segunda-feira, 19 de agosto de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 464, 465, 466 - Do Contrato Preliminar – VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 464, 465, 466
- Do Contrato Preliminar – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título V – DOS CONTRATOS EM GERAL
 (art. 421 a 480) Capítulo I – Disposições Gerais –
Seção VIII – Do Contrato Preliminar
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 464. Esgotado o prazo poderá o juiz, a pedido do interessado, suprir a vontade da parte inadimplente, conferindo caráter definitivo ao contrato preliminar, salvo se a isto se opuser a natureza da obrigação.

Segundo a cartilha de Nelson Rosenvald, ao comentarmos o artigo precedente, observamos que a obrigação de fazer sucessiva aos contratos preliminares consiste em emissão de uma declaração de vontade por parte do contratante, autorizando o ingresso das partes do contrato definitivo. Havendo resistência injustificada à execução espontânea, o contratante lesado exercitará a pretensão de direito material por intermédio da tutela específica da obrigação de fazer, na qual o preceito cominatório (astreintes) desempenhará uma função coercitiva indireta perante o devedor, constrangendo-o a desempenhar a obrigação em juízo.

Porém, fracassando a modalidade coercitiva, aplica-se o art. 466-A do CPC/1973 (correspondência no CPC/2015, art. 501, com a seguinte redação: Na   ação   que   tenha   por objeto a emissão de declaração de vontade, a sentença que julgar procedente o
pedido, uma vez transitada em julgado, produzirá todos os efeitos da declaração não emitida”.), com o fito de imposição de execução direta, mediante a tutela sub-rogatória. Ou seja, sobejando perfeito o contrato preliminar no plano de validade, a vontade do magistrado substituirá a do devedor renitente, que injustificadamente a negou. A possibilidade de obtenção do suprimento judicial demonstra a fungibilidade da obrigação de fazer, e serve como título para a obtenção do registro definitivo de compra e venda nas sentenças originárias de contratos preliminares de promessa de compra e venda.

Como esclarece o próprio dispositivo, a execução específica não será viabilizada “se isto se opuser à natureza da obrigação”. Cuida-se das obrigações intuitu personae, nas quais não se pode constranger o devedor ao fazer, sendo impossível ao juiz suprir a sua omissão.

Há o que observar, no campo específico do compromisso de compra e venda, importante alteração legislativa que passou despercebida para muitos. O art. 41 da Lei n. 6.766/79 admite a transmissão da propriedade imobiliária unicamente em decorrência da averbação da quitação do contrato preliminar de compromisso, independentemente da celebração do contrato definitivo – escritura de compra e venda. Isto é, realizado o contrato preliminar e demonstrado o pagamento do preço, nada mais precisaria o adquirente providenciar, pois o negócio jurídico estaria completo.

A outro giro, a Lei n. 9.785/99 – objetivando a implantação de loteamentos para pessoas de baixa renda – introduziu na Lei n. 6.766/79 fundamental inovação no art. 26, § 6º: “Os compromissos de compra e venda, as cessões e as promessas de cessão valerão como título para o registro da propriedade do lote adquirido, quando acompanhados da respectiva prova de quitação”. Da forma que foi inserida, a norma se aplica a qualquer tipo de aquisição de lotes em loteamentos e não apenas à destinadas a populações de baixa renda.

Portanto, em tais hipóteses, será dispensada a sentença de adjudicação compulsória, pois a averbação da quitação ao registro do contrato de compromisso será medida suficiente para a obtenção da propriedade. Aliás, dispensando-se a superfetação da segunda escritura, o contrato de compromisso perde a característica de contrato preliminar, pois só existirá uma manifestação de vontade dos contratantes. A nosso viso, cuida-se de excelente medida sob o ponto de vista econômico e jurídico. No aspecto econômico, evita o encarecimento despropositado da aquisição da propriedade imobiliária, eis que é afasta a duplicidade de atos de escrituração e registro. Na lógica jurídica, é de ver que, quando da assinatura do compromisso, o vendedor praticamente transferiu todo o conteúdo dominial para o comprador, sobrando-lhe apenas a obrigação de outorga de escritura. Assim, a entabulação de um segundo contrato sobeja despicienda, pois as faculdades da propriedade já se encontravam com o adquirente.

Note-se, contudo, que, pela dicção emprestada pelo CC. 1.417 e 1.418, a promessa de compra e venda de imóveis não loteados prossegue na condição de contrato preliminar, sendo o seu registro apenas fato gerador de direito real à aquisição em coisa alheia, insuficiente para isoladamente proporcionar direito real de propriedade, aqui sendo mantida a necessidade de uma segunda manifestação de vontade, alicerçada na obrigação de emissão do instrumento definitivo de compra e venda (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 533 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 15/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na esteira de Ricardo Fiuza, a sentença judicial que supre a declaração de vontade do contratante inadimplente em tutela específica da obrigação substitui o contrato definitivo. Em regra, o da obrigação (v.g., promessa de casamento), o contrato é resolvido em perdas e danos, operando-se o disposto no CC. 465. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 250, apud Maria Helena Diniz, Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 16/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo os ensinamentos do mestre Marco Túlio de Carvalho Rocha, o prazo a que se refere o dispositivo é o prazo para a realização do contrato definitivo. O artigo permite expressamente que sentença judicial substitua o contrato definitivo que uma das partes se recusa injustamente a realizar. Ressalva-se que isso não será possível se a natureza da obrigação não o permitir. Que tipo de obrigação não permite sentença que supra a ausência do contrato definitivo? A obrigação contraída no contrato preliminar é sempre obrigação de fazer. Não é, portanto, propriamente, a “natureza da obrigação” que pode eventualmente impossibilitar o suprimento judicial da vontade, mas a presença de cláusula de arrependimento (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 16.08.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 465. Se o estipulante não der execução ao contrato preliminar, poderá a outra parte considera-lo desfeito, e pedir perdas e danos.

Na linha de raciocínio de Nelson Rosenvald, a norma em apreciação remete as partes a uma opção subsidiária, qual seja a indenização por perdas e danos contra o estipulante que não deu execução ao contrato preliminar.

Cuida-se, conforme o exposto, de uma segunda possibilidade de atuação do credor, pois o sistema deseja precipuamente o adimplemento da obrigação, mesmo que o cumprimento se viabilize pela tutela específica. A noção tão contemporânea da efetividade do direito material indica que a obrigação nasce para ser cumprida e o ordenamento civil, pelo princípio da operabilidade, velará para que a relação obrigacional, como um processo, marche em direção ao seu término natural, sendo patológicas e excepcionais as hipóteses de inadimplemento e consequente pleito indenizatório.

Se toda a arquitetura do Código Civil 2002 privilegia o adimplemento, a opção do art. 465 apenas será exercitada quando a natureza personalíssima da obrigação se opuser à tutela específica ou quando for o desejo do próprio credor a conversão da coisa devida em seu equivalente pecuniário, nos termos dos CC. 389 a 420, que cuidam da responsabilidade contratual.

Tecnicamente, a parte lesada pelo inadimplemento propugnará pela resolução do contrato, conforme o indicado no CC. 475.

Caso o rompimento se verifique na fase das tratativas – negociações preliminares -, não se pode falar em responsabilidade contratual, mas em quebra ilegítima do princípio da boa-fé objetiva do contato social, pelo comportamento daquele que, injustificadamente, viola a confiança da contraparte mediante o desleal e abusivo exercício do direito de recesso (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 534 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 19/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Pela Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, a alternativa apresentada tem lugar para opção do contratante credor quando impossível a tutela específica da obrigação, em face de sua natureza, ou seja, não admitir o pré-contrato a sua execução coativa, como observa a parte final do art. 464. Nesse último caso, a inadimplência da obrigação gera, apenas, a composição de perdas e danos, atinente ao objeto da promessa, nos termos do CC.389 (art. 1.056 do CC/1916). As perdas e danos compõem-se, além do que o devedor efetivamente perdeu, do que razoavelmente deixou de lucrar (CC/2002, art. 402; CC/1916, art. 1.059). A culpa in contrahendo é uma forma de responsabilidade contratual. (Orlando Gomes, Contratos, 2’ ed., Rio de Janeiro. Forense, 1966, p. 132-3) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 250, apud Maria Helena Diniz, Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 19/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o primeiro direito que surge para um contratante em relação ao outro é o de exigir que o outro execute sua prestação tal como se obrigou. Em caso de recusa, a execução específica pode ser requerida judicialmente. o direito de se requerer a execução específica de contrato preliminar encontra-se previsto no art. 464.

Ao invés de requerer o cumprimento da obrigação, o credor pode, se preferir, requerer a resolução do contrato.

Em ambos os casos os pedidos podem ser cumulados com o pedido de condenação do devedor ao pagamento de indenização por prejuízos sofridos pelo credor (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 19.08.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 466. Se a promessa de contrato for unilateral, o credor, sob pena de ficar a mesma sem efeito, deverá manifestar-se o prazo nela previsto, ou, inexistindo este, no que lhe for razoavelmente assinado pelo devedor.

Segundo entendimento de Nelson Rosenvald, os contratos preliminares se dividem em unilaterais ou bilaterais. Estes geram obrigações para ambas as partes, podendo uma exigir da outra o cumprimento do contrato definitivo (v.g., na promessa de compra e venda, o promissário comprador assume obrigação de pagar prestações – e o promitente vendedor, de fazer outorgar escritura definitiva). Já os contratos unilaterais produzem obrigações para apenas uma das partes. Constitui exemplo de promessa unilateral a promessa de doação, figura controversa no direito pátrio.

Tradicional exemplo dessa modalidade é o contrato de opção – frequente em negócios imobiliários -, pelo qual os contratantes deliberam que um deles exercitará preferencia para a eventual celebração de um contrato. Enquanto uma das partes assume a obrigação de conceder a preferência, nas condições da declaração, a outra tem a liberdade de efetuar ou não o contrato, sendo suficiente que exerça o direito potestativo da preferência no prazo estipulado – que se converte, portanto, em prazo decadencial. Enfim, só uma das partes está adstrita à prestação de fazer. A outra e livre.

O artigo em exame aduz que, quando não houver prazo, o credor será cientificado por um termo razoável, aposto em notificação. Aliás, é um equívoco e uma contradição, em termos, utilizar a expressão “prazo indeterminado”, pois o vocábulo prazo já indica um tempo ou período determinado.

O mérito do dispositivo consiste em demonstrar que as obrigações são transitórias, na medida em que uma pessoa não pode se vincular ao poder da vontade alheia ad eternum. O termo vínculo expressa a ideia de cadeia, prisão. A relação obrigacional remete à ideia de liberdade que, inicialmente cedida em prol do êxito do projeto contratual, será recuperada pelo devedor com o adimplemento.

Por fim, não se pode confundir a promessa unilateral de contratar com a proposta do contrato a que alude o CC. 427. Na policitação, o proponente apenas realiza uma oferta, aguardando a aceitação ou a contraproposta do oblato. A proposta não gera obrigatoriedade em várias oportunidades (CC. 428). Já a promessa unilateral é um contrato formado em que se concretizou a manifestação das vontades. Outrossim, a segurança jurídica do contrato preliminar, mesmo que unilateral, estende-se ao plano da sucessão mortis causa, pois o contrato integra o acervo hereditário transmitido aos herdeiros do promitente (devedor) e do beneficiário (credor), ao contrário da proposta, que caducará com a morte do ofertante ou do destinatário (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 535 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 19/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

No entendimento de Ricardo Fiuza diz-se do contrato preliminar “unilateralmente vinculante”, onde apenas uma das partes tem a aptidão de exigir a constituição do contrato definitivo. O contrato preliminar obriga uma das partes, quando por declaração (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 250, apud Maria Helena Diniz, Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 19/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo orientação do mestre Marco Túlio de Carvalho Rocha o dispositivo cuida do negócio unilateral que obriga o promitente a realizar contrato, denominado promessa unilateral ou opção.

Na promessa de compra (opção de venda) uma das partes obriga-se a comprar algum bem nas condições que prevê; na promessa de venda (opção de compra) obriga-se a vender um determinado bem.

O descumprimento da promessa unilateral sujeita o inadimplente a indenizar perdas e danos ou à execução específica.

Tratando-se de opção de compra irrevogável, válida e regular, uma vez não cumprida pelo devedor a obrigação, é permitido ao credor obter a condenação daquele a emitir a manifestação de vontade que se comprometeu, sob pena de, não o fazendo, produzir a sentença o mesmo efeito do contrato a ser firmado (STJ, REsp 5.406-SP, 29.4.91).

É comum que a opção seja dada por prazo determinado. Caso não possua prazo, pode o devedor notificar o devedor para que manifeste sua aceitação ao negócio dentro de um prazo razoável que assinalar, sob pena de ser a mesma revogada, liberando-se o devedor (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 19.08.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).