quinta-feira, 22 de setembro de 2022

Direito Civil Comentado - Art. 656, 657, 658 - Do Depósito Necessário – VARGAS, Paulo S. R. - vargasdigitador.blogspot.com digitadorvargas@outlook.com

 

Direito Civil Comentado - Art. 656, 657, 658
- Do Depósito Necessário – VARGAS, Paulo S. R.
- vargasdigitador.blogspot.com
digitadorvargas@outlook.com

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações

Título VI – Das Várias Espécies de Contrato

Capítulo X – Do MANDATO – Seção I –

Disposições Gerais

 (Art. 653 a 666)

 

Art. 656. O mandato pode ser expresso ou tácito, verbal ou escrito.

Buscando no Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 656, p. 352-353, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: No que tange à sua forma, o mandato, como contrato consensual que é, pode ser expresso ou tácito, verbal ou escrito. É expresso quando o mandante, pessoalmente, outorga, por escrito, ao mandatário os poderes que lhe são inerentes, ocorrente naqueles casos que exigem procuração contendo poderes especiais. É tácito, por sua vez, quando resulta da prática de atos em nome do mandante sem sua autorização, mas mediante seu conhecimento e sem qualquer oposição. Nele, a aceitação do encargo se opera por atos que a presumem e pode ser provada por todos os meios em direito permitidos. Arnaldo Marmitt, lucidamente, sustenta ser ele simples “gestão de negócios, que se constitui sem declaração expressa do mandante, à sua vista, sem sua oposição, por circunstâncias reveladoras da vontade de constituí-lo, e da existência do fator confiança do mandante para com o mandatário” (Mandato, 1. ed., Rio de Janeiro, Aide, 1992).

 

É verbal o mandato quando, oralmente e independentemente de instrumento, o mandante outorga ao terceiro os poderes a ele conferidos, desde que a lei não exija mandato escrito, podendo provar-se por todos os meios probatórios reconhecidos em direito, inclusive o testemunhal. Tem-se como exemplo aquele que não ultrapasse o décuplo do maior salário-mínimo vigente no País ao tempo em que foi celebrado (Art. 401 do CPC-1973, hoje o art. 444 no CPC/2015. Nota VD), ante a ausência de documentação escrita que o comprove. Ainda, em outra pertinente ponderação, assevera o autor supracitado: “o mandato verbal distingue-se do tácito, porque no primeiro a autorização é expressa, ao passo que o mandato tácito repousa na presunção ou na dedução de circunstâncias” (ob. Cit., p. 110); já o escrito é o mais comum, materializando-se na procuração, que lhe serve de instrumento — seja particular, seja público — nos casos expressos em lei.

 

Referências: Arnaldo Marnijtt, Mandato, 1. ed., Rio de Janeiro, Aide 1992; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de direito civil, 4. ed., Rio de Janeiro. Forense, 1978; Silvio Rodrigues, Direito civil, 27. ed. São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3 — Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade.

 

No entender de Cláudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 656, p. 672-673: O dispositivo trata da forma do mandato, contrato consensual, como se disse no comentário ao art. 653, por isso que entabulável sem exigência de forma especial, com a ressalva que se fará nos comentários ao artigo seguinte. De qualquer sorte, o mandato pode ser expresso, consumado por escrito ou verbalmente, tanto quanto pode ser tácito. O mandato tácito sempre foi assim definido a partir da perspectiva da aceitação do mandatário, que será tácita quando inferida do começo da execução do ajuste (art. 659). Porém, mesmo a declaração de vontade do mandante pode ser tácita, admitindo a prática de atos, no seu interesse, pelo mandatário, como no exemplo do empregador que age de modo a denotar outorga inexplícita de poderes para pequenas compras que, periodicamente, um empregado faz, no seu interesse (Pereira da Silva, Caio Mário. Instituições de direito civil, 10. ed. Rio de Janeiro. Forense, 1999, v. III, p. 255), o que para muitos configura, antes, gestão de negócios (v. g., Pontes de Miranda. Tratado de direito privado, 3. ed. São Paulo, RT, 1984, t. X L III, § 4.706, n. 2, p. 192), mas o que se diferencia por, num caso, de mandato tácito, se exigir mais que o silêncio do empregador, assim uma conduta ativa, como o deixar recursos para as pequenas aquisições, desnecessária na segunda hipótese, de mera c omissiva anuência (ver a respeito: Carvalho Santos, J. M. Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1952, v. XVIII, p. 131-2).


Muito embora nem sempre se faça essa distinção, difere, para alguns, o mandato tácito do mandato presumido, ou seja, de existência presumida até que se prove o contrário, ou mesmo que o presumido mandatário prove o inverso, como no caso do condômino presumido mandatário para administrar a coisa comum ou do portador presumido mandatário para preencher letra recebida sem data e lugar de saque (ver Pontes de Miranda. Op. cit., t. XII, § 4.680, n. 1, p. 38-9; t. XII, § 1.293, n. 2, p. 89), exemplos que, para muitos, são também de mandato tácito (v. g., Barros Monteiro, Washington. Direito das obrigações. São Paulo, Saraiva, 1956, v. II, p. 275). A bem dizer, caso de mandato presumido, ou ao menos de aceitação presumida, havia no art. 1.293 do CC/1916. Presumia-se aceito o mandato entre ausentes quando o negócio para o qual dado fosse da profissão do mandatário, dissesse respeito à sua qualidade oficial ou fosse oferecido mediante publicidade, sem que o mandatário fizesse constar de imediato a sua recusa. Fato é, todavia, que a regra não foi repetida no novo Código Civil. No mais, e como já afirmado em comentários ao art. 654, a rigor não há confundir-se a forma do mandato com a forma da procuração. Ou seja, a regra para a forma do contrato de mandato vem disposta no artigo presente, destinando-se aquele a disciplinar a forma pela qual se outorga a procuração, instrumento da representação destinada ao conhecimento de terceiro, que, malgrado o que comumente ocorre, pode não conter todos os elementos do contrato de mandato (por exemplo, preço e condições de pagamento, se for oneroso), eventualmente em instrumento outro ou ajustado verbalmente. Pense-se, ainda exemplificativamente, na procuração outorgada a advogado, a qual não contém todas as condições do ajuste entre ele e seu cliente, próprias do contrato de mandato, assim sem possível confusão de um ou outro instituto, como se vem afirmando. (Cláudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 656, p. 672-673, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 22/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Sebastião de Assis Neto, et al, em Manual de Direito Civil, Capítulo X – Negócios de Intermediação – item 1. Mandato, 1.1. Conceito e natureza jurídica p. 1.180. Comentários ao CC 656: O mandato tem forma livre, podendo ser expresso ou tácito, verbal ou escrito. No entanto, a sua outorga está sujeita à forma exigida por lei para o ato a ser praticado. Não se admite, portanto, mandato verbal quando o ato deva ser celebrado por escrito e assim por diante.

 

Essa questão quanto a forma do mandato é refletida pela natureza jurídica da contratação. A lei admite até mesmo a convenção de mandato sem necessidade de declaração de vontade expressa, tanto para a outorga de poderes pelo mandante (art. 656) quanto para a aceitação pelo mandatário (art. 659). (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Capítulo X – Negócios de Intermediação – item 1. Mandato, 1.1. Conceito e natureza jurídica p. 1.180. Comentários ao CC 656: Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 22/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 657. A outorga do mandato está sujeita à forma exigida por lei para o ato a ser praticado. Não se admite mandato verbal quando o ato deva ser celebrado por escrito.


A busca é feita baseado na forma do Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 657, p. 353, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: Como observado anteriormente, o mandato verbal se dá quando alguém delega a outrem sua representação por palavra falada e prova-se por qualquer meio, inclusive testemunhal. Todavia, não comporta esta modalidade a prática de atos para os quais se exija o mandato escrito, seja público, seja particular. Logo, não se admitirá mandato verbal, p. ex., para a constituição de servidão (RT 115/179), para aceite de títulos cambiais (RT 126/108, RF 101/317) e para outorga de fiança (RF 87/728). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 657, p. 353, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na defesa de Cláudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 657, p. 673-674: A parte final do artigo presente, segundo a qual o mandato deve ser escrito quando o negócio a cuja prática se o outorgou for daqueles só consumáveis por igual instrumento escrito, repete a regra do art. 1.291 do Código Civil de 1916. Sob seu pálio, aliado ainda ao que se continha na disposição do art. 1.289, § 2º, do mesmo CC/1916, grassava a discussão sobre a adoção, em nosso sistema, da assim chamada tese da simetria, isto é, sobre se exigível, para o mandato, a mesma forma exigida à prática do negócio jurídico para o qual outorgados poderes pelo mandante. Assim, por exemplo, e particularmente nessas hipóteses, debatia-se sobre se para a entabulação de compra e venda de imóvel, a que é necessária escritura pública, também exigível o mandato respectivo pela pública forma. Pois bem. Primeiro ponto a ser realçado, de novo, está na diferenciação que se deve fazer entre a forma do mandato e a forma da representação que se tenha outorgado. Nesse sentido, já de há muito observava Pontes de Miranda que o preceito do art. 1.291 do CC/1916, na verdade, usava o termo mandato por procuração, meio de comunicação da outorga a um terceiro, de tal sorte que, outorgada a procuração por escrito, mesmo quando essa forma fosse da essência do ato principal a ser praticado, o mandato, em si, poderia se dar de forma tácita, por exemplo pelo começo de execução (ver Pontes de Miranda. Tratado de direito privado, 3. ed. São Paulo, RT, 1984, t. XLII1, § 4.678, n. 2, p. 21).

Quanto à simetria, em si, dividia-se a doutrina, ora ao contentar-se com que, se escrita e pública a forma exigida para o negócio a cuja prática outorgada a procuração, se a outorgasse por escrito, outros entendendo que, nesses casos, também a procuração deveria ter a forma pública, não sendo suficiente o escrito particular. Procede a uma detalhada revista da doutrina, ora esposando uma tese, ora outra, o civilista Renan Lotufo (Questões relativas ao mandato, representação e procuração. São Paulo, Saraiva, 2001. p. 117-25), para concluir pela ausência de simetria, mas sem olvidar relevante remissão à lição de José Paulo Cavalcanti, que já assinalava a importância de se distinguir a forma do mandato e da procuração e anotava - conclusão a que se acede - que, se o negócio a que outorgado poderes ao procurador é solene, exigindo a forma pública, é porque o legislador revelou especial preocupação com a manifestação de vontade refletida, assim importando que, malgrado a autonomia da procuração, se por meio dela se delibera outorgar poderes para a prática daquele negócio formal, então sua forma deve ser a mesma. Em diversos termos, assinala o autor que se a lei cuida de exigir forma especial e pública para determinado negócio jurídico, com isso tencionando garantir a deliberação refletida do sujeito, nenhuma diferença faz que essa deliberação seja tomada no próprio ato ou quando se outorgam poderes para a sua prática. E, pese embora a longa e grande divergência instaurada sobre o tema, parece ter o CC/2002, agora, definitivamente imposto a simetria, quando, na primeira parte do art. 657, que constitui inovação, porquanto ausente no art. 1.291 da legislação anterior, dispôs estar a outorga do mandato (rectius: procuração) “sujeita à forma exigida por lei para o ato a ser praticado”. De resto o que, na mesma esteira, o Projeto de Lei n. 276 de 2007, de Reforma do Código Civil, pretende acrescentar ao art. 655, a cujo comentário se remete. (Cláudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 657, p. 673-674, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 22/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na apreciação de Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 657: A forma de mandato é, em geral, livre: é comum que o mandato ocorra, inclusive, tacitamente. O art. 657 exige, no entanto, que o mandato revista a mesma forma exigida para o trato a ser praticado. Assim, uma vez que a alienação de imóvel é necessária escritura pública, a representação para a outorga de escritura pública depende de procuração outorgada também por instrumento público.

Se o mandante for analfabeto, entende-se necessário o instrumento público.

Durante muito tempo prevaleceu o entendi mento de que a procuração outorgada por incapaz, por meio de seu representante legal, deveria ser pública. Atualmente, tal entendimento não mais prevalece:

É válida a procuração ‘ad juditia’, outorgada por instrumento particular pelo representante de menor impúbere, em nome deste (STJ-1ª Turma, RE 86.168-8-SP, j. 27.5.80, v.u., DJU 13.6.80, p. 4.461; RJTJESP 56/132, JTJ 188/225, Lex-jta 162/424, RJTA-MG 33/81, JTAERGS 91/67, 91/151, Bol. AASP 955/40): neste sentido: comentário de Gelson Amaro de Souza (RCJ 2/17)”  (THEOTONIO NEGRÃO.  Código de Processo Civil, 31. ed. Nota ao Art. 38: 1ª). (Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 657, acessado em 22/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 658. O mandato presume-se gratuito quando não houver sido estipulada retribuição, exceto se o seu objeto corresponder ao daqueles que o mandatário trata por oficio ou profissão lucrativa.

Parágrafo único. Se o mandato for oneroso, caberá ao mandatário a retribuição prevista em lei ou no contrato. Sendo estes omissos, será ela determinada pelos usos do lugar, ou, na falta destes, por arbitramento.

Historicamente diz o presente dispositivo: em relação ao anteprojeto de Agostinho Alvim, foi objeto de emenda, por parte da Câmara dos Deputados, no período inicial de tramitação do projeto apenas para aprimorar a linguagem. A redação original do dispositivo incluso no texto proposto pela Câmara era a seguinte: “Art. 658. O mandato presume-se gratuito, se não houver sido estipulada retribuição, ou se o seu objeto for daqueles que o mandatário trata por ofício ou profissão lucrativa”. O Senador Josaphat Marinho apresentou a composição atual, melhorando a linguagem do texto. O caput do artigo repete o parágrafo único do Art. 1.290 do CC de 1916, com a melhoria de redação apontada.

Aduz o Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 658, p. 353, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: É gratuito o mandato quando não se estipula remuneração ao mandatário. O Silencio das partes interessadas sobre a remuneração faz presumir até prova em contrário (presunção juris tantum), a gratuidade da função, sem direito a qualquer tipo de indenização. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 658, p. 353, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em suas apreciações Cláudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 658, p. 674-675 conclui: Seguindo a tendência do Código Civil de 1916, a nova normatização manteve a regra do mandato presumidamente gratuito, sem, entretanto, estabelecer que essa gratuidade seja da essência do mandato (o ofício de amizade). Com efeito, malgrado presumindo-o gratuito, permitiu a lei que o mandato pudesse ser estabelecido de forma onerosa. E, mais, fê-lo não somente quando dispôs sobre a possibilidade de pactuar-se, expressamente, uma remuneração, como quando o objeto do ajuste for daqueles que o mandatário trata por ofício ou pro[1]fissão. Bem de ver, então, que o mandato será oneroso quando, independentemente da natureza de seu objeto, tiverem as partes convencionado uma retribuição. Mas também o será sempre que o mandato se recebe por quem, nessa condição, exerce profissão lucrativa, como o advogado, por exemplo, ou mesmo quando o mandatário atue profissionalmente na gestão de interesse alheio. Daí vir-se de costume afirmando que o mandato mercantil não pode ser considerado gratuito por presunção, revelando-se, ao contrário, um dos casos em que a retribuição é de rigor, de resto tal qual já o determinava o Código Comercial brasileiro (art. 154, revogado), caracterizando-o como contrato necessariamente oneroso (ver, ainda: MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais. Rio de Janeiro. Forense, 1984, p. 292).

Todavia, como já na vigência do CC/1916 se ressalvava, a presunção de gratuidade pode ainda se infirmar, posto que não pelo pacto de retribuição ou pelo exercício profissional dos poderes outorgados, mas pelo quanto resulte das circunstâncias do caso, que façam acreditar na existência de convenção tácita, no dizer de De Plácido e Silva (Tratado do mandato e prática das procurações, 4. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1989, v. I, p. 39). Conforme sua lição, as circunstâncias fáticas do caso podem bem levar à admissão de que tenha sido intenção das partes remunerar os serviços do mandatário. Pois se por qualquer das hipóteses examinadas havida remuneração, seu valor se estabelece pelo quanto preveja a lei ou o contrato. Mas, conforme está no parágrafo único do dispositivo em comento, omissos lei e contrato, a remuneração se fixará segundo os usos do lugar, ou seja, a praxe local, se houver, ou, se não, de acordo com arbitramento judicial. Nesse caso, os salários do mandatário são arbitrados pelo juiz tomando-se em consideração o objeto do mandato, a dificuldade para sua execução e o proveito gerado. Vale aqui, de resto, socorro analógico aos mesmos critérios que a lei estabeleceu para o arbitramento dos honorários relativos ao mandato ad judicia, quando não convencionados, e que devem ser compatíveis com o trabalho realizado e com o valor econômico envolvido (art. 22, § 2o, da Lei n. 8.906/94). O arbitramento se fará em processo de conhecimento, formando título judicial executivo, em se tratando de mandatário profissional liberal mediante o rito sumário (art. 275, II / do CPC, sobre o conceito de profissional liberal, valendo conferir: Miranda, Gilson Delgado. Procedimento sumário. São Paulo, RT, 2000, p. 120-2). Por fim, diga-se que, se devidos, os honorários deverão ser pagos ainda que o negócio para o qual outorgado não surta os efeitos desejados, salvo culpa do mandatário, a propósito do que se remete ao comentário ao art. 676, infra. (Cláudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 658, p. 674-675, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 22/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Detalhando Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 658: O mandato pode ser gratuito ou oneroso. No silêncio do contrato, será oneroso se outorgado para o exercício de profissão ou de atividade lucrativa do mandatário. Assim, por exemplo, embora a ética da advocacia exija que os honorários sejam expressos no momento da contratação, caso não o sejam, podem ser arbitrados, uma vez que o mandato judicial conferido a advogado visa a possibilitar o exercício profissional em benefício do outorgante. (Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 658, acessado em 22/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 21 de setembro de 2022

Direito Civil Comentado - Art. 653, 654, 655 - Do Depósito Necessário – VARGAS, Paulo S. R. - vargasdigitador.blogspot.com digitadorvargas@outlook.com

 

Direito Civil Comentado - Art. 653, 654, 655
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Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações

Título VI – Das Várias Espécies de Contrato

Capítulo X – Do MANDATO – Seção I –

Disposições Gerais

 (Art. 653 a 666)

 

Art. 653. Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem, poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do mandato.

Segundo o conhecimento do Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 653, p. 349-350 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: Quando o interessado na consecução de determinado negócio jurídico não pode, ou mesmo não quer, seja qual for a razão, praticá-lo, tem a faculdade de efetuá-lo por meio de outrem.

Tendo em vista a premência de um substituto para a feitura de atos de seu interesse, o interessado se coloca na contingência, então, de rogar a estranho, de sua confiança, a incumbência de realizar certo encargo, como se fora ele próprio. A essa transferência de responsabilidade se dá o nome de representação, cujos poderes derivam ou da lei (representação legal) ou do próprio negócio jurídico (representação voluntária ou negocial).

A par dessa colocação preambular, tem-se que o mandato é a relação contratual pela qual uma das partes (mandatário) se obriga a praticar, por conta da outra (mandante), um ou mais atos jurídicos, criando-se daí uma espécie de obrigação interna entre ambos. Afigura-se, pois, imanente e imprescindível a ideia de representação no mandato, desde que estabelece relação contratual direta entre o representado e a terceira pessoa, por intermédio do representante.

O mandato só pode ser conferido para a prática de atos jurídicos em que a lei não exija a pessoal intervenção do interessado, ou seja, para os atos destituídos de natureza personalíssima, vedando-se, p. ex., conceder mandato para elaborar e/ou revogar testamento, para o exercício do voto e para prestar depoimento pessoal. Há casos, contudo, embora raros, em que se dispensa a apresentação de mandato para tratar de negócios alheios, v. g., o registro e a averbação, no Registro Imobiliário, poderão ser provocados por qualquer pessoa (art. 217 da Lei n. 6.015/73).

Como ressabido, a procuração consubstancia o mandato, à medida que por ela o outorgante manifesta sua intenção de assenhorear alguém para a prática de atos em seu nome. O traço característico do mandato, portanto, é a representação decorrente da fidúcia, da confiança, possibilitando ao mandante agir como se estivesse a um só tempo em dois lugares.

Referências: Renan Lotufo, Questões relativas a mandato, representação e procuração, 1. ed. São Paulo, Saraiva, 2001; Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro, 16. ed. São Paulo, Saraiva, v. 3 — Teoria das obrigações contratuais e extracontratuais, 2001; Carlos Alberto Gonçalves, Direito das obrigações — Parte Especial, 2. ed. São Paulo, Saraiva. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 653, p. 349-350 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Demonstrando o domínio do Direito Civil Cláudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 653, p. 668-669, explica: O preceito inaugura o regramento reservado ao mandato, contrato consensual, em regra gratuito e unilateral, intuitu personae, mediante o qual alguém - sempre que a lei não o impeça, erigindo atos personalíssimos, como a elaboração de testamento, por exemplo, que não permite intervenção de mandatário - recebe poderes para agir no interesse de outrem. É consensual porque se perfaz com o simples ajuste de vontades, independentemente da prática de qualquer ato pelo mandatário, muito embora o começo da execução implique aceitação tácita (art. 659). É normalmente gratuito, porém é possível estipular sua onerosidade, presumida para os mandatários ditos profissionais (art. 658), quando então revela natureza bilateral, havendo, depois de aperfeiçoado, obrigações e prestações a ambas as partes, o que não sucede gracioso, por isso chamado unilateral ou, quando muito, bilateral imperfeito, pela existência ocasional de obrigações a cargo do mandante, por exemplo, a ressarcitória (art. 678). É típico contrato daqueles denominados fiduciários, lastreado na confiança que se deposita na pessoa do mandatário, por isso inclusive revogável a qualquer tempo (art. 682,1).

A atual redação do art. 653 repete o CC/1916 (art. 1.288), persistindo na equivocidade que então já se suscitava. É que, na dicção dos dois diplomas, destarte pela sistemática da normatização civil, o mandato induz sempre a outorga de poderes para que o mandatário aja em nome do mandante, portanto como se fosse seu pressuposto a existência de representação. Na verdade, por natureza, porém, o mandato envolve, isto sim, a prática de atos ou a administração de interesses por conta, mas não, necessariamente, em nome de outrem. Noutros termos, a representação, que é o mecanismo, legal ou convencional, mercê do qual alguém fala em nome de outrem (v. arts. 115 e ss do CC/2002), a rigor pode ou não estar no mandato. Malgrado se reconheça que, em regra, no mandato há a outorga de poderes de representação (contemplatio domini), nada impede que o mandatário atue em seu próprio nome, mas no interesse do mandante, assim sem representação, como está nos arts. 1.180 a 1.184 do Código Civil português e como, a bem dizer, o próprio CC/2002 não desconheceu quando previu a regra, adiante examinada, contida no art. 663, repetição, aliás, do que já se continha no art. 1.307 do CC/1916, e mesmo tendo agora tipificado a comissão, em que se age por conta, mas não em nome de outrem (v. comentário ao art. 693). E não é só. Da mesma forma que, em verdade, pode haver mandato sem representação, pode, inversamente, haver representação, e voluntária, sem mandato. Basta pensar, por exemplo, no empregado que possua poderes para vender objetos em nome do empregador, portanto, com representação constante, eventualmente, do contrato de trabalho. Por fim, permanece o novo Código a estabelecer que a procuração é o instrumento do mandato. Fê-lo, decerto, ao pressuposto genérico, sobre o qual se baseou, como se viu, de que no mandato haja necessariamente a representação. É bem de ver, porém, que a procuração, antes, é sim o instrumento da representação convencional, a qual, repita-se, pode ou não estar num mandato. A procuração, destarte, em tese é independente do mandato, na exata medida em que a representação o é. Mesmo na sua configuração essencial, distinguem-se os dois institutos. O mandato é contrato, portanto negócio jurídico bilateral a regrar as relações internas entre mandante e mandatário, que pressupõe aceitação, o que não ocorre com a procuração, ato jurídico unilateral mediante o qual são atribuídos ao procurador poderes para agir em nome do outorgante (autorização representativa) e para conhecimento de terceiros. Alguns nem mesmo consideram possa a procuração ser considerada negócio jurídico, posto que unilateral, pelo que insistem na terminologia ato jurídico, porque não visualizam qualquer efeito jurídico ao representante na simples outorga, não mais que um pressuposto para que, depois, sobrevenha o negócio praticado mercê da representação (para uma diferenciação da procuração como ato ou negócio, malgrado sempre unilateral, conferir: Lotufo, Renan. Questões relativas a mandato, representação e procuração. São Paulo, Saraiva, 2001, p. 151).

De toda a sorte, posto que, apesar do art. 663, optando a legislação - e não se nega que poderia fazê-lo, a despeito da natureza do instituto - por vincular o mandato à outorga de poderes de representação, ao revés da comissão, assim regrada separadamente, muito embora a priori para atos de aquisição e de venda (veja-se comentário ao art. 693), os conceitos não podem ser baralhados, de modo que se os trate como se fossem um só. Ainda a esse mesmo propósito, remete-se aos comentários do art. 663, em que se volverá ao assunto. (Cláudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 653, p. 668-669, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 21/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Conceitualmente no site direito.legal/dicionario-juridico/mandato-significado/: A palavra mandato deve ser lida como uma procuração em que uma pessoa poderá praticar atos em nome de outra pessoa. Trata-se de uma relação onde há a autorização expressa (por meio do voto ou contratual) da pessoa que cede seus poderes a outrem.

Como exemplo prático, o advogado deverá possuir um mandato (procuração) para exercer e praticar atos em nome de seu cliente.

“O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão virtual encerrada nesta sexta-feira (16/4), declarou a inconstitucionalidade de um dispositivo de uma lei paulista que previa a contribuição a cargo de outorgante de mandato judicial, como parte da receita da Carteira de Previdência dos Advogados”. (IURI-direito.legal/dicionario-juridico/mandato-significado/, apreciação nos comentários ao CC 653, acessado em 21/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 654. Todas as pessoas capazes são aptas para dar procuração mediante instrumento particular que valerá desde que tenha a assinatura do outorgante.

§ 1º O Instrumento particular deve conter a indicação do lugar onde foi passado, a qualificação do outorgante e do outorgado, a data e o objetivo da outorga com a designação e a extensão dos poderes conferidos. 

§ 2º O Terceiro com quem o mandatário tratar poderá exigir que a procuração traga a firma reconhecida.

Na segurança que nos passa a resposta do relator dentro do Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 654, p. 350 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: O mandato está sujeito às regras gerais da capacidade, impondo-se distinguir, daí a incapacidade absoluta da incapacidade relativa. Todas as pessoas maiores ou emancipadas, no gozo dos seus direitos civis, estão aptas a outorgar mandato mediante instrumento particular por elas assinado, que valerá desde que tenha a assinatura do mandante.

Os absolutamente incapazes de exercer, por si, os atos da vida civil não podem constituir mandatário, ao passo que os relativamente incapazes podem passar procuração, desde que assistidos pelos seus representantes legais e por instrumento público (RI’ 438/135). Os primeiros, todavia, não comparecem em pessoa e, por isso, são representados, pelo que não têm condições de constituir procurador, ou seja, de outorgar mandato, sob nenhuma de suas formas, porquanto não pode passar a outrem, poderes para realizar ato jurídico quem, pessoalmente, não pode fazê-lo.

Neste particular, é certo que a regra de capacidade reside, fundamentalmente, em saber se pode, ou não, o mandante executar validamente o ato autorizado. Se a resposta for afirmativa, poderá, de maneira eficaz e legal, outorgar poderes a seu representante para, em seu nome, cumprir o mandato.

A capacidade é aferida contemporaneamente à formação do contrato, na oportunidade em que este é celebrado, diante da natureza do ato a executar. Inexistindo ela no momento da celebração do mandato, este se toma inoperante, e nulos ou anuláveis serão os atos dele decorrentes, não se convalidando o vício — ressalte-se — com a superveniente aquisição de capacidade por parte do mandante. Aliás, nem a boa-fé do mandatário tampouco a do terceiro com que contratou o mandante têm o condão de suprir o requisito ou a restrição capacitária. Entretanto, a perda ou a diminuição da capacidade surgida somente após a celebração do mandato não o invalida.

A procuração particular não precisa ser registrada em Cartório de Títulos e Documentos, pois é bastante o reconhecimento da firma dos signatários para revestir-se de validade perante terceiros. A lei não exige nenhuma outra formalidade, limitando-se a exigir o reconhecimento oficial da assinatura aposta no documento (RT 640/50).

Assim sucede porque, enquanto a procuração pública é autêntica por si mesma, fazendo prova por si própria, a particular, para tanto, necessita de autenticação, que se dá mediante o reconhecimento da firma. Cuida-se de condição essencial à sua validade perante terceiros, mas não relativamente ao mandante e ao mandatário. Contra estes dois, valem todas as situações jurídicas eventualmente surgidas em decorrência do mandato, pois quanto a eles a procuração gera todos os seus efeitos legais, ainda que ausente o reconhecimento da firma respectiva.

Quando se tratar de procuração ad judicia, no entanto, a exigência de reconhecimento de firma, constante da redação primitiva do Art. 38 do CPC, foi cancelada pela Lei n. 8.952, de 13-12-1994, no novel esforço legislativo de reforma processual, ainda que a procuração contenha poderes especiais (STJ, 6’ Turma, REsp n. 154.245-RS, rei. Mm. Fernando Gonçalves, DJ de 16-2-1998). Diz o v. Acórdão: “1—O Art. 38, do CPC, — Lei 8.952/1994, a teor do que ensina desburocratizar os trâmites processuais, razão reconhecida a firma de procuração outorgada a advogado, com o fim de postular em juízo, mesmo aquela que contenha poderes especiais, pois, tratando-se de matéria de índole processual, fica afastada qualquer alusão à norma contida no art. 1.289, par. 32, do CC. 2. Recurso especial não conhecido”.

Referências: Amoldo Wald, Curso de direito civil brasileiro — Obrigações e contratos, 14. Açai, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000; Orlando Comes, Contratos, 8. ed., Rio de Janeiro. Forense, 1981; Silvio Rodrigues, Direito civil, 27. ed. São Paulo, Saraiva, v. 3 — Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, 2000. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 654, p. 350-351, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo apreciações do professor Cláudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 653, p. 669-671: O preceito reproduz a regra do art. 1.289 do CC/1916, com algumas alterações e basicamente com a supressão do anterior § 2º, cujo comando passou a dar conteúdo ao art. 655 do Código Civil de 2002, a seguir examinado. Cuida, fundamentalmente, da forma e dos requisitos de que deve a procuração se revestir. Diferente a questão da forma do mandato, que vem regrada em dispositivo diverso, o do art. 656, o qual inclusive prevê que possa ele se estipular por escrito ou verbalmente. E, ao revés, mesmo por, na essência, servir de prova da representação, que se deve fazer perante terceiro com quem se negocie (art. 118), o Código Civil estatui firmar-se a procuração por instrumento escrito, público ou particular, que valerá desde que contenha a assinatura do outorgante. O instrumento deve conter, ainda, o lugar e a data em que foi passado, a identificação das partes, outorgante e outorgado, o que de resto afasta a possibilidade da chamada procuração em branco, ou seja, a pessoa indeterminada (cf. Lotu­fo, Renan. Questões relativas a mandato, representação e procuração. São Paulo, Saraiva, 2001, p. 156-8). Deve também discriminar, de modo preciso, os poderes conferidos. Modificando o que a propósito se continha no § 3o do art. 1.289 do CC/1916, que erigia o reconhecimento da firma do outorgante em requisito de validade (rectius: eficácia) da procuração, passada por instrumento particular, perante terceiro, o Código Civil de 2002 apenas faculta a este terceiro a exigência de reconhecimento da firma do outorgante, o que, vale advertir, não se aplica ao mandato ad judicia (art. 38 do CPC, com redação dada pela Lei n. 8.952/94). Desde o Decreto n. 29.151/51, depois substituído pelo Decreto n. 83.858/79, alvitrou-se a outorga de procuração por telegrama, uma vez observados os requisitos lá dispostos quanto à autenticidade da assinatura. Da mesma forma, poder-se-á cogitar da outorga pela via telemática, pela informática, mas sempre e somente quando identificáveis as partes e, frise-se, pelo meio devido, mesmo de controle de assinatura digital, a se regulamentar, a autenticidade de sua declaração de vontade, inclusive cuja comprovação pode ser exigida pelo terceiro, na forma do § 2º (ver a propósito: Sandoval, Ovídio Rocha Barros. “ Do mandato”. In: O novo Código Civil - estudos em homenagem ao prof. Miguel Reale, coord. Domingos Franciulli Netto, Gilmar Ferreira Mendes e Ives Gandra da Silva Martins Filho. São Paulo, LTr., 2003, p. 597-600).

A procuração por instrumento particular somente poderá ser outorgada por pessoa capaz, como está no caput do artigo cm comento, destarte impondo-se a forma pública para os relativamente incapazes, porquanto assim se atesta a assistência e se garante a fidelidade do consentimento de quem a lei quer proteger, se bem que só para outorga de poderes ad nego[1]tia, por se vir entendendo que o art. 38 do CPC dispensa a formalidade para as procurações ad judicia, em que também dispensável, sempre, o reconhecimento de firma (Lei n. 8.952/94, que deu nova redação ao mesmo preceito processual). De igual maneira, só por instrumento público o analfabeto outorga procuração, já que inviável a sua assinatura, como quer a lei. Deve-se ressalvar a excepcional possibilidade de o menor púbere outorgar procuração, sem o seu assistente, para fins trabalhistas (art. 792 da CLT) ou para formulação de queixa-crime ou representação (art. 34 do CPP), aqui apenas se discutindo o exato elastério do dispositivo processual penal, que alude à idade entre 18 e 21 anos, isso diante da redução da maioridade pelo Código Civil de 2002. Da mesma forma, há de se admitir possa o interdito, ele próprio, outorgar procuração para se postular o levantamento de sua interdição, por cessação da respectiva causa. Já aos pródigos se deve deferir a livre outorga para os atos em que a assistência não seja exigível (art. 1.782). Quanto aos menores impúberes e aos demais absolutamente incapazes, a lei garante-lhes a representação legal pelos pais, pelos tutores ou pelos curadores, não havendo cogitar possam eles, pessoalmente, outorgar procuração, de resto privados da possibilidade de livre gestão de seus interesses, o que está na base da faculdade de outorga da procuração. Quanto à outorga de procuração, em nome do absolutamente incapaz, pelos representantes, vale anotar a regra geral de que o exercício do poder familiar, da tutela ou da curatela são, de forma genérica, indelegáveis, mas lembrando-se, quanto aos pais, que são usufrutuários dos bens dos filhos, agindo, na sua administração, por direito próprio, muito embora nos limites do quanto preserve a higidez do patrimônio dos filhos sob sua autoridade, pelo que inviáveis atos que ultrapassem a mera administração, senão por autorização judicial (art. 1.691), até por isso não se excluindo, nesses lindes, eventual outorga de procuração, às vezes inclusive indispensável, como no caso da constituição de advogado. Mesmo ao tutor, afora a nova hipótese contida no art. 1.743, já antes do Código Civil de 2002 e malgrado a pessoalidade de seu exercício, não se excluía a delegação, por procuração, de poderes para prática de atos específicos, compreendidos no alcance da tutela, não se permitindo, isto sim, uma cessão genérica do exercício de direitos e deveres decorrentes deste instituto assistencial (v. g., Carvalho santos, J. M. Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1952, v. V I, p. 297). E, por fim, admitida, excepcionalmente, a procuração outorgada pelo representante em nome do absolutamente incapaz, desnecessária a forma pública se, afinal, fala, juridicamente, quem tem plena capacidade, nesse caso não se cogitando de assistência. Fomentada pela indistinção do Código Civil de 2002 acerca do mandato e da procuração (v. art. 653), a doutrina costuma traçar os requisitos subjetivos dos contratantes do mandato quando se dá a examinar o artigo presente, que, na realidade, versa sobre a forma da procuração, particularmente daquela passada por instrumento particular. De qualquer maneira, a capacidade do mandante segue o regramento geral, aferindo-se, mais, sua legitimação em função do negócio ou dos negócios para cuja atuação nomeia-se o mandatário. Já a capacidade do mandatário tem a normativa geral excepcionada pela disposição do art. 666, adiante comentado. (Cláudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 654, p. 669-671, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 21/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Na sequência Sebastião de Assis Neto, et al, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Capítulo X – Negócios de Intermediação – item 1. Mandato, 1.1. Conceito e natureza jurídica   p. 1.180. Comentários ao CC 653 e 654: alerta-nos ser o mandato, a relação contratual pela qual uma das partes se obriga a praticar, por conta do outro, um ou mais atos jurídicos ou para lhe administrar interesses (Gomes, 1979, p. 423).

Observa-se, portanto, que o mandante dá ao mandatário poderes para que ele pratique atos jurídicos em seu nome ou administre interesses. Esses poderes se dividem, então, em: (a) poder de agir administração de interesses) e (b) poder de representar (praticar atos jurídicos em nome do mandante). A prática de atos jurídicos específicos em nome do mandante, portanto, depende da outorga de poderes expressos em favor do mandatário.

A procuração é o instrumento do mandato. Pode ser pública ou particular. O instrumento particular exige a assinatura do outorgante, a indicação do lugar onde foi passado, a qualificação do outorgante e do outorgado, a data e o objetivo da outorga com a designação e a extensão dos poderes conferidos.

A validade do mandato não exige reconhecimento de firma. O terceiro com quem o mandatário tratar é que poderá exigir que a procuração traga a firma reconhecida (CC-2002, art. 654, § 2).

O mandato tem forma livre, podendo ser expresso ou tácito, verbal ou escrito. No entanto, a sua outorga está sujeita à forma exigida por lei para o ato a ser praticado. Não se admite, portanto, mandato verbal quando o ato deva ser celebrado por escrito e assim por diante. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Capítulo X – Negócios de Intermediação – item 1. Mandato, 1.1. Conceito e natureza jurídica p. 1.180. Comentários ao CC 653 e 654: Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 21/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 655. Ainda quando se outorgue mandato por instrumento público, pode substabelecer-se mediante instrumento particular.

Segundo a descrição no Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 654, p. 351-352, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: O substabelecimento é o negócio unilateral pelo qual o mandatário (procurador) transfere ao substabelecido, no todo ou em parte, os poderes que lhe foram conferidos pelo mandante (outorgante). Sem embargo da controvérsia instalada em tomo do tema e não obstante as insuspeitáveis opiniões divergentes, parece-nos que o substabelecimento não está sujeito à forma especial. É que, agora com a nova redação do texto, ainda quando a procuração tenha sido outorgada por instrumento público, o procurador nomeado pode substabelecer mediante instrumento particular, com ou sem reserva de poderes, resolvendo o problema de interpretação criado com a antiga redação. Tal orientação á era abraçada pela grande maioria da doutrina. Assim, p. ex., embora se tenha outorgado uma procuração por instrumento público para venda de determinado imóvel, cujo contrato deve perfazer-se por escritura pública, o mandatário pode substabelecer por instrumento particular. Relevante é notar, ao entendimento ora manifesto, que, na redação do § 2 o do art. 1.289 do CC de 1916, o ato ali reportado condizia com aquele a não exigir o instrumento público, enquanto a nova redação adotada pelo dispositivo em comento tem por indiferente exigir ou não o ato aquela forma especial.

No substabelecimento com reserva, o substabelecente (mandatário) permanece como procurador, continuando a possuir, cumulativa e simultaneamente, os poderes por ele substabelecidos, ao passo que no efetuado sem reserva os poderes são transferidos, definitiva e totalmente, para o substabelecido por meio de uma cessão integral, continuando responsável o mandatário (substabelecente) apenas se, com a cessão, não anuiu o mandante. Inexistente declaração a respeito, o substabelecimento se presume feito sob reserva de poderes.

Na didática e magistral lição de José Paulo Cavalcanti, “o substabelecimento pode ser total ou parcial. Se o substabelecimento for efetuado em parte com reserva, o substabelecente continua como procurador, solidariamente, com o substabelecido quanto aos poderes transferidos com reserva. Se for efetuado em parte sem reserva, haverá procuração individual somente ao estabelecido quanto aos poderes a ele transferidos sem reserva” (apud José Lopes de Oliveira, Contratos, 1. ed. Recife, Livrotécnica, 1978).

lmpende rememorar ainda, que “a mera juntada do substabelecimento não dá oportunidade a que se conheça a sequência dos mandatários, o que implica não se saber se o substabelecente é, de fato, mandatário” (TJPF. 4ª Câmara Cível, Agr. n. 69031-9, Rei. Des. Napoleão lavares, j. em 22-2-2001). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 654, p. 351-352, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Referências: Amoldo Wald, Curso de direito civil brasileiro — obrigações e contratos, 14. ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000; José Lopes de Oliveira, Contratos, 1. ed. Recife, Livrotécnica, 1978; Silvio Rodrigues, Direito civil, 27. ed. Saraiva, São Paulo, 2000, v. 3 — Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade.

Na crítica de Cláudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 655, p. 671-672: Normalmente conceituado como ato unilateral mediante o qual o mandatário transfere a outrem os poderes recebidos do mandante, tem-se que o substabelecimento, em verdade, o seja da procuração. Vale dizer, substabelece-se a procuração, e não o mandato propriamente (v. g„ Pontes de Miranda. Tratado de direito privado, 3. ed. São Paulo, RT, 1984, t. X LIII, § 4.701, n. 1, p. 165). Sendo assim, o substabelecente, por ato unilateral (ou negócio unilateral, a respeito remetendo-se ao comentário do art. 653), transfere ao substabelecido os poderes que lhe foram outorgados em uma procuração. Pode fazê-lo com ou sem reservas de poderes, isto é, mantendo-se também como procurador ou deixando de sê-lo para que o outro assuma seus poderes. Vale dizer, no primeiro caso há poderes cumulativos de substabelecente e substabelecido; no segundo, há integral substituição do procurador. O substabelecimento pode ainda ser total ou parcial, conforme se transfiram todos ou alguns dos poderes do substabelecente.

A autorização ou proibição de substabelecer, bem como as respectivas consequências quanto à responsabilidade do substabelecente, são tratadas pelo art. 667, a seguir examinado e a cujos comentários se remete. De resto, o dispositivo do artigo presente se dá a cuidar da forma do substabelecimento, procurando superar discussão que a respeito suscitava o § 2o do art. 1.289 do CC/1916. Isso porquanto, na anterior normatização, permitia-se o substabelecimento por instrumento particular só quando a procuração, lavrada por instrumento público, poderia tê-lo sido por instrumento particular. Em diversos termos, a forma do substabelecimento seguia a regra do negócio principal, de tal arte que o instrumento particular só seria admissível se a procuração também pudesse ter sido passada por instrumento particular, malgrado escolhida, no caso concreto, a forma pública. Hoje, essa é a inovação, o substabelecimento tem regramento autônomo quanto à sua forma, garantindo-se a possibilidade de lavratura por instrumento particular, mesmo que, por qualquer motivo, a procuração tenha obedecido a forma pública. A conclusão, pois, é a de que, ainda nas hipóteses em que a procuração deva ser pública, o substabelecimento pode ser particular. Sucede, porém - e a discussão é a mesma que, de maneira mais completa, se examinará nos comentários ao art. 657 -, que, a bem da segurança jurídica e da harmonização com este mesmo preceito citado, o Projeto de Lei n. 276/2007 tenciona adicionar um parágrafo ao artigo em comento para explicitar que “é da essência do ato a forma pública, quando a procuração visar a constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis”. Reitere-se, isto, a rigor, na esteira da exigência do art. 657 no sentido de que a “outorga do mandato está sujeita à forma exigida por lei para o ato a ser praticado”. (Cláudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 655, p. 671-672, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 21/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No artigo “Tudo sobre o básico de procuração: O instrumento do contrato de mandato”, Marcos Vinicius há 2 anos publicou em jusbrasil.com, todos os artigos que compõem a estrutura do mandato. Aqui, temos as apreciações do autor sobre o artigo 655 em foco: 

Trata-se de um subcontrato de mandato, ou seja, aquele para o qual os poderes foram outorgados repassa todos ou parte deles para um outro sujeito, chamado substabelecido.

 

O substabelecimento, regra geral, é permitido quando a procuração é omissa a este respeito. Mas, poderá o outorgante autorizar o substabelecimento ou até mesmo proibi-lo.

 

Quando omissa, o procurador será responsável pelos atos do substabelecido, desde que este aja com culpa.

 

Já a procuração que veda o substabelecimento, o outorgado responderá pelos prejuízos causados ao outorgante derivados do substabelecido, mesmo em caso fortuito, apenas se livrando na condição de provar que o fato teria acontecido mesmo que não tivesse havido o substabelecimento.

 

A vedação do substabelecimento, se expressa, nenhum ato do outorgado tornará o outorgante responsável, a menos que este o ratifique expressamente, e tal ratificação retroagirá à data do ato praticado.

 

O substabelecimento pode ser total ou parcial, ou seja, para todos os atos ou para alguns. Poderá ser com ou sem reserva de poderes. Trata-se de uma ressalva de poderes onde o substabelecido não realizará determinados poderes outorgados ao substabelecente pelo outorgante.

A lei permite que, mesmo que a procuração seja pública, haja o substabelecimento por instrumento particular (art. 655 do Código Civil). Contudo, conforme o Enunciado n. 182 do CJF, se a forma pública for oriunda da forma do ato a ser realizado, a exemplo, uma compra e venda de imóvel com valor superior a 30 vezes o maior salário mínimo vigente no país, então o substabelecimento também será na forma de escritura pública. (Marcos Vinicius em artigo intitulado, “Tudo sobre o básico de procuração: O instrumento do contrato de mandato ”, há 2 anos, publicou em jusbrasil.com. Aqui, o art. 655, acessado em 21/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 20 de setembro de 2022

Direito Civil Comentado - Art. 650, 651, 652 - Do Depósito Necessário – VARGAS, Paulo S. R. - vargasdigitador.blogspot.com digitadorvargas@outlook.com

 

Direito Civil Comentado - Art. 650, 651, 652
- Do Depósito Necessário – VARGAS, Paulo S. R.
- vargasdigitador.blogspot.com
digitadorvargas@outlook.com

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações

Título VI – Das Várias Espécies de Contrato

Capítulo IX – Do Depósito – Seção II –

Do Depósito Necessário

 (Art. 647 a 652)

 

Art. 650. Cessa, nos casos do artigo antecedente, a responsabilidade dos hospedeiros, se provarem que os fatos prejudiciais aos viajantes ou hóspedes não podiam ter sido evitados.

Dentro da lógica do Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 650, p. 348 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: A exclusão da responsabilidade do hospedeiro é referida pela norma diante da inevitabilidade do ato lesivo. Fatos inimputáveis são aqueles para os quais o hospedeiro não concorreu com negligência ou falta do dever de vigilância.

Por outro lado, tenha-se presente o art. 642: “O depositário não responde pelos casos de força maior; mas, para que lhe valha a escusa, terá de prová-los”. Diga-se, a propósito, que o caso fortuito não é de per si excludente de responsabilidade (RT 5791233). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 650, p. 348 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

O dispositivo em comento, conforme apreciação de Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 650, p. 665-666 cuida da isenção de responsabilidade dos hospedeiros pelos danos causados aos bens dos hóspedes é consequência da ocorrência de um fato inevitável e estranho à atividade do agente. Essa norma se coloca em consonância com o art. 642, que exonera o depositário de indenizar quando demonstrada a força maior.

Vimos que a força maior é associada ao fortuito externo, vale dizer aos eventos lesivos exteriores à atividade do depositário. Não é possível incluir nos riscos do hoteleiro a obrigação de indenizar pelos perigos que não foram por ele introduzidos, diante da ausência de nexo causal.

Assim, em não havendo ação ou omissão concorrente pelo depositário, é temerário acioná-lo pela perda das bagagens cm razão de fortes enchentes, deslizamentos de terra e outras catástrofes incontroláveis. Não se esqueça de que o fato exclusivo da vítima também elide a responsabilidade do hospedeiro, mas o mesmo não se diga do fato concorrente, pois, em sede de relação de consumo, qualquer parcela de participação do fornecedor para o resultado danoso já é suficiente para lhe impor a obrigação de indenizar, à luz do art. 14, § 3", II, do Código de Defesa do Consumidor.

A demonstração do evento externo recai sobre o depositário, até mesmo pela própria distribuição do ônus da prova, atribuída ao réu, tratando-se da existência de fato impeditivo ao direito do autor (art. 373, II, do CPC). (Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 650, p. 665-666, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 20/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

No dizer de Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 650: A regra deste dispositivo baseia-se na responsabilidade subjetiva. Fatos prejudiciais inevitáveis excluem a culpa por parte do hospedeiro. A regra vale para hospedagens que não conformam relação de consumo, isto é, nos casos em que o hospedeiro não exerça a atividade em caráter profissional e habitual. Se a hospedagem for caracterizada como relação de consumo, os artigos 14 a 17 do Código de Defesa do Consumidor incidem e tornam objetiva a responsabilidade do hospedeiro com relação a todos os riscos inerentes à sua atividade. Somente não responde se o dano às bagagens foi ocasionado por fato estranho à sua atividade, quando haverá a quebra do nexo causal.  (Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 650, acessado em 20/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 651. O depósito necessário não se presume gratuito. Na hipótese do art. 649, a remuneração pelo depósito está incluída no preço da hospedagem.

Na orientação que dá o Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 651, p. 348 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: Ao contrário do que acontece com o depósito voluntário, o depósito necessário presume-se oneroso, somente se acolhendo a graciosidade mediante expressa previsão contratual. A onerosidade dos depósitos necessários, congregando tanto os legais quanto os miseráveis, tem arrimo na premissa de todos eles constituírem obrigações decorrentes de imposição legal ou de algum fato imprevisto e urgente, a ordenar não apenas a realização do depósito como também a escolha -não-livre do depositário, porquanto designado pelas circunstâncias e, em regra, entre pessoas estranhas ao depositante.

No caso do art. 649, o depósito da bagagem dos viajantes ou hóspedes igualmente se presume oneroso, já incluída a remuneração no preço da hospedagem. É que o hospedeiro assume a obrigação de zelar e defender a coisa guardada em seu estabelecimento, responsabilizando-se por eventuais prejuízos, salvo quando inevitáveis. Bem por isso os doutrinadores equiparam o negócio à prestação de serviços.

É importante salientar que a onerosidade presumida no depósito necessário acarreta maiores responsabilidades para o depositário, “pois quem recebe remuneração deve ser mais cuidadoso e mais atento do que a pessoa que só aceita encargo para servir a um amigo” (Silvio Rodrigues, Direito civil, 27 ed. São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3 — Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, p. 267). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 651, p. 348 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 651, p. 666: Ao contrário do que ocorre no depósito voluntário (art. 628 do CC), nas hipóteses em que o depósito é necessário - seja por lei, seja pela situação de calamidade -, a presunção será a de onerosidade do negócio jurídico.

A distinção é explicada pelo fato de o depósito voluntário frequentemente contar com a cumplicidade dos parceiros contratuais e o ânimo do depositário de proteger graciosamente os bens do depositante. Todavia, no depósito necessário não há relação fraternal entre os parceiros, sendo a obrigação do depositário um risco relacionado à sua atividade profissional. Daí a imposição de uma remuneração àquele que cuida dos bens alheios em situações emergenciais, bem como do hoteleiro. Nesse caso, o valor do depósito já estará incluído (embutido) no preço da hospedagem, pois seria inconcebível uma cisão entre o ato de hospedar e o de depositar os pertences do hóspede, sendo essa uma espécie de obrigação inerente àquele contrato.

Caso as partes não alcancem um valor para o depósito necessário, será ele arbitrado judicialmente. Anote-se que, nas situações de calamidade, o negócio jurídico poderá ser anulado pelo depositante em função do vício da lesão (art. 157 do CC), quando o depositário exigir prestação manifestamente desproporcional para aceitar a custódia do objeto, aproveitando-se da situação de extrema necessidade do depositante. (Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 651, p. 666, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 20/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

A crítica de Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 651 é que “O depósito necessário se presume oneroso. Tal presunção confere ao depositário o direito de requerer o arbitramento de remuneração pela atividade exercida. Será, no entanto, gratuito, se as partes estabelecerem voluntariamente a gratuidade ou quando a lei que institui a relação de depósito não estabelecer o dever de remunerar, como no caso das contribuições e tributos devidos à Fazenda Nacional. No caso de depósito necessário de bagagens, a remuneração do depósito inclui-se no preço da hospedagem. (Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 651, acessado em 20/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 652. Seja o depósito voluntário ou necessário, o depositário que não o restituir quando exigido será compelido a fazê-lo mediante prisão não excedente a um ano, e ressarcir os prejuízos.

Seguindo o Código Civil por conta da doutrina de Ricardo Fiuza – comentários ao art. 652, p. 349 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: Em derivando de relação de mútua confiança — depósito voluntário —ou de obrigação legal ou de fato imprevisto e urgente decorrente de calamidade pública — depósito necessário — é certo que a lei pune severamente o depositário infiel, ou seja, aquele que se nega a restituir, quando reclamado pelo depositante, o objeto depositado sob sua guarda e conservação, com “a prisão não excedente de um ano e o ressarcimento dos prejuízos (...), pena corporal que será determinada na ação própria (Código de Processo Civil, arts. 901 e ss), ou em processo de que resultar o depósito judicial” (Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de direito civil, 4. ed., Rio de Janeiro. Forense, 1978, v. 3, p. 322).

Tal penalidade encontra-se expressamente prevista na Constituição Federal de 1988, inciso LXVII do art. 9, constituindo um dos dois casos taxativos de prisão civil.

v. 2 — Direito das obrigações, p. 242). Por tal conduto, o legislador cuidou de fixar um prazo máximo para a duração da pena, não tratando do lapso temporal menor. “Esse mínimo está na própria vontade do depositário infiel. A qualquer momento pode este liberar-se da prisão, desde que satisfaça a obrigação de exibir o depósito” (Washington de Barros Monteiro, ob. cit., p. 242-3).

Por fim, é relevante e oportuna a anotação de Maria Helena Diniz: “De acordo com a sistemática introduzida pelo novo Estatuto processual civil, foi abolida a prisão, liminar do depositário infiel, para admiti-la somente depois de julgado procedente e não cumprido o mandado para entrega da coisa ou do equivalente em dinheiro, dentro do prazo marcado, em regra 24 horas” (Rt 422/78 e 519/164)”. (Curso de direito civil brasileiro, 16. ed. São Paulo, Saraiva, 2001. v. 3 — Teoria das obrigações contratuais e extracontratuais, p. 297). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 652, p. 349 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

A crítica, segundo entende Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 652, p. 667-668: A relação de confiança que se estabelece entre depositante e depositário indica que aquele pretenderá reaver o objeto dado em depósito assim que o reclamar ou superado o termo contratual (art. 633 do CC). Destarte, a obrigação de restituir é algo ínsito ao contrato de depósito e o que o particulariza em relação a outros modelos negociais.

Atento ao art. 5º, LXVII, da CF, “não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável da obrigação alimentícia e a do depositário infiel”, o legislador determinou que a sanção para o depositário infiel será a pena de prisão não excedente a um ano e o ressarcimento dos prejuízos. No fundo o que determina a prisão é a infidelidade, não a dívida.

A supressão da liberdade do devedor será uma consequência da quebra da fidúcia do depositante, pela recusa à restituição do objeto depositado. Trata-se de medida coercitiva que objetiva persuadir o devedor à devolução da coisa, pois no instante em que o depositário realiza a restituição a pena de prisão encerra, cumprida a sua finalidade. Aliás, o objetivo de constrangimento impõe a recusa aos benefícios normalmente concedidos ao condenado no sistema criminal (v. g., suspensão da pena; prisão domiciliar), pois eles frustrariam a própria intensidade da medida e a sua teleologia.

A pena de prisão civil é o desfecho da ação de depósito, que tem por finalidade a restituição do bem depositado (arts. 901 a 906, do CPC). A decretação da medida extrema só ocorrerá após a prolação da sentença, com o insucesso da expedição de mandado para entrega da coisa ou do equivalente em dinheiro.

A nosso viso, o artigo em comento já nasce sob o vício da inconstitucionalidade, pois a pena de prisão civil do depositário infiel é ofensiva ao Pacto de São José da Costa Rica, que penetrou no ordenamento jurídico interno mediante o Decreto federal n. 678/92. Em seu art. 7º autoriza a prisão civil apenas para o caso de inadimplemento da obrigação alimentar.

É cediço que o rol dos direitos fundamentais elencados no art. 5o da Constituição Federal não é numerus clausus, pois o art. 5º, § 2º, a eles acrescenta outros direitos e garantias provenientes de tratados internacionais. Portanto, as convenções subscritas pelo Brasil, quando versem sobre os direitos humanos, adentram nosso ordenamento com força de normas constitucionais, revogando a legislação anterior no que com ela conflitem. Assim, não se podendo mais cogitar de prisão civil em sede constitucional, perdem eficácia as normas editadas pelo legislador subalterno, como o presente dispositivo e o art. 902 do Código de Processo Civil.

Contudo, para aqueles que entendem que a convenção internacional avança na legislação positiva somente com força de norma federal ordinária, a edição do novo Código Civil traz um novo argumento, qual seja se o Pacto de São José havia revogado a pena de prisão inserida na legislação processual, o art. 652 acaba de restaurar a prisão civil, pois exclui o referido tratado de nosso sistema jurídico.

Tanto o Decreto-lei n. 911/69 como o Código Civil (art. 1.363) situam o devedor fiduciante na posição de depositário no contrato de alienação fiduciária, pois mantém a posse direta do bem pela tradição ficta (constituto possessório), cuja propriedade fora transferida em garantia ao credor fiduciário (art. 1.361 do CC). Pela equiparação do fiduciário ao depositário, caso seja ajuizada ação de busca e apreensão sem que o bem seja restituído - ou o equivalente em dinheiro -, sujeitar-se-á à pena de prisão após a conversão em ação de depósito (art. 4o do Decreto-lei n. 911/69) e a prolação da sentença condenatória.

Para além da motivação já apontada, contrária a qualquer pena de prisão no contrato de depósito em razão da subscrição pelo Brasil de convenção internacional de direitos humanos, some-se mais um argumento específico no que tange à supressão da liberdade na alienação fiduciária.

O contrato de depósito tipicamente requer a entrega da coisa com o objetivo de uma posterior devolução. Isso não ocorre na alienação fiduciária, pois desde o início o fiduciante (depositário) efetua pagamentos sucessivos com vistas à aquisição da propriedade, jamais no intuito de restituir a coisa. Vale dizer: cuida-se de depósito atípico, pois a propriedade do depositante é resolúvel e o depósito é apenas uma fase necessária para o depositário resgatar definitivamente a propriedade. Portanto, sendo a pena de prisão civil do depositário infiel uma sanção inserida no Capítulo “Dos Direitos e Deveres Individuais” (art. 5o), deverá ser interpretada restritivamente, apenas alcançando o contrato de depósito típico e não aquele apenas a ele equiparado.

Acreditamos ainda que o princípio da dignidade da pessoa humana impede que alguém seja privado de sua liberdade em razão de uma discussão meramente econômica (art. 1º, III, da CF). O limite que separa a ideia de pessoa e de coisa é justamente aquele em que o ser humano é instrumentalizado, coisificado, em razão da prevalência de questões patrimoniais sobre as existenciais. Os critérios de legitimidade de qualquer atividade econômica serão modelados e legitimados pelos direitos da personalidade e pela proteção ao ser humano concreto que se insere por trás das abstratas relações financeiras. O ordenamento jurídico deverá criar garantias econômicas que tutelem o credor sem que o seu direito subjetivo ao crédito seja exercitado de forma abusiva, desvirtuando a função para a qual fora concedido e vulnerando os limites materiais e éticos do sistema (art. 187 do CC).

Enfim, tanto para os casos de prisão decorrente de depósito como de alienação fiduciária, caberá ao devedor impetrar o habeas corpus, em razão do desproporcional constrangimento ilegal pela invasão da esfera de liberdade como forma de prestigiar interesses patrimoniais. (Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 652, p. 667-668, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 20/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Como resolução lógica, na apreciação de Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 652: A prisão do depositário infiel foi considerada revogada pelo STF, em razão da adesão do Brasil ao Pacto de San José da Costa Rica (RE 466343, HC 87585, julgados em 3-12-08).

O STF julga constitucional a prisão civil em caso de depósito judicial (RHC n. 90.759; HC 92.541-PR, Rel. Min. Menezes Direito, 19.02.2008), embora a Súmula n. 419/STJ estabeleça o contrário: “Descabe a prisão civil do depositário judicial infiel” (Rel. Min. Felix Fischer, em 3.3.2010). (Marco Túlio de Carvalho Rocha et alapud Direito.com, nos comentários ao CC 652, acessado em 20/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).