quarta-feira, 22 de maio de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 356, 357, 358 e 359 Da Dação em Pagamento – VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 356, 357, 358 e 359
Da Dação em Pagamento – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título III – DO ADIMPLEMENTO E EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES
 (art. 304 a 388) Capítulo V – Da Dação em Pagamento –
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 356. O credor pode consentir em receber prestação diversa da que lhe é devida.

Senão, veja-se, seguindo o parecer de Bdine Jr. que, ao contrário do art. 995 do Código revogado, o presente dispositivo admite a dação em pagamento mesmo nas dívidas que não sejam em dinheiro – embora tal providencia já fosse admitida, pois se insere nos limites da autonomia privada. A dação implica extinção da obrigação originalmente contraída pelo devedor mediante concordância do credor em receber outra prestação, distinta da convencionada: por exemplo, aceita receber em serviços prestados pelo devedor, que lhe devia dinheiro ou concorda em dar quitação de dívida de dinheiro ao receber um quadro de um pintor consagrado.

Sob o enfoque de Bdine Jr., não há contradição entre este dispositivo e o art. 313, porque não se trata de obrigar o credor a receber prestação diversa da estipulada, mas sim de contar com seu consentimento na entrega de prestação diversa, o que inclui a dação em pagamento entre negócios jurídicos bilaterais – conjugação das vontades destinada a extinguir direitos de natureza patrimonial. A aceitação do credor é essencial à validade da dação. Distingue-se da novação, porque acarreta o adimplemento da prestação, diversamente desta última, em que nova obrigação ainda não adimplida substitui a anterior, igualmente não cumprida. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 369 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/05/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Seguindo a doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, tem-se que a dação em pagamento, também chamada datio in solutum pelos romanos, é o acordo liberatório feito entre o credor e o devedor, em virtude do qual consente ele em receber coisa que não seja dinheiro, em substituição à prestação que lhe era devida – aliud pro alio.

Também que a dação pode ter por objeto qualquer tipo de prestação, positiva (dar e fazer) e negativa (não fazer), bens móveis e imóveis, direitos reais ou pessoais, cessão de crédito etc., contudo não se pode confundir dação e novação, porque esta substitui a obrigação por outra, enquanto aquela extingue definitivamente a obrigação. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 197, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/05/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Encontra-se em direito.com, em 22/05/2019, o que pose ser considerado uma síntese dos dois comentários acima, que os completa. No site temos que, desde que o credor consinta, pode haver a substituição da coisa a ser entregue por outra, por meio da transferência de propriedade de bem móvel ou imóvel (efeito translatício esse que se dá pela tradição ou pelo registro de título aquisitivo, respectivamente). Esse negócio, então, de caráter translativo oneroso, exige uma dupla capacidade das partes: a capacidade de dispor da coisa pelo devedor (ius disponendi) e a capacidade de dar o consentimento necessário à substituição da coisa a ser entregue pelo credor. São requisitos da dação em pagamento: (i) a existência de uma dívida, (ii) o consentimento do credor; e (iii) a entrega de coisa diversa da devida, visando à extinção da dívida.

Explica que a coisa a ser entregue pode ser tanto um móvel quanto imóvel, corpóreo ou incorpóreo ou até mesmo um direito (ex.: usufruto). A coisa dada em pagamento deve ter uma existência atual, dado que, se versar sobre compromisso de entregar algo no futuro, implicará na criação de uma nova obrigação, configurando a novação da dívida, caso a obrigação original seja extinta e substituída. A coisa também deve ser efetivamente diversa da coisa originalmente devida, não se configurando dação em pagamento a utilização de meios de pagamento (entrega de cheque, crédito em conta corrente).

E que a dação em pagamento pode se dar pela substituição de uma coisa por dinheiro (rem pro pecúnia), de uma coisa por outra coisa (rem pro re), de uma coisa por um fato (rem pro facto), de um fato por outro fato etc.

Finalmente, que a dação em pagamento pode referir-se apenas à quitação parcial da dívida. (Direito.com acesso em 22.05.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 357. Determinado o preço da coisa dada em pagamento, as relações entre as partes regular-se-ão pelas normas do contrato de compra e venda.

Há aqui uma inversão das partes no contrato. Segundo Bdine Jr., são as regras da compra e venda que incidem sobre os casos em que as partes estabelecem o preço do bem dado em pagamento. Assim, o negócio da dação será uma compra e venda, em que o devedor ocupa a posição do vendedor e o credor, a do comprador.

Se não houver indicação de valor específico do bem dado em pagamento, mas houve intenção de dar em pagamento e aceitação do bem, será imperioso o reconhecimento da quitação, só sendo possível prevalecer eventual saldo se as partes convencionarem a respeito. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 371 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/05/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em seguida dois comentários quase desiludidos. Um em relação à equiparação entre a dação em pagamento e a compra e venda após a definição do preço, sem, no entanto, existir identidade. A dação em pagamento, segundo Guimarães e Mezzalina, não é um contrato, mas sim uma modalidade específica de solução, com efeitos liberatórios ao devedor. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 22.05.2019), o segundo comentário, refere-se ao parecer de Ricardo Fiuza, sobre não ter sido o dispositivo em exame, atingido por nenhuma espécie de modificação, seja da parte do Senado Federal, seja da parte da Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto. Trata-se, segundo ele, de mera repetição do art. 996 do Código Civil de 1916, sem qualquer alteração, nem mesmo de ordem redacional. O dispositivo, esclarece, só tem aplicação quando o objeto da dação consistir na entrega da coisa, móvel ou imóvel, corpórea ou incorpórea, e cujo preço se equivalha à coisa contratada inicialmente de acordo com os contratantes. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 198, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/05/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 358. Se for título de crédito a coisa dada ao pagamento, a transferência importará em cessão.

Seguindo a esteira de Guimarães e Mezzalina, há, nesse caso, uma cessão de crédito, dado que, na entrega do título de crédito, há uma transferência da qualidade creditícia do devedor ao credor em determinada relação jurídica (datio in solutum). Assim, o credor poderá exigir de terceiro a prestação incorporada no título.

Observa-se que a entrega de título de crédito ao credor, em que o próprio devedor está no polo passivo da obrigação, não representa uma dação em pagamento, mas simples meio de pagamento (datio pro solvendo – não há sub-rogação de obrigações; a primeira só é extinta com o cumprimento da segunda) ou novação de débito. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 22.05.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Ricardo Fiuza, importando a transferência em cessão do crédito dado em pagamento, resulta a observância do disposto nos arts. 290 a 295 deste Código. Assim, a operação deve ser notificada ao devedor e quem fez a dação fica responsável pela existência do crédito. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 198, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/05/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

O parecer de Bdine Jr., estende-se um tanto mais, ao comentar outros autores, esclarecendo este artigo tratar das hipóteses em que o título de crédito é de emissão do próprio devedor. Citando Renan Lotufo, que, embora pareça, não se trata de uma novação, pois a nova obrigação subsiste ao lado da antiga, “servindo a mais recente como forma mais rápida de realização do crédito” (Código Civil comentado. São Paulo, Saraiva, 2003, v. II, p. 335).

Se o título dado em pagamento houver sido emitido por terceiro, a afirmação de que se trata de cessão de crédito significa que a transferência do título de crédito não se sujeita às regras cambiárias do endosso. Assim, o portador não pode valer-se da inoponibilidade das exceções pessoais ao terceiro de boa-fé, pois, regendo-se a relação jurídica pela cessão de crédito, serão oponíveis ao portador – cessionário do título por força da dação em pagamento -, as mesmas exceções de que ele dispunha contra o credor originário até que venha a ter conhecimento da transferência (art. 294).

Observa ainda Bdine Jr., que isso só se verifica porque a entrega do título pelo devedor ao credor configurou cessão, e não endosso, nos termos do dispositivo ora em exame. O comentário ao art. 294 é pertinente à interpretação e aplicação do presente dispositivo. Maria Helena Diniz observa que, nessa hipótese, o cedido deve ser notificado, de acordo com o disposto no art. 290, e o devedor fica responsável pela existência do débito dado em pagamento (art. 295) (Curso de direito civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2002, v. II, p. 270). A autora conta com a concordância de Judith Martins-Costa (Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. V, t. I, p. 497). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 371-372 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/05/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 359. Se o credor for evicto da coisa recebida em pagamento, restabelecer-se-á obrigação primitiva, ficando sem efeito a quitação dada, ressalvados os direitos de terceiros.

Na visão de Guimarães e Mezzalina, com a anulação da quitação, restabelece-se a obrigação primitiva, inclusive no tocante às respectivas garantias. Tanto a evicção total, como a parcial têm o condão de anular por inteiro a quitação conferida ao débito. Afinal, segundo Pereira, “vindo a perder uma parte dela, não pode o credor ser compelido a aceitar a parte não evicta como solução parcial”. (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, op. cit., p. 238) (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 22.05.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Explica Bdine Jr., que a evicção está disciplinada nos arts. 447 a 457 deste Código. Se ela se verificar quanto ao bem entregue em dação, as consequências não serão as previstas no art. 450, mas sim a sua desconsideração, para que se restabeleça a obrigação primitiva. Com isso, as consequências do inadimplemento desta é que serão impostas aos inadimplentes, e não as que da evicção decorreram.

O autor ensina que a incidência das demais disposições da evicção à dação é reconhecida neste dispositivo, de maneira que o devedor que adimplir sua prestação por intermédio da dação pode pactuar reforço, diminuição ou exclusão da responsabilidade (art. 448), sujeitando-se, nesse caso, ao disposto no art. 449. Também poderá optar entre o restabelecimento da obrigação primitiva e sua quitação parcial, se a evicção for parcial, tendo em vista o disposto no art. 455. Finalmente, poderá proceder à denunciação por saltos aos anteriores proprietários do bem e deixar de resistir à ação do evictor, se o devedor que lhe deu o bem em pagamento não atender à denunciação (arts. 455 e ss). (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 373 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/05/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Inicia o maestro Ricardo Fiuza, conceituando Evicção, como a perda da coisa por decisão judicial proferida em ação de reivindicação proposta pelo legítimo dono. Vide comentários aos arts. 447 a 457 deste Código. E menciona Carvalho de Mendonça, citado por Beviláqua, que resume com maestria a situação: “Se a dação é uma forma de pagamento, não se compreende que este se possa fazer senão de modo a libertar o devedor e satisfazer, plenamente, os interesses do credor. Ora, se o que ele prestou não era seu, não se pode ver de que modo ele possa se exonerar. Por outro lado, se o credor pode ser ainda incomodado por terceiro, se aquilo que recebeu como uma prestação, que lhe era devida, deixa de o ser, de fato, a que ficaria reduzido o seu direito creditório” (Código Civil comentado, cit., p. 160). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 198, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/05/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 21 de maio de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 354, 355 Da Imputação do Pagamento – VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 354, 355
Da Imputação do Pagamento – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título III – DO ADIMPLEMENTO E EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES
 (art. 304 a 388) Capítulo IV – Da Imputação do Pagamento –
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Art. 354. Havendo capital e juros, o pagamento imputar-se-á primeiro nos juros vencidos, e depois no capital, salvo estipulação em contrário, ou se o credor passar a quitação por conta do capital.

No entendimento de Ricardo Fiuza, tratando-se de exceção à regra geral de que a imputação pressupõe a existência de dois ou mais débitos a um só credor, aqui existe apenas uma única dívida, vez que os juros constituem mero acessório.

E cita a bem colocada palavra de João Luiz Alves, “devendo capital e juros, não pode o devedor forçar o credor a imputar pagamento no capital, antes de pagos os juros vencidos, porque de outro modo prejudicaria ao credor, desde que pagando o capital, o priva da respectiva renda. Assim o pagamento, salvo acordo, se imputa primeiro nos juros vencidos e exigíveis e depois no capital” (Código Civil anotado, Rio de Janeiro. E. Briguiet, 1917, p. 670).

Os juros podem ser compensatórios ou moratórios. Ressalta Beviláqua “quando houver mais de uma dívida vencendo juros, e o devedor puder, por serem elas vencidas e líquidas, escolher qual deve ficar extinta, é claro que não se imputa nos juros das outras dívidas, o pagamento destinado a uma dívida determinada com os juros respectivos” (Beviláqua, Clóvis. Código Civil comentado, cit., p. 156) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 197, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/05/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na orientação de Bdine Jr., a regra não exclui, como se vê, que as partes ajustem que o pagamento do capital se dará antes dos juros. Desse modo, somente quando o devedor não fizer a imputação, nem houver imputação expressa feita pelo credor com aceitação do devedor (art. 352) este dispositivo terá incidência. O dispositivo só incide nos casos em que as dívidas a serem pagas sejam o próprio capital e os juros respectivos. Não incide quando se tratar de juros de determinada dívida e capital de outra, mas é certo que esse caso pode sujeitar-se à incidência analógica ou subsidiária deste artigo. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 365 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 20/05/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

O comentário encontrado a respeito do art. 354 do Código Civil, em Direito.com., no dia 20.05.2019, diz ser direito do credor que a quitação parcial do débito imputado se dê, primeiramente, na parcela tocante aos juros vencidos, salvo se convencionado de forme diversa entre as partes ou se houver quitação pelo capital.

Art. 355. Se o devedor não fizer a indicação do art. 352, e a quitação for omissa quanto à imputação, esta se fará nas dívidas líquidas e vencidas em primeiro lugar. Se as dívidas forem todas líquidas e vencidas ao mesmo tempo, a imputação far-se-á na mais onerosa.

O dispositivo trata da modalidade da imputação legal ao pagamento, aplicável aos casos em que nenhuma das partes haja efetuado a escolha do débito a ser quitado, segundo comentário encontrado na página de direito.com, em 20.05.2019, assim, na omissão de ambos os sujeitos da obrigação, considerar-se-ão quitadas as dívidas líquidas e vencidas anteriormente; e, se todas tiverem qualidades idênticas nesse aspecto, primeiro as mais onerosas (ilustrativamente, aquelas com juros incidentes de valor maior, as que estejam sujeitas à cláusula penal). Por fim, se todas forem, igualmente, onerosas, serão imputadas a pagamento as mais antigas em primeiro lugar. Esta era a solução do Código Comercial de 1850 (art. 433), bem como a que o Direito Romano apontava. (Direito.com acesso em 20.05.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

O dispositivo, como sua primeira parte revela, incide sobre os casos em que nem o devedor, nem o credor fazem a imputação. Não havia necessidade de dizer que o pagamento compreenderia as dívidas líquidas e vencidas, pois isso já resulta da interpretação da parte final do art. 352. Bdine Jr., magistralmente, nos mostra que o legislador, porém, quis eliminar a possibilidade de se sustentar que a dívida mais onerosa não vencida pudesse ser considerada quitada antes daquela, menos onerosa, mas já vencida, resultando daí, ter o credor direito de considerar quitadas as dívidas vencidas e líquidas antes das não vencidas ou ilíquidas, a despeito da maior onerosidade, como, aliás, revela o art. 352, que só contempla a imputação de dívidas vencidas e líquidas. Anote-se que as partes podem, livremente, estabelecer o contrário (ver comentário ao art. 352), mas esse artigo dispõe sobre os casos em que nada é convencionado a respeito. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 368 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 20/05/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

A imputação legal, como nos ensina Ricardo Fiuza, tem lugar na ausência de indicação expressa do devedor ou do credor. Assim, far-se-á a imputação: a) por conta da dívida líquida em concorrência com outra ilíquida; b) na concorrência de dívidas igualmente líquidas, por conta da que for mais onerosa e c) havendo igualdade na natureza dos débitos, imputar-se-á o pagamento da dívida vencida em primeiro lugar. Ainda segundo Fiuza, o dispositivo aprimora a redação do art. 994 do Código Civil de 1916, ao substituir a expressão “dívida mais antiga” por “dívida vencida em primeiro lugar”. No direito anterior havia a dúvida se “mais antiga” seria a de origem mais remota ou a que primeiro vencesse, conclui. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 197, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/05/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 20 de maio de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 352, 353 Da Imputação do Pagamento – VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 352, 353
Da Imputação do Pagamento – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título III – DO ADIMPLEMENTO E EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES
 (art. 304 a 388) Capítulo IV – Da Imputação do Pagamento –
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Art. 352.  A pessoa obrigada por dois ou mais débitos da mesma natureza, a um só credor, tem o direito de indicar a qual deles oferece pagamento, se todos forem líquidos e vencidos.

A imputação ao pagamento, no entendimento de Guimarães e Mezzalina, é a faculdade que a lei confere ao devedor de, havendo mais de uma obrigação de natureza fungível a um mesmo credor, qual das dívidas pretende satisfazer. Tal direito, inclusive, é extensível aos terceiros que pagam a dívida do devedor, quando a lei assim lhes permitir. São, assim, requisitos da imputação ao pagamento: (i) diversidade de débitos; (ii) identidade de sujeitos (mesmos devedores e face de mesmos credores); (iii) dívidas de mesma natureza líquidas e exigíveis; e (iv) a prestação oferecida deve ser em valor suficiente a quitar algum dos débitos, dado que o credor não é obrigado a receber pagamento parcial.

Segundo os autores citados, o devedor pode se recusar a receber dívida ilíquida e não exigível. No entanto, as dívidas com termo não vencido estipulado em favor do devedor podem ser imputadas a pagamento, dado que tal ato seria encarado como renúncia do devedor a determinado privilégio. De outro lado, caso o termo seja fixado em benefício do credor, não poderá o devedor dele dispor, permanecendo o débito inimputável. Igualmente, as dívidas condicionais são inimputáveis antes do implemento da condição suspensiva.

No mesmo diapasão, é ato bilateral a imputação a pagamento convencional, unilateral nas hipóteses dos artigos 352 e 353 e legal no caso do artigo 355.

Súmula STJ 464. A regra da imputação a pagamento estabelecida no art. 354 do Código Civil não se aplica às hipóteses de compensação tributária” (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 19.05.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Imputação do pagamento: Ricardo Fiuza, traz os ensinamentos de Pothier, que por sua vez, citava Ulpiano, que “o devedor, quando paga, tem o direito de declarar qual é a dívida que está pagando, dentre todas as que ele tem” Tratado das obrigações, cit., p. 498). A essa operação, pela qual o devedor de várias dívidas a um mesmo credor, ou o próprio credor em seu lugar, diante da insuficiência do pagamento para saldar todas elas, declara qual das dívidas estará sendo extinta, denomina-se imputação do pagamento. Carvalho Santos, em síntese copiada, diz apenas ser “o ato pelo qual o devedor, de mais de uma dívida da mesma natureza, a um só credor, escolhe qual delas quer extinguir (Cfr. Vampré. Manual de Direito Civil, vol. 2, § 150)” (J. M. de Carvalho Santos, Código Civil brasileiro interpretado, v. 13, cit., p. 111).

Requisitos da Imputação: a) Existência de duas ou mais dívidas, liquidas e vencidas, de um só devedor para com um só credor; b) idêntica natureza das dívidas. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 196, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 19/05/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo na esteira de Bdine Jr., imputação do pagamento é a indicação de qual entre mais de um débito líquido e vencido com o mesmo credor está sendo pago. Para que seja possível e necessário imputar o pagamento, aos necessários os requisitos seguintes: a) que existam dois ou mais débitos; b) que esses débitos tenham a mesma natureza; c) que o credor seja o mesmo; e d) que todos sejam líquidos e vencidos.

É possível, segundo ele, deduzir que os débitos que dependem de imputação devem ser da mesma natureza, líquidos e vencidos, porque, em caso contrário, não há risco de dúvida sobre qual deles está sendo pago. Assim, se uma obrigação é de dar e a outra de fazer, certamente não há dúvida de que a primeira conduta não pode significar o adimplemento da segunda obrigação. O mesmo pode ser dito se somente uma das obrigações se venceu ou está liquidada.

Na observação de Bdine Jr., o dispositivo não repetiu a parte final do art. 991 do Código Civil de 1916, que admitia a imputação da dívida ilíquida ou não vencida, desde que o credor concordasse com isso. Contudo, tal procedimento ainda parece válido e possível, na medida em que se insere no limite de disponibilidade de direito das partes (autonomia privada).

É certo, porém, que deve haver ajuste expresso nesse sentido, explica o autor, sem possibilidade de presunção, ou de imposição do credor, o que acarretaria abuso de direito (art. 187). Haveria tal abuso, por exemplo, se a instituição financeira incluísse em determinado contrato que os pagamentos efetuados pelo mutuário seriam primeiro destinados a quitar a dívida ainda não vencida, mas com juros reduzidos – porque subsidiados, por exemplo -, em lugar da quitação de outro débito vencido, mas com maior taxa de juros – como cheque especial. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 362-363 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 19/05/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 353. Não tendo o devedor declarado em qual das dívidas líquidas e vencidas quer imputar o pagamento, se aceitar a quitação de uma delas, não terá direito a reclamar contra a imputação feita pelo credor, salvo provando haver ele cometido violência ou dolo.

Buscado na página de Direito.com, em 19/05/2019, encontrou-se que, não exercendo o devedor o direito à imputação ao pagamento na forma do artigo precedente, a faculdade transfere-se ao credor. Não poderá o devedor reclamar da escolha do credor, uma vez que este tenha lhe conferido quitação do débito, inclusive na hipótese de a opção ter-lhe gerado prejuízo. Eventuais perdas, nesse tocante, decorrem de omissão própria do devedor, com as quais deve arcar, exceto se comprovar que a ausência de imputação decorreu de conduta maliciosa, com violência ou dolo do credor. (Direito.com acesso em 19.05.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No parecer de Ricardo Fiuza, compete ao devedor imputar o pagamento a uma das dívidas líquidas, certas e vencidas que possui junto ao credor. No ato do pagamento, deve ele declarar qual das dívidas pretende quitar. Se não o fizer e aceitar a imputação feita pelo credor, não poderá reclamar a posteriori, a não ser provando que o credor agiu com dolo ou violência.

Afirma Fiuza, o dispositivo haver sido praticamente copiado do Código Civil francês (“art. 1.255. Lorsque te débiteur de diverses dettes a accepté une quittance par laquelle le créancier a imputé ce qu’il a reçu sur Pune de ces dettes spécialement, le débiteur ne peut plus demander l’imputation sur une dette diference, à moins qu'ti n'y ait eu dol ou surprise de la part du créancier”). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 196, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 19/05/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Bdine Jr., há de verificar-se que a imputação será feita pelo credor se estiverem presentes dois requisitos: a) o devedor quita e não indica qual das dívidas quer saldar; e b) o devedor aceita a quitação de uma delas oferecida pelo devedor. assim, se o devedor não aceita a quitação de determinada dívida e exige a de outra, estará, a rigor, fazendo ele próprio a imputação. Se, no entanto, aceitar a quitação de uma dívida que não lhe convém, só poderá reclamar da imputação se demonstrar violência ou dolo do credor.

A restrição do artigo às hipóteses de violência ou dolo, contudo, não exclui o reconhecimento de outros defeitos do negócio jurídico, ainda que se considere que a quitação é ato jurídico lícito, por força do disposto no art. 185 deste Código. Dessa forma, também o erro poderá autorizar a reclamação, desde que identificados os requisitos do art. 138 do Código Civil. Por exemplo, o credor de uma indenização por dívida decorrente de redução de capacidade de trabalho imputa o pagamento nas pensões mensais que o réu lhe deve, e este a aceita, porque supõe que se trata de dívida de alimentos, cujo não pagamento autoriza a prisão do inadimplente. No entanto, os juros incidentes sobre a indenização dos danos materiais e morais são os da taxa Selic – porque assim foi estabelecido na decisão judicial -, de maneira que lhe seria mais conveniente quitar os juros vencidos até o momento, e não as pensões mensais mais recentes – até porque, admita-se, os juros mais recentes da taxa Selic são mais reduzidos. Na hipótese aventada, teria havido erro de direito do devedor, que poderia reclamar da imputação aceita, ainda que não havendo dolo ou violência. A coação e o dolo estão contemplados no presente artigo.

Ainda seguindo sob orientação de Bdine Jr., se ocorrerem os demais defeitos tipificados na Parte Geral – fraude contra credores e simulação -, não encontrarão obstáculo no presente dispositivo, porque o destinatário da norma é apenas o devedor, e não há limitações impostas a terceiros, como são as vítimas de fraude ou simulação. Não se diga que a imputação é negócio unilateral, pois o próprio dispositivo cuida de ressalvar a necessidade de aceitação dela pelo devedor. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 363-364 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 19/05/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).