sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

DIREITO CIVIL COMENTADO. Arts. 18, 19, 20, 21 – Dos Direitos da Personalidade – Vargas, Paulo S. R.



DIREITO CIVIL COMENTADO. Arts. 18, 19, 20, 21 –
Dos Direitos da Personalidade – Vargas, Paulo S. R. 

TITULO I – Das Pessoas Naturais (art. 1 a 39)
Capítulo II - Dos Direitos da Personalidade
vargasdigitador.blogspot.com

Art. 18. Sem autorização, não se pode usar o nome alheio em propaganda comercial. 1

1 Aspectos patrimoniais do nome e da imagem da pessoa

Atualmente o conteúdo do direito à imagem e ao nome é entendido sob um duplo aspecto, marcado pela união de um elemento subjetivo, referente aos aspectos do nome e da imagem como direitos da personalidade de um indivíduo (right of privacy). Carlos Alberto Bittar esclarece que “a doutrina é tranquila a respeito, tanto no exterior, como em nosso país, pois a proteção que se confere à imagem e ao nome preserva à pessoa, simultaneamente, a defesa de componentes essenciais de sua personalidade, e, de outro, o respectivo patrimônio, pelo valor econômico que representa” (ver nota 4 ao art 11) (1). Explicando esse natural interesse comercial que recai sobre o nome de pessoas notórias, o autor explica que: “de fato, o relacionamento de pessoas a produtos e a empresas, na divulgação pelos diferentes veículos de comunicação, de sua existência e de sua atuação, conferiu destaque próprio aos direitos à imagem e ao nome, permitindo-se-lhes, em razão de sua disponibilidade jurídica, a atribuição de valor econômico expressivo e progressivo, na exata medida da posição de evidencia do retrato e do espectro da campanha publicitária. O fenômeno ganha vulto em nossos tempos, em que a vinculação publicitária de pessoas bem sucedidas em suas atividades representa estímulo ao consumo, mediante a atração que exercem junto ao público: assim acontece com os grandes estadistas, políticos, artistas, escritores, esportistas. Explora-se, nesse passo, a ânsia do espectador em identificar-se com os seus ídolos, com os seus hábitos, os seus gostos, as suas preferencias, levando-o, pois, ao consumo do produto anunciado, direta ou indiretamente, conforme o caso” (2). Assim é que, sob o aspecto patrimonial, a proteção que o direito confere à imagem e ao nome de uma pessoa obedece às mesmas diretivas daquela que é conferida ordinariamente a um bem in comercio. Ou seja, seu valor patrimonial não pode ser explorado sem a autorização de seu titular e toda subtração ilegítima de seu valor de mercado deve ser reparada. Daí o artigo 18 do Código Civil explicitamente exigir a autorização da pessoa para que possa usar seu nome em propaganda comercial. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Carlos Alberto Bittar, Danos Morais: cálculo da indenização por violações à imagem e ao nome de pessoa notória, LEX: JTACSP, 1990, v.24, n. 121, pp. 6-7.
(2)      _______________________________

Art. 19. O pseudônimo adotado para atividades lícitas goza da proteção que se dá ao nome. 1

1 Proteção ao pseudônimo

Pseudônimo, de origem grega, pseudônimos, de pseudes (falso) e onoma (nome) entende-se a denominação ou o nome falso ou suposto, escolhido ou adotado por uma pessoa, para ocultar sua verdadeira identidade ou seu verdadeiro nome, no exercício de qualquer atividade”. (1) É normalmente utilizado no meio artístico e literário (lei n. 9.610/98), recebendo, dada sua importância no meio em que é utilizado, a mesma proteção que se confere ao nome, tanto em sua vertente patrimonial quanto sob a ótica dos direitos da personalidade. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      De Plácido e Silva. Vocabulário Jurídico, 27ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2007, p. 1.131.

Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias a administração da justiça ou a manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinares a fins comerciais. 1, 2, 3, 4, 5

Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes. 6

1.        Imagem-retrato e imagem-atributo

De acordo com Maria Helena Diniz, “a imagem-retrato é a representação física da pessoa, como um todo, ou em parte separadas do corpo (nariz, olhos, sorriso etc.) desde que identificáveis, implicando o reconhecimento de seu titular, por meio de fotografia, escultura, desenho, pintura, interpretação dramática, cinematografia, televisão, sites etc., que requer autorização do retratado (CF, art 5º, X). A imagem atributo é o conjunto de caracteres ou qualidades cultivados pela pessoa, reconhecidos socialmente (CF, art 5º V), como habilidades, competência, lealdade, pontualidade etc. a imagem abrange também a reprodução romanceada em livro, filme ou novela, da vida de pessoa de notoriedade”.(1) Sob essas diferentes vertentes é que deve ser analisada a proteção conferida pelo direito à imagem da pessoa. Tem a pessoa o inequívoco direito de defender a forma como ela é vista na sociedade (imagem-atributo), insurgindo-se contra toda e qualquer divulgação não autorizada que prejudique ou atente contra essa sua boa-fama, proibindo sua divulgação e exigindo a respectiva reparação. Em tais situações, para que se configure a violação da imagem da pessoa, nos termos do próprio artigo 20, é necessário que a divulgação não autorizada da imagem atinja “a honra, a boa fama ou a respeitabilidade” da pessoa. Além disso, tem a pessoa o direito de opor-se à mercantilização não autorizada de sua imagem, pelo simples fato de que a pessoa pode não querer ser associada a qualquer marca ou produto ou porque, sem ter autorizado o uso da imagem, foi ainda privada da respectiva remuneração caso esse uso tivesse sido autorizada. Nesse outro viés da proteção a imagem da pessoa, o Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido que a simples exibição da imagem não autorizada dá ensejo à reparação, independentemente da existência de prova de prejuízo (STJ, Súmula 403). Atualmente, entretanto, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça parece delinear uma tendência de aproximar essas duas e diferentes situações, afirmando que “a ofensa ao direito à imagem, materializa-se com a mera utilização da imagem sem autorização, ainda que não tenha caráter vexatório ou que não viole a honra ou a intimidade da pessoa, e desde que o conteúdo exibido seja capaz de individualizar o ofendido” (STJ, REsp 794.586-RJ, rel. Min. Raul Araújo, j. 15.03.12).

2.        Pessoa retratada em situações públicas

Em tal hipótese, entende-se que não é necessária uma expressa e formal autorização para a utilização da imagem da pessoa. Acertadamente, entende-se que a pessoa que conscientemente se expõe, abrindo mão de sua privacidade não pode opor-se à utilização de sua imagem. Há, em tais casos, uma legitima presunção de que a autorização foi tacitamente conferida pela pessoa. Nesse sentido: “não se pode cometer o delírio de, em nome do direito de privacidade, estabelecer-se uma redoma protetora em torno de uma pessoa para torna-la imune de qualquer veiculação atinente à sua imagem. Se a demandante expõe sua imagem em cenário público, não é ilícita ou indevida sua reprodução pela imprensa, uma vez que a proteção à privacidade encontra limite na própria exposição realizada” (STJ, REsp 595.600-SC, rel. Min. Cesar Asfor rocha, j. 18.03.04); “danos morais – Direito de imagem – Participação em concurso de trajes sumários, evento aberto ao público em um clube, com convite aos órgãos de imprensa – Modelo que voluntariamente posa para os fotógrafos presentes de seios nus – Contexto das fotografias que demonstra desejo explícito de exibir-se ás lentes dos fotógrafos – Consentimento tácito à publicação da fotografia em jornal popular, em matéria sobre o evento, dois dias após” (TJ-SP, Apel n. 9173602-75.2004.8.26.0000, rel. Des. Francisco Loureiro, j. 12.04.07).

3.        Pessoa retratada num contexto genérico ou em meio a uma multidão

A razoabilidade de tal premissa serve para evitar que fotos e filmagens feitas em grandes eventos ou em espaços públicos, dependam da autorização das dezenas ou centenas de pessoas que invariavelmente têm sua imagem captada em tais situações. Em tais casos, desde que a pessoa não seja o foco do cenário retratado, mas apenas parte dele, não é necessária a obtenção de autorização. Todavia, caso o contexto retratado seja desabonador, denegrindo a imagem de pessoa retratada em situação vexatória, caberá reparação pelo uso indevido da imagem. Nesse sentido: “tratando-se de imagem de multidão, de pessoa famosa ou ocupante de cargo público, deve ser ponderado se, dadas as circunstâncias a exposição da imagem é ofensiva à privacidade ou à intimidade do retratado, o que poderia ensejar algum dano patrimonial ou extra patrimonial. Há, nessas hipóteses, em regra, presunção de consentimento do uso da imagem, desde que preservada a vida privada” (STJ, REsp n. 801.109-DF, rel. Min. Raul Araújo, j. 16.6.12).

4.        Pessoa retratada em contexto jornalístico

Como todo direito, a proteção da imagem da pessoa não é absoluta, devendo sempre ser ponderada e relativizada diante de outros direitos e princípios. Tratando-se da proteção da imagem da pessoa, a situação mais corriqueira – problemática – que se apresenta na jurisprudência é a de sua relativização frente à garantia constitucional da liberdade de imprensa. Tratando-se de dois princípios constitucionais, exige-se do operador do direito uma boa dose de razoabilidade e proporcionalidade no confronto entre tais valores. É exatamente isso o que diz o Enunciado 279 da IV Jornada de Direito Civil que “a proteção à imagem deve ser ponderada com outros interesses constitucionalmente tutelados, especialmente em face do direito de amplo acesso à informação e da liberdade de imprensa. Em caso de colisão, levar-se-á em conta a notoriedade do retratado e dos fatos abordados, bem como a veracidade destes e, ainda, as características de sua utilização (comercial, informativa, biográfica), privilegiando-se medidas que não restrinjam a divulgação de informações’. Em situações como essa, a jurisprudência tem reconhecido que a ilustração de reportagens e matérias jornalísticas, com imagens e retratos constitui exercício regular da atividade jornalística “a divulgação, ao público, sobre episódios relevantes ao cotidiano dos brasileiros é dever do Estado, na medida em que a informação é um direito do cidadão. Assim, embora no corpo do texto haja foto do autor preso, houve apenas animus narrandi, o qual não acarreta abalo à honra, porquanto consagra o direito de informação” (TJ-SP, Apel n. 9169035-24.2008.8.26.0000, rel. Des. Coelho Mendes, j. 19.3.13). todavia, essa ampla liberdade de imprensa não pode desviar-se da finalidade informativa e narrativa, sob pena de caracterização do abuso e do consequente dever de indenizar: “A liberdade da divulgação de notícias baseia-se no interesse público da obtenção da informação – Se não houver caráter informativo, interesse público atual e respeito ao decoro, reputação e à vida privada, a divulgação indiscriminada, por qualquer de suas formas, ou de notícia falsa, ainda que não de forma intencional, resulta na obrigação de reparar o dano” (TJ-SP, Apel n. 0020722-43.2011.8.26.0625, rel. Des Alcides Leopoldo e Silva Júnior, j. 14.08.12).

5.        Captação da imagem necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública. Ainda a dispensa de autorização

O exemplo mais didático para essa exceção legal à divulgação da imagem da pessoa por imposição da administração da justiça é o da imagem da pessoa retratada em cartaz de ‘procura-se’. Todavia, as situações concretas são muito mais complexas do que esse exemplo, exigindo um juízo de ponderação e razoabilidade sobre a necessidade de divulgação da imagem de uma pessoa.

6.        Legitimados

Se o ofendido vier a falecer ou encontrar-se ausente, terão legitimidade para reclamar a proteção e a reparação da imagem da pessoa o cônjuge, o companheiro (Enunciado 400 da V Jornada de Direito Civil) os ascendentes ou os descendentes. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil Brasileiro, Vol. I, 24ª ed. São Paulo, Saraiva, 2007, p. 129

Art. 21. A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providencias necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma 1, 2, 3.


1.        Vida privada e intimidade

Apesar de o artigo se referir apenas à vida privada da pessoa. É comum a distinção entre vida privada e intimidade feita pela doutrina. Por intimidade, costuma-se entender os aspectos da vida privada de uma pessoa que ela legitimamente mantém afastada do convívio público. É a parte de sua vida que o indivíduo leva quando se encontra longe de observação de estranhos. A proteção jurídica conferida a esses aspectos da vida íntima da pessoa se traduz no direito que todo indivíduo tem de afastar pessoas estranhas de fatos ou informações pessoais que não queira dividir. É esse o fundamento de onde se extrai a inviolabilidade de seu domicílio, do sigilo de sua correspondência, conversas telefônicas, dados bancários etc. Além disso, a proteção à vida privada da pessoa pode ainda ser entendida como o direito que tem ela de gerir sua vida sem a intromissão de terceiros. É o direito que tem a pessoa de manter o estilo de vida que quiser.

2.        É Legítimo o interesse jornalístico sobre a vida de pessoa famosa

Da mesma forma como ocorre com o direito à imagem, a intimidade de certas pessoas acaba sofrendo certos temperamentos decorrentes de sua notória. Adriano de Cupis explica esse legítimo interesse e essa curiosidade jornalística que recaem sobre a imagem e a biografia de pessoas notórias dizendo que: “as pessoas de certa notoriedade, como não podem opor-se à difusão da própria imagem, igualmente não podem opor-se à divulgação de acontecimentos da sua vida. O interesse público sobreleva, nesses casos, o interesse privado; o povo, assim como tem interesse em conhecer a imagem dos homens célebres, também aspira a conhecer o curso e os passos da sua vida, as suas ações e as suas conquistas; e, de fato, só através de tal conhecimento pode formar-se um juízo sobre seu valor. Mesmo nesses casos, por outro lado, as exigências do público detêm-se perante a esfera íntima da vida privada, e, além disso, as mesmas exigências são satisfeitas pelo modo menos prejudicial ao interesse individual”.(1) Diversas foram as teorias desenvolvidas pela doutrina para justificar a dispensa da autorização para exibição de imagens de pessoas públicas. Na França, surgiu a teoria do consentimento tácito ou do consentimento presumido. Dizia-se que “pessoas notórias se encontrariam em um estado de représentation permanente, aplicável com relação aos fatos da vida, seja da vida pública, como privada. Quando a vontade de divulgar sua personalidade ao público pareça evidente, é extensiva ao direito à imagem”. (Jacques Ravanas). Outros, por outro lado, refutavam a teoria do consentimento presumido, fundando a dispensa de consentimento “no legítimo interesse público que recai sobre tais pessoas” Pierre Kayser).(2)

3.        Outras limitações à inviolabilidade da vida privada. Gravações de conversas telefônicas; quebra de sigilo bancário; busca e apreensão no domicílio da pessoa.

Apesar de o artigo 21 do Código Civil ter se omitido quanto às limitações que a “administração da justiça ou à manutenção da ordem pública” podem impor aos direito à vida privada da pessoa, não há dúvida que em certas situações a vida privada da pessoa deve ceder a outros interesses. É exatamente isso o que autoriza que, em casos excepcionais, a quebra do sigilo bancário, a gravação de conversas telefônicas ou a realização de buscas dentro do domicílio da pessoa, esmo contra sua vontade. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Adriano de Cupis. Os direitos da personalidade, tradução Adriano Vera Jardim, Lisboa, Livraria Morais, 1961, p. 145
(2)      Regina Saham, Direito à imagem no Direito civil Contemporâneo, São Paulo, Atlas, 2002, pp. 199-200.