sábado, 26 de março de 2022

Código Civil Comentado – Art. 105 Dos Fatos Jurídicos - Do Negócio Jurídico Disposições Gerais - VARGAS, Paulo S. R. digitadorvargas@outlook.com – paulonattvargas@gmail.com - Whatsap: +55 22 98829-9130

 

Código Civil Comentado – Art. 105
Dos Fatos Jurídicos - Do Negócio Jurídico
Disposições Gerais - VARGAS, Paulo S. R.
digitadorvargas@outlook.com
paulonattvargas@gmail.com -  
Whatsap: +55 22 98829-9130 
Livro III  Dos Fatos Jurídicos-
Título I Do Negócio Jurídico –
Capítulo I – Disposições Gerais
(art. 104 a 114)

 

Art. 105. A incapacidade relativa de uma das partes não pode ser invocada pela outra em beneficio próprio, nem aproveita aos cointeressados capazes, salvo se, neste caso, for indivisível o objeto do direito ou da obrigação comum.

 

Por vezes a estrutura da lei parece tão clara e sagaz, que o leigo é sugerido a pensar estar totalmente protegido na totalidade da vida por conta de um artigo que fala ou descortina um problema que por vezes parece insolúvel. E é. Uma vez não ter a humanidade ainda maturidade suficiente para espantar todas as nuances criadas por si mesmo, tão fértil se sente a mente de novas ideias velhas a cada momento que se nos depara. Prova disso é a variedade de diferentes condições de vida e de novas leis criadas para resolver cada nova forma de direção que cada um dá à sua própria vida e a Filosofia espancada pelos jurisconsultos, trazendo soluções cujas raízes parecem nunca terminar. No artigo 105, o relator aponta em sua doutrina este viés. (Nota VD).

 

Incapacidade relativa como exceção pessoal: Por ser a incapacidade relativa uma exceção pessoal, ela somente poderá ser formulada pelo próprio incapaz ou pelo seu representante. Como a anulabilidade do ato negocial praticado por relativamente incapaz é um beneficio legal para a defesa de seu patrimônio contra abusos de outrem, apenas o próprio incapaz ou seu representante legal o deverá invocar. Assim, se num negócio um dos contratantes for capaz e o outro incapaz, aquele não poderá alegar a incapacidade deste em seu próprio proveito, porque devia ter procurado saber com quem contratava e porque se trata de proteção legal oferecida ao relativamente incapaz. Se o contratante for absolutamente incapaz, o ato por ele praticado será nulo (CC, art. 166, 1), pouco importando que a incapacidade tenha sido invocada pelo capaz ou pelo incapaz, tendo em vista que o Código Civil, pelo art. 168, parágrafo único, não possibilita ao magistrado suprir essa nulidade, nem mesmo se os contratantes o solicitarem, impondo-se-lhe até mesmo o dever de declará-la de ofício.

 

Invocação da incapacidade de uma das partes ante a indivisibilidade da objeto do direito ou da obrigação comum: Se o objeto do direito ou da obrigação comum for indivisível, ante a impossibilidade de separar o interesse dos contratantes, a incapacidade de um deles poderá tornar anulável o ato negocial praticado, mesmo que invocada pelo capaz, aproveitando aos cointeressados capazes, que porventura houver. Logo, nesta hipótese, o capaz que veio a contratar com relativamente incapaz estará autorizado legalmente a invocar em seu favor a incapacidade relativa deste, desde que indivisível a prestação, objeto do direito ou da obrigação comum. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – Art. 105, (CC 105), p. 75, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 24/12/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Veja as referências consultadas gravadas no crédito ao final do artigo. Nota VD).

 

A visão de Sebastião de Assis Neto et al, exaltam a vontade, o voluntarismo jurídico que levam à autonomia da vontade e a autonomia privada que levam o ser humano a criar as diversas espécies de Fatos Jurídicos. (Nota VD).

 

Veja-se que, na vontade reside um dos pontos de maior destaque do direito no mundo moderno. Vale lembrar, ainda que de forma bastante sintética, que somente a partir da Revolução Francesa é que a história do mundo ocidental passou a conceber a liberdade e a vontade como predicados de todos os cidadãos, sem exceção.

 

A Vontade, no entanto, levada às últimas consequências nas primeiras legislações liberais de que é exemplo máximo o Código Francês de 1804 (Código de Napoleão), pode encaminhar o ordenamento jurídico a uma realidade de distorções e falhas na missão máxima do direito, que é a da pacificação da sociedade.

 

Com efeito, muito se discutiu, inclusive, se a vontade era, de fato, elemento verdadeiramente criador de efeitos jurídicos, já que, de qualquer forma, a vontade não seria capaz de agregar a nenhum fato o efeito jurídico se este não fosse previsto ou não proibido pela lei.

 

Caio Mário da Silva Pereira proclama com acerto, a fragilidade dessa discussão, já que, por outro lado, a lei, também, sem o concurso da vontade, não seria elemento suficiente para a geração de efeitos, máxime no estado democrático de direitos, em que, embora se conviva com o mandamento constitucional da legalidade (CF, art. 5º, II), segundo o qual ninguém será obrigado a fazer deixar de fazer nada senão em virtude de lei, tem-se, por outro lado, como fundamento da República (CF, art. 1º, IV), o postulado da livre iniciativa.

 

Como se vê, o voluntarismo jurídico é mola propulsora do direito da qual não se pode afastar, e cuja presença, nos estados democráticos, é inegável. Daí se fala, portanto, em autonomia da vontade, pela qual é a vontade do agente que determina a sua prerrogativa de vincular-se ou não a um direito ou dever, fala-se também em autonomia privada, pela qual, além de o cidadão escolher livremente se se obriga ou não, poderá determinar o conteúdo da obrigação.

 

É a vontade, portanto (embora esquecida como elemento essencial do negócio jurídico no artigo anterior), o motor de chamado comércio jurídico, é a condição sine qua non para que o cidadão saia da ampla e irrestrita liberdade para se vincular a uma obrigação, perdendo, com isso, parcela dessa natureza livre, pois a partir daí, assumirá o compromisso de cumprir bem e fielmente aquilo a que contratou.

 

Esse preceito, na verdade, já está presente desde o Direito Romano, quando se formulou a máxima pacta sunt servanda, pela qual o indivíduo, uma vez obrigado, deve dar cumprimento à sua obrigação. Repetindo, no entanto, o que já se disse, se levada às últimas consequências, sem um sistema de freios e contrapesos, a autonomia da vontade pode desaguar em um sistema jurídico recheado de falhas e injustiças. basta imaginar a situação imediatamente decorrente da chamada Revolução Industrial, em que se noticia que na Rússia czarista (ou pré-bolchevista) a liberdade de contratar acarretava verdadeiros absurdos, como a contratação de operários para jornadas de trabalho desumanas, de doze, quatorze ou até mesmo dezesseis ou dezoito horas diárias, já que, sem um sistema de freios e contrapesos, o trabalhador ficava à mercê daqueles que disponibilizavam as ofertas de trabalho sob pena de, sem emprego, não obter condições de subsistência.

 

Por isso, as legislações modernas contêm vários instrumentos de mitigação da autonomia da vontade e da autonomia privada, de forma que, embora a vontade continue a ser (em regra) elemento primordial para a prática dos atos jurídicos (sobretudo dos negócios jurídicos), existem limites legais e sociais para a sua manifestação ou declaração na vida prática, como a boa-fé objetiva, a função social do contrato, a proteção dos hipossuficientes (consumidores, inquilinos etc.) e outros tantos exemplos que servem para refrear a ambição do ser humano em conseguir lucro desmedido à custa, muitas vezes, da dignidade do próximo.

 

Pode-se dizer, portanto, que o voluntarismo jurídico, ainda hoje uma regra, encontra-se mitigado, de forma que s partes podem livremente contratar e determinar o conteúdo do negócio, no entanto, devem respeito aos limites impostos, em última análise pelo princípio d dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), que orienta, fundamentalmente, institutos como a boa-fé, a função social (da propriedade e do contrato), a proteção dos hipossuficientes, e, porque não dizer, a própria isonomia material, consubstanciada na máxima “tratar igualmente aos iguais e desigualmente aos desiguais na medida das suas desigualdades”. Feitos esses esclarecimentos – absolutamente necessários – pode-se averiguar as diversas espécies de fatos jurídicos. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em   Manual de Direito Civil, Volume Único. Cap. V – Fatos Jurídicos, verificada, atual. e ampliada, item 3.2.1.1. Atos-Fatos jurídicos, comentários ao CC 105. Editora JuspodiVm, 6ª ed., p. 317, consultado em 23/12/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Embarcando na nave da equipe de Guimarães e Mezzalira, relativo ao artigo 105, da incapacidade relativa como exceção pessoal. Como precisamente qualificado por Maria Helena Diniz, a incapacidade relativa é uma exceção pessoal. Ou seja, apenas pode ser alegada por quem a aproveita. Nada mais natural, afinal de contas, sendo um instituto voltado à proteção da pessoa natural que não tenha ainda o necessário discernimento para a prática de determinados atos da vida civil, seria uma subversão à finalidade desse instituto permitir que outras pessoas a invocassem em prejuízo do próprio relativamente incapaz. Assim, v.g., não pode a pessoa que se obrigou a determinada prestação em favor de uma pessoa com dezessete anos invocar essa condição para se livrar dessa respectiva prestação.

 

Incapacidade relativa ante a indivisibilidade do objeto. A indivisibilidade do objeto invariavelmente impõe que se adote a mesma solução jurídica, ainda que existentes diferentes interessados em seu objeto. Sem esse caso, os cointeressados capazes poderão invocar a incapacidade relativa em favor do incapaz e de si mesmos. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 105, acessado em 24/12/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).