Direito Civil Comentado - Art. 743, 744,
745 – continua
- DO TRANSPORTE DE
COISAS - VARGAS, Paulo S. R.
Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI
– Das Várias Espécies de Contrato
(art. 481 a 853) Capítulo XIV – Do Transporte
– Seção III
Do
Transporte de Coisas - (art. 743 a 756)
vargasdigitador.blogspot.com -
Art.
743. A
coisa, entregue ao transportador, deve estar caracterizada pela sua natureza,
valor, peso e quantidade, e o mais que for necessário para que não se confunda
com outras, devendo o destinatário ser indicado ao menos pelo nome e endereço.
Vivenciando Claudio Luiz Bueno de Godoy, no contrato de transporte
de coisas, o transportador as recebe do expedidor ou remetente para entregá-las
ao destinatário ou consignatário. Impende que a coisa recebida esteja
devidamente especializada, identificada, individuada, a fim de que não seja
confundida com outras, conforme a lei determina. A ideia é a de que seja sempre
reconhecível a coisa – e suas condições – entregue ao transporte, para perfeita
execução e eficácia do contrato, ademais de viabilizar a concreta
responsabilidade do transportador. Por isso, exige-se que a mercadoria a ser
transportada, além de ser devidamente acondicionada, sob pena de se poder
rejeitar seu deslocamento (CC 764), venha a ser caracterizada, com indicação de
natureza, peso, valor e quantidade, também para servir à sua identificação.
Em diversos termos, objeto passível de transporte é a coisa
identificável, mercê de dados que, como se verá nos comentários ao artigo
seguinte, serão aludidos no conhecimento de transporte, sem prejuízo de o
transportador exigir sua relação escrita e assinada.
Por isso, afeta ao expedidor
o dever mesmo de declarar os dados de identificação da mercadoria, até como
forma de se estabelecer a exata responsabilidade do transportador pelos danos
que sejam causados à coisa, além de evitar qualquer fraude do remetente, de
resto como já se continha no art. 5º do Decreto n. 2.681/12. Da mesma forma, o
expedidor deve especificar quem seja o destinatário, ao menos indicando seu
nome e endereço. Nada impede que o destinatário seja o próprio expedidor. (Claudio Luiz
Bueno de Godoy, apud Código Civil
Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord.
Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 766 - Barueri, SP:
Manole, 2010. Acesso 22/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Há um histórico: Este artigo corresponde ao art. 749 do Projeto de
Lei n. 634/75, que utilizava a palavra “condutor”, trocada por “transportador”,
conforme subemenda do Relator-Geral Ernani Satyro, na Câmara, na primeira fase
de tramitação do projeto. Não há paralelo no Código Civil de 1916.
Para a doutrina de Fiuza, no contrato de transporte de coisas
participam o remetente ou expedidor – pessoa que entrega a coisa a ser
transportada – e o transportador – pessoa que recebe a coisa, obrigando-se a
transportá-la. o destinatário ou consignatário é a pessoa a quem é destinada a
coisa. As vezes o expedidor é ao mesmo tempo, destinatário, como no caso em que
o remetente envia coisas em seu próprio nome, de um lugar para outro.
A descrição ou especificação da coisa transportada é necessária,
para que não se confunda com outras. Para tanto, deve estar caracterizada pela
sua natureza, valor, peso, quantidade e o que mais for preciso para determinar
sua identificação. O destinatário deve estar indicado, ao menos, pelo nome e
endereço, podendo constar outros dados, como nacionalidade, estado civil,
número de carteira de identidade, inscrição na Junta Comercial, número no
cadastro de pessoas jurídicas etc. (Direito Civil -
doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 392 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/01/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Para Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira, o transporte exige que a coisa transportada seja
infungível, pois o transportador deve levar ao destino os mesmos bens que
recebeu para transportar. A infungibilidade decorre da caracterização da coisa,
sendo sua natureza, peso, quantidade e outras características necessárias à sua
individuação. Igualmente, o destinatário deve ser indicado com seu nome e
endereço. Tal individuação visa ao cumprimento do contrato de transporte,
porque quem contrata é o expedidor. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 22.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art.
744. Ao
receber a coisa, o transportador emitirá conhecimento com a menção dos dados
que a identifiquem, obedecido o disposto em lei especial.
Parágrafo
único. O transportador poderá exigir que o remetente lhe entregue, devidamente
assinada, a relação discriminada das coisas a serem transportadas, em duas
vias, uma das quais, por ele devidamente autenticada, ficará fazendo parte
integrante do conhecimento.
Na
pauta de Claudio
Luiz Bueno de Godoy, o conhecimento de transporte, de frete ou de cargas, é o
documento que o transportador emite quando recebe a mercadoria a ser
transportada. Prova o recebimento da coisa, devidamente identificada, com os
dados mencionados no artigo anterior, tanto quanto se identificam as partes
envolvidas, assim o expedidor, o transportador e o destinatário, por fim
detalhando-se as condições do transporte, tal como o valor do frete, vale
dizer, a remuneração devida pelo deslocamento contratado.
O Código Civil remete à legislação especial porquanto, de fato,
conforme a natureza do transporte de coisas, inúmeras leis regram a expedição
ou emissão do conhecimento de transporte. Por exemplo, o Decreto n. 1.832/96
regula o transporte ferroviário e o conhecimento que dele se expede. Já o art.
235 do Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei n. 7.565/86) cuida do conhecimento
de transporte aéreo de carga, discriminando tudo quanto ele deve conter,
acrescentando o art. 240 que, por ele, se presume, de forma relativa, a
conclusão do contrato, o recebimento da carga e as condições do transporte. Mas
bem adverte o art. 226, da mesma normatização, que a falta, irregularidade ou
perda do conhecimento de carga não prejudica a existência e eficácia do
contrato de transporte, apenas que inviabilizando possa o transportador
pretender limitar sua responsabilidade em função do que dele constaria, por
exemplo no que toca ao valor da carga, sujeitando-se a eventual arbitramento.
Editada a Lei n. 11.442, de 05.01.2007, tendente a disciplinar o
transporte rodoviário de cargas em território nacional, igualmente se dispôs,
no art. 6º, sobre a prestação desse serviço sob contrato ou conhecimento de transporte,
que deve conter os dados identificativos das partes e do frete. Nada diverso do
quanto, antes, para o transporte multimodal (um único contrato de transporte,
contudo efetuado por mais de um meio), já se havia levado ao texto dos arts. 8º
e 9º da Lei n. 9.611/98. Lembre-se, porém, conforme se acentuou nos comentários
ao CC 730, que o contrato de transporte não exige forma especial, pelo que o
conhecimento não pode condicionar o seu aperfeiçoamento. Como, do mesmo modo,
não se há de olvidar da primazia do regramento geral do CC/2002 acerca do
transporte, quando confrontado com a lei especial (CC 732). Apenas que, como
está no item da jurisprudência, a seguir, ausente o conhecimento, inverte-se o
ônus de provar questões afetas ao conteúdo da mercadoria transportada.
Lembre-se, a propósito, conforme se acentuou já nos comentários ao
CC 730, que o contrato de transporte não exige forma especial, pelo que o
conhecimento não condiciona seu aperfeiçoamento. O conhecimento de transporte
sempre foi considerado um título de crédito, desde o Decreto n. 19.473/30, que
regulamentava os conhecimentos de transporte de mercadorias por terra, água ou
ar, depois alterado pelos Decretos n. 4.938/42 e Decreto n. 90.959/85, o
chamado Regulamento Geral dos Transportes. São títulos impróprios, por que
representativos das mercadorias, mas dotados, se não emitidos com a respectiva
proibição, portanto com a cláusula não à ordem, da possibilidade de
endosso, de tal sorte que o endossatário presume-se o titular das coisas nele
discriminadas, ou, na justa advertência de Fran Martins (Contratos e
obrigações comerciais, 7. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1984, p. 252-3),
titulares do direito de receber ou retirar a mercadoria transportada.
A perda ou extravio do conhecimento enseja procedimento próprio
previsto também na lei especial, com aviso que se deve dar ao transportador,
para que retenha a mercadoria. A essa matéria se tornará quando do exame do CC
754.
Acrescenta, finalmente, o
parágrafo único, do artigo em comento, ser direito potestativo da transportador
exigir declaração assinada pelo expedidor, dando conta da discriminação das
coisas a serem transportadas. Trata-se de medida de cautela de que pode se
valer o transportador, assim garantindo-se contra o eventual transporte de
carga ilegal. Uma vez exigida e apresentada a declaração, uma de suas duas vias
passa a fazer parte integrante do conhecimento. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e
Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários
autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 767 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/01/2020.
Revista e atualizada nesta data por VD).
Para a doutrina de Ricardo Fiuza, o conhecimento de transporte,
também chamado conhecimento de frete ou conhecimento de carga, prova o
recebimento da coisa e da obrigação de transportá-la. no conhecimento, a coisa
deve estar identificada, com os dados mencionados no artigo anterior. Lei
especial deve mencionar os demais requisitos do conhecimento.
O conhecimento é documento emitido pelo transportador. Está preso
ao princípio da literalidade> o que está escrito vale e deve ser cumprido.
Os direitos e deveres das partes estão nele consignados, pelo que goza de
autonomia. E considerado título de crédito, embora improprio, representando as
coisas ou mercadorias objeto do transporte e mencionadas no documento. Em
regra, é título à ordem, e, como tal, pode ser endossado; o último endossatário
e detentor do conhecimento presume-se titular da mercadoria constante no título.
É claro, o conhecimento nominativo com a cláusula “não à ordem” não pode ser
endossado.
Para facilitar a elaboração do conhecimento e dar mais segurança à
relação entre as partes, o transportador poderá exigir que o remetente lhe
entregue, devidamente assinada, a relação discriminada das coisas que serão
transportadas, em duas vias. Uma das vias, devidamente autenticada pelo
transportador, ficará fazendo parte integrante do conhecimento. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 393 apud
Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft
Word. Acesso em 22/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Sob o prisma
de Luís
Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, “Conhecimento” ou “nota de
conhecimento” é o documento emitido pelo transportador ao expedidor, que contenha
os dados identificadores da coisa transportada, inclusive o valor dela. O valor
declarado da coisa assegura o valor a ser indenizado ao transportador em caso
de dano ou extravio, bem como o valor máximo da indenização a ser paga pelo
transportador nos mesmos casos (CC 750). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 22.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art.
745. Em
caso de informação inexata ou falsa descrição no documento a que se refere o
artigo antecedente, será o transportador indenizado pelo prejuízo que sofrer,
devendo a ação respectiva ser ajuizada no prazo de cento e vinte dias, a contar
daquele ato, sob pena de decadência.
Na
toada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, já se viu, em
primeiro lugar, até por conta da responsabilidade a ele afeta, que o
transportador pode exigir, por um lado, a devida discriminação, pelo expedidor,
das mercadorias que deverão ser transportadas, de suas condições, natureza e
características. Por outro lado, como em qualquer contrato, no transporte deve
imperar padrão ético de conduta das partes, que, pelo quanto o princípio da
boa-fé objetiva lhes impõe, na sua função supletiva, devem cuidar da devida
informação sobre o que interesse ao escorreito cumprimento da prestação.
Nesse sentido é que se refere a lei à precisa informação que deve
prestar o expedidor sobre as mercadorias a serem transportadas, inclusive de
modo que tais dados, levados ao conhecimento de transporte, sejam exatos.
Não se olvide a responsabilidade do transportador e a
possibilidade de que ele venha a experimentar algum prejuízo decorrente da
incorreção de dados fornecidos pelo expedidor e levados ao conhecimento. Não é
diferente a previsão que em lei especial já se continha, como o art. 239 do
Código Brasileiro de Aeronáutica sobre o transporte aéreo. Segundo esse
preceito, sem prejuízo de sua responsabilidade penal, o expedidor deve
responder pela exatidão das indicações e declarações constantes do conhecimento
aéreo e pelo dano que, em consequência de suas indicações ou declarações
irregulares, inexatas ou incompletas, venha a sofrer o transportador ou
qualquer outra pessoa.
Na redação de igual artigo do Código Civil de 2002, este que ora
se comenta, o problema está em que se estabelece prazo decadencial para
exercício da ação indenizatória pelo transportador que tenha experimentado
prejuízo em decorrência das informações imprecisas do remetente – fugindo à
regra geral acerca dos prazos de ação de responsabilidade, que são de
prescrição, por não envolverem direitos potestativos, estes sim, indutivos do
curso de prazo de decadência, segundo o Código Civil de 2002 – de 120 dias,
frise-se, contados, segundo a dicção legal daquele ato, sugerindo a
possível interpretação de que o termo a quo se contaria da emissão do
conhecimento.
Sucede que, mesmo havido dano diretamente oriundo dessas inexatas
informações levadas ao conhecimento, como quando o transportador seja apenado
pela incorreção, pela irregularidade das condições de peso, por exemplo, o fato
constitutivo de seu direito ressarcitório não se terá ostentado já no momento
da emissão do conhecimento. Pior, pense-se, pense-se, na exemplificação de Zeno
Veloso (Novo Código Civil comentado, coord. Ricardo Fiuza. São Paulo,
Saraiva, 2002, p. 672), no transporte de mercadoria inflamável, circunstancia
não informada, que se incendeia durante o transporte e causa dano ao
transportador.
Evidente que a ação
ressarcitória não pode ter seu prazo de propositura iniciado da expedição do conhecimento,
supondo-se até que o caso seja de prejuízo diretamente resultante da imprecisão
do conhecimento de transporte, já ao que não se acede. De toda a forma, nessas
hipóteses não se considera que o termo inicial de contagem de prazo se possa
dar antes de havido o prejuízo, cujo ressarcimento se perseguirá com a
propositura da demanda indenizatória. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 768 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 22/01/2020. Revista e
atualizada nesta data por VD).
Com a Doutrina de Ricardo Fiuza, o transporte, como qualquer
contrato, é regido pelos princípios de probidade e boa-fé (CC 422). Se o remetente
apresenta ao transportador a relação das mercadorias com informação inexata ou
falsa descrição destas, o transportador será indenizado pelo prejuízo que
sofrer, devendo a ação respectiva ser ajuizada no prazo de cento e vinte dias,
a contar da data em que ocorreu o dano, sob pena de decadência.
Para exemplificar, imagine-se o caso de a mercadora ser altamente
inflamável, ou de ser facilmente deteriorável, e essas circunstâncias terem
sido omitidas pelo remetente, ou, o que é mais grave, terem sido prestadas
falas informações a respeito, e, no percurso, por causa dessas qualidades,
ocorrer incêndio no navio, no trem, no caminhão etc., ou aparecer estragado ou
contaminado o restante da carga. (Direito Civil -
doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 393 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 22/01/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Explicam Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, em que
situações um transportador pode sofrer prejuízo por informações inexatas do
expedidor. Em regra, somente ao indenizar o expedidor valor superior ao que
deveria indenizar, em virtude de se ter baseado em falsas informações prestadas
pelo expedidor. O dispositivo é pouco operativo, pois, se o transportador
discordar do valor declarado pelo expedidor após a perda do bem ele deixará de
efetuar o pagamento e, logo, a ação de cobrança competirá ao expedidor. O prazo
de 120 dias fica, em última instância, na dependência de ação do expedidor. A
rigor, no entanto, não há o menor sentido em se limitar do tempo o direito do
transportador de provar que o valor da mercadoria transportada não corresponde
ao valor declarado. Em suma, o dispositivo atenta contra a razoabilidade e, ao
impedir a restituição integral do dano é inconstitucional. (Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 22.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).