Art.
1.723. É
reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher,
configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o
objetivo de constituição de família.
§
1º. A
união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521;
não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar
separada de fato ou judicialmente.
§
2º. As
causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união
estável.
Memoroso, o dispositivo em tela, inexistente no projeto, foi acrescentado pelo Senado Federal, com a redação seguinte: “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, vivendo os companheiros como se casados fossem por mais de cinco anos consecutivos. § 1º O prazo previsto neste artigo poderá ser reduzido para três anos, quando houver filho comum. § 2º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos e as causas suspensivas constantes dos arts. 1.519 e 1.520”. Retornando, em seguida, o projeto à Câmara, promoveu o Deputado Ricardo Fiuza completa reformulação no dispositivo, proposta que restou acolhida em definitivo. Segundo a justificativa da emenda que modificou este artigo, “A Constituição Federal de 1988, em seu art. 226, § 30 reconheceu, para efeito de proteção do Estado, a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar.., legitimou uma prática social aceitável, qual a da existência de uniões livres... diferenciadas daquelas oriundas de comportamento adulterino.., posto que formadas, essas últimas, por quem mantém relação de casamento com outrem, íntegra na realidade existencial de continuarem juntos. No influxo do dispositivo constitucional, adveio a Lei n. 8.971, de 29 de dezembro de 1994, a disciplinar o direito dos companheiros a alimentos e à sucessão, sem definir, contudo, a moldura jurídica do instituto da união estável, o que veio a acontecer apenas com a Lei n. 9.278, de 10 de maio de 1996... ao dispor que ‘é reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituição de família”’. A seguir, a justificativa da emenda refere a distinção entre a união estável e a relação adulterina, caracterizando esta última como a união de pessoa casada com terceiro, durante a convivência conjugal, à qual ficou reservada a denominação de concubinato, sem que lhe seja dado o mesmo tratamento legal oferecido à primeira em razão do princípio jurídico da monogamia. Aponta, então, a existência de inúmeras pessoas que, mesmo impedidas de casar, por existir o vínculo conjugal, já que estão separadas de fato ou judicialmente de seu cônjuge, encontram-se em união estável com outrem. Ressaltou a justificativa as características da união estável, que já constavam do art. 12 da Lei n. 9.278/96: dualidade de sexos, publicidade, continuidade e durabilidade da relação. A justificativa considerou inconstitucional o estabelecimento de prazo mínimo de duração da relação, já que a Constituição Federal não define qualquer prazo, sendo o conceito de estabilidade que deve informar a existência da relação produtora de efeitos jurídicos. Por outro lado, o elemento more uxório, integrante do artigo na redação anterior, a exprimir a vida em comum de um homem e de uma mulher” sob o mesmo teto, é dever do casamento não estando inscrito entre os deveres dos conviventes, apontados no art. 1.724 do novo Código. É mencionada, por fim, a jurisprudência a respeito, que reconhece a existência de união estável independentemente da convivência sob o mesmo teto, por meio da Súmula 382 do STF: “a vida em comum sob o mesmo teto, more uxório, não é indispensável à caracterização do concubinato”.
Na composição da doutrina, o relator Ricardo Fiuza, distinguiu Requisitos: o artigo em análise reproduziu, no seu caput o disposto no art. 1º da Lei n. 9.278/96, que já continha falhas, a seguir apontadas:
1) A união estável existe diante de constituição de família e não de simples “objetivo de constituição de família”, já que, se assim não fosse, o mero namoro ou noivado, em que há somente o objetivo de formação familiar, seria equiparado à união estável. A errônea referência ao mero objetivo de constituição de família partiu da Lei n. 9.278/96, art. 1º, tendo sido absorvida pelo novo Código Civil. É necessária, portanto, a modificação do dispositivo, com clara referência à constituição de família e não apenas a seu objetivo.
2) A capacidade civil é requisito essencial à celebração do casamento, sendo também indispensável à existência de união estável, em razão dos efeitos que produz, dentre os quais a aplicação das regras do regime de comunhão parcial de bens. Deve, assim, constar dos pressupostos da união estável.
3) É indispensável a demonstração da existência de união estável, em ação própria , em caso de litígio entre os interessados, sob pena de serem atribuídos direitos, inclusive sucessórios, sem que estejam presentes os respectivos requisitos. No entanto, com os instrumentos processuais da tutela antecipada e das ações cautelares liminarmente, poderá haver o provi do jurisdicional, para acautelar direitos, como, por exemplo, em ação de reconhecimento e dissolução de união estável com pedido cumulado de alimentos.
4) Quanto ao prazo de duração, as uniões estáveis formam-se e desenvolvem-se de maneira natural e espontânea, de modo que o estabelecimento de período mínimo de duração para que gere efeitos jurídicos merece certa análise. Relações estáveis, com a formação de família e patrimônio comum, podem ocorrer antes do decurso do prazo de cinco anos, que era estabelecido anteriormente no projeto. O estabelecimento de prazo mínimo pela lei acabaria por gerar situações de extrema injustiça e de locupletamento ilícito daquele que tem o patrimônio em seu nome e dissolve a relação antes do alcance daquele prazo, em prejuízo do outro convivente, que ofereceu seu esforço na respectiva aquisição.
No entanto, não podem ser olvidadas as dificuldades de apuração da existência de união estável diante da falta de prazo preestabelecido em lei, de modo que, se tivesse ocorrido a adoção de período mínimo, que poderia ser de dois anos, chegou-se a sugerir a produção, em caráter excepcional, de efeitos jurídicos antes de seu vencimento, com a prova do esforço comum, para o fim de evitar o locupletamento ilícito daquele que fica com o patrimônio em seu nome, embora constituído pelo esforço de ambos os companheiros, e desfaz a relação às vésperas do decurso do prazo.
5) A união estável pressupõe a notoriedade, porque o relacionamento secreto, clandestino, com o cultivo apenas de relações sexuais, não pode ter estabilidade e produzir efeitos jurídicos. Por essas razões, a publicidade da convivência é exigida expressamente pela lei vigente.
6) A continuidade da relação também é havida como pressuposto indispensável para que a união tenha a necessária estabilidade.
7) A lei em vigor não exige a convivência sob o mesmo teto, a exemplo do ordenamento jurídico anterior, em que a Súmula 382 do Supremo Tribunal Federal já dispunha que “A vida em comum sob o mesmo teto, more uxório, não é indispensável à caracterização do concubinato”. E, realmente, mesmo com domicílios diversos, pode estabelecer-se união estável entre um homem e uma mulher, o que é reflexo da evolução social.
8) Pelas regras do projeto, na redação da referida emenda senatorial, somente haveria união estável diante da inexistência de impedimento matrimonial. Isso significa que as pessoas separadas judicialmente não poderiam constituir união estável.
União estival não pode existir se os conviventes forem casados, uma vez que haverá, neste caso, a prática de adultério, mas com a separação judicial deixa de existir a sociedade conjugal, extingue-se o dever de fidelidade, não havendo razão para vedar a produção de efeitos à união estável de pessoas separadas judicialmente.
Como observado nas sugestões encaminhadas à Comissão Especial da Câmara dos Deputados, no entanto, o § lº do artigo em análise passou a possibilitar a existência de união estável às pessoas com impedimento para o casamento, diante de separação de fato, olvidando-se de fazer referência à separação judicial.
Assim, segundo o texto atual, é possível a constituição de união estável se um dos participantes da relação for casado e estiver simplesmente separado de fato. Como já manifestado em estudos anteriores, essa disposição do texto atual não se coaduna com o princípio constitucional de proteção à família, já que a convivência de uma pessoa casada com terceira pessoa, que apenas deixe de coabitar com o cônjuge e não regularize seu estado civil, não deve gerar efeitos de união estável, sob pena de haver grave turbação familiar e patrimonial, sem que se possa concluir qual é a relação que deve gerar efeitos e delimitar qual é o patrimônio pertencente ao cônjuge ou ao convivente.
A título de exemplo, imagine-se a seguinte hipótese: uma pessoa casada, no regime da comunhão parcial de bens, que deixe de coabitar com o cônjuge e no dia seguinte passe a conviver com terceira pessoa, realizando a compra de um bem logo após a separação de fato, A quem se comunicará esse bem? Ao cônjuge ou ao companheiro?
E seja também lembrado que na situação acima apresentada, desde que provada a participação do companheiro na aquisição de bens, em razão da vedação ao enriquecimento ilícito, sempre estariam resguardados os seus direitos, com base nos princípios da sociedade de fato.
Tenha-se ainda em vista, que a construção jurisprudencial sobre a produção de efeitos nas relações afetivas de pessoas separadas de fato em seus casamentos deveu-se, especialmente, às limitações à dissolução da sociedade conjugal que existiam na legislação anterior à Lei do Divórcio (Lei n. 6.515/77), segundo as quais, havia somente o desquite consensual e o desquite litigioso como fundamento numa das causas taxativas que eram previstas no diploma civil (arts. 315 a 317). Com a Lei do Divórcio, surgiram outras espécies de dissolução da sociedade conjugal, com o alargamento das causas legais da ruptura do casamento, como a separação judicial, ruptura fundada na separação de fato prolongada por um ano (art. 52, § lº), e o divórcio direto, baseado na separação de fato prolongada por dois anos (art. 4º). Desse modo, não há mais razão para que o cônjuge não regularize seu estado civil. Não há mais motivo que justifique a geração de efeitos jurídicos em união concorrente com um casamento.
A manutenção de uma relação estável na vigência de um casamento tem o mesmo significado da bigamia, em que concorrem dois casamentos civis, o que é ilícito civil, a acarretar a nulidade do segundo casamento, como também dispõe este Código Civil, nos arts. 1.548, II, e 1.521, VI, e ilícito penal, como tipifica o Código Penal, no art. 235; não há, portanto, sentido em atribuir efeitos à união estável que concorre com o casamento civil e punir com a nulidade o casamento que concorre com outro casamento civil. No entanto, tal pensamento não foi acolhido pela maioria dos autores colaboradores, que, como nos demais projetos de lei apresentados neste trabalho, opinaram quanto às respectivas formulações, razão pela qual não é apresentada sugestão legislativa no sentido exposto.
Por outro lado, apresentou-se sugestão legislativa no art. 1.576 deste Código, para coaduná-lo com o princípio adotado no artigo em tela; observe-se que, no dispositivo proposto, para que o regime de bens no casamento seja extinto pela separação de fato, faz-se necessária a prova da incomunicabilidade ao cônjuge do patrimônio adquirido nessa situação fática.
Efeitos: 1) O art. 1.641, incisos I e II, deve aplicar-se não só ao casamento, mas, também, à união estável. Segundo aquele dispositivo, o casamento celebrado com causa suspensiva e contraído por pessoa com idade superior a sessenta anos tem, obrigatoriamente, o regime de separação de bens. Na união estável, segundo o § 2º do dispositivo em análise, ‘As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização de união estável”, e não há limite máximo de idade para que sejam produzidos os efeitos previstos no art. 1.725.
Então, se a pessoa se casa, com causa suspensiva ou com mais de sessenta anos, submeter-se-á obrigatoriamente ao regime da separação de bens, e, se passa a viver em união estável, nas mesmas circunstâncias, não sofrerá qualquer restrição no regime de bens, que, pela lei, será o da comunhão parcial. Essa diferença de tratamento não faz qualquer sentido.
2) A possibilidade de homologação judicial da dissolução consensual de união estável deve ser prevista em lei, para que reste indene de dúvida sua viabilidade em extinções de união estável realizadas por mútuo acordo, muito embora permaneça a possibilidade de sua realização por instrumento particular, para o fim de preservar a liberdade no rompimento da relação, independentemente de procedimento judicial (v. Rodrigo da Cunha Pereira, Concubinato e união estável, 5. ed., Belo Horizonte, DeI Rey, 1999, p. 60).
Sugestão legislativa: Pelas razões expostas, ofereceu-se ao Deputado Ricardo Fiuza a seguinte sugestão: Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher civilmente capazes, configurada na convivência pública, contínua, duradoura e constitutiva de família. § 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do Art. 1.521: não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente. § 2º Aplica-se à união estável o regime da separação de bens nas hipóteses previstas no CC 1.641, incisos 1 e II? § 3º A produção de efeitos na união estável, inclusive quanto a direitos sucessórios, havendo litígio entre os interessados, dependerá da demonstração de sua existência em ação própria. § 4º Poderá ser homologada judicialmente a extinção consensual da união estável. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 881-84, CC 1.723, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 31/05/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Daniela de
Souza Ferraz Lima e Leonardo Barreto Ferraz Gominho, em Artigo publicado em
fevereiro de 2017, planificando como justificam, no decurso do tempo a ideia de
constituição familiar necessitou se modelar para acompanhar as mudanças e as
transformações ocorridas na sociedade. Assim também, aconteceu com o Direito
das Famílias e o Direito das Sucessões que englobam as regras jurídicas que
regulam tal instituto.
Dentro do estudo dos autores Lima e Gominho, entende pertinente ao dispositivo em comento este blogueiro. O instituto da união estável é, ainda nos dias atuais, um dos pontos mais polêmicos do mundo jurídico, sobretudo no que diz respeito aos “efeitos patrimoniais” dessa já constitucionalmente reconhecida forma de família.
Como
é de conhecimento notório, a união estável é a forma de família caracterizada pela
convivência pública de duas pessoas com o intuito de constituírem família, mas
sem uma “benção” estatal, sem as formalidades inerentes ao instituto do
casamento civil. Tal forma de família ganhou a proteção estatal com o advento
da Carta Magna de 1988 que assegurou aos que estivessem em união estável a
mesma proteção conferida ao casamento (artigo 226, § 3°), o que tornou
imperiosa uma série de evoluções legislativas acerca do tema. (BRASIL,
Constituição Federal de 1988).
A
partir de 2002 passou a vigorar o vigente Código Civil, que, apesar da forma
moderna e dinâmica como tratou diversos temas do direito pátrio, inclusive em
sede de direito das famílias, foi raso ao lidar sobre diversos institutos
relacionados à união estável, como, por exemplo, a questão da permanência ou
não após o Código Civil de 2002 do direito real de habitação e
do usufruto ao companheiro, tendo em vista o CC 1.831 do referido
diploma legal somente abordar o direito real de habitação ao cônjuge. (BRASIL,
Lei Federal n.º 10.406/2002).
No direito sucessório não foi diferente. O atual Código Civil excluiu o convivente em união estável da ordem de vocação hereditária como sucessor legítimo, sendo que este também não foi qualificado como herdeiro necessário. Em suma, àquele que convive em união estável só foi garantido o direito hereditário aos bens adquiridos de maneira onerosa durante a mantença da união estável. (BRASIL, Lei Federal n.º 10.406/2002).
Além disso, o vigente diploma civil pátrio ainda traz em seu artigo 1.790 as regras acerca da sucessão para o convivente, quais sejam: I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho; II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles; III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança; e IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança. (BRASIL, Lei Federal n.º 10.406/2002).
Diante do posicionamento do constituinte pátrio, que protege a união estável tal qual o casamento, passou-se a discutir a constitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil em vigor. Há uma corrente que defende sua total constitucionalidade, afirmando que o artigo acima referido não está em discordância com os valores constitucionais, haja vista que o texto da Constituição Federal em nenhum momento contemplou igualdade de tratamento entre cônjuges e companheiros, mas apenas enunciou estar vedada a ausência de direitos sucessórios, podendo estes, portanto, serem diversos daqueles conferidos ao cônjuge, corroborando esta afirmativa com o fato de o artigo 5°, XXX, da Constituição Federal, assegurar tão somente o direito de herança. Vale ressaltar que essa corrente vem sendo adotada pelos Tribunais estaduais. (BRASIL, Lei Federal n.º 10.406/2002). (BRASIL, Constituição Federal de 1988).
Contudo,
adotar tal posicionamento seria um retrocesso à atual ordem constitucional, que
se baseia na dignidade da pessoa humana e no princípio da isonomia, e é esta
corrente – a da inconstitucionalidade do artigo 1790 do Código Civil – que a
jurisprudência pátria deve se basear. (BRASIL, Lei Federal n.º 10.406/2002).
Assim sendo, vale ressaltar que o ideal é que o casamento e união estável possuam o mesmo tratamento legislativo, para que seja respeitada a regra do artigo 226, §3°, da Magna Carta, assegurando toda a credibilidade e proteção jurídica da união estável, até porque a conveniência de unir-se pelo casamento ou pela união estável está inserida em uma esfera da vida privada na qual o Estado não pode intervir, mas deve proteger. Assim, os conviventes em união estável merecem, enquanto formadores de família, reconhecida legalmente como a base da sociedade, o reconhecimento da inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil. (BRASIL, Constituição Federal). (BRASIL, Lei Federal n.º 10.406/2002).
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a sociedade concubinária, hoje com a nomenclatura de União Estável, teve seu reconhecimento como entidade familiar, tendo esta lhe empregado o mesmo status conferido ao casamento e o gozo da proteção estatal. (BRASIL, Constituição Federal de 1988). De acordo com o texto da Carta Magna de 1988:
“Art.
226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...) § 3º
Para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem
e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em
casamento. (BRASIL, Constituição Federal de 1988).
Assim,
as uniões extramatrimoniais ganharam força no ordenamento jurídico, levando a
Constituição Federal a dar nova dimensão da concepção de família, passando a
proteger novas formas de entidades familiares, como a união estável, e com o
julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 4277, o reconhecimento
da união homoafetiva.
A
fim de acompanhar a evolução dos costumes, e assegurar os direitos concedidos
ao longo dos anos, leis foram criadas, são elas: Lei dos Companheiros (Lei
Federal n.º 8.971, de 29 de dezembro de 1994), a qual reconheceu aos
companheiros o direito de alimento e os direitos sucessórios, incluindo a
possibilidade de reserva de usufruto de parte dos bens; Lei dos Conviventes
(Lei Federal n.º 9.278, de 10 de maio de 1996), a qual reconheceu o direito de
partilhar os bens adquiridos onerosamente durante a união e o direito dela de
habitação concedido em caso de dissolução por morte, relativo ao imóvel
destinado a residência da família, enquanto o sobrevivente viver ou não
constituir nova união ou casamento. Tal lei trouxe o que se chama de presunção
dos esforços em comum. Somente em 2002, o Código Civil Brasileiro, reconheceu a
união estável como entidade familiar, demonstrado entre seus artigos 1723 e
1727. (BRASIL, Lei Federal n.º 10.406/2002). A legislação brasileira não define
ao certo o conceito sobre união estável; por esta razão, ficou a cargo da
doutrina e jurisprudência a função de conceituá-la.
Para
Maria Helena Diniz, a união estável é: Convivência pública, contínua e
duradoura de um homem com uma mulher, vivendo ou não sob o mesmo teto, sem
vínculo matrimonial, estabelecida com o objetivo de constituir família, desde
que tenha condições de ser convertida em casamento, por não haver impedimento
legal para sua convolação. (DINIZ, 2008, p. 368).
Ainda
no entendimento da renomada doutrinadora supracitada, para se constituir uma
união estável, se faz necessário elementos mais abrangentes, são eles:
diversidade de sexo; ausência de matrimônio civil válido e de impedimento
matrimonial entre os conviventes; notoriedade das afeições recíprocas,
afirmando não se ter união estável se os encontros forem furtivos ou secretos,
embora haja prática reiterada de relações sexuais; honorabilidade, reclamando
uma união respeitável entre os parceiros; fidelidade entre os parceiros, que
revela a intenção de vida em comum; coabitação, uma vez que o concubinato deve
ter a aparência de casamento e participação da mulher no sustento do lar como
administradora e também provedora. (DINIZ, 2002, pp. 322-329).
Já
Silvio de Sávio Venosa identifica cinco elementos constitutivos da União
Estável, a saber: estabilidade da união, como transcurso de razoável prazo; continuidade
da relação, complementar à estabilidade; diversidade de sexos, posto que
necessário o intuito de gerar prole; a publicidade da convivência e; o objetivo
de constituição de família. (VENOSA, 2006, pp. 42-45).
Como
dito alhures, a multiplicidade de ideias doutrinárias tende a levar-nos à
variação de elementos, mas podemos nos servir da própria lei para retirar os
elementos essenciais da união estável. De acordo com o artigo 1723 do Código
Civil de 2002, tem-se: “Art. 1723 É reconhecida como entendida familiar à
união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública,
contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.
(BRASIL, Lei Federal n.º 10.406/2002).” Nesse sentido, a união estável nada
mais é do que uma união entre homem e mulher com o intuito de constituir
família, através da união pública, contínua e duradoura.
Prevista constitucionalmente como entidade familiar e presente no Direito das Famílias, a união estável também possui seus efeitos patrimoniais, os quais consistem nas consequências que o instituto traz economicamente aos companheiros, os direitos adquiridos por serem contraentes desse tipo de vínculo. São efeitos patrimoniais decorrentes da união estável: alimentos, regime e administração de bens, patrimônio comum e os direitos sucessórios em geral. (Daniela de Souza Ferraz Lima e Leonardo Barreto Ferraz Gominho, em Artigo intitulado “Os direitos sucessórios na união estável: a inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil pátrio, publicado em fevereiro de 2017 no site jus.com.br/artigos, acessado em 31.05.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Para os autores Guimarães e Mezzalira, quanto para a maior parte da doutrina, a união estável é fato jurídico. Hélio Borghi entende que é contrato (Casamento & União estável: formação, eficácia e dissolução. 2ª ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2005, p. 31 e ss). União estável é, no entanto, ato jurídico lícito que exige a capacidade de ter “intuito de constituir família”.
Não exige idade mínima nem capacidade civil pois o Código nada menciona sobre a capacidade civil dos companheiros, além de permitir que ao companheiro a condição de curador do outro (CC 1.775). A questão é polêmica. Há manifestações na doutrina e na jurisprudência no sentido de se exigir a capacidade civil dos companheiros para efeito de constituição de união estável (cf. Belmiro Pedro Welter, op. cit., p. 100, para quem aplicam-se os limites etários previstos para o casamento. Hélio Borghi entende aplicável o limite de 16 nos, por ser a união estável um contrato, p. 64).
(...)
Se o “enfermo mental sem o necessário discernimento para os atos
da vida civil” (CC 1.548, I) não pode contrair núpcias, sob pena de nulidade,
pela mesma razão não poderá conviver em união estável, a qual, neste caso,
jamais será convertida em casamento. A adoção de entendimento diverso, data
venia, contrariaria o próprio espirito da Constituição Federal, a qual foi
expressa ao determinar a facilitação da transmutação da união estável em
casamento.
A lei civil exige, como requisito da validade tanto dos negócios
jurídicos, quanto dos atos jurídicos – no que couber -, a capacidade civil (CC
104, 166 e 185).
Não só pela impossibilidade de constatar-se o intuito de constituir família, mas também sob a perspectiva das obrigações que naturalmente emergem da convivência em união estável, tem-se que o incapaz, sem o necessário discernimento para os atos da vida civil, não pode conviver sob tal vínculo. (STJ, 3ª Turma, REsp. n. 1.201.462-MG, Rel. Min. Massami Uyeda, j. 14.04.2011).
O instituto está previsto no § 3º do art. 226 da Constituição da República, que reconheceu a união estável entre homem e mulher como entidade familiar e, como tal, merecedora de proteção legal. A previsão constitucional levou à elaboração das Leis n. 8.971/94 (revogada) e n. 9.278/96 (derrogada). A sede principal de regulamentação da união estável é o Código Civil.
A inovação constitucional foi precedida pela gradual e crescente regulamentação das chamadas uniões livres, conforme o quadro seguinte:
Evolução normativa |
Ano |
Ato normativo |
Efeitos |
|
Direito Romano |
O convívio more uxório foi, durante um longo período, uma
das formas de se contrair o casamento, conhecido como usus e
correspondente à posse de estado de casado. |
|
Ord. Filipinas |
Livro IV, Título 92. |
1912 |
Decreto n. 2.681 |
Dispõe sobre responsabilidade civil das estradas de ferro. Assegurou
à concubina direito à indenização por morte do companheiro (art. 22) |
1919 |
Decreto n. 3.724 |
Dispõe sobre acidentes de trabalho. Assegurou indenização a
todos os dependentes da vítima, em caso de falecimento. |
|
|
Permitia a ação de investigação de paternidade se ao tempo da
concepção a mãe estivesse estado concubinada com o pretendido pai (art. 363,
I); proibia doações e atribuição de herança ao concubino (arts. 248, 1.177 e
1.719, III). |
1931 |
Decreto n. 20.465 |
Assegurou benefícios previdenciários à concubina |
1944 |
Decreto n. 7.036 |
Lei de Acidentes de Trabalho (revogado pela Lei n. 6.367/76 –
art. 21, parágrafo único: concedeu indenização à concubina por morte
resultante de acidente de trabalho. |
1963 |
Lei n. 4.242 |
Regulamenta o Imposto de Renda. Permitiu abater despesas com a
companheira. |
1973 |
Lei n. 6.015 |
Art. 57, § 2º: permitiu a adoção do patronímico do concubino em
relação ao qual houvesse impedimento matrimonial. |
1979 |
Lei n. 6.649 |
Lei do Inquilinato. Permitiu continuassem a locação às pessoas
que residissem com o locatário sob sua dependência econômica (art. 12) |
1988 |
Constituição da República |
Reconheceu a união estável como entidade familiar. |
|
|
Institui a Impenhorabilidade do Bem de Família. Permite a
proteção do bem de família de companheiros. |
|
|
Regulamentou a Previdência Social. Atribuiu a condição de
beneficiário do Regime Geral de Previdência Social ao companheiro. |
|
|
Estabeleceu os requisitos para a caracterização da união
estável; criou os direitos dos companheiros a alimentos e à sucessão. |
1996 |
Lei n. 9.278 |
Caracterizou a união estável; estabeleceu a presunção de
“condomínio” entre os companheiros. |
2002 |
Código Civil |
Caracterizou a união estável e o concubinato; estabeleceu os
impedimentos para a união estável; regulou os alimentos, a sucessão do
companheiro e o regime de bens da união estável; permitiu a instituição de
bem de família voluntário em benefício da união estável (CC 1.711) |
O CC 1.723 estabelece os elementos constitutivos da união estável:
a) Publicidade;
b) Continuidade;
c) Durabilidade.
Não foi estabelecido um tempo mínimo. Alguns autores entendem deva ser de, pelo menos, 2 anos, com base no prazo que a Constituição estabelece para o divórcio direito. O TJMG já admitiu como união estável relacionamento de 2 anos, mas com apenas 6 meses de coabitação.
d) Intuito de constituir família (convivência more uxório); A coabitação não é necessária (TJMG, Ap. Cível 1.0024.97.070.578-6-MG, rel. Des. Almeida Melo, j. 24.6.2004; STJ, REsp n. 474.962-SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Dj 01.03.2004, p. 186; TJMG, ap. Cível 1.0024.02.626.004-2-MG, Rel. Des. Edgard Penna amorim, j. 26.08.2004; TJMG, Ap. Cível. 000.283.677-3, Rel. Des. Wander Marotta, j. 12.08.2002).
A dispensa da coabitação deve, no entanto, ser tomada com extrema cautela, pois ela é o maior indício do intuito de constituição de família. O CC 1.569 exemplifica casos em que a coabitação é dispensável no casamento e deve ser aplicado por analogia.
e) Exclusividade – O § 1º do CC 1.723 permite a união estável de pessoa casada, desde que separada de fato ou judicialmente. O CC 1.643, V, impede o cônjuge de reivindicar bens “transferidos” ao “concubino”, se ocorrer separação de fato superior a 5 anos.
(...) (Luiz
Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários
ao CC 1.723, acessado em 31/05/2021, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).