CPC LEI 13.105 e LEI
13.256 - COMENTADO
LIVRO III – ART 927,
928 - DOS PROCESSOS NOS TRIBUNAIS E DOS MEIOS
DE IMPUGNAÇÃO DAS
DECISÕES JUDICIAIS - VARGAS, Paulo S.R.
TITULO I – DA ORDEM
DOS PROCESSO E DOS PROCESSOS DE COMPETÊNCIA
ORDINÁRIA DOS
TRIBUNAIS
– CAPÍTULO I – DISPOSIÇÕES GERAIS
– vargasdigitador.blogspot.com
Art 927. Os juízes e os
tribunais observarão:
I – as decisões do
Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
II – os enunciados
de súmula vinculante;
III – os acórdãos
em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas
e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
IV – os enunciados
das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior
Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;
V – a orientação do
plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
§ 1º. Os juízes e
os tribunais observarão o disposto no art 10 e no art 489, § 1º, quando
decidirem com fundamento neste artigo.
§ 2º. A alteração
de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos
repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de
pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese.
§ 3º. Na hipótese
de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais
superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver
modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança
jurídica.
§ 4º. A modificação
de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotado em
julgamento de caos repetitivos observará a necessidade de fundamentação
adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da
proteção, da confiança e da isonomia.
§ 5º. Os tribunais
darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão jurídica
decidida e divulgando-os, preferencialmente na rede mundial de computadores.
Sem correspondência
no CPC/1973
1.
(IN) CONSTITUCIONALIDADE
DO ART 927 DESTE ATUAL CÓDIGO
A eficácia vinculante do precedente previsto no art 927, I, do CPC, tem
previsão constitucional (art 102, § 2º, CF), o mesmo se verificando quanto à
súmula vinculante prevista no inciso II do mesmo dispositivo legal (art 103-A,
da CF). Nos demais incisos a eficácia vinculante decorre tão somente de normas
infraconstitucionais, o que levanta importa questão a respeito de sua
constitucionalidade.
Já existe doutrina a apontar a inconstitucionalidade das normas que
criam um eficácia vinculante de precedentes e de súmulas não vinculantes sem
previsão nesse sentido no texto constitucional, já que a Constituição Federal
reserva efeito vinculante apenas às súmulas vinculantes, mediante devido
processo e aos julgamentos originados em controle concentrado de
constitucionalidade.
Afirma-se que a vinculação obrigatória às súmulas do Superior Tribunal
de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, bem como aos precedentes criados no
julgamento de casos repetitivos e no incidente de assunção de competência
invade a seara legislativa, por outorgar ao Poder Judiciaria o estabelecimento
de normas, criando uma vinculação inconstitucional a preceitos abstratos e
gerais fixados pelo Poder Judiciário, ou seja, com características de lei.
A doutrina que defende a novidade legislativa – uma das mais importantes
desse atual CPC -, entende que o Poder Judiciário não cria norma jurídica
nesses casos, não se devendo confundir a atividade de dar um sentido unívoco à
o cabimento de reclamação constitucional norma que foi criada pela via
legislativa como a tarefa de criação de norma. Entendimento em sentido
contrário levaria à conclusão de que o Supremo Tribunal Federal legisla ao
decidir processo objetivo e ao editar súmula vinculante, o que não parece
correto.
Ainda que a questão a respeito da constitucionalidade dos três últimos
incisos do art 927 do CPC sirva de interessante combustível para discussões
doutrinárias, que devem se estender por tempo indefinido, no plano dos fatos é
difícil imaginar o Supremo Tribunal Federal declarando tais normas
inconstitucionais. E isso por um singelo motivo: é de todo interesse daquela
corte a eficácia vinculante consagrada em tais dispositivos, e especial em sua
promessa de diminuição no número de processos e recursos, em especial os
recursos especial e extraordinário. (Apud Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 1.491.
Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo –
2016. Ed. Juspodivm).
2.
EFICÁCIA VINCULANTE
O art 927, caput¸ do CPC,
prevê que os juízes e os tribunais observação as decisões do Supremo Tribunal
Federal em controle concentrado de constitucionalidade; os enunciados de súmula
vinculante, os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução
de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial
repetitivos, os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria
constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional
e a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
Surge na doutrina o questionamento a respeito do significado do termo
“observarão” previsto no dispositivo legal ora analisado. E essa definição é de
extrema relevância para se concluir ser ou não o art 927 do CPC norma que
consagra a eficácia vinculante de precedentes e súmulas, por termos por ele
descritos.
Para parcela minoritária da doutrina o dispositivo cria tão somente um
dever ao órgão jurisdicional de levar em consideração, em suas decisões, os
precedentes e enunciados sumulares lá previstos. De forma que, não havendo em
outro dispositivo a previsão expressa de sua eficácia vinculante, o órgão
jurisdicional teria o dever de considerar o precedente ou súmula, mas não
estaria obrigado a segui-los, podendo fundamentar sua decisão com o argumento
de ser equivocado o entendimento consagrado no precedente ou na súmula.
Não parece, entretanto, ser esse o melhor entendimento. Conforme entende
a doutrina amplamente majoritária o art 927 do CPC é suficiente para consagrar
a eficácia vinculante aos precedentes e enunciados sumulares previstos em seus
incisos). Ou seja, “observarão” significa aplicação de forma obrigatória.
Ao adotar-se o entendimento de que o termo “observarão” utilizado no art
927, caput, do CPC não consagra a
eficácia vinculante estar-se-ia diante de curiosa e insustentável situação. Coo
é extraído da praxe forense, o Superior Tribunal de Justiça sumula
entendimentos de matérias infraconstitucionais, sendo o direito processual
campo fértil de tal atuação. Ao se interpretar que o art 927, IV, do CPC obriga
o órgão jurisdicional a apenas levar em consideração as súmulas do Supremo
Tribunal Federal em matéria constitucional, não existiria tal dever quanto às
súmulas de direito infraconstitucional editadas pela Corte Superior?
Como a eficácia vinculante das hipóteses previstas nos primeiros três
incisos do art 927 do CPC tem previsão expressa em outros dispositivos de lei
(controle concentrado de constitucionalidade no art 102, § 2º, da CF; súmula
vinculante no art 103-A, caput, da CF;
incidente de assunção de competência no art 947, § 3º, do CPC; IRDR no art 985
do CPC, recursos especial e extraordinário repetitivos no art 1.040 do CPC, a
divergência doutrinaria coloca em questão a eficácia vinculante apenas dos
enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e
do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional e da orientação
do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
Com relação às súmulas previstas no art 927, IV, do CPC, deve ser feita
uma importante observação. A discussão a respeito de sua eficácia vinculante
tende a ter pouca ou nenhuma relevância prática, já que as súmulas, como
concretização da jurisprudência do tribunal, necessariamente deverão ter como
fundamento a ratio decidendi dos
precedentes do tribunal que justificam sua edição, de forma que a eficácia
vinculante desses coloca em segundo plano a divergência ora enfrentada.
Mas como estamos no Brasil, não se deve desconsiderar a possibilidade de
o tribunal sumular um entendimento com base em precedentes não vinculantes, ou
seja, em decisões que não sejam proferidas em julgamento de casos repetitivos
ou no incidente de assunção de competência. Apesar de não ser recomendável, não
se deve descartar tal possibilidade. Nesse caso, ainda que não vinculantes, os
precedentes utilizados para justificar a edição da súmula deverão ser
considerados em seus fundamentos determinantes (ratio decidendi) para a fixação do objeto da vinculação
obrigatória.
Ainda que nesse caso se possa constatar uma eficácia vinculante indireta
de precedentes meramente persuasivos, não são eles que geram a eficácia
vinculante, mas sim a súmula que materializa suas conclusões. É dizer que antes
da súmula seus fundamentos determinantes são apenas persuasivos, e com a edição
da súmula passam a ser vinculantes.
Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal já deu exemplos de que a
edição de súmula vinculante nem sempre tem como fundamento qualquer precedente,
como ocorreu na edição da Súmula Vinculante nº II. Obviamente se trata de um
desvio de conduta, mas nesse caso irrelevante para a divergência ora analisada
porque a eficácia vinculante da súmula vinculante tem previsão constitucional e
com relação a ela não se discute.
Por fim, para se distinguir as súmulas previstas no inciso II do art 927
do CPC daquelas previstas no inciso IV do mesmo dispositivo, ainda que nos dois
casos sua aplicação no caso concreto seja obrigatória, convém se chamar as
primeiras de súmulas vinculantes, nome já consagrado, e as segundas de súmulas
com eficácia vinculante. Na pratica, naturalmente, não existirá diferença, mas
as diferentes expressões podem ajudar o operador do Direito a distingui-las no
caso concreto.
Até se pode argumentar que com a identidade de eficácia vinculante não
teria mais sentido existir súmula vinculante, já que ao Supremo Tribunal Federal
bastaria editar uma súmula simples sobre matéria constitucional (e nem se
cogita que uma súmula vinculante tenha matéria infraconstitucional) para gerar
a eficácia vinculante. Tal argumento é falho por dois motivos: (a) o cabimento
de reclamação constitucional, limitado ao desrespeito às súmulas vinculantes e
(b) a vinculação à Administração Pública, também privativa das súmulas
vinculantes. (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.491. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
3.
CONTROLE
CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE
Segundo o art 927, I, do CPC, os juízes e tribunais observarão as
decisões e os precedentes do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado
de constitucionalidade.
Numa primeira leitura pode-se concluir não se tratar de grande novidade,
considerando-se a eficácia erga omnes
do controle concentrado de constitucionalidade realizado pelo Supremo Tribunal
Federal (art 28, parágrafo único, da Lei 9.868/1999). Nunca é demais lembrar
que o art 102, § 2º, da CF prevê que as decisões definitivas de mérito,
proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de
inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade
produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais
órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas
esferas federal, estadual e municipal.
Não se descarta a possibilidade de o legislador ter incluído a decisão do
controle concentra de constitucionalidade no rol do art 927 do CPC apenas com o
objetivo de tornar o rol exauriente, tese corroborada pela inclusão também da
súmula vinculante, que tem sua eficácia vinculante já prevista em texto
constitucional, a exemplo da decisão proferida no controle concentra de constitucionalidade.
Mas é possível se extrair uma utilidade, e de extrema importância, na
previsão ora analisada, distinguindo-se a eficácia erga omnes da coisa julgada material gerada no controle concentra
de constitucionalidade, já consagrada no texto constitucional, da eficácia
vinculante dos fundamentos determinantes da decisão (ratio decidendi), consagrada no art 927, I, do CPC.
Segundo o Enunciado 168 do FPPC, “os fundamentos determinantes do
julgamento de ação de controle concentrado de constitucionalidade realizado
pelo STF caracterizam a ratio decidendi
do precedente e possuem efeito vinculante para todos os órgãos jurisdicionais”.
Trata-se da chamada “transcendência dos motivos determinantes” ou do efeito transcendente de motivos
determinantes, que teria sido expressamente adotado pela previsão do art
927, I, do CPC.
O Supremo Tribunal Federal vinha aplicando a tese ora analisada, mas
atualmente o entendimento do tribunal se modificou (STF, Tribunal Pleno, Rcl
11.479 AgRg/CE, rel. Min. Cármen Lúcia, j. 19.12.2012, DJe 25.2.2013).) de
forma que a teoria subsiste apenas no ambiente doutrinário, sem encontrar
aplicação na praxe forense. Como consequência prática da inadmissão ora
analisada pelo Supremo Tribunal Federal, encontra-se o não cabimento da
reclamação constitucional contra decisão que apenas contrariar fundamentos no
controle de constitucionalidade sem agredir o dispositivo da decisão (STF, 1ª
Turma, Rcl 11.478 AgRg/CE, rel. Min. Marco Aurélio, j. 5.6.2012, DJe
21.6.2012). Espera-se uma mudança da posição jurisprudencial em decorrência do
art 927, I, do CPC.
Qualquer órgão jurisdicional, no julgamento de qualquer processo,
recurso ou reexame necessário (nesse caso somente os tribunais de segundo
grau), pode declarar de forma incidental a inconstitucionalidade de uma norma
legal, mas nesse caso não há qualquer eficácia vinculante de tal declaração.
Essa realidade, entretanto, é mais sensível no caso de tal controle incidental
ter sido realizado pelo Supremo Tribunal Federal.
Nos estritos termos do art 927, I, do CPC, essa espécie de controle de
constitucionalidade, mesmo que realizada pela Corte constitucional, não tem
eficácia vinculante, já que o dispositivo legal é suficientemente claro ao
estabelecer tal eficácia somente à declaração de inconstitucionalidade
realizada de forma concentrada, portanto, o controle de constitucionalidade
realizado por meio de processo objetivo. Ocorre, entretanto, que os arts 525, §
12º e 535, § 5º do CPC permitem que a alegação de coisa julgada inconstitucional
em sede de impugnação ao cumprimento de sentença tenha como fundamento e
declaração de inconstitucionalidade realizada pelo Supremo Tribunal Federal
tanto em controle concentrado como em controle difuso.
A contradição é na realidade apenas aparente, porque se o inciso I do
art 927 do CPC a sugere, o inciso V do mesmo dispositivo parece afastá-la.
Tendo a orientação do Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal eficácia
vinculante, é possível se concluir que mesmo no controle difuso de
constitucionalidade haverá eficácia vinculante, se não em razão do inciso I do
art 927 do CPC, pelo inciso V do mesmo dispositivo legal. (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.493/1.494. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
4.
ENUNCIADOS DE
SÚMULAS VINCULANTES
O inciso II do art 927 do CPC se justifica apenas se levarmos em conta o
objetivo do dispositivo legal de elencar todas as hipóteses em que há eficácia
vinculante em nosso sistema jurídico. Afinal, se a súmula é vinculante, é dizer
o óbvio que tem eficácia vinculante.
Nos termos do art 103-A, caput,
da CF, o Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante
decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria
constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa
oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder
Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal,
estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma
estabelecida em lei.
Na realidade a eficácia vinculante na hipótese ora analisada é até mesmo
mais ampla do que aquela prevista no art 927 do CPC, já que enquanto em seu caput há previsão de que os juízes e
tribunais observarão o enunciado das súmulas vinculantes, o texto
constitucional prevê, em seu art 103-A, § 3º, da CF, que do ato administrativo
ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a
aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a
procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial
reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da
súmula, conforme o caso. Ou seja, a eficácia vinculante extrapola a atuação do
Poder Judiciário, vinculando também a Administração Pública. (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.494/1.495. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
5. ENUNCIADOS DAS SÚMULAS DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL EM MATÉRIA CONSTITUCIONAL E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EM
MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL.
Segundo o inciso IV do art 927 do CPC, os juízes e tribunais observarão
os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria
constitucional, e do Superior Tribunal de Justiça, em matéria
infraconstitucional.
A norma praticamente torna todas as súmulas dos tribunais superiores com
eficácia vinculante, sejam ela súmulas vinculantes ou não, à exceção daquelas
editadas pelo Supremo Tribunal Federal que disserem respeito a normas
infraconstitucionais, circunstância até certo ponto comum na seara processual.
Na realidade elas em deveriam existir, quanto menos ter eficácia vinculante. O
interessante é que, a partir do momento em que o Superior Tribunal de Justiça
sumule a matéria, o Supremo Tribunal Federal estará vinculado ao entendimento
consagrado na súmula.
Dessa forma, coo sempre defendi que em matéria infraconstitucional é o
Superior Tribunal de Justiça o órgão jurisdicional responsável pela última
palavra, certa ou errada, devendo tal realidade ser respeitada inclusive pelo
Supremo Tribunal Federal, ao menos em temas sumulados, isso pode se tornar
realidade. Em especial em matérias processuais não são poucas as vezes em que
os dois tribunais divergem, o que deveria ser inadmissível num sistema jurídico
coeso, cabendo ao Supremo Tribunal Federal seguir o entendimento consolidado do
Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional. (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.495. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
6. ORIENTAÇÃO DO PLENÁRIO OU DO ÓRGÃO
ESPECIAL AOS QUAIS ESTIVEREM VINCULADOS
Por fim, o inciso V do art 927 do CPC dá eficácia vinculante à
orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados os
juízes e os tribunais. Entendo que o termo “orientação só possa ser
interpretado como decisão, porque o órgão jurisdicional não tem natureza
consultiva. Em minha percepção, portanto, passam a ter eficácia vinculante as
decisões colegiadas proferidas no Tribunal Pleno no Supremo Tribunal Federal e
na Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça.
Com relação ao Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal, entendo
justificável a vinculação considerando-se tratar de órgão que reúne a
totalidade dos Ministros julgadores. O mesmo não se pode dizer da Corte
Especial do Superior Tribunal de Justiça, mas como outras espécies de decisão
de tal órgão têm eficácia vinculante, a generalização criada pelo dispositivo
ora mencionado não parece ser temerária. (Apud Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 1.495/1.496.
Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo –
2016. Ed. Juspodivm).
7.
EFICÁCIA EX TUNC OU EX NUNC DA NOVIDADE LEGISLATIVA
Partindo-se da premissa de que o art 927 do CPC, em seus cinco incisos,
consagra uma série de precedentes vinculantes e torna súmulas atualmente
persuasivas em súmulas com eficácia vinculante, surge uma importante questão:
essa eficácia vinculante atingirá os precedentes criados e as súmulas editadas
antes da entrada em vigência do novo diploma legal?
Com relação às súmulas não haveria maiores problemas práticos em se
admitir uma eficácia ex tunc do art
927, IV, do CPC, caso os tribunais superiores se empenhassem em fazer uma
revisão de todas as suas súmulas antes da entrada em vigência do novo diploma
legal. Poderiam assim revogar as chamadas “súmulas zumbis”, que não são mais
seguidas nem mesmo pelos tribunais que as editaram, bem como àquelas que são
incompatíveis com o atual Código ora analisado. Poderiam, inclusive, revogar
súmulas que, apesar de não estarem superadas, o tribunal não pretende permitir
que tenham eficácia vinculante.
Infelizmente, entretanto, não parece que essa será a conduta a ser
adotada pelos tribunais superiores, o que poderá gerar eficácia vinculante à
súmulas que definitivamente não deveriam ter tal eficácia.
A situação torna-se ainda mais dramática quando se analisa a questão ora
levantada no tocante aos precedentes obrigatórios, porque nesse caso os
tribunais não podem “revogar” decisões já proferidas e transitadas em julgado.
E ainda pior, há precedentes contraditórios, como é facilmente notado, por
exemplo, com decisões que tratam a mesma matéria jurídica de forma diferente
pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça. Ainda que neste caso se
possa dizer que a eficácia vinculante seja do precedente mais recente, não se
pode desconsiderar que quanto eles foram criados os julgadores responsáveis
pela sua criação o fizeram com a certeza de que teriam no máximo eficácia
persuasiva.
A solução não é simples. Se adotarmos a eficácia ex tunc do art 927 do CPC, certamente se estará dando uma amplitude
imediata considerável à eficácia vinculante de súmulas e precedentes, mas nesse
caso é de discutível adequação simplesmente transformar o que foi criado como
persuasivo em vinculante. Por outro lado, ao se admitir uma eficácia ex nunc ao art 927 do CPC, estar-se-á
adotando a opção mais segura, que menos problemas práticos gerará, mas nesse
caso a eficácia vinculante ou persuasiva dependerá da data de formação do
precedente ou da edição da súmula, criando-se uma distinção temporal que também
poderá causar problemas práticos.
Sem solução fácil, entendo que o mais adequado seja, nesse caso,
prestigiar a segurança jurídica, atribuindo-se ao art 927 do CPC eficácia ex tunc ou seja, somente as súmulas
editadas e os precedentes formados na vigência do atual Código devem ter
eficácia vinculante. Tal entendimento, além de prestigiar a segurança jurídica,
ainda tem o mérito de tornar a adoção da novidade legislativa paulatina, o que
certamente auxilia em sua exata compreensão e aplicação no caso concreto. (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.496/1.497. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
8.
CABIMENTO DE
RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL
Apesar de ser o art 927 do CPC suficiente para atribuir a todos os
precedentes e enunciados sumulares por ele previstos em seus incisos a eficácia
vinculante, não é homogêneo o tratamento da impugnação da decisão que
desrespeita tal eficácia vinculante.
As decisões que desrespeitam os procedentes obrigatórios, inclusive
aqueles derivados de decisão proferida em controle concentrado de
constitucionalidade, e as súmulas vinculantes, são impugnáveis por reclamação
constitucional, nos termos do art 988, IV, do CPC. Já com relação às decisões
que desrespeitam as súmulas com eficácia vinculante (súmulas “simples”) do
Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional e do Supremo
Tribunal federal em matéria constitucional (art 927, IV do CPC) e às
orientações do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados
(art 927, V, do CPC) não é cabível a reclamação constitucional.
Significa dizer que se uma sentença desrespeita a eficácia vinculante
consagrada nos incisos IV e V do art 927 do CPC a parte sucumbente deverá
apelar da sentença para impugnar a decisão. E caso seja um acórdão de tribunal
de 2º grau que desrespeite tal eficácia vinculante, será cabível o recurso
especial e/ou extraordinário. Ou seja, a parte sucumbente não terá um
instrumento impugnativo que permita seguir diretamente para o tribunal
superior.
Essa realidade cria uma eficácia maior e menor entre as hipóteses
previstas no art 927 do CPC, o que coloca, inclusive, em questão a eficácia
vinculante prática das hipóteses previstas nos dois últimos incisos do
dispositivo ora comentado. Juridicamente não tenho dúvidas a respeito de suas
eficácias vinculantes, mas se a parte deve recorrer da decisão que a
desrespeita da mesma forma que recorreria de qualquer outra decisão com a qual
não concorde, no plano prático a eficácia vinculante está seriamente
comprometida. Trata-se de uma eficácia vinculante jurídica com eficácia apenas
persuasiva no plano prático.
E tudo piorou consideravelmente em razão da Lei 13.256, de 04.02.2016,
que alterou o atual Livro do CPC em sua vacância ao modificar o cabimento da
reclamação constitucional com relação a decisões que desrespeitem os
precedentes obrigatórios criados em julgamento de casos repetitivos e no
julgamento da repercussão geral.
Com a criação de um inciso II ao § 5º do art 988 do CPC, a decisão que
desrespeita precedente de repercussão geral ou de recurso especial ou
extraordinário em questão repetitiva só poderá ser impugnada por reclamação
constitucional se esgotadas as instâncias ordinárias. A lamentável novidade,
fruto de pressão dos tribunais superiores receosos do aumento no número de
reclamações constitucionais, precisa, antes de ser criticada, ser interpretada,
já que se é péssima em seu conteúdo, não é muito melhor em sua forma.
Por “esgotamento das instâncias ordinárias” o legislador aparentemente
pretendeu afastar o cabimento de reclamação constitucional contra sentença que
desrespeita precedente fixado em julgamento de recurso especial e
extraordinário repetitivo.
Diante da novidade legislativa, se um acórdão desrespeitar o precedente
criado em julgamento de recurso especial e extraordinário repetitivo, e em
julgamento de recurso extraordinário com repercussão geral, ainda que não
repetitivo, caberá reclamação constitucional para o tribunal de superposição.
Mas no caso de sentença proferida em tais moldes caberá a apelação. Também a
decisão monocrática na hipótese ora analisada não poderá ser impugnada por
reclamação constitucional por ser cabível contra ela agravo interno (art 1.021,
do CPC).
Como se pode perceber, em nítido desrespeito ao previsto no art 928 do
CPC, o art 988, em seu inciso IV e § 5º, II, deste Código, trata de forma
diferente o julgamento de casos repetitivos. Decisão que desrespeite o
julgamento em IRDR ainda não julgado pelos tribunais superiores, por meio de
recurso especial ou extraordinário, pode ser impugnada por reclamação
constitucional, já que o “esgotamento das instâncias ordinárias” é exigido
apenas para o julgamento de recurso especial – e extraordinário – repetitivo.
O incidente de assunção de competência continua a ser impugnável por
reclamação constitucional, porque permanece e previsto no inciso IV do art 988
do CPC, e não está previsto no § 5º, II, do mesmo dispositivo legal.
Com a Lei 13.256, de 04.02.2016 passa a ser possível se falar em três
graus de eficácia vinculante grande, médio e pequeno.
O julgamento proferido em controle concentrado de constitucionalidade,
as súmulas vinculantes, o IRDR e o incidente de assunção de competência têm
eficácia vinculante grande, porque o desrespeito a qualquer deles, por qualquer
decisão, proferida em qualquer grau de jurisdição, é impugnável por reclamação
constitucional.
O precedente formado em julgamento de recursos especial e extraordinário
repetitivos e no julgamento de recurso extraordinário com repercussão geral tem
eficácia vinculante média, já que o cabimento da reclamação constitucional
exige o exaurimento das instâncias ordinárias.
Finalmente, os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em
matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria
infraconstitucional e a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais
estiverem vinculados têm eficácia vinculante pequena, porque da decisão que a
desrespeita não cabe reclamação constitucional. (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.497/1.498. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
9.
PRECEDENTE
BRASILEIRO E PRECEDENTS NA TRADIÇÃO
DA COMMON LAW
Conforme
já devidamente exposto, precedente é um julgamento que sirva como razão de
decidir de outro julgamento proferido posteriormente. É natural, portanto, que
um julgamento não nasça precedente, mas que se torne um precedente a partir do
momento em que é utilizado posteriormente como razão de decidir em outro
julgamento.
Assim
ocorre no sistema da common law, no
qual os julgamentos só se tornam precedentes no momento em que passam a
concretamente servir como fundamento de decisão de outros julgamentos. Conforme
vem apontando a melhor doutrina, no Brasil foi adotada outra técnica na
formação dos precedentes, já que o CPC atual prevê, de forma expressa e
específica, quais são os julgamentos que serão considerados precedentes.
Trata-se de “precedente doloso”, em interessante nomenclatura dada por
Alexandre Freitas Câmara, ou seja, um julgamento já predestinado a ser
precedente.
Nesse
tocante, entretanto, cabe uma observação. Nem todo precedente é vinculante –
obrigatório – já que continuam a existir no sistema processual brasileiro
julgamentos proferidos em processo subjetivo que não decidem casos repetitivos
e nem o incidente de assunção de competência, e que poderão servir como
fundamento de decidir de outros julgamentos a serem proferidos
supervenientemente.
Tem-se,
portanto, um tratamento diferente de formação de precedente a depender de sua
eficácia vinculante (binding precedents),
e de sua eficácia persuasiva (persuasive precedentes).
Enquanto os precedentes vinculantes são julgamentos que já nascem precedentes,
os precedentes persuasivos se tornam precedentes a partir do momento em que são
utilizados para fundamentar outros julgamentos. (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.498/1.499. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
10.
RATIO DECIDENDI E OBTER DICTA
A ratio decidendi não é
fenômeno alheio ao direito brasileiro, pelo contrário, sendo considerada pelos
tribunais superiores com relativa frequência, ora com a utilização da expressão
“motivos determinantes” (STF,
Tribunal Pleno, Rcl 5.216 AgR/PA, rel. Min. Cármen Lúcia, j. 13.06.2012, DJe
19.02.2012; STJ, 1ª Seção, MS 15.920/DF, rel. Min. Benedito Gonçalves, rel.
p/acórdão Min. Mauro Campbell Marques, j. 14.11.2012; DJe 5.2.2013) ora com a
utilização da expressão “razões de decidir” (STF, 1ª Turma, RE 578.582 AgR/RS,
rel. Min. Dias Toffoli, j. 27.11.2012, DJe 19.12.2012; STJ, 2ª Turma, AgRg no
REsp 786.612/RS, rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 127.10.2013, DJe
24.10.2013). Mas não há dúvida de que o fenômeno terá que ser repensado.
Conforme ensina a melhor doutrina, a ratio
decidendi (chamada de holding no
direito americano) é o núcleo do precedente, seus fundamentos determinantes,
sendo exatamente o que vincula. Distingue-se da fundamentação obter dicta, que são prescindíveis ao
resultado do julgamento, ou seja, fundamentos que, mesmo se fossem em sentido
invertido, não alterariam o resultado do julgamento. São argumentos jurídicos
ou considerações feitas apenas de passagem de forma paralela e prescindível
para o julgamento, como ocorre com manifestações alheias ao objeto do
julgamento, apenas hipoteticamente consideradas. Justamente por não serem
essenciais ao resultado do precedente os fundamentos obter dicta não vinculam (Enunciado 318 do FPPC: “Os fundamentos
prescindíveis para o alcance do resultado fixado no dispositivo da decisão (obter dicta), ainda que nela presentes,
não possuem efeito de precedente vinculante.”).
O § 4º do art 521 do Projeto de Lei do CPC aprovado na Câmara
contribuía, ainda que de forma simplista e incompleta, para a definição da ratio decidendi: (I) prescindíveis para
o alcance do resultado fixado em seu dispositivo, ainda que presentes no
acórdão; (II) não adotados ou referendados pela maioria dos membros do órgão
julgador, ainda que relevantes e contidos no acórdão. O texto legal não foi
mantido no atual CPC.
Afirmar-se que a ratio decidendi
do precedente vincula, o que não ocorre com a fundamentação obter dicta, é indiscutível e a parte
fácil de se compreender a eficácia vinculante dos precedentes. O mais
problemático é a distinção entre elas no caso concreto, já que o conceito de ratio decidendi não é tranquilo, mesmo
em países de muito mais tradição em seu exame do que o Brasil, havendo estudo
que aponta o incrível número de 74 formas de encontrar a ratio decidendi.
Conforme considerável corrente doutrinária, o ideal é a adoção do método
eclético sugerido por Rupert Cross.
Dessa forma, combinam-se a técnica da inversão defendida por Wambaugh, que defende a identificação da
ratio decidendi como a razão jurídica
que, se invertida, resultaria em julgamento diferente e a técnica defendida por Goodhart, pela qual a identificação
da ratio decidendi parte dos fatos
materiais – categorias de fatos relevantes para o direito – e da decisão
jurídica neles embasada – o julgamento final.
Um mesmo precedente pode ter mais de uma ratio decidendi, sendo que nesse caso todas elas têm eficácia
vinculante. Não se admite, portanto, uma eficácia vinculante fatiada, já que,
se o que vincula no precedente é sua ratio
decidendi, nada mais natural do que se concluir que havendo mais de uma,
todas tenham eficácia vinculante.
Apesar de aconselhável, em especial naqueles julgamentos predestinados a
se tornarem precedentes vinculantes, não existe um dever de os tribunais
identificarem a ratio decidendi,
cabendo ao intérprete do julgamento tal tarefa. E mesmo que exista tal
identificação não se cria um impedimento para que o intérprete identifique uma ratio decidendi não exposta como tal no
precedente, permitindo sua aplicação como razão do decidir de futuros
julgamentos.
Por fim, é preciso registrar que não basta ser um fundamento
determinante para o resultado do julgamento para que se projete a eficácia
vinculante. Significa dizer que, só a ratio
decidendi vincula, mas nem sempre haverá tal eficácia vinculante.
Somente o fundamento determinante acolhido pela maioria dos julgadores
tem eficácia vinculante (Enunciado 317 do FPPC: “O efeito vinculante do
precedente decorre da adoção dos mesmos fundamentos determinantes pela maioria
dos membros do colegiado, cujo entendimento tenha ou não sido sumulado.”),
lembrando-se que o julgamento nem sempre é determinado pela opinião majoritária
dos julgadores sobre os mesmos fundamentos, mas pela combinação de
entendimentos minoritários que levem a um determinado resultado. Basta imaginar
a existência de diferentes causas de pedir fundamentando um mesmo pedido, sendo
possível que ele seja acolhido pela maioria que, entretanto, se vale de forma
minoritária de cada causa de pedir para chegar ao resultado do julgamento.
Essa exigência, que não está expressamente consagrada no texto legal,
estava presente no art 521, § 3º, do Projeto de Lei do Novo Código de Processo
Civil aprovado pela Câmara e não mantido pelo Senado na aprovação do texto
final do novo diploma processual.
Essa realidade, conforme bem apontado pela melhor doutrina, exige uma
mudança na forma do julgamento colegiado, que atualmente se dá por adesão à
conclusão e que deve passar a ser realizado por adesão à fundamentação. Os
julgadores não poderão se limitar a aderir ao voto do relator, cabendo
expressar sua concordância de forma expressa aos seus fundamentos, cabendo
também, e em especial, ao magistrado expor sua discordância com tais
fundamentos, ainda que concorde com a conclusão do voto condutor.
Por outro lado, se for difícil a identificação da ratio decidendi do precedente, seja por ser sua fundamentação
insuficiente ou por não estar a questão jurídica decidida bem delineada,
afasta-se sua eficácia vinculante. (Apud Daniel Amorim Assumpção Neves, p.
1.499/1.500. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo –
2016. Ed. Juspodivm).
11.
FUNDAMENTAÇÃO
Reafirmando a importância dos princípios do contraditório e da
fundamentação das decisões judiciais, o art 927, § 1º, do CPC exige do órgão
jurisdicional na formação e aplicação do precedente judicial o respeito ao
disposto nos arts 10 e 489, § 1º, do mesmo diploma legal.
A criação de precedentes obrigatórios e a ampliação das espécies de
súmulas com eficácia vinculante derivadas do art 927 do CPC vêm causando
justificável apreensão na doutrina. A realidade na aplicação de súmulas e de
teses fixadas no julgamento de recursos especial e extraordinário realmente não
é muito animadora.
O absurdo volume de trabalho, aliado a constante falta de estrutura
adequada, vem fazendo com que os juízes se valham dos entendimento consagrados
nos tribunais superiores de forma mecânica, sem qualquer preocupação na
identificação do caso concreto como sujeitável a tais entendimentos, e muito
menos na imprescindível correlação entre o caso concreto e o entendimento
consolidado pelos tribunais superiores utilizado para resolvê-lo. E com a
ampliação da eficácia vinculante teme-se, com razão, que os julgadores não
compreendam que a aplicação de um precedente é um ato hermenêutico e não
meramente mecânico.
Essa indevida forma de aplicar os precedentes e os entendimentos
sumulados foi objeto de atenção do legislador, que nos incisos V e VI do art
489, § 1º do CPC, exige do julgado uma fundamentação adequada tanto para a
aplicação do precedente e do entendimento sumulado, como para a rejeição de sua
aplicação no caso concreto. Não basta a aplicação do precedente pura e
simplesmente, mas sua interpretação e adequação ao caso concreto, inclusive
podendo ser extraída de sua ratio
decidendi uma aplicação mais ampla do que aquela que foi originalmente
pensada na criação do precedente.
Conforme ensina a melhor doutrina, a ratio
decidendi do precedente, a exemplo da norma legal, deve ser objeto de interpretação
para ser aplicada, sendo naturalmente mais restrito o espaço de interpretação
uma vez que o precedente já resulta da interpretação do texto legal. De
qualquer forma, é importante a consideração de que o precedente em termos de
interpretação é ao mesmo tempo um ponto de chegada e um ponto de partida: de
chegada na interpretação da norma legal aplicável ao caso concreto e de saída
para os que pretendem aplica-lo para posteriormente decidirem processos com
base no precedente.
O cuidado coma fundamentação na utilização ou rejeição de aplicação dos
precedentes e dos enunciados de súmulas, entretanto, não é suficiente para que
um sistema baseado – ou ao menos fortemente influenciado – em precedentes
funcione no direito brasileiro. Será necessária uma mudança cultural, sempre
difícil, traumática e demorada, que levem os órgãos jurisdicionais a
trabalharem de forma adequada com a identificação e aplicação da ratio decidendi dos precedentes. (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.501. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
12.
DIVULGAÇÃO
Nos termos do § 5º do art 927 do CPC, os tribunais darão publicidade a
seus precedentes, organizando-os por questão jurídica decidida e divulgando-os,
preferencialmente, na rede mundial de computadores.
A partir do momento em que nosso sistema processual passa a contar com
precedentes vinculantes, é imprescindível que as partes, os advogados e os
juízes tenham fácil acesso a eles. Tal ciência servirá aos advogados para
otimizar a orientação jurídica às partes diante de um conflito de interesses,
no sentido de favorecer a solução consensual dos conflitos, e para os juízes a
ciência é indispensável para que possam respeitar a eficácia vinculante dos
precedentes, já que sem conhecê-los não poderão aplicá-los no caso concreto.
Lamento que o dispositivo legal se limite à previsão da publicidade dos
precedentes, já que tendo a maioria das súmulas do Superior Tribunal de Justiça
e do Supremo Tribunal Federal assumido eficácia vinculante, a mesma preocupação
deveria ter sido destinada a elas. A interpretação extensiva do art 927, § 5º,
do atual CPC é imperiosa. (Apud Daniel Amorim Assumpção Neves, p.
1.501/1.502. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo –
2016. Ed. Juspodivm).
13.
DISTINÇÃO (DISTINGUISHING)
Tendo o CDC adotado a teoria dos precedentes judiciais obrigatórios, era
esperado que também consagrasse os fenômenos da distinção (distinguishing) e da superação (overruling).
O art 927, em seus §§ 2º a 4º, do CPC, entretanto, só trata da superação do
precedente, não havendo qualquer previsão legal a respeito da distinção.
Trata-se de hipótese de não aplicação do precedente no caso concreto
sem, entretanto, sua revogação. Dessa forma, é excluída a aplicação do precedente
judicial apenas para o caso concreto em razão de determinadas particularidades
fáticas e/ou jurídicas, mantendo-se o precedente válido e com eficácia
vinculante para outros processos.
Registre-se que no § 5º do art 521 do Projeto de lei de Novo CPC aprovado
na Câmara estava regulamentado o distinguishing.
Ainda que a regulamentação não tenha restado consagrada no atual Livro do CPC,
é importante a análise do dispositivo legal não consagrado que ainda poderá
doutrinariamente auxiliar na compreensão do fenômeno.
Segundo o dispositivo, o precedente ou jurisprudência dotada do efeito
vinculante poderia não ser seguida, quando o órgão jurisdicional distinguisse o
caso sob julgamento, demonstrando fundamentadamente se tratar de situação
particularizada por hipótese fática distinta ou questão jurídica não examinada,
a impor solução jurídica diversa.
Como se pode notar do dispositivo legal, seriam duas as causas de
distinção que levariam à não aplicação do precedente no caso concreto.
A distinção das circunstâncias fáticas deveria ser analisada com
cuidado, porque a vinculação dos precedentes não exigia identidade de fatos,
bastando a identidade da situação fática. Significa que, sendo comum a origem
fática, o precedente seria vinculante, mesmo que existissem diferenças fáticas
entre o processo em curso e o processo em que houve a formação do precedente. A
diferença fática só seria capaz de evitar a aplicação do precedente quando
fosse determinante para a aplicação da regra jurídica ao caso concreto.
Por outro lado, mesmo havendo identidade fática entre o processo em
curso e aqueles que ensejaram a edição do precedente, é possível sua não
aplicação no caso concreto. Para tanto, deve ficar demonstrado que no processo
em trâmite foi alegada matéria jurídica ainda não examinada. Apesar de ser algo
improvável de ocorrer se os tribunais levarem realmente a sério sua função
harmonizadora dos entendimentos jurídicos, é indiscutível haver lógica em
deixar de aplicar o precedente quando se discute matéria jurídica inédita, não
tratada anteriormente na formação do precedente.
Registre-se que a técnica do distinguishing
não deve ser aplicada de forma enviesada para se obter algo que somente pelo overruling pode ser obtido. Conforme
lembra a melhor doutrina, nos países da common
law não é incomum, ainda que continue a ser reprovável, juízes que não
querem aplicar os precedentes por considera-los injustos ou equivocados,
simplesmente se valerem de uma discutível distinção para se afastar da eficácia
vinculante dos precedentes.
Ao pretender uma superação que não pode fazer o juízo se vale de uma
distinção inexistente para justificar a não aplicação do precedente obrigatório
ao caso concreto. Não é preciso muito esforço para se concluir que nesse caso o
próprio sistema de precedentes será desvirtuado. (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.502/1.503. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
14.
SUPERAÇÃO DA TESE JURÍDICA (OVERRULING)
Não resta dúvida de que a superação do precedente é medida muito mais
drástica que a aplicação da distinção no caso concreto, porque por meio da
superação do precedente ele deixa de existir como fonte vinculante. Não é
naturalmente anulado, revogado ou reformado, porque o precedente na realidade é
uma decisão judicial já transitada em julgado, mas com a superação o
entendimento nele consagrado deixa de ter eficácia vinculante e até mesmo
persuasiva, sendo substituído por outro.
Essa superação, portanto, chamada de overruling
no direito norte-americano, deve ser realizada com extremo cuidado, ponderação e
o mais importante, raramente. Se o art 926 do CPC, exige uma jurisprudência
íntegra, coerente e estável, é natural se compreender que a superação do
precedente deva ocorrer com parcimônia, em situações excepcionais. Se o sistema
de precedentes e súmulas com eficácia vinculante não deve engessar o direito,
por outro lado não existe sistema de precedentes e súmulas com eficácia
vinculante sem segurança jurídica e estabilidade. (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.503. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
15.
MOTIVOS PARA
SUPERAÇÃO
Apesar de o art 927, § 4º, do CPC exigir que a fundamentação da
superação considere os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança
e da isonomia, não há no novo diploma legal qualquer regra a respeito das
motivações que justificam a superação do entendimento sumulado ou consagrado em
precedente obrigatório.
Registre-se que no art 521, § 7º, do Projeto de lei do Novo CPC aprovado
na Câmara havia expressa menção à superação diante de superveniente realidade
econômica, política econômica ou social, ou de revogação ou modificação de
norma em que se fundou a tese do precedente. Não obstante a inexistência de tal
regra do Código ora em vigor, parece incontestável que tais circunstâncias
autorizam a superação do entendimento fixado em súmula ou precedente (Enunciado
322 do FPPC: “A modificação de precedente vinculante poderá fundar-se, entre
outros motivos, na revogação ou modificação da lei em que ele se baseou, ou em
alteração econômica, política, cultural ou social referente à matéria
decidida”).
Também parece ser tranquilo o entendimento de que o precedente ou súmula
podem ser superados diante de mudança legislativa que com suas razoes conflite.
Nesses casos a superveniência legislativa pode tornar o entendimento sem
sentido ou até mesmo ilegal, cabendo sua superação (Enunciado 324 do FPPC: “Lei
nova, incompatível com o precedente judicial, é fato que acarreta a não
aplicação do precedente por qualquer juiz ou tribunal, ressalvado o
reconhecimento de sua inconstitucionalidade, a realização de interpretação
conforme ou a pronúncia de nulidade sem redução de texto”). Por outro lado, não
se deve descartar a possibilidade de a superveniente lei consagrar
expressamente o entendimento fixado em precedente ou súmula, quando a lei
passará a ser o novo referencial normativo.
Essa técnica de overruling não
se confunde com o overriding, porque
nesse o tribunal apenas limita o âmbito de incidência de um precedente em
função de superveniência de regra ou de princípio legal. Não há, portanto, sua
superação – quando muito uma superação parcial – mas sua adequação à
superveniente configuração jurídica do entendimento fixado.
Por fim, não é pouca a doutrina, com amparo em estudos de direito
comparado na common law, que aponta a
correção de erro manifesto ou grave injustiça como motivação suficiente para a
superação de súmula ou precedente, ou seja, a superação de precedente
manifestamente equivocado. Entendo que nesse caso os tribunais devam ter
redobrado cuidado porque o erro deve ser manifesto, e não derivado de uma nova
interpretação que, por exemplo, uma nova composição do colegiado venha a ter da
mesma matéria.
O órgão é colegiado e como colegiado deve se portar, não sendo a mudança
de composição suficiente para a superação do precedente ou do entendimento
sumulado. Chega até mesmo a ser descortês com os antigos componentes da corte
equiparar interpretação superada em razão de nova composição a erro no
julgamento.
De qualquer forma, qualquer que seja o motivo da superação, somente o
próprio tribunal que fixou a tese com eficácia vinculante tem competência para
superar o seu próprio entendimento. Chega a ser até mesmo intuitivo que órgãos
hierarquicamente inferiores não possam fazê-lo, ou mesmo se vinculando a tal
sinalização, já que ela somente demonstra uma possibilidade de futura
superação, que poderá nem vir a ocorrer. A partir da adoção dessa técnica os
tribunais inferiores terão fundamento mais seguro para se valerem do anticipatory overrruling.
Considerando-se que somente os tribunais dos quais emana a eficácia
vinculante têm competência para superar o entendimento fixado em súmulas com
eficácia vinculante e precedentes obrigatórios, cria-se a possibilidade de os
órgãos hierarquicamente inferiores se valerem do chamado antecipatory overruling, sempre que o tribunal do qual emana a
eficácia vinculante sinalizar em seus julgamentos a possibilidade de alteração
do entendimento. Note-se, não é necessária a adoção da técnica do sinaling para a adoção do antecipatory overruling, porque mesmo
que não haja uma sinalização expressa do tribunal superior é possível aos
órgãos hierarquicamente inferiores se anteciparem a tal superação se notarem
dos julgamentos do tribunal superior uma sinalização nesse sentido. (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.503/1.504. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
16.
FUNDAMENTAÇÃO DA
DECISÃO DE SUPERAÇÃO
O § 4º do art 927 do CPC prevê que a modificação de enunciado de súmula, de
jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos
observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os
princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.
Considerando-se que toda decisão
judicial deve ser fundamentada, nos termos do art 93, IX, da CF, parece uma
redundância o dispositivo ora analisado exigir que a decisão do tribunal que
supera o precedente obrigatório ou súmula com eficácia vinculante seja
fundamentada. Trata-se, entretanto, de fundamentação diferenciada, ainda mais
qualificada que a tradicional, chegando a doutrina a falar em exigência de
carga de motivação maior para justificar a decisão de superação ora analisada.
O termo “adequada” para qualificar a
fundamentação utilizado pelo art 927, § 4º, do CPC não cria nada novo ou
peculiar para a decisão ora analisada, já que a fundamentação adequada é aquela
exigida pelo art 489, § 1º, deste Código, dispositivo que naturalmente deve
nortear o tribunal na decisão de superação do precedente ou da súmula
Mas ao exigir que a fundamentação seja específica o legislador parece
realmente ter inovado, criando uma especialidade quanto à motivação da decisão que
supera súmula com eficácia vinculante e precedente obrigatório. Entendo que
essa fundamentação específica exija do tribunal a demonstração de que a nova
tese adotada em superação da anterior é melhor e/ou mais adequada, além de
existirem mais fortes razoes para alterar o entendimento do que para mantê-lo,
mesmo que com sacrifício da ideia de segurança jurídica. (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.504/1.505. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
17. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA SUPERAÇÃO
A partir do momento em que o
precedente passa a ser obrigatório e a súmula a ter eficácia vinculante,
cria-se uma expectativa de comportamento em todos, que confiantes ao
entendimento consolidado e vinculante fixado pelos tribunais passam a pautar
sua conduta no plano material da forma como entende adequada os tribunais. Cria-se,
dessa forma, uma previsibilidade de conduta conforme a interpretação da lei
consolidada pelos tribunais em suas súmulas e precedentes, gerada pela
expectativa legítima de que o Poder Judiciário continuará a decidir conforme
seus precedentes e súmulas. Conforme ensina a melhor doutrina, a vinculação da superação
dos entendimentos consagrados pelos tribunais ao princípio da irretroatividade
é decorrente da atuação dos princípios da segurança jurídica e da boa-fé
objetiva.
Como é impossível defender que um
sistema baseado em precedentes asfixie o direito, a possibilidade de sua
superação, nas condições já analisadas, é imprescindível. Mas essa necessidade
não afasta o problema prático advindo de tal revogação: a quebra da confiança
das partes que se conduziram conforme o entendimento consolidado e agora são surpreendidos
como um novo entendimento.
Parece claro que se o sujeito se
portou de determinada maneira confiando no entendimento consolidado pelo
tribunal, a mudança de entendimento não pode desprestigiar essa confiança. Em razão
disso deve ser saudado o § 3º do art 927 do CPC no sentido de permitir ao
tribunal a modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança
jurídica, consagrando no direito pátrio a possibilidade de prospective overruling.
Registre-se que, além de preservar a
confiabilidade e a segurança jurídica, a possibilidade de modulação de efeitos
da superação do precedente permite aos tribunais uma superação com mais
tranquilidade, porque em sistemas em que não se admite tal modulação o trauma
gerado pela superação do precedente funciona como impeditivo de tal superação. No
direito pátrio, o tribunal poderá dimensionar temporalmente o alcance da quebra
da confiança no entendimento consolidado e pela modulação limitar os problemas
advindos pela superação para aqueles sujeitos que se portaram no sentido do
precedente ou súmula superada.
Parcela da doutrina compreende a
necessidade da modulação dos efeitos da superação ora analisada, mas lembra que
em um país ainda não acostumado com a força dos precedentes, é possível que tal
técnica incentive os tribunais a se sentirem confortáveis para realizar
sucessivas alterações de entendimentos. A preocupação é absolutamente justificável,
o que demonstra mais uma vez que um sistema de precedentes não se impõe somente
com mudança legislativa, mas também com uma mudança de mentalidade dos
operadores do direito.
Já é tradicional no sistema
processual pátrio a modulação dos efeitos da declaração de
inconstitucionalidade proferida pelo Supremo Tribunal Federal, nos termos do
art 27 da Lei 9.868/1999. Segundo o Supremo Tribunal Federal a modulação dos
efeitos da declaração de inconstitucionalidade se presta a preservar relevantes
princípios constitucionais, revestidos de superlativa importância sistêmica
(STF, Tribunal Pleno, ADI 2.797/ED/DF, rel. Min. Menezes Direito, rel.
p/acórdão Min. Ayres Britto, j. 16.05.2012, DJe 28.02.2013), sendo tal
entendimento também aplicável à superação ora analisada.
O tribunal, portanto, por razão de
interesse social ou de segurança jurídica, poderá modular os efeitos da superação
do entendimento consagrado na súmula com eficácia vinculante e no precedente obrigatório,
que pode no caso concreto ter eficácia ex
nunc; ex tunc; ex tunc limitado; eficácia projetada para o futuro. A adoção
de qualquer modalidade de eficácia dependerá do caso concreto e de decisão fundamentada
pelo juiz.
O essencial para a modulação ex
nunc ou projetada para o futuro é a preservação da confiança dos
jurisdicionados. Como é possível que um precedente venha a ser superado aos
poucos, tal circunstância deve ser considerada pelo tribunal para limitar a
eficácia ex nunc ou até mesmo aplicar
a eficácia ex tunc. Pode ocorrer de o
precedente não ser aplicado há longo tempo, ainda que sem revogação expressa,
de forma que quando tal revogação é feita não se pode dizer propriamente que os
jurisdicionados foram surpreendidos. Por isso não concordo com o entendimento doutrinário
que defende ser sempre ex nunc a
eficácia da superação ora analisada. (Apud Daniel Amorim Assumpção Neves, p.
1.505/1.506. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo –
2016. Ed. Juspodivm).
18. PROCEDIMENTO
Não há no atual CPC previsão específica
e geral a respeito do procedimento a ser adotado pelo tribunal na superação do
entendimento fixado em súmula com eficácia vinculante obrigatório.
A única previsão procedimental é o §
2º do art 927 do CPC ao prever que a alteração de tese jurídica adotada em
enunciado de súmula ou em julgamento de casos repetitivos poderá ser precedida
de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que
possam contribuir para a rediscussão da tese. Como se pode notar, admitia-se a intervenção
do amicus curiae em razão da eficácia
ultra partes da revogação do
precedente e da realização de audiências públicas para democratizar o
procedimento de revogação.
Diante do silêncio da lei quanto ao
procedimento, mais uma vez é possível se valer do art 521 do Projeto de Lei de
Novo CPC aprovado pela Câmara. Segundo o § 6º do artigo ora comentado, a modificação
de entendimento sedimentado poderia realizar-se: (i) por meio do procedimento
previsto na Lei 11.417/2006, quando se tratar de enunciado de súmula
vinculante; (II) por meio do procedimento previsto no regimento interno do
tribunal respectivo, quando se tratar de enunciado de súmula da jurisprudência dominante;
(III) incidentalmente, no julgamento de recurso, na remessa necessária ou na
causa de competência originária do tribunal, nas demais hipóteses dos incisos
II a IV do caput.
Como o atual Código não revogou o
procedimento previsto na Lei 11.417/2006 para a revogação da súmula vinculante,
não há qualquer dúvida que para sua superação deva ser esse o procedimento a
ser observado. Ainda que as súmulas em matéria constitucional editadas pelo
Supremo Tribunal Federal e as súmulas em matéria infraconstitucional editadas
pelo Superior Tribunal de Justiça, em razão do art 927, IV, do CPC, tenham
passado a ter eficácia vinculante, não se confundem com as súmulas vinculantes
quanto às exigências para sua edição e revogação, de forma que para sua superação
o procedimento deve ser determinado pelo regimento interno do tribunal e não pela
Lei 11.417/2006.
Para a superação de tese fixada em
julgado de IRDR, o art 986 deste CPC prevê que a revisão da tese jurídica firmada
no incidente far-se-á pelo mesmo tribunal, de ofício ou mediante requerimento
dos legitimados mencionados no art 977, inciso III do mesmo diploma legal. Não se
trata propriamente de um procedimento criado pela lei, já que a norma só
disciplina a competência (mesmo tribunal) e legitimidade ativa para o pedido,
de forma que caberá aos regimentos internos dos tribunais regulamentarem de
forma exaustiva a matéria.
No caso de superação de tese fixada
em julgamento de recurso especial de extraordinário repetitivos não há qualquer
previsão no CPC ora analisado, cabendo aos tribunais superiores criarem o
procedimento por meio de seus regimentos internos.
Observe-se que, à exceção da revogação
de súmula vinculante, que tem forma de superação expressamente prevista em lei,
nos demais casos, além da criação de incidentes ou procedimentos
administrativos para superação de súmula com eficácia vinculante ou precedente obrigatório,
a superação também poderá ocorrer no julgamento de processos de competência originária,
recursos ou reexame necessário (Enunciado 321 do FPPC: “A modificação do
entendimento sedimentado poderá ser realizada nos termos da Lei nº 11.417, de
19 de dezembro de 2006, quando se tratar de enunciado de súmula vinculante; do
regimento interno dos tribunais, quando se tratar de enunciado de súmula ou jurisprudência
dominante; e, incidentalmente, no julgamento de recurso, na remessa necessária ou
causa de competência originária do tribunal.”).
Quanto à competência para decidir pela superação do precedente, o art
521, § 9º, do projeto de lei aprovado na Câmara previa que o órgão jurisdicional
que tivesse firmado a tese a ser rediscutida seria preferencialmente competente
para a revisão do precedente formado em incidente de assunção de competência ou
de resolução de demandas repetitivas, ou em julgamento de recursos extraordinários
e especiais repetitivos. Apesar da não consagração de tal norma no novo diploma
legal, seu conteúdo continua a fazer bastante sentido, devendo ser prestigiado.
(Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.506/1.508. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
CPC LEI 13.105 e LEI
13.256 - COMENTADO
LIVRO III – ART 928 - DOS PROCESSOS NOS TRIBUNAIS E DOS MEIOS
DE IMPUGNAÇÃO DAS
DECISÕES JUDICIAIS - VARGAS, Paulo S.R.
TITULO I – DA ORDEM
DOS PROCESSO E DOS PROCESSOS DE COMPETÊNCIA
ORDINÁRIA DOS
TRIBUNAIS
– CAPÍTULO I – DISPOSIÇÕES GERAIS
– vargasdigitador.blogspot.com
Art 928. Para os fins deste Código, considera-se julgamento
de casos repetitivos a decisão proferida em:
I – incidente de resolução de demandas repetitivas;
II – recursos especial e extraordinário repetitivos.
Parágrafo único. O julgamento de casos repetitivos tem por objeto questão
de direito material ou processual.
Sem correspondência no CPC/1973
1.
PRECEDENTES CRIADOS EM JULGAMENTO DE CASOS REPETITIVOS E NO INCIDENTE DE
ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA
O art 928 do CPC prevê as hipóteses que
se consideram julgamento de casos repetitivos: decisões proferidas em incidente
de resolução de demandas repetitivas (I) e em recurso especial e extraordinário
repetitivos (II). Os julgamentos proferidos em ambos os casos, ainda que por
meio de técnicas procedimentais significativamente distintas, são precedentes
obrigatórios. O incidente de assunção de competência não se confunde com o julgamento
de casos repetitivos, prevendo o art 947 do CPC que seu cabimento depende de inexistência
de repetição da relevante questão de direito, com grande repercussão social, em
múltiplos processos.
São técnicas de julgamento para situações distintas, mas que têm em
comum a criação de precedentes obrigatórios. É natural que o precedente formado
no julgamento de casos repetitivos venha a ser aplicado com maior frequência do
que aquele formado no incidente de assunção de competência, em razão da
quantidade de processos que versam sobre a mesma questão jurídica, mas em termos
de eficácia vinculante não há diferenças entre eles, inclusive sendo reunidos
num mesmo dispositivo legal (art 927, III, do CPC). (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.508. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).