Art. 1.824. O
herdeiro pode, em ação de petição de herança, demandar o reconhecimento de seu
direito sucessório, para obter a restituição da herança, ou de parte dela,
contra quem, na qualidade de herdeiro, ou mesmo sem título, a possua.
Este artigo corresponde ao art. 1.871 do Projeto de Lei n. 634/75. No Código Civil de 1916 não há regra semelhante.
Atentando para as dicas do relator, a ação de petição de herança (petitio hereditatis) é a que utiliza o herdeiro para que se reconheça e torne efetiva esta sua qualidade, e, consequentemente, lhe sejam restituídos, total ou parcialmente, os bens da herança, com os frutos, rendimentos e acessórios. Nesta ação, o réu é a pessoa que não tem título legítimo de herdeiro e, não obstante, possui bens da herança, total ou parcialmente.
Tal ação pode ser utilizada, por exemplo, quando a herança é recolhida por parentes mais afastados do falecido, e o interessado é parente mais próximo, que se acha em classe preferencial; quando a herança é distribuída entre os herdeiros legítimos, e aparece testamento do de cujus em que outra pessoa é nomeada herdeira; quando o filho não reconhecido do de cujus ingressa com ação investigatória (ação de estado), cumulada com a de petição de herança.
A petitio hereditatis é uma ação real, intentada pelo herdeiro, para que seja reconhecido o seu direito sucessório, contra o possuidor de bens hereditários, com o título de herdeiro, ou mesmo sem título, ou seja, no polo passivo desta ação está o falso herdeiro, ou o que possui a herança, ou parte dela, sem título algum.
Porém, se o possuidor da herança ou de um bem hereditário tem posse fundada em algum outro título, o herdeiro não poderá fazer valer os seus direitos com a ação de petição de herança, sendo-lhe facultado utilizar outra ação, que seja cabível. Na lição de Caio Mário da Silva Pereira, em qualquer caso, a petitio hereditatis deve intentar-se contra possuidor pro herede, não sendo cabida contra um possuidor ordinário, que detenha os bens da herança a outro título, “pois neste último caso a ação idônea será a reivindicatória” (Instituições de direito civil, li. ecl.. Rio de Janeiro - Forense, 1997, v. 6. n. 436, p. 55).
Orlando Gomes (Sucessões, 7. ed., Rio de Janeiro, Forense, 1977, n. 213, p. 242) afirma que a ação de petição de herança pode ser intentada a todo tempo, sendo imprescritível, ressalvando que o herdeiro aparente pode usucapir os bens recebidos na convicção de que lhe pertenciam por devolução regular. É a solução adotada, expressamente, pelo Código Civil português, art. 2.075, 2, que diz que a ação de petição de herança pode ser intentada a todo tempo, sem prejuízo da aplicação das regras da usucapião relativamente a cada uma das coisas possuídas, dispositivo este que se inspirou no art. 533, aIínea 2, do Código Civil italiano. Aliás, o Anteprojeto de Código Civil, revisto, de 1972, trazia o parágrafo único do art. 2.011 (que redundou neste CC 1.824), com a redação seguinte: “A petição de herança é imprescritível, ressalvadas as regras sobre usucapião relativamente a cada um dos bens singulares do acervo”. Mas a Comissão que elaborou o anteprojeto mudou a orientação, pois o aludido parágrafo único já não apareceu no CC 1.871 (que corresponde ao art. 2.011 do anteprojeto revisto e a este art. 1.824) do Projeto n. 634/75, de Código Civil.
Caio Mário da Silva Pereira (Instituições de direito civil, 2ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1997, v. 6, n. 436, p. 55) expõe que o problema se esclarece com a distinção entre o status, que é imprescritível, e a pretensão econômica judicialmente exigível, que como toda outra pretensão exigível (Anspruch) prescreve: “O filho terá ação sempre para se fazer reconhecer (ação de estado, imprescritível); mas não terá direito à herança depois de decorridos 20 anos da abertura da sucessão (petição de herança)”. O prazo mencionado pelo mestre é o referido no art. 177 do Código Civil de 1916. No presente Código, o assunto está regulado no CC 205: “A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor”.
O STF editou a Súmula 149: “É imprescritível a ação de investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança”. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 944, CC 1.824, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 21/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Flavio Tartuce, em artigo publicado no site migalhas.com.br, em janeiro de 2020, intitulado “Família e Sucessões – O início do prazo para a ação de petição de herança – Polêmica, em complemento, nos termos do dispositivo seguinte, a ação de petição de herança, ainda que exercida por um só dos herdeiros, poderá compreender todos os bens hereditários, tendo caráter universal (CC 1.825). A figura é admitida há tempos pela jurisprudência brasileira, tendo o Supremo Tribunal Federal editado, no ano de 1963, a Súmula 149, que envolve o tema central deste artigo.
Conforme explicam Jones Figueiredo alves e Mario Luiz Delgado, trata-se de uma ação real, eis que, por força do CC 8º, II, o direito à sucessão aberta constitui um imóvel por determinação legal (Código Civil Anotado. São Paulo: Método. 2005, p 936). Na mesma linha, como se retira de importante julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, “a ação de petição de herança é uma ação de natureza real, para a qual só tem legitimidade ativa aquele que já é herdeiro desde antes do ajuizamento, e através da qual ele pode buscar ver reconhecido seu direito hereditário sobre bem específico que entende devera integrar o espólio, mas que está em poder de outrem” (TJRS – Apelação Cível, n. 363960-28.2012.8.21.7000, 8ª Câmara Cível, Santa rosa. Rel. Des. Rui Portanova, j. 18.10.2012, DJERS: 25.10.2012).
Por ser uma ação real, e também universal, a petição não se confunde com a ação reivindicatória, que visa a um bem específico. Aplicando tal forma de pensar, constar de aresto do Superior Tribunal de Justiça que “ocorre turbação à posse de bem imóvel quando coerdeiros reconhecidos em ação de petição de herança molestam a posse anterior de outros herdeiros que exerciam tal direito com base em formal de partilha. Isso porque a ação de petição de herança tem natureza universal, pela qual o autor pretende o reconhecimento de seu direito sucessório, o recebimento da fração correspondente da herança e não a restituição de bens específicos. Isso é o que a diferencia de uma ação reivindicatória, de natureza sim, de natureza singular, que tem por objeto bens particularmente considerados. Desse modo, é equivocado concluir que, por força da ação de petição de herança, foram transmitidos o domínio e a posse dos bens herdados, quando, em verdade, transferiu-se o direito à propriedade e a posse comum da universalidade e não dos bens singularmente considerados. Por força da procedência da ação de petição do acervo hereditário, que voltam a ser de todos em comunhão até que nova partilha se realize” (STJ. Res 1244118 SC. Terceira turma. Rela. Min. Nancy Andrighi, j. 22;10.2013. DJe 28.10.2013).
A respeito do prazo para a propositura dessa demanda, a citada e antiga Súmula 149 do STF estabelece que “é imprescritível a ação de investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança”. O fundamento da prescrição é relacionado ao fato de a herança envolver direitos subjetivos de cunho patrimonial, que são submetidos a prazos prescricionais. Além disso, tem esteio na sempre alegada segurança jurídica, comumente associada à prescrição.
O entendimento sumulado é ainda considerado majoritário, para todos os fins, teóricos e práticos, inclusive na doutrina brasileira. Nesse contexto, na vigência do CC/1916, a ação de petição de herança estaria sujeita ao prazo geral de prescrição, que era de vinte anos, conforme o seu art. 177. Na vigência do Código Civil de 2002, deve ser aplicado o prazo geral de dez anos, previsto no seu CC 205. Exatamente nessa linha, do STJ extrai-se o seguinte: “Controvérsia doutrinária acerca da prescritibilidade da pretensão de petição de herança que restou superada na jurisprudência com a edição pelo STF da súmula n. 149. (...). Ausência de previsão, tanto no Código Civil de 2002, como no código Civil de 1915, de prazo prescricional específico para o ajuizamento da ação de petição de herança, sujeitando-se, portanto, ao prazo geral de prescrição previsto em cada codificação civil: vinte anos e dez anos, respectivamente, conforme previsto no art. 177 do CC/1916 e no CC 2025 de 2002” (STJ REsp 1.3368.677 MG. Rel. Mm Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, julgado em 05.12.2017. DJe 15.02.2018). Voltarei a esse acórdão mais à frente.
Em ambas as hipóteses, entende-se desde os tempos remotos que o prazo tem início da abertura da sucessão, como regra, que se dá pela morte daquele de quem se busca a herança (STF, RE 741.00 SE. Tribunal Pleno, Rel. Min. Eloy da Rocha, j. 03.10.1973. DJU 02.01.1974). todavia, a questão não é pacífica, pois alguns acórdãos superiores mais recentes trazem o julgamento de que o prazo deve ter início do reconhecimento vínculo parental em demanda própria, ou seja, do trânsito em julgado da sentença na ação de investigação de paternidade, tema principal deste texto. Como é notório, na grande maioria dos casos concretos, a petição de herança está cumulada com esse pedido relativo à filiação.
Nessa linha, em 2016, surgiu importante julgamento do Superior tribunal de Justiça que representa uma quebra dessa primeira corrente, tida como clássica, concluindo que o prazo de prescrição da ação de petição de herança deve correr do trânsito em julgado da sentença da ação de reconhecimento de paternidade. Ver publicação constante do Informativo n. 583 do Tribunal da Cidadania:
“Na hipótese em que ação de investigação de paternidade post mortem tenha sido ajuizada após o trânsito em julgado da decisão de partilha de bens deixados pelo de cujus, o termo inicial do prazo prescricional para o ajuizamento de ação de petição de herança é a data do trânsito em julgado da decisão que reconheceu a paternidade, e não o trânsito em julgado da sentença que julgou a ação de inventário. A petição de herança, objeto dos CC 1.824 a 1.828, é ação a ser proposta por herdeiro para o reconhecimento de direito sucessório ou a restituição da universalidade de bens ou de quota ideal da herança da qual não participou. Trata-se de ação fundamental para que um herdeiro preterido possa reivindicar a totalidade ou parte do acervo hereditário, sendo movida em desfavor do detentor da herança de modo que seja promovida nova partilha dos bens. A teor do que dispõe o CC 189, a fluência do prazo prescricional, mais propriamente no tocante ao direito de ação, somente surge quando há violação do direito subjetivo alegado. Assim, conforme entendimento doutrinário, não há falar em petição de herança enquanto não se der a confirmação da paternidade. Dessa forma, conclui-se que o termo inicial para o ajuizamento da ação de petição de herança é a data do trânsito em julgado da ação de investigação de paternidade, quando, em síntese, confirma-se a condição de herdeiro” (STJ, REsp 1..475.759 DF. 3ª Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 17.05.2016. DJe 20.05.2016).
Em 2018, essa mesma posição foi confirmada pela mesma Terceira Turma do Tribunal, no aresto há pouco mencionado e que cita a teoria da actio nata subjetiva, segundo a qual o prazo prescricional deve ter início do conhecimento da lesão ao direito subjetivo. Como consta do trecho final da sua ementa. “Nas hipóteses de reconhecimento ‘post mortem’ da paternidade, o prazo para o herdeiro preterido buscar a nulidade da partilha e reivindicar a sua parte na herança só se inicia a partir do trânsito em julgado da ação de investigação de paternidade, quando resta confirmada a sua condição de herdeiro. Precedentes específicos desta Terceira Turma do STJ. Superação do entendimento do STF, firmado quando ainda detinha competência para o julgamento de matérias infraconstitucionais, no sentido de que o prazo prescricional da ação de petição de herança corria da abertura da sucessão de pretendido pai, seguindo a exegese do art. 1.572 do CC/196. Aplicação da teoria da actio nata (STJ, REsp 1368677 MG, 3ª Turma. Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino. J. 05.12.2017. DJe 15.02.2018). Essa forma de julgar consubstancia uma visão que posse ser chamada de contemporânea.
No final de 2019, todavia, instaurou-se divergência na atual composição do Superior Tribunal de Justiça, pois surgiu outro acórdão, da sua Quarta Turma, voltando a aplicar a visão clássica, de que o prazo prescricional deve ter início da abertura da sucessão. O julgamento se deu nos autos do agravo no Recurso Especial n. 479648 MS, em dezembro de 2019. Conforme notícias retiradas do site do Tribunal, uma vez que a decisão ainda não foi publicada quando da elaboração deste texto, o relator. Ministro Raul Araújo, seguiu os fundamentos apresentados pela Ministra Isabel Gallotti, na linha de que o entendimento de que o trânsito em julgado da sentença de reconhecimento de paternidade marca o início do prazo prescricional para a petição de herança conduz, na prática, a imprescritibilidade desta ação, causando grave insegurança às relações sociais. De fato, trata-se de profundo debate que envolve a segurança e a certeza – de um lado -, e a efetividade da herança como direito fundamental previsto no art. 5º, XXX, da Constituição da República.
Entre uma e outra corrente, fica o autor com a segunda, tida como contemporânea, justamente pelo argumento da necessidade de se efetivar o direito à herança. A propósito, apesar de não ter sido essa a opção expressa do legislador – ao contrário do que ocorreu com o Código Civil Italiano, nos termos do seu art. 533, e com o Código Civil Peruano, art. 664 -, entende que não há prazo para se demandar a petição de herança especialmente no caso de estar cumulada com a investigação de paternidade.
Na doutrina, a propósito, essa é a posição de Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, para quem “a petição de herança não rescreve. A ação é imprescritível, podendo, por isso, ser intentada a qualquer tempo. Isso assim se passa porque a qualidade de herdeiro não se perde (semel heres semper heres), assim como o não exercício do direito de propriedade não lhe causa a extinção. A herança é transferida ao sucessor no momento mesmo da morte de seu autor, e, como se viu, isso assim se dá pela transmissão da propriedade do todo hereditário. Toda essa construção, coordenada, implica o reconhecimento da imprescritibilidade da ação, que pode ser intentada a todo tempo, como já se afirmou” (Comentários ao Código Civil. Vol 20. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 202). A proposito, na mesma esteira, pondera Luiz Paulo Vieira de Carvalho que, ‘em nosso sentir, as ações de petição de herança são imprescritíveis, podendo o réu alegar em sede de defesa apenas a exceção de usucapião (Súmula 237 do STF), que atualmente tem como prazo máximo 15 anos (na usucapião extraordinária sem posse social, CC 1.238, caput)” (Direito das Sucessões. São Paulo. Atlas. 204, p. 282-283).
De toda sorte, apesar dessa imprescritibilidade, segue o autor a possibilidade, em outros sistemas jurídicos, de se alegar a usucapião a respeito de bens singularizados. Isso faz com que a situação de cada bem seja analisada especificamente, atribuindo a determinado herdeiro, se for o caso, a propriedade da coisa caso estejam preenchidos os requisitos da usucapião, em qualquer uma das suas modalidades.
Como palavras finais, não se pode negar que o tema é de difícil análise e que gera intensos debates, sendo fortes os argumentos das duas correntes. Portando, o STJ encontra-se defronte a mais um desafio, que é pacificar a questão no âmbito da sua Segunda Seção. É preciso aguardar para ver qual será a posição seguida pela Corte. (Flavio Tartuce, em artigo publicado no site migalhas.com.br, em janeiro de 2020, intitulado “Família e Sucessões – O início do prazo para a ação de petição de herança – Polêmica, acessado em 21/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Na dicção de Guimarães e Mezzalira, como o herdeiro ajuizou a petição de herança, os demais herdeiros deverão ser ouvidos no prazo de 15 (quinze) dias, verdadeira contestação, podendo o juiz decidir em seguida. O CC é mais agressivo e permite ao herdeiro obter a restituição da herança, quer esteja em mãos de outro herdeiro, quer do herdeiro aparente.
Muitas vezes o herdeiro não tem o título e precisa ajuizar a ação de investigação de paternidade. Nesse caso, é de bom alvitre que essa ação – imprescritível seja feita em conjunto com a petição de herança, para evitar que o herdeiro ou possuidor da coisa alegue a usucapião.
Merece destaque o estudo feito por Eduardo de Oliveira Leite sobre o assunto. Em primeiro lugar apresenta o duplo objetivo da ação: reconhecimento judicial da qualidade de herdeiro e restituição dos bens que compõem o seu acervo hereditário. Adianta, mais, o autor. Podem invoca-la o filho não reconhecido pelo pai, o herdeiro testamentário excluído, parentes do de cujus excluídos por outros titulares, herdeiros legítimos preteridos pelos testamentários, um inventariante, o síndico da falência do morto, o testamenteiro, curador da herança do morto, o companheiro do inventariado. (Leite, Eduardo de Oliveira. Direito Civil Aplicado. Vol. 6 direito das sucessões. São Paulo: RT, 2004, p. 119/125).
Jurisprudência: Direito civil e processual civil. Recurso especial. Família e sucessões. Ação de investigação de paternidade c/c petição de herança. Pedido de anulação da partilha amigável homologada. Violação dos arts. 128 e 460 do CPC. Inexistência. Alegação de enriquecimento sem causa. Cálculo do quinhão devido ao herdeiro preterido. Multa por litigância de má-fé afastada. 1. Se a decisão proferida pelo Tribunal de origem não extrapola, no plano horizontal, os limites impostos pelo objeto dos recursos levados a julgamento, não se pode qualifica-la de ultra, quiçá extra petita. 2. O herdeiro que não participou do processo de inventário não sofre os efeitos da coisa julgada, referente à sentença que homologou a partilha amigável. 3. A fim de evitar o enriquecimento sem causa, o cálculo da quota-parte a ser entregue pelos coerdeiros ao meio-irmão observará, quanto aos bens alienados antes da citação, o valor atualizado da venda, e, com relação àqueles dos quais ainda eram proprietários, na data em que foram citados, o valor atual de mercado. 4. A litigância de má fé, à que ajude o parágrafo único do art. 538 do CPC, nada mais é que uma forma de abuso do direito, e, portanto, só se concretiza quando demonstrado que a parte se vale do direito de recorrer, não para ver a reforma, invalidação ou integração da decisão impugnada, mas para postergar ou perturbar o resultado do processo. 5. Ainda que a pretensão recursal não tenha sido acolhida pelo tribunal de origem, não se pode taxar o recurso de manifestamente protelatório, ou sem qualquer fundamento, especialmente ao se considerar que o acórdão embargado reformou a decisão de 1º grau e que se tratam dos primeiros – e únicos – embargos de declaração opostos, nos quais, ao menos em abstrato, foram apontadas contradições e obscuridades, além de vícios no julgamento. 6. Recurso especial conhecido d parcialmente provido. (STJ – REsp 1381655 SC Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 13/08/2013, DJe 06/11/2013). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.824, acessado em 21/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 1.825. A ação de petição de herança, ainda que exercida por um só dos herdeiros poderá compreender todos os bens hereditários.
Este artigo corresponde ao art. 1.872 do Projeto de Lei n. 634/75. Sem paralelo no Código Civil de 1916.
No entender do relator, ainda que um só dos herdeiros verdadeiros exerça a ação petitória, pode requerer a restituição de toda a herança do possuidor ilegítimo. O real herdeiro, desde a morte do hereditando, é possuidor e dono de sua quota sucessória. Como copossuidor e condômino, todavia, está autorizado a intentar a ação com o objetivo de serem restituídos todos os bens da herança.
A herança é o patrimônio deixado pelo defunto, ou seja, o complexo de relações jurídicas, de conteúdo econômico. Trata-se de uma universalidade de direito — universitas juris —, e se defere como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros (CC 1.791, caput); até a partilha, o direito dos coerdeiros quanto à propriedade e posse da herança será indivisível (CC 1.791, parágrafo único). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 945, CC 1.825, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 21/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Eduardo Nunes, em seu artigo “Herança digital e o direito à privacidade do de cujus”, publicado no site jusbrasil.com.br, em janeiro de 2021, tece comentários a respeito do artigo e questão, sobre os quais atenta-se, para não entrar em toda a descrição do direito das sucessões.
[...] O termo herança digital é uma cumulação entre o termo herança, que já é conhecido e tratado no Código Civil, e o termo digital que é considerado a novidade em que abrange todos os ativos digitais.
Em razão do instituto ser recente, sem uma estrutura
consolidada no ordenamento jurídico, resta necessário trazer para o estudo a
conceituação dos ativos digitais; projetos de leis acerca do tema; soluções
efetivas da área privada e o marco civil da internet (Lei 12.965/2014).
Para a compreensão da
herança digital e dos ativos digitais é importante trazer à tona a fala de
Emerenciano (2003, p. 78) quanto aos bens digitais:
Os bens digitais
constituem conjuntos organizados de instruções, na forma de linguagem de sobre
nível, armazenados em forma digital, podendo ser interpretados por computadores
e por outros dispositivos assemelhados que produzam funcionalidades
predeterminadas.
Assim, a construção da herança digital, considerando os
seus termos componentes, dá-se pelo aglomerado de informações de um determinado
usuário em domínio digital, e esse aglomerado comporta os ativos digitais e as
contas criadas (LARA, 2016).
Por ativos digitais entende-se que sejam os “registros nos
quais os indivíduos têm um direito ou interesse” (ALMEIDA, 2019, p. 125). Os
ativos digitais permeiam no grupo de bens intangíveis, isto é, não possuem
corporeidade, o que dificulta a sua visualização e mensuração, necessitando de
elementos precisos para classifica-los e reconhece-los.
A herança digital, dada à fragilidade e subjetividade do
bem deixado, despertou divergências de posicionamentos carecendo de
posicionamento efetivo do Estado no sentido de regrar este tipo de bem que
possui as nuances pertencentes a qualquer bem do “mundo material” (LARA, 2016).
Como supracitado, o direito sucessório assim como a
herança são institutos pacificados e estruturados no âmbito jurídico, não
obstante a herança digital surgiu como problemática após ocorrem mortes de
pessoas que nasceu após a ‘’febre’’ internet, o que gerou uma repercussão
diante dos bens deixados por aquele indivíduo.
Assim, Almeida e Almeida (2013, p. 180) mencionam que “à
medida que o número de bens digitais detidos pela média das pessoas aumenta, as
questões que envolvem a disposição desses bens quando da morte ou incapacidade
do indivíduo se tornam mais comuns”.
Observa-se que os bens digitais podem ser categorizados em
três grandes grupos, que de acordo com Brant (2014) são: (I) os bens digitais
com conteúdo econômico, como as contas financeiras ou nomes; (II) os bens
digitais sem conteúdo econômico, como por exemplo, as informações extraídas do
uso de redes sociais, como preferências ou dados de localização; e (III) os
bens digitais com conteúdo misto, assemelhando-se aos direitos autorais,
tais como as mensagens e escritos contidos em perfis de redes sociais, ou até
mesmo em blogs.
É preciso considerar, também, que os bens deixados em meio
digital tanto podem ter valor econômico, como somente sentimental, e também
sendo tutelado pelo direito. No entanto, os bens que possuem uma mensuração
econômica integram o conceito patrimonial de fácil observância (HIRONAKA,
2011).
A imprevisibilidade legal aliada à ausência de importância
que os autores da herança atribuem a esses bens fomentam os entraves
decorrentes da sua morte dando ensejo a eventual disputa por tais bens
dependendo do que se pode aferir destes. E assim, Doneda e Viola (2010, p. 99)
comentam que:
Os detentores dos bens digitais podem não considerar o
fato de que suas presenças on-line podem não ser tão longas de modo a serem
capazes de gerenciar seus bens, e podem, não expressamente prever a disposição
de seus bens digitais ou comunicações eletrônicas no caso de sua morte ou
incapacidade.
Nesta senda, há de se considerar que mesmo se tratando de
bens inseridos em domínio digital e mesmo da ausência de legislação específica
sobre o tema, a sucessão obedece os critérios de legitimidade na ausência de
testamento. É nesse interim que advém a ideia da manutenção da privacidade
do de cujus, como será abordada na sequência.
Em que pese a ausência de testamento regrando a gerencia
dos bens em domínio digital, se esbarra na problemática da violação da
privacidade do autor da herança. O quadro pode ser agravado quando estão em
questão os bens que são destituídos de valor econômico, pois versam
estritamente quanto a bens de ordem íntima e de interesse limitado dos
herdeiros. É sobre essa temática que Ribeiro (2016, p. 34) discute:
Quanto aos bens sem valoração econômica que compõem o
patrimônio digital do falecido, como por exemplo, perfis em redes sociais e
e-mails o entendimento não é uno, vez que inexistindo disposição de última
vontade do falecido, os bens seguem a política dos provedores e empresas que
fornecem os serviços, sendo que a transmissão desses bens poderá ser ou não ser
autorizada de acordo com tais políticas, outra possibilidade é a solicitação de
uma autorização do judiciário para que se tenha acesso a esses dados pelos
sucessores.
E sob esse aspecto se pode considerar a violação da privacidade do indivíduo, pois a disponibilidade de suas informações de cunho pessoal e privado não poderiam, então, ser objeto integrante do quinhão que compõe a herança. Isto deve-se ao fato de que estas informações não seriam revestidas de interesse dos herdeiros tampouco podendo ser exigida a sua transmissão (BRANT, 2014). (Eduardo Nunes, em seu artigo “Herança digital e o direito à privacidade do de cujus”, publicado no site jusbrasil.com.br, em janeiro de 2021, tece comentários ao artigo 1.825. Acessado em 21/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
No prever de Guimarães e Mezzalira, interessante que o direito de
um só herdeiro, exibindo seu título e ajuizando a ação de petição de herança,
desconstituir-se-á a partilha já feita, beneficiando a todos os demais
herdeiros. A explicação é simples: há uma universalidade até a legítima
partilha, entregando o direito de cada herdeiro ao seu titular. A lei faculta,
o que significa que não deverão ser arrolados todos os bens, obrigatoriamente.
Se o herdeiro postula seu direito em petição de herança, por ser filho de
herdeiro pré-morto, seu direito ficará restrito ao direito daquele como que
vivo estivesse. Cabe-lhe examinar a partilha anterior, igualdade dos coerdeiros
etc. (Luiz
Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários
ao CC 1.825, acessado em 21/07/2021, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).