preencher determinados requisitos legais. E apesar de cada modalidade possuir suas particularidades, a sua grande maioria possui alguns requisitos em comum, que podem ser extraídos da leitura dos conceitos acima apresentados. Desta forma, o doutrinador Fabio Ulhoa Coelho (2012) leciona acerca da existência de características ou princípios inerentes aos títulos de crédito, são eles: a cartularidade, a literalidade a a autonomia das obrigações cambiais.

A cartularidade é o princípio pelo qual “o credor do título de crédito deve provar que se encontra na posse do documento para exercer o direito nele mencionado” (Coelho, 2012, p. 486). Logo, é necessário o documento (carta) para o exercício do direito nele contido. Tal princípio é uma garantia de que quem postula a satisfação do direito é de fato o seu titular. (Thais F. Vasconcellos, no site Jusbrasil.com, denominado Princípios do Título de Crédito, acessado em 31/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo parecer de Wille Duarte Costa, infelizmente vamos conviver com os CC 887 a 926, que tratam dos Títulos de Crédito no Novo Código Civil. Lamentamos, porque aquelas disposições são perfeitamente dispensáveis e até mesmo imprestáveis, pois não atingem e não se aplicam aos títulos de crédito típicos, ou nominados, regulados pelas leis especiais ainda em vigor e que são muitas. Com tais normas, a Comissão elaboradora do anteprojeto de Código Civil pretendia completar uma unificação com o Direito Comercial, o que não ocorreu sob a forma lógica, didática e nem científica.

O CC 887 reproduz, em sua análise, quase que fielmente a definição de Vivante, elaborada no século XIX. Em verdade, a definição apresenta pouquíssima diferença da original. Mas, de qualquer maneira, definições não devem surgir no corpo da lei, pela possibilidade de modificação futura do conceito e, com isto, contrariar o texto legal. Definições devem ficar para a doutrina e para a jurisprudência.

O título de crédito é um documento formal cujo direito do possuidor é aquele que se encontra literalmente descrito no papel e é também autônomo, em relação aos obrigados no título e até mesmo em relação à causa debendi, se circulou por endosso. Nos termos do artigo ele só produz efeitos quando preencher os requisitos da lei. Logo, as disposições do Código não se aplicam a quaisquer títulos de crédito típicos ou nominados, que são regulados por suas respectivas leis especiais.

As disposições do Código são dirigidas aos títulos atípicos ou inominados. Repetindo, os títulos típicos ou nominados são regulados por leis especiais. Mauro Brandão Lopes, (Lopes, Mauro Brandão. Observações sobre o Livro I. Título VIII (Dos Títulos de Crédito) Anteprojeto do Código Civil. 23 edição revisada, Brasília: Ministério da Justiça, 1973, p. 91-92) que redigiu a parte referente aos títulos de crédito, esclareceu que, para os títulos de crédito, esclareceu que, para os títulos de crédito, ressalvadas as disposições das leis especiais, estas sobre títulos de crédito contidas no CC/2002 regulam os títulos atípicos e não os títulos de crédito típicos. Mas o que é isto propriamente? Pode ser uma letra do tesouro, um bônus de subscrição, bônus do tesouro nacional, apólices públicas de renda ou qualquer outro lançado por órgãos públicos. Também seriam as ações de companhia, que nunca foram títulos de crédito. Mas não pensem em passagens aéreas, passagens de ônibus, vale transporte, ingresso de teatro e outros semelhantes. Estes estão longe de representar um título de crédito. (Wille Duarte Costa, Títulos de crédito no Novo Código Civil) extraída da Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, p.288-289, Acesso 31/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 Art. 888. A omissão de qualquer requisito legal, que tire ao escrito a sua validade como título de crédito, não implica a invalidade do negócio jurídico que lhe deu origem.


Segundo parecer de Wille Duarte Costa, o artigo está mal colocado, pois devia estar após o CC 889, que trata dos requisitos do título. Mas é bom ressaltar que o rigor da lei, neste caso, não é absoluto e, às vezes, pode o título deixar de conter um ou outro requisito, com exceção da assinatura, até o momento de ser exercido o direito nele contido. (Wille Duarte Costa, Títulos de crédito no Novo Código Civil) extraída da Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, p.289, Acesso 31/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, somente será considerado como título de crédito aquele que venha a ser assim definido e caracterizado pela legislação especial, de natureza mercantil. Depende, pois, de expressa previsão em lei, encenando hipótese restrita numerus clausus, a caracterização de qualquer instrumento obrigacional como título de crédito. Não será reconhecido como título de crédito o documento a que faltar expressa previsão legal descrevendo suas características como tal. Ao contrário da livre prevalência do princípio da autonomia da vontade com fonte de criação de novas modalidades de contratos e obrigações mercantis, compete exclusivamente à lei criar formas de títulos de crédito que possam valer por seu conteúdo expresso e literal. Contudo, apesar da autonomia declarada dos títulos de crédito, sempre existirá um negócio jurídico ou um contrato subjacente, que deu causa à emissão do título representativo de uma dívida. Desse modo, de acordo com este dispositivo do CC 888, se o preenchimento de um título de crédito for realizado em desacordo com as normas legais que estabelecem os requisitos obrigatórios de preenchimento do título, como a falta da assinatura do emitente ou a declaração do valor do título, mesmo assim ficará preservado o negócio jurídico subjacente do qual ele se origina, não podendo ser declarado inválido, cabendo, neste caso, ao credor a cobrança da dívida pela via ordinária. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 458, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 31/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 889. Deve o título de crédito conter a data da emissão, a indicação precisa dos direitos que confere, e a assinatura do emitente.

§ 1º. É a vista o título de crédito que não contenha indicação de vencimento.

§ 2º. Considera-se lugar de emissão e de pagamento, quando não indicado no título, o domicílio do emitente.

§ 3º. O título poderá ser emitido a partir dos caracteres criados em computador ou meio técnico equivalente e que constem da escrituração do emitente, observados os requisitos mínimos previstos neste artigo.

Como observa Marcelo Fortes Barbosa Filho, há uma discriminação de elementos essenciais gerais e não essenciais gerais, próprios aos títulos atípicos. Adotada, como padrão, a presença de uma relação bipolar (entre um emitente e um beneficiário), semelhante à estabelecida na nota promissória, os elementos essenciais expressos gerais são três: a) descrição do direito literal, com a precisa indicação de seu conteúdo; b) data de criação; c) assinatura do emitente ou sacador, indicando a inequívoca vontade de criar o  título de crédito.

Há um quarto elemento implícito, correspondente ao nome do beneficiário, pois não é admitida a possibilidade de um título atípico ao portador, dado o disposto no CC 907. A ausência de qualquer desses elementos não pode ser superada e induz a desnaturação do título de crédito, que, de documento dispositivo, passa a assumir apenas um caráter probatório.

O texto legal elenca, também, outros três elementos não essenciais gerais, cuja ausência pode ser superada pela aplicação de presunções absolutas (jure et de jure) expressas nos §§ 1º e 2º do presente artigo: a) data de vencimento (em caso de omissão, o título deve ser considerado à vista); b) local de criação (ausente a menção, deve ser considerado o de domicílio do emitente); c) local de pagamento (ausente a menção, deve ser considerado o de domicílio do emitente, pois, em regra, as obrigações cartulares são quesíveis).

Consta, por fim, no § 3º, uma autorização legislativa para a criação de títulos atípicos com cártula digital, i.é, composta em arquivo magnético,, em que a assinatura do emitente, como sinal gráfico, será evidentemente, substituída por um identificador digital ou alfanumérico. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 907 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 31/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, o título de crédito deve conter e indicar, no mínimo, três requisitos básicos para a correta definição do direito nele incorporado: 1) a data da emissão do título; 2) o valor do crédito; e 3) a assinatura do emitente do título. O título de crédito tanto pode ser emitido pelo próprio devedor, no caso do cheque e da nota promissória, como pelo credor, para a letra de câmbio e para a duplicata. Se o título não indicar a data de vencimento da obrigação, presume-se que seja à vista, contra apresentação. Sendo omitidos no título o lugar da emissão e o local onde deve ser pago, considera-se que serão no domicílio do emitente.

Qualquer título de crédito pode ser emitido por meio de sistema de processamento de dados ou por qualquer outro meio mecânico ou eletrônico, tal como hoje é praxe comum na atividade bancária e mercantil em geral. A duplicata e a letra de câmbio, que são títulos emitidos pelo credor, podem ser represadas por slips, boletos bancários e outros documentos gerados por meio eletrônico que contenham os requisitos básicos que represente uma obrigação de pagar quantia líquida e certa em data determinada a credor devidamente legitimado. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 458, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 31/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Wille Duarte Costa, os requisitos são mínimos mesmo. Além disso, o § 3º generaliza a criação do título o que é desnecessário. Emitir títulos a partir de caracteres criados por computador não pode incluir a assinatura do emitente. Esta não é criada por computador. Só a criptografada. Mas este tipo de assinatura não foi regulado pelo novo Código. O título, por força do artigo, pode ser digitado ou criado por computador. Só a criptografada. Mas este tipo de assinatura não foi regulado pelo CC/2002. O título, por força do artigo, pode ser digitado ou criado por computador ou meio técnico equivalente. Neste caso, pode ser criado em máquina de escrever, impressora gráfica, computador e até de forma manuscrita.

A emissão é ato de criar o título e entregá-lo a terceiros, já com a assinatura. Então, não podemos admitir que o título de crédito possa ser criado e enviado a terceiro pelo computador. Para tanto, precisaria estar regulamentada a assinatura criptografada, o que não está. Seria preciso também regular a chave privada e a chave pública, coisas que, certamente, a Comissão mostrou desconhecer. (Wille Duarte Costa, Títulos de crédito no Novo Código Civil) extraída da Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, p.290, Acesso 31/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

segunda-feira, 30 de março de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 884, 885, 886 Do Enriquecimento Sem Causa - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 884, 885, 886
Do Enriquecimento Sem Causa - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título VII – Dos Atos Unilaterais
(Art. 854 a 886) Capítulo IV – Do Enriquecimento Sem Causa
(Art. 884 a 886) – vargasdigitador.blogspot.com –

Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.

Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restitui-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido.

Seguindo Hamid Charaf Bdine Jr., no Direito Romano, o princípio que veda o enriquecimento sem causa já era conhecido e aplicado. Atualmente, várias ações têm o objetivo de evitar esse tipo de enriquecimento: a repetição de indébito, a de enriquecimento ilícito na cobrança do cheque prescrito, a de indenização etc. Todas elas pertencem ao gênero das ações in rem verso.

No Código Civil de 1916, eram exemplos dessas medidas o dispositivo que determinava a restituição do pagamento indevido, o que reconhecia o direito de ressarcimento das despesas de produção e custeio e das benfeitorias necessárias ao possuidor de má-fé, bem como aquela que reconhecia o direito à indenização do construtor de boa-fé em terreno alheio.

No Código Civil de 2002, foi dedicado um capítulo específico ao enriquecimento sem causa. O parágrafo único deste dispositivo acrescenta, no que se refere ao enriquecimento que tem por objeto coisa determinada, que “quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido”.

Os requisitos da ação de enriquecimento sem causa são: a) enriquecimento de alguém; b) empobrecimento correspondente de outrem; c) relação de causalidade entre ambos; d) ausência de causa jurídica; e) inexistência de ação específica (Gonçalves, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. São Paulo, saraiva, 2004, v. III, p. 590).

O enriquecimento compreende não só o aumento patrimonial, mas também qualquer vantagem, como não suportar determinada despesa. Exemplo interessante da questão é fornecido por Silvio Rodrigues e tem origem na Corte de Cassação francesa: “Um negociante havia entregue ao arrendatário de uma propriedade agrícola adubos por este comprados. Rescindido o arrendamento, o negociante, que não conseguiu receber o preço da venda do arrendatário, que de resto se tornara insolvente, veio cobrá-lo do arrendante por meio da ação de in rem verso. Seu êxito na demanda é que valeu a consagração e do princípio do repúdio ao enriquecimento indevido, no Direito francês” (Direito civil. São Paulo, Saraiva, 2002, v. III, p. 422).

O empobrecimento pode consistir em uma redução de patrimônio ou em não perceber determinada verba que seria obtida em razão do serviço prestado ou da vantagem conseguida pela outra parte. Para Agostinho Alvim, esse requisito nem sempre é necessário (RT 259/3). Segundo o ilustre mestre, há hipóteses em que a ação é cabível mesmo sem o enriquecimento; por exemplo, quando uma pessoa informa ao herdeiro sua qualidade em determinada sucessão.

A relação de causalidade significa que o enriquecimento e o empobrecimento resultam de um só fato, atuando um como determinante da ocorrência do outro. Se os valores forem diversos, a indenização será fixada pela cifra menor. Assim, se a vantagem de quem enriquecer é de R$ 5.000,00, mas o empobrecimento correspondente é de R$ 3.000,00, esta última importância é que deverá ser paga pelo montante de seu prejuízo, seu interesse fundado na ausência de outros danos a reparar desaparecerá, de modo que não poderá receber além do que perdeu. Não é necessário que o empobrecimento seja causa eficiente do enriquecimento e vice-versa. Cuida-se de verificar se ambos têm origem no mesmo fato. Assim, o indivíduo trabalha sem remuneração e sofre um empobrecimento ao qual corresponde um enriquecimento do beneficiado. O serviço foi a causa de ambos os fatos.

A ausência de causa jurídica é o requisito mais importante para o reconhecimento do enriquecimento sem caus. Não haverá enriquecimento sem causa quando o fato estiver legitimado por um contrato ou outro motivo previsto em lei. Somente quando não houver nenhum destes dois fundamentos é que haverá ilicitude no locupletamento. (Hamid Charaf Bdine Jr., apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 902 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 30/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Com os aplausos de Ricardo Fiuza, o Código Civil de 2002 inova ao prever em seu texto a figura do enriquecimento sem causa. E louvável tal inserção, uma vez que se consolida na lei civil a matéria, não ficando ela sujeita às interpretações da jurisprudência.

Na clássica definição de Orlando Gomes: “Há o enriquecimento ilícito quando alguém, a expensas de outrem, obtém vantagem patrimonial sem causa, i.é, sem que a tal vantagem se funde em dispositivo de lei, ou em negócio jurídico anterior. São necessários os seguintes elementos: a) o enriquecimento de alguém; b) o empobrecimento de outrem; c) o nexo de causalidade entre o enriquecimento e o empobrecimento; e d) a falta de causa justa” (Obrigações, 3 ed., Rio de Janeiro, Forense, 1972, p. 289). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 456, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 30/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Conceituando Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, enriquecimento sem causa é o fato gerado pelo enriquecimento de alguém em razão do empobrecimento de outrem sem causa justificadora da atribuição patrimonial (titulus adquirendi). - Enriquecimento ilícito, enriquecimento injusto, enriquecimento injustificado, locupletamento à custa alheia, empobrecimento sem causa, são sinonímias.

Como natureza jurídica – Fato jurídico em sentido estrito originado por fatos e atos, lícitos e ilícitos.

Tem uma evolução histórica. O enriquecimento sem causa era previsto no Direito Romano, no Digesto: Iure naturae aequum est neminem cum alterius detrimento et iniuria fieri locupletiorem (“É justo, por direito natural, que ninguém se enriqueça em detrimento ou prejuízo de outrem”; D. 50.17.206).

A primeira teorização do instituto coube a Hugo Grotius, seguido por Wollf, que o consideraram um princípio de direito natural.

O Código Civil francês de 1804, o Código Civil português de 1867 e o Código Civil brasileiro de 1916 não disciplinaram o enriquecimento sem causa. O instituto era tido como vago e propiciador de incertezas jurídicas.

Três teorias buscam explicá-lo: a doutrina unitária (tradicional), que o define a partir de seus elementos: enriquecimento + empobrecimento + ausência de causa, a teoria da ilicitude e a teoria do conteúdo da destinação.

O instituto é tido como um princípio informador da ordem jurídica, fundado na equidade (aequitas) e a regra (cláusula geral) que o positiva (CC 884) como um “travão”, pois somente pode ser invocado subsidiariamente (CC 886). Como princípio, o enriquecimento sem causa é concretizado por muitos institutos. Impugnação pauliana (CC 165); invalidade do negócio jurídico (CC 182); cessão de crédito (CC 295 e 297); libera o devedor de pagar se seu crédito correspectivo se torna impossível (CC 477); obsta a devolução no mútulo a menor incapaz (CC 588); obriga o dono da obra a pagar acréscimos na empreitada (CC 619, parágrafo único); gestão de negócios (CC 868, parágrafo único; 869, 871 e 872); dá ao possuidor de boa-fé direito à indenização por benfeitorias (CC 1.219); avulsão (CC 1.251); acessões (CC 1.254 a 1259).

Das espécies: a) enriquecimento por prestação (impugnação de negócio jurídico). Exemplos: pagamento indevido (CC 876 a 883); pagamento de indenização de seguro de furto ou roubo seguido de retomada da posse da coisa pelo segurado (cessação da causa); cumprimento de prestação em contrato cuja contraprestação venha a se tornar impossível em razão de caso fortuito ou força maior (CC 393); b) enriquecimento por intervenção de terceiro ou do próprio enriquecido. Exemplos: devedor que paga a credor putativo (CC 309); alienação de imóvel a non domino (CC 879); frutos colhidos antecipadamente (CC 1.214, parágrafo único, 2ª parte); c) enriquecimento resultante de fenômeno natural. Exemplos: avulsão (CC 1.251); direito de o possuidor de boa-fé se ressarcir de gastos úteis (CC 1.214, parágrafo único, 1ª parte); animal que se alimenta de coisa alheia (CC 936) e d) por desconsideração de um patrimônio interposto. Exemplo: fraude contra credores.

Em suposta exceção, pode-se afirmar não haver enriquecimento sem causa no caso de usucapião; prescrição extintiva; obrigação natural. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 30.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 885. A restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que justifique o enriquecimento, mas também se esta deixou de existir.

Ora, Hamid Charaf Bdine Jr, de acordo com o disposto neste artigo, a restituição é devida não só quando não houver causa que justifique o enriquecimento, mas também se esta deixar de existir. Assim, mesmo que, de início, o enriquecimento estivesse justificado, a partir do momento em que deixa de haver causa para sua permanência, a restituição será possível.

Giovanni Ettore Nanni, ao comentar o presente dispositivo, apresenta como exemplo o bem alheio cujo uso foi consentido por negócio jurídico regular que, após o período estabelecido, deixa de ter justa causa, gerando enriquecimento sem causa. (Enriquecimento sem causa. São Paulo, Saraiva, 2004, p. 264). Acrescenta, ainda, ocaso dos esponsais, observando que, ainda que não acolhidos no Direito brasileiro, geram efeitos jurídicos, inclusive o de postulação de perdas e danos (idem, ibidem). (Hamid Charaf Bdine Jr., apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 903 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 30/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, havendo o enriquecimento desmotivado, por não ter causa que o justifique, a devolução sempre é devida, inclusive se a causa deixou de existir. Artigo sem correspondente no Código Civil de 1916. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 457, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 30/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

De acordo com os estudos de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o adquirente de um bem pode vir a perdê-lo em razão de evicção. No momento em que realizou o pagamento do preço da aquisição, o negócio possuía causa, tanto que a propriedade lhe foi transmitida. Depois, quando o verdadeiro proprietário obtém a vitória na ação em que reivindica o bem, o adquirente perde a propriedade e o negócio que originariamente tinha causa de atribuição patrimonial a perde. O ganho preço recebido pelo alienante passa à condição de enriquecimento sem causa, uma vez que a transferência da propriedade ao adquirente não foi garantida a este. Portanto, conforme este exemplo, é possível que um negócio que, originariamente, possuía causa de atribuição patrimonial, venha a se tornar sem causa, dando ensejo à repetição do pagamento do preço. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 30.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 886. Não caberá a restituição por enriquecimento, se a lei conferir ao lesado outros meios para se ressarcir do prejuízo sofrido.

Finalizando com Hamid Charaf Bdine Jr., a ação fundada no enriquecimento sem causa só é cabível quando não houver ação específica, tendo em vista seu caráter subsidiário. Se o interessado deixa prescrever a ação específica, não poderá valer-se da ação de enriquecimento ilícito, ou todas as demais ações seriam absorvidas por ela. Vale dizer, aquele que dispunha de determinada ação específica para receber seu crédito e deixa sua pretensão prescrever não poderá invocar o enriquecimento injusto para postular indenização correspondente ao crédito prescrito. Se houver ação específica, esta é que deve ser utilizada.

Giovanni Ettore Nanni observa que “o conceito básico que predomina a respeito da subsidiariedade é que a ação de enriquecimento deve ser entendida como um remédio excepcional, cujo exercício é condicionado à inexistência de outra solução prevista na lei” (Enriquecimento sem causa. São Paulo, Saraiva, 2004, p. 268) e prossegue, anotando que “a verificação da subsidiariedade não deve ser feita abstratamente, a priori, mas analisada em concreto, conforme as particularidades da questão submetida a julgamento, em que se averiguará a possibilidade ou não da existência de outros meios disponíveis ao demandante para recompor a perda sofrida” (idem, p. 270). A rigor, como o insigne monografista pondera, o que se pretende é evitar que a ação de enriquecimento sem causa seja utilizada para viabilizar violação ou fraude à lei, possibilitando que se alcance por via oblíqua o que é vedado pela lei (idem, ibidem). Por outro lado, sempre que outra demanda for suficiente para restabelecer o equilíbrio da situação, não haverá necessidade da ação de enriquecimento sem causa, sob pena de ela ser admitida em praticamente todas as hipóteses de pedido condenatório, como verdadeira panaceia. Giovanni Ettore Nanni, porém, pondera que não se deve fazer uma análise meramente formal da subsidiariedade, devendo o intérprete admitir essa ação em todos os casos em que, mesmo concorrendo com outra ação, a demanda preencha os seus requisitos específicos (idem, p. 273). (Hamid Charaf Bdine Jr., apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 904 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 30/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Para Fiuza, existindo na lei outros meios que sirvam para ressarcir o prejuízo sofrido pelo lesado, não há que se falar em restituição por enriquecimento. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 457, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 30/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No conceito de Guimarães e Mezzalira, o enriquecimento sem causa, como se viu nos comentários ao CC 884, tem natureza principiológica e, como princípio, encontra-se na base de inúmeros instituto jurídicos: impugnação pauliana, invalidade do negócio jurídico, liberação do devedor de pagar se seu crédito correspectivo se torna impossível...

A variedade é tão grande que a permissão de utilização livre do instituto poderia ocasionar a utilidade prática das regras que regulam todos os muitos institutos que têm o enriquecimento sem causa como base, com prejuízo para as nuances e condições específicas que cada qual prevê.

Desse modo, embora tenha entendido conveniente positivar o instituto que, por sua abrangência e generalidade, havia sido omitido no Código Civil de 1916, a lei em vigor estabelece que o mesmo somente pode ser aplicado se a lei não conferir outros meios ao lesado para este se ressarcir do prejuízo sofrido.

A impossibilidade de o interessado fazer uso de outro instituto jurídico pode advir da prescrição da pretensão relativa a ele. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 30.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 27 de março de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 882, 883 Do Pagamento Indevido - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 882, 883
Do Pagamento Indevido - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título VII – Dos Atos Unilaterais
(Art. 854 a 886) Capítulo III – Do Pagamento Indevido
– Seção III – (art. 876 a 883) – vargasdigitador.blogspot.com - digitadorvargas@outlook.com

Art. 882. Não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita, ou cumprir obrigação judicialmente inexigível.

No pensar de Hamid Charaf Bdine Jr, o pagamento da dívida alcançada pela prescrição, ou juridicamente inexigível, é adimplida espontaneamente pelo devedor, que não pode invocar a prescrição ou a inexigibilidade para postular a repetição. Mas, se houver outra espécie de erro no pagamento, será possível repetir o adimplemento. Imagine-se que o erro resultou do fato de uma seguradora pagar indenização a um segurado, após o prazo prescricional, porque imaginava que ele havia sido vítima de um furto. Ao ser apurado o erro – o furto não ocorreu, e o equívoco da denúncia foi informado à seguradora em momento oportuno -, a seguradora poderia postular a repetição do indébito decorrente do erro cometido, porque seu pedido não estaria fundamentado no pagamento de dívida prescrita.

Conclui-se que o dispositivo veda a alegação de que a dívida estava prescrita ou que era juridicamente inexigível como causa da repetição, mas não exclui a repetição se o fundamento do devedor for o erro, ou seja, a alegação de que pagou o que era indevido – e o fato de ter ocorrido prescrição ou de a dívida não ser juridicamente exigível não significa que ela não era devida. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 899 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 27/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como Ricardo Fiuza trata em sua doutrina, este artigo, do pagamento de dívidas prescritas (aquelas que não cobradas em tempo hábil) e das oriundas de obrigação judicialmente inexigível, que é a obrigação natural, expressão usada no Código Civil de 1916. Segundo a definição de Clóvis Beviláqua: “Denominam-se obrigações naturais as que não conferem direito de exigir seu cumprimento, as desprovidas de ação, como: as prescritas, as de jogo e apostas, em geral, as que consistem no cumprimento de um dever moral (Código Civil dos Estados Unidos do Brasil, 9 ed. Rio de Janeiro 1953, v.4 p. 127). Assim, quem paga obrigação natural não pratica uma liberalidade, mas cumpre dever a que, em seu foro interior, se acha preso, portanto não tem o direito de repetir. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 456 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 27/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Como lecionam Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, não é pagamento indevido o que se faz para solver obrigação natural. São obrigações naturais as dívidas de jogo e de aposta, porque são judicialmente inexigíveis. A dívida prescrita no sistema do Código Civil de 2002 deixa de existir. Não é dívida, pois o Código determina que a prescrição extingue o direito e a pretensão que o resguarda. Embora alterados os efeitos da prescrição, a irrepetibilidade do pagamento da dívida prescrita é assegurada pelo dispositivo. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 27.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 883. Não terá direito à repetição aquele que deu alguma coisa para obter fim ilícito, imoral, ou proibido por lei.

Parágrafo único. No caso deste artigo, o que se deu reverterá em favor de estabelecimento local de beneficência, a critério do juiz.

Lecionando Hamid Charaf Bdine Jr, caso o objeto da prestação não cumprida seja ilícito, imoral ou proibido por lei, a repetição é indevida, pois não se pode prestigiar a obrigação nula (CC 166), indesejada pelo legislador. Contudo, também não será adequado que aquele que recebeu algo para realizar uma dessas prestações fique com o bem, de modo que o legislador inovou ao determinar que o bem reverta em proveito de estabelecimento de beneficência.

Será necessário que aquele que deu alguma coisa postule a repetição e que o juiz identifique o fim ilícito no curso da demanda, de modo a acolher o pedido e condenar quem recebeu a entregar o bem ao estabelecimento. Mas também é possível que algum estabelecimento de beneficência postule a repetição, ou que o interesse público legitime o Ministério Público a fazê-lo. O princípio da socialidade do Código Civil autoriza esta interpretação: em nome do interesse social predominante, é de se alargar a interpretação do presente dispositivo para que seja possível admitir a legitimação extraordinária na hipótese, a fim de evitar que, mais do que o interesse particular, tutela interesse público.

Pela mesma razão, a natureza pública do texto legal autoriza que o juiz o aplique de ofício, sem que qualquer das partes o sugira ou mencione. A regra teria aplicação ao caso em que alguém entrega dinheiro para que uma pessoa com qualificação melhor preste concurso público em seu lugar. Ao ser identificado o crime e preso aquele que se faiz passar pelo candidato, este poderia pretender a repetição do indébito, na medida em que foi excluído do concurso – o objeto do contrato não lhe foi conferido, tendo havido, por isso, inadimplemento. O presente dispositivo, porém, veda essa devolução, ao estabelecer que a importância reverterá a um estabelecimento de beneficência. Com essa solução, evita-se que qualquer dos participantes da conduta permaneça com a quantia que se destinava a fim ilícito, imoral ou contrário à lei. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 900 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 27/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina de Ricardo Fiuza, o solvens não poderá pleitear a quantia que pagou indevidamente, quando fez o pagamento para obter fim ilícito ou proibido por lei (v.g., compra de substância entorpecente) ou ainda imoral (v.g., pornografia). É a aplicação do princípio nomo auditur turpidinem allegans, i.é, ninguém pode ser ouvido alegando sua própria torpeza. A quantia envolvida nesses negócios escusos será, a critério do juiz, doada a estabelecimentos beneficentes. – o caput deste dispositivo corresponde ao art. 971 do Código de 1916, devendo ser-lhe dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 456 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 27/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 Enquanto para Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o pagamento da obrigação resultante de negócio inidôneo não permite a repetição. Assim, não pode requerer a repetição do indébito aquele que adquiriu bem mediante receptação, nem o usuário pode requerer a repetição do preço pago pela aquisição de droga ilícita junto ao traficante.

É significativo notar que a irrepetibilidade depende não da ilicitude do negócio em si, mas, nos termos do dispositivo, de o enriquecedor ter visado a um fim ilícito. Assim, é repetível o pagamento feito por bem furtado se o adquirente desconhecer a origem ilícita do bem. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 27.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quinta-feira, 26 de março de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 879, 880, 881 - continua Do Pagamento Indevido - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 879, 880, 881 - continua
Do Pagamento Indevido - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título VII – Dos Atos Unilaterais
(Art. 854 a 886) Capítulo III – Do Pagamento Indevido
– Seção III – (art. 876 a 883) – vargasdigitador.blogspot.com - digitadorvargas@outlook.com

Art. 879. Se aquele que indevidamente recebeu um imóvel o tiver alienado em boa-fé, por título oneroso, responde somente pela quantia recebida; mas, se agiu de má-fé, além do valor do imóvel, responde por perdas e danos.

Parágrafo único. Se o imóvel foi alienado por título gratuito, ou se, alienado por título oneroso, o terceiro adquirente agiu de má-fé, cabe ao que pagou por erro o direito de reivindicação.

No ritmo de Hamid Charaf Bdine Jr o dispositivo contempla os casos em que o pagamento indevido compreende a transferência de um imóvel ao credor. Nesse caso, o imóvel pode ser transferido a terceiro por esse credor.

As soluções previstas neste artigo variam conforme o terceiro adquirente esteja ou não de boa-fé e segundo a transferência efetuada ao terceiro seja gratuita ou onerosa. As soluções serão as seguintes: a) alienação onerosa feita de boa-fé a terceiro igualmente de boa-fé. O credor que recebeu o imóvel indevidamente responde perante o devedor que pagou apenas pela quantia recebida do terceiro pela aquisição do imóvel. Não se cuida de determinar a restituição do valor do bem, pois o artigo refere-se expressamente à quantia recebida, que só pode ser aquela recebida pelo falso credor. Não se determina o pagamento do valor do próprio bem, pois, nesse caso, o credor de boa-fé poderia ser obrigado a restituir mais do que recebeu – i.é, o valor real do bem, e não aquilo que recebeu efetivamente; b) o credor age de má-fé ao transferir o imóvel recebido incorretamente a terceira pessoa. A segunda parte deste dispositivo impõe ao credor que recebe o imóvel e o aliena de má-fé a obrigação de indenizar perdas e danos – ou seja, o montante de seus prejuízos mais lucros cessantes. A má-fé tanto pode caracterizar-se em razão do fato de o credor ter conhecimento de que o pagamento era indevido, quanto do fato de o credor ter conhecimento de que o pagamento era indevido, quanto do fato de o credor ter efetuado a alienação com o propósito de não restituir o bem ao devedor que o entregou indevidamente, admitindo-se que só posteriormente tenha tomado conhecimento da intenção do devedor de sustentar que o pagamento era indevido, desconhecendo o fato até este momento. No caso de o credor que recebeu o indevido ter agido de má-fé, ele responde perante aquele que pagou pelo valor do imóvel – e não pelo valor recebido, como se verificaria na hipótese anterior – além das perdas e danos; c) o credor transfere o imóvel a terceiro gratuitamente ou a terceiro que adquire onerosamente, mas atuando de má-fé. Nessas hipóteses, segundo a regra do parágrafo único deste dispositivo, a reivindicação do imóvel a ser ajuizada pelo devedor que paga indevidamente poderá atingir o terceiro; no caso da alienação gratuita, porque a transferência do bem sem contraprestação justifica que o beneficiado ceda o bem ao titular que dele foi privado por erro; no que se refere ao terceiro que adquire de má-fé, porque o sistema do Código Civil não autoria que a má-fé seja prestigiada em detrimento de quem age de boa-fé. Também nos casos em que o credor não houver transferido o imóvel a terceiro, será possível que o devedor que o entregou em pagamento indevido tenha sucesso na reivindicação.

Em todos esses casos, cabe a quem pagou optar entre a reivindicação e o recebimento do valor. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 898 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No parecer de Ricardo Fiuza se quem recebeu indevidamente o prédio vier a vende-lo de boa-fé deverá devolver tão-somente o valor que valorar do valor do bem imóvel, deverá somar danos, se existentes. Se doado gratuitamente ou vendido a terceiro de má-fé, o que pagou por erro pode reivindicar o bem. Este artigo é correspondente ao art. 968 do Código Civil de 1916 e deve merecer o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 455 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No dizer Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, quando a obrigação consiste na transferência da propriedade de bem imóvel e o cumprimento dela é feito com erro, configurando pagamento indevido, o enriquecedor pode requerer a repetição do indébito. Embora o Código, neste capítulo, não seja expresso, se o enriquecido tiver recebido o bem de má-fé fica obrigado pelo pagamento de perdas e danos.

 

O dispositivo cuida da hipótese em que o bem já tiver sido alienado pelo enriquecido quando este for cobrado pelo enriquecedor. Neste caso, fica o enriquecido obrigado a pagar ao enriquecedor o que recebeu pela alienação. Por se tratar de dívida de valor, se o enriquecido agiu de boa-fé, a quantia original somente deve ser acrescida de correção monetária, pois não há previsão legal para a incidência de juros, exceto os juros moratórios relativos à legislação processual, que incidem após a citação. Se o enriquecido recebeu o imóvel de má-fé, i.é, ciente do erro cometido pelo alienante enriquecedor, fica obrigado a pagar-lhe também as perdas e danos que se apurarem.

 

O bem poderá ser reivindicado dos terceiros adquirentes em duas hipóteses: se o tiverem recebido a título gratuito ou se o tiverem recebido de má-fé. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 26.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 880. Fica isento de restituir pagamento indevido aquele que, recebendo-o como parte de dívida verdadeira, inutilizou o título, deixou prescrever a pretensão ou abriu mão das garantias que asseguravam seu direito; mas aquele que pagou dispõe de ação regressiva contra o verdadeiro devedor e seu fiador.

Segundo Hamid Charaf Bdine Jr, nas hipóteses referidas neste artigo, a repetição do indébito é afastada em razão de, por alguma razão, o pagamento indevido haver levado o credor, de boa-fé, a se desfazer de algum direito de que era titular verdadeiramente.

Assim, se a dívida realmente existente deixar de ser realizável em decorrência do pagamento indevido – o credor inutiliza o título, permite que ocorra a prescrição ou abre mão das garantias -, ficará o devedor impossibilitado de postular a repetição. Caberá a ele, porém, ajuizar ação regressiva em relação ao verdadeiro devedor e seu fiador.

É certo que a disposição em exame só incide se o credor agiu convencido de que recebia o que lhe era devido – vale dizer, de boa-fé -, pois, do contrário, se agiu maliciosamente, não pode ser dispensado da obrigação de restituir o recebimento do indébito. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 898 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como mostra a doutrina este artigo trata da hipótese do recebimento de boa-fé de quem não é o devedor, sendo a dívida verdadeira. O accipiens que, ao receber de boa-fé, inutiliza o título ou deixa prescrever a ação, ou ainda renuncia às garantias, não precisa restituir o pagamento. Quem pagou erroneamente – o solvens – terá ação regressiva contra o verdadeiro devedor e seu fiador. O dispositivo trata de mera repetição do art. 969 do Código Civil de 1916, com pequena melhoria de redação devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 455 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Exemplificando Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, se A deve a B determinada quantia representada por título de crédito; se C efetua pagamento a B; se B recebe o pagamento de C na suposição de que se trata de pagamento da dívida de A; sem nessa suposição, B inutiliza o título que tinha contra A ou deixa prescrever a pretensão contra A ou abre mão de garantias que asseguravam o direito contra A; se o pagamento que C fez a B for indevido, B fica isento de restituir a C o que este pagou indevidamente.

Neste caso, ocorre uma sub-rogação legal de C nos direitos de B contra A. C poderá cobrar de A o que pagou indevidamente a B, salvo, obviamente, se tiver ocorrido a prescrição. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 26.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 881. Se o pagamento indevido tiver consistido no desempenho de obrigação de fazer ou para eximir-se da obrigação de não fazer, aquele que recebeu a prestação fica na obrigação de indenizar o que a cumpriu, na medida do lucro obtido.

 

Na toda de Bdine Jr, o pagamento não se aperfeiçoa apenas pela entrega de dinheiro ou bem, mas também pela entrega de uma prestação de fazer ou não fazer. Nessas hipóteses, também é possível verificar-se que a prestação não era devida, cabendo a repetição. Contudo, não será possível a restituição da mesma espécie de prestação recebida, de modo que o credor que recebeu o indevido indenizará aquele que deu cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer.

Essa indenização, porém, não será medida pela extensão dos prejuízos, mas pelo lucro obtido pelo credor. Assim, será identificado o valor da vantagem obtida pelo credor e este será o montante a indenizar ao devedor. pode ocorrer, portanto, que o prejuízo do devedor ultrapasse o valor repetido, caso o fazer ou não fazer seja inferior, não produza ao credor vantagem ao menos igual à de suas despesas. Nessa hipótese, deixará de haver enriquecimento injusto do credor, que restituirá ao devedor o enriquecimento obtido. No entanto, não estará o devedor integralmente ressarcido dos danos suportados. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 899 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Para a doutrina de Fiuza, se o pagamento indevido abranger obrigação de fazer (obrigação positiva) ou obrigação de não fazer (obrigação negativa), quer sejam elas originadas de contrato ou de decisão judicial (preceito cominatório, CPC 814 a 823, (antigos arts. 632 a 645 do CPC/1973), o accipiens deve indenizar o solvens, independentemente de ter recebido de boa ou má-fé. A indenização terá como base o lucro obtido, pois se assim não fosse caracterizar-se-ia um enriquecimento sem causa. Não havendo lucro do recebedor, não há que se falar em indenização, uma vez que o locupletamento não ocorreria. Esse artigo não tem dispositivo correspondente no Código Civil de 1916. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 455 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No parecer de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a repetição do indébito somente é possível nas obrigações de dar. Nas obrigações de fazer e nas de não fazer, o enriquecedor somente pode pleitear indenização. O cerne do dispositivo é a quantificação do valor da indenização: deve levar em conta o proveito obtido pelo enriquecido. Proveito que é lucro no sentido mais amplo. Assim, o fato de o enriquecedor ter despendido esforços em prol do enriquecido não significa que este deva indenizar-lhe, uma vez que tais esforços podem não resultar em ganhos efetivos para ele. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 26.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).