quarta-feira, 11 de agosto de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.864, 1.865, 1.866, 1.867 Do Testamento Público - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com

Direito Civil Comentado – Art. 1.864, 1.865, 1.866, 1.867
Do Testamento Público - VARGAS, Paulo S. R.
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m.me/DireitoVargas – Parte Especial –Livro V – Do Direito das
Sucessões - Título III – Da Sucessão Testamentária – Capítulo III
– Das Formas Ordinárias do Testamento - Seção II:
Do Testamento Público (Art. 1.864 e 1.867)

 

Art. 1.864. São requisitos essenciais do testamento público:

I — ser escrito por tabelião ou por seu substituto legal em seu livro de notas, de acordo com as declarações do testador, podendo este servir-se de minuta, notas ou apontamentos;

II— lendo o instrumento, ser lido em voz alta pelo tabelião testador e a duas testemunhas, a um só tempo; ou pelo testador, se o quiser, na presença destas e do oficial;

III — ser o instrumento, em seguida à leitura, assinado pelo testador, pelas testemunhas e pelo tabelião.

Parágrafo único. O testamento público pode ser escrito manualmente ou mecanicamente, bem como ser feito pela inserção da declaração de vontade em partes impressas de livro de notas, desde que rubricadas todas as páginas pelo testador, se mais de uma.

Tradicionalmente, o caput e incisos I, II e III deste artigo correspondem ao art. 1.916 do Projeto de Lei n. 634/75, embora este falasse em “oficial público”, que, na Câmara, na primeira fase de tramitação do projeto, foi trocado por “tabelião ou seu substituto legal”. O parágrafo único foi, igualmente, introduzido na fase inicial de tramitação, na Câmara dos Deputados. Ver art. 1.632 do Código Civil de 1916.

 

Segundo a crítica do relator, Miguel Reate depõe que um dos aspectos mais salientes deste Código foi a simplificação, em geral, dos atos de testar, sem perda, todavia, dos valores de certeza e segurança (O projeto do novo Código Civil, 2. ed., São Paulo, Saraiva, 1999, p. 94).

 

Por uma série de motivos — até por superstição — os testamentos não são muito utilizados no Brasil. Quase todas as sucessões seguem os preceitos da sucessão legítima. Entretanto, quando alguém resolve testar, na grande maioria dos casos, a forma preferida é o testamento público.

 

Testamento público é feito perante tabelião ou seu substituto legal, que escreve as declarações do testador, podendo este servir-se de minuta, notas ou apontamentos, observando-se os requisitos previstos neste artigo.

 

O serviço notarial é exercido em caráter privado, por delegação do Poder Público, como enuncia o art. 236, caput, da Constituição Federal, que foi regulamentado pela Lei n. 8.935, de 18 de novembro de 1994, cujo art. 72, II, dispõe que compete aos tabeliães de notas, com exclusividade, lavrar testamentos públicos e aprovar os cerrados. O art. 20 dessa lei autoriza os notários, para o desempenho de suas funções, a contratar escreventes, dentre eles escolhendo os substitutos. No art. 20, § 4º, a citada lei afirma que os substitutos poderão, simultaneamente com o notário praticar todos os atos que lhe sejam próprios, exceto lavrar testamento. Com a entrada em vigor deste Código Civil, admitindo que o substituto escreva o testamento público, fica revogada, nesta parte, a Lei n. 94, pois a norma que ela exprime é incompatível com a posterior (Lei da Introdução ao Código Civil, art. 2o , § 1o ).

 

Depois de lavrado, o instrumento deve ser lido em voz alta pelo tabelião (ou por seu substituto legal, se for ocaso) ao testador e a duas testemunhas, a um só tempo, podendo a leitura ser feita pelo próprio testador, se o quiser. na presença das duas testemunhas e do tabelião. Em seguida, o testamento deve ser assinado pelo testador, pelas testemunhas e pelo tabelião.

 

Desde o direito romano, a unidade do ato testamentário (uno actu), ou, melhor dizendo, a unidade de contexto (uno contextu), é uma rigorosa exigência: o tabelião, o testador e as testemunhas devem estar presentes, simultaneamente, do começo até o fim da solenidade, sem intervalos e lacunas. Mas o tema não deve escravizar-se à rigidez romana, merecendo temperamentos, uma interpretação inteligente, considerando as circunstâncias de cada caso, que consinta breves interrupções, por falta de energia elétrica, para resolver uma emergência passageira, para o atendimento de um telefonema urgente, ou para remediar uma necessidade corporal do tabelião, do testador ou das testemunhas, por exemplo (cf. Zeno Veloso, Testamentos, 2. ed., Belém, Cejup, 1993, n. 277, p. 143).

 

O parágrafo único permite que o tabelião escreva o testamento manual ou mecanicamente, utilizando, por exemplo, máquina de datilografia ou computador e pode o notário inserir a declaração de última vontade em partes impressas do livro de notas, desde que rubricadas pelo testador todas as páginas, se mais de uma.


Observe-se que o testamento é ato formal e solene. As formalidades previstas em lei são substanciais (ad solemnitatem), os requisitos são essenciais. Vontade e forma se integram e se fundem, resultando um todo indivisível. O descumprimento, a desatenção, a falta de qualquer das formalidades implica nulidade insuprível. e essa advertência vale para o testamento público e para todas as outras formas — ordinárias ou especiais — de testamento. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 970/971, CC 1.864, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 11/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Marielli Favaro, em artigo publicado em novembro de 2017 no site jus.com.br, intitulado “Formas ordinárias e especiais de testamento”, referencia o CC 1.864 e ss., o testamento público é escrito pelo tabelião ou substituto legal, em seu livro de notas, de acordo com as declarações do testador, feitas em língua nacional, em presença de duas testemunhas que devem assistir a todo o ato.

O tabelião deve escrever exatamente o que foi dito pelo testador, ficando este, portanto, obrigado a dizer, não podendo, por exemplo, ser copiado. Caso assim o faça, haverá a nulidade do ato.

Após escrito, o instrumento do testamento será lido em voz alta pelo tabelião ao testador e às duas testemunhas, a um só tempo; ou pelo testador, se assim o quiser, na presença das testemunhas e do oficial. Não é permitida a leitura sucessiva, ao testador e, depois às testemunhas. A leitura precisa ser feita na presença simultânea, conjunta e contínua do testador, do tabelião e das testemunhas como expressamente mencionado no inciso II do art. 1.864 do Código Civil.

Após a leitura, estando em ordem, a cédula será assinada pelo tabelião que o escrever, pelo testador e pelas testemunhas, seguidamente e em ato contínuo (CC 1.964, III). (Marielli Favaro, em artigo publicado em novembro de 2017 no site jus.com.br, intitulado “Formas ordinárias e especiais de testamento”, referencia o CC 1.864 e ss., acessado em 11/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na dicção de Guimarães e Mezzalira, todos os testamentos são atos solenes, i.é, precisam preencher os requisitos legais para sua eficácia. O testamento público é aquele que requer maiores requisitos: sempre deverá ser escrito em língua portuguesa, qualquer que seja a nacionalidade do testador e das testemunhas; deve ser feito em Cartório de Notas, à escolha do testador. Geralmente, as pessoas testam em cartório de seu domicílio, podendo, contudo, fazê-lo em outra cidade.

O testamento público é o que oferece maior segurança, porque é escrito em livro próprio e o tabelião é obrigado a guarda-lo indefinidamente, consoante aquilo que tiver sido ditado pelo testador para o tabelião.

A pessoa se dirige ao Cartório, onde há, quase sempre, um funcionário especializado que ajuda a preparar o instrumento. No entanto, segundo a lei, somente o tabelião ou seu substituto estão capacitados para fazê-lo. Pode o testador levar a minuta pronta, todos os seus desejos e entregar o papel ao tabelião, que deve conversar com o testador, “investigando” se o testador está em pleno discernimento e manifestando sua livre vontade. Pedir-lhe-á os documentos, do testador e das duas (2) testemunhas. Tudo certo, marcará o dia para as assinaturas.

Diz a lei que o tabelião terá o testamento para o testador e as testemunhas. Em seguida, o testador lerá o instrumento lavrado, assinando-o em seguida, bem como as testemunhas. É importante notar que o ato deve ter total segurança para que seja preservado. Não é permitido a leitura para o testador em uma determinada hora, com sua assinatura e as testemunhas aporem suas assinaturas em outras horas diferentes.

Embora o tabelião tenha experiencia no desempenho de suas atribuições, não pode redigir o testamento, segundo essa experiencia, mas, exclusivamente, transcrevendo aquilo que o testador lhe ditou.

Ainda que a lei preveja que o testamento pode ser escrito manualmente, é uso corriqueiro que o tabelião o fará em seu computador, imprimindo-o para a leitura de viva voz. Hoje, todos os cartórios têm livros próprios, com folhas já preenchidas em parte, como o cabeçalho. Segue-se a transcrição da qualificação completa do testador e suas anotações, culminando com a citação das testemunhas testamentárias, qualificações e leitura para que todos tomem conhecimento do ato.

Jurisprudência: Apelação cível. Sucessões. Pedido de registro e cumprimento de testamento público. Testamento que conta com a assinatura de duas testemunhas instrumentárias. Assinatura parcial do testador, que, por se declarar impossibilitado de assinar seu nome completo, requereu a terceiro que assinasse a seu rogo, circunstância que não enseja a invalidade do testamento. 1. Constando claramente ao final do testamento público a assinatura das duas testemunhas qualificadas naquele instrumento, resta atendido o requisito de validade previsto no art. 1.864, inc. III, do Código civil. 2. Considerando que o testador assinou parcialmente seu nome ao final do instrumento e quem, por se declarar impossibilitado de firmar seu nome completo, requerer a terceiro 0- presente ao menos ao final do ato – que assinasse, a seu rogo, não há falar em invalidade do testamento, ainda que o firmatário não figure como testemunha instrumentária do ato. precedente do STF (RE 70540). Negaram provimento. Unanime. (AC n. 70057373573, 8ª CV, TJRS, Relator Luiz Felipe Brasil Santos, J 20/03/2014). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.864, acessado em 11/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.865. Se o testador não souber, ou não puder assinar, o tabelião ou seu substituto legal assim o declara assinando, neste caso, pelo testador, e, a seu rogo, uma das testemunhas instrumentárias.

Este artigo corresponde ao art. 1.917 do Projeto de Lei n. 634/75. Ver art. 1.633 do Código Civil de 1916.

Na visão do Relator, este dispositivo dá solução para o caso em que o testador não sabe ou não pode assinar. A regra abrange o testador analfabeto, como aquele que sabe assinar, mas, no momento, não pode fazê-lo. As causas da impossibilidade são inúmeras: debilidade física, paralisia, tremores, amputação das mãos, imobilização dos braços etc.

O não poder assinar não precisa chegar ao extremo da impossibilidade absoluta, do impedimento radical e definitivo. Deve ser compreendida no preceito a grave dificuldade para assinar.

O tabelião ou seu substituto legal deve declarar que o testador não sabe ou não pode assinar, conforme a hipótese. O Código Civil francês (art. 973), o italiano (art. 603), o chileno (art. 1.018), o argentino (art. 3.662), exigem que o tabelião mencione na escritura a causa pela qual o testador não assina.

Não assinando o testador, porque não sabe, ou porque não pode, assinará por ele, e a seu rogo, uma das testemunhas instrumentárias. Trata-se de formalidade abundante e desnecessária. O Código paga tributo, aqui, a reminiscências das Ordenações Filipinas, ao excesso de solenidades. Bastava, no caso, que o tabelião, sob a sua fé pública, declarasse que o testador não sabe ou não pode assinar, e tudo estaria resolvido. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 971, CC 1.865, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 11/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Marielli Favaro acrescenta que, o número legal de testemunhas, não pode ser reduzido. Pode, no entanto, ser aumentado, especialmente na hipótese do CC 1.865, quando o testador não souber ou não puder assinar e, em vez de solicitar que uma das testemunhas instrumentárias assine a seu rogo, como determina o referido dispositivo legal, faz o pedido a outrem. (Marielli Favaro, em artigo publicado em novembro de 2017 no site jus.com.br, intitulado “Formas ordinárias e especiais de testamento”, referencia o CC 1.865, acessado em 11/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Agregando Guimarães e Mezzalira, muita vez a pessoa está com o braço enfaixado e não consegue assinar o instrumento. Nesse caso, permite a lei que uma das testemunhas, à escolha do testador, o faça, e o notário ou seu substituto deverá constar essa circunstância. Qualquer omissão pode dar ensejo à postulação de anulação do ato. todo cuidado é pouco para o tabelião, razão pela qual nem todos os Cartórios de Notas “aceitam” fazer testamento.

Assinar a rogo é permitido, devendo no instrumento ser declarado quem o faz, a pedido do testador. Pode uma das testemunhas, mas, por segurança, precavendo-se o testador, indica mais uma testemunha, porque os inimigos do testamento são muitos.

Jurisprudência: Apelação cível. Sucessões. Pedido de registro e cumprimento de testamento público. Preliminar de nulidade afastada. Assinatura do testador presente ao final do testamento. Cognição que se limita à análise de requisitos extrínsecos de validade do testamento. Inviabilidade de análise de alegados vícios relativos ao conteúdo do testamento. Questão que desafia o ajuizamento de ação própria. 1. (...) 2. Constando do testamento público lavrado por tabeliã de Notas que o testador assinou o instrumento, e havendo em todas as folhas e ao final da escritura pública uma assinatura do campo destinado ao testador, resta atendido o requisito de validade previsto no art. 1.864, inciso III, do Código Civil. O fato de constar do documento de identidade do testador a informação de que seria ele analfabeto e não significa, necessariamente, que ele não soubesse ou não pudesse assinar o próprio nome – situação que, aí sim, ensejaria a necessidade de uma das testemunhas instrumentárias assinasse pelo testador, e, a seu rogo, de acordo com o art. 1.865 do Código Civil. 3. Na dicção do art. 1.126 do Código de;;; Processo Civil, em sede de registro de testamento, a cognição se limita à análise de requisitos formais/extrínsecos de validade, não avançando à análise de seu conteúdo. Desse modo, eventuais insurgências que se refiram a alegados vícios presentes no conteúdo do testamento, a exemplo da suscitada incapacidade do testador à época da lavratura, devem ser arguidas em ação própria para tanto, tendo em vista que a temática exige ampla cognição, não comportando discussão no bojo do presente pedido de registro de testamento. Negaram provimento. Unanime.(TJRS AC 70064939424 RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos. DJ 20/08/2015, 8ª VC. DJ 25/08/2015). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.865, acessado em 11/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.866. O individuo inteiramente surdo, sabendo ler, lerá o seu testamento, e, se não o souber, designará quem o leia em seu lugar, presentes as testemunhas.

Segundo parecer do Relator, é um artigo desnecessário. Repete-se a fórmula do art. 1.636 do Código Civil de 1916, introduzindo um novo personagem na solenidade: o ledor do testamento.

Não vejo vantagem em convocar mais um figurante para fazer a leitura do testamento, pois essa providência poderia muito bem ser cumprida por uma das testemunhas — como acontece no testamento do cego — ou pelo tabelião mesmo, como se propõe, de lege ferenda. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 971, CC 1.866, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 11/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Adindo Marielli Favaro, além da hipótese do artigo 1.865 já mencionada, na qual, quando o testador não souber, ou não puder assinar, o tabelião assim o declarará assinado pelo testador, e a seu rogo, umas das testemunhas, há os casos a seguir:

Art. 1.866: O indivíduo inteiramente surdo, sabendo ler, lerá o seu testamento, e, se não o souber, designará quem o leia em seu lugar, presentes as testemunhas. (Marielli Favaro, em artigo publicado em novembro de 2017 no site jus.com.br, intitulado “Formas ordinárias e especiais de testamento”, referencia o CC 1.866, acessado em 11/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Mesma toada Guimarães e Mezzalira. Se o testador é surdo, mas sabe ler, ele mesmo fará a leitura do instrumento; se, diversamente, for analfabeto designará uma testemunha que o fará por ele, na sua presença e da outra testemunha e do tabelião. Prevenir é melhor que remediar, e o ideal é o testador analfabeto pedir a uma terceira pessoa que leia o instrumento, o que será relatado no testamento. A anulação do testamento público acarreta, cotidianamente, problemas para o tabelião. Ciente desse fato, por experiencia profissional, deve pesquisar a viabilidade de elaboração do ato, antes de fazê-lo.

Jurisprudência: Testamento. Anulação. Capacidade testamentária ativa presumida. Ausência de demonstração suficiente de que, no ato de testar, a testadora estivesse privada de seu discernimento. Artigos 1.267 do CC/16 e 1.860 do CC/2002. Inexigência, ademais, de formalidade incidente apenas quando o testador seja completamente surdo. Regra dos artigos 1.636 do CC/16  e 1.866 do CC/2002. Sentença mantida. Apelação desprovida. (TJSP AP 994070887776 SP, Relator: Cláudio Godoy, DJ 03/08/2010, 2ª TC, DP 06/08/2010). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.866, acessado em 11/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.867. Ao cego só se permite o testamento público, que lhe será lido, em voz alta, duas vezes, uma pelo tabelião ou por seu substituto legal, e a outra por uma das testemunhas, designada pelo testador, fazendo-se de tudo circunstanciada menção no testamento.

Este artigo corresponde ao art. 1.919 do Projeto de Lei n. 634/75. Ver art. 1.637 do Código Civil de 1916.

Na pregação do Relator, a capacidade testamentária ativa do cego, pela via ordinária, restringe-se ao testamento público. No direito brasileiro, o cego não pode fazer testamento cerrado, nem testamento particular.

Redigido o ato, será a escritura de testamento lida, em voz alta, duas vezes: uma pelo tabelião ou por seu substituto legal, e a outra por uma das testemunhas, designada pelo testador. A dupla leitura do testamento público do cego constitui formalidade especial e indeclinável. De sua preterição resulta nulidade do ato. De todas as ocorrências (dupla leitura, nome da testemunha designada pelo testador), o tabelião fará circunstanciada menção no testamento. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 971-972, CC 1.867, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 11/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No conhecimento de Marielli Favaro: Art. 1867: Ao cego só se permite o testamento público, que lhe será lido em voz alta, duas vezes, uma pelo tabelião ou por seu substituto legal, e a outra por uma das testemunhas, designada pelo testador, fazendo-se de tudo circunstanciada menção no testamento;

Como o art. 1.864, I, do Código Civil exige que o testamento seja escrito de acordo com as declarações do testador, que deve ouvir a sua leitura em voz alta, feita ao final pelo tabelião, conclui-se que o surdo-mudo não pode testar por essa forma ordinária, ainda que saiba ler e escrever. Reforça essa convicção o fato de o art. 1.873 declarar expressamente que o surdo-mudo pode fazer testamento cerrado.

O analfabeto também só pode testar de forma pública, pois não lhe é permitido fazer testamento cerrado (CC, art. 1.872) ou particular (art. 1.876, § 1º). (Marielli Favaro, em artigo publicado em novembro de 2017 no site jus.com.br, intitulado “Formas ordinárias e especiais de testamento”, referencia o CC 1.867, acessado em 11/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Aplicando o direito, Guimarães e Mezzalira, a lei permite que o cego faça seu testamento; entretanto, condiciona que seja testamento público, devendo o texto ser lido por duas vezes, uma pelo tabelião e outra pela testemunha indicada pelo testador. Repete-se, a responsabilidade do tabelião é muito grande para a validade do testamento, devendo exigir que todas as solenidades sejam preservadas e cumpridas.

O cego, especialmente, por ter sido privado da visão, além de ser tratado pela lei de forma própria, também merece de todos o maior respeito na manifestação de sua vontade. A jurisprudência reitera a necessidade de absoluta segurança, vez que podem eles ser ludibriados por incautos com difícil reparação. A perda do patrimônio pode ser extremamente danosa para sua subsistência.

Jurisprudência: Ação de confirmação e registro de testamento particular. Testamento particular eivado de vícios Provas dos autos que demonstram com absoluta segurança que a falecida tinha sérios problemas de visão, o que a impediu de ler o próprio testamento, e provavelmente de elabora-lo. O deficiente visual só pode se valer do testamento público, nos termos do art. 1.867 do Código Civil. Testamento nulo, uma vez que não reveste a forma prescrita em lei Art. 166, IV do CC. Testamento elaborado por meio de processo mecânico. Ausência de leitura pela testadora. Infringência ao disposto no art. 1.867, § 2º, do CC. Nulidade por ausência de solenidade que a lei considera essencial. Art. 166, V do Cc. Sentença mantida. Recurso desprovido. Honorários advocatícios. Procedimento de jurisdição voluntária, no qual não cabe, em regra, a fixação de honorários advocatícios. Precedentes do STJ que admitem a condenação em honorários advocatícios, desde que o procedimento assuma caráter litigioso. Ocorrência de litigiosidade e de trabalho desenvolvido com sucesso pelo advogado dos impugnantes que recomenda a fixação honorária em R$ 2.500,00. Recurso adesivo provido. (TJSP – APL 00037611120128260619 SP 0003761-11.2012.8.26.0619, Relator: Francisco Loureiro. DJ 15/08/2013, 6ª CDP, DP 16/08/2013). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.867, acessado em 11/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 10 de agosto de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.862, 1.863 Das Formas Ordinárias do Testamento - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.862, 1.863
Das Formas Ordinárias do Testamento - VARGAS, Paulo S. R.
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Sucessões - Título III – Da Sucessão Testamentária – Capítulo III
– Das Formas Ordinárias do Testamento - Seção I:
Disposições Gerais (Art. 1.862 e 1.863)

 

Art. 1.862. São testamentos ordinários:

I - o público;

II – o cerrado;

III – o particular.

Verazmente, este corresponde ao art. 1.914 do Projeto de Lei n. 634/75. Ver art. 1.630 do Código Civil de 1916.

Segundo palavras do Relator, o testamento é negócio jurídico formal e solene. O princípio da liberdade de forma (art. 107) não vigora a respeito de testamentos, absolutamente.

Só é testamento o negócio jurídico que for feito sob uma das formas minuciosamente reguladas no Código. Os testamentos ordinários são o público, o cerrado e o particular; os testamentos especiais são o marítimo, o aeronáutico e o militar. Não se admitem outros testamentos ordinários e especiais além dos contemplados no Código Civil. Essa norma, inclusive, é de ordem pública. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 968-969, CC 1.862, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 10/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Júlio Martins, www.juliomartins.net, em artigo publicado em julho/2021 no site jusbrasil.com.br, intitulado “Titia não fez testamento mas sempre disse que sua casa seria minha quando ela morresse. E agora?”, CC 1862 explica:

Infelizmente agora "Inês é morta"... na verdade a Tia dele(a) pode nem se chamar Inês, mas já não vai adiantar alegar que a falecida, supostamente sem outros herdeiros, queria deixar o bem em favor do(a) sobrinho(a). Lidando diariamente com questões relativas a sucessões não raro ouve-se que determinado parente tinha vontade de direcionar bens para certos parentes ou até mesmo amigos e demais pessoas sem relação de parentesco mas que infelizmente nada fez além de falar, apenas falar, da sua vontade. O importante, de fato, para concretizar a deixa testamentária é adotar uma das formas prescritas e reconhecidas pela Lei Brasileira. Sem prejuízo das formas especiais (art. 1.886), reza o art. 1.862 do Código Civil Brasileiro que: "Art. 1.862. São testamentos ordinários: I - o público; II - o cerrado; III - o particular".

 

Pode ser colocado lado a lado os três tipos de Testamentos apontando desde já que o testamento público (CC 1.864) deve ser lavrado por Tabelião em Cartório de Notas, enquanto o testamento particular (CC 1.876) é feito inteiramente pelo testador e, por fim, o testamento cerrado (CC 1.868) mistura um pouco dos dois primeiros, surgindo com sua elaboração pelo testador mas tendo validade apenas se aprovado por Tabelião.

 

Como prédica, em que pese a conhecida tendência dos Tribunais de flexibilização de alguns requisitos e exigências para prestigiar a vontade do Testador, é muito importante observar os requisitos legais em ato de tamanha importância já que a inobservância pode infelizmente macular a vontade do instituidor.

 

Desse modo, não vai bastar apenas deixar escrito em qualquer lugar o que se pretende, sem observar os requisitos que a Lei exige (e esse é o maior risco do testamento particular feito sem qualquer assessoria jurídica, já que no Testamento Público não restam dúvidas que o Tabelião garantirá a higidez e plena validade do ato por ocasião da lavratura).

 

Por fim, não restam dúvidas sobre inexistir no ordenamento jurídico, pelo menos até o momento, validade de disposições testamentárias verbais, como restou assentado pelo TJPR:


"TJPR. 0061120-93.2014.8.16.0014. J 06/12/2018. Apelação Cível. Ação Declaratória. Sentença de improcedência. Pleito de reconhecimento de testamento verbal. Impossibilidade. Testamento inexistente. Inteligência do artigo 1.887 do código civil. Recurso não provido". (Júlio Martins, www.juliomartins.net, em artigo publicado em julho/2021 no site jusbrasil.com.br, intitulado “Titia não fez testamento mas sempre disse que sua casa seria minha quando ela morresse. E agora?”, CC 1862, acessado em 10/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Corroborando Guimarães e Mezzalira, a sequência escrita no Código não significa que um testamento é mais importante que o outro. todos três têm o mesmo valor e o testador é conhecido como ato de última vontade, porque ele pode revoga-lo até instantes antes de sua morte, desde que tenha plena capacidade mental do ato praticado.

É comum o cidadão chamar seu advogado e pedir-lhe orientação, um ou dois dias antes de sofrer uma cirurgia de elevado risco. O profissional especializado dará ao constituinte todos os conhecimentos necessários, capacitando-o a escolher se quer fazer testamento público, particular ou cerrado.

Claro que a opção pelo testamento público pode ser mais segura, mas o particular fica mais em conta, sabido que o advogado não pode cobrar pelo valor dos bens que estão sendo dispostos, mas a consulta que lhe foi feita, e nada mais.

Jurisprudência: Ementa: Apelação cível. Ação de cumprimento de testamento. Declaração de última vontade que não se reveste de nenhuma das formalidades impostas pela legislação de regência. Nulidade do ato. “Forma dat esse rei”. Recurso não provido. – Conquanto se incline a jurisprudência do STJ pelo aproveitamento do testamento quando não obstante a existência de certos vícios formais a essência do ato se mantém íntegra, inevitável o reconhecimento da nulidade do testamento que não se reveste sequer de nenhuma das formalidades impostas pela legislação de regência. – O testamento, diversamente dos atos jurídicos estritamente privados em que há liberdade de exteriorização, tem sua “forma de ser” pré-estabelecida em lei, razão pela qual não sendo observada nenhuma das exigências dispostas nas normas que disciplinam sua confecção, não adquire contornos de declaração de última vontade e tampouco produz os efeitos do ato jurídico que almejou ser. – A forma do testamento não lhe serve apenas de indumentária com que se apresenta à sociedade jurídica, mas antes lhe integra a própria natureza jurídica enquanto “ser testamento”. – Exegese do princípio “form dat esse rei”. (TJMG – AC 1.0701.01.018786-5/001. Relator: des. Belizário de Lacerda, 7ª CV, J 28/01/2014, PS 07.02.2014). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.862, acessado em 10/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.863. É proibido o testamento conjuntivo, seja simultâneo, recíproco ou correspectivo.

Factualmente, este corresponde ao art. 1.914 do Projeto de Lei n. 634/75. Ver art. 1.630 do Código Civil de 1916.

Interpretando o Relator, o testamento conjuntivo, conjunto ou de mão comum é o feito no mesmo ato, por duas ou mais pessoas. A proibição de tal negócio jurídico é substancial, seja o testamento simultâneo ou correspectivo fazem disposições em favor de terceiro —, seja recíproco – se um testador favorece o outro, e vice-versa —. seja correspectivo – além da reciprocidade, cada testador beneficia o outro na mesma proporção em que este o tiver beneficiado, caso em que a interdependência, a relação causal entre as disposições, é mais intensa.

A proibição do testamento conjuntivo consta no Código Civil de 1916, art. 1.630, seguindo o que estatal o art. 968 do Código Civil francês - Proíbem, também, o testamento conjuntivo os Códigos Civis da Itália (art. 589), da Espanha (art. 669), de Portugal (art. 2.181), do Japão (art. 975), da Argentina (art. 3.618), do Chile (art. 1.003), do Paraguai (art 2.612), do Peru (art. 814), de Cuba (art. 477.2), de Québec (art. 704, Art. 2) e do México (art. 1.296).

Sendo o testamento negócio jurídico unilateral (mais que isso: unipessoal), revogável, personalíssimo , a repulsa do Código ao testamento conjunto é plenamente justificável, considerando, também, que são terminantemente proibidos os pactos sucessórios (Art. 426). A liberdade de testar e de revogar o testamento, que é princípio capital nesta matéria (art. 1.858), precisa ser rigorosamente preservada. O testamento conjuntivo arranharia esse princípio.

Mas nada impede que duas pessoas, em atos separados, ainda que na mesma data, perante o mesmo tabelião, façam testamentos dispondo em favor de um terceiro, ou, mesmo, em proveito recíproco. Por sinal, isso ocorre com certa frequência, quando os testadores são marido e mulher. 

Na Alemanha, todavia, admite-se o testamento conjuntivo - (Gemeinschafthiches Testament) —, mas, conforme o art. 2.265 do BGB: “Em gemeinschaftliches Testament kann nur von Ehegatten errichtet werden” (= “Um testamento de mão comum só pode ser outorgado pelos cônjuges”). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 969, CC 1.863, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 10/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Natanny Pignaton, em artigo publicado em maio/2020, no site jus.com.br, intitulado “Sobre testamentos conjuntivo não simultâneos e a adequada interpretação do art. 1.863 do Código Civil), comenta brevemente sobre a adequada interpretação do CC 1.863 e a possibilidade de testamentos conjuntivos.

Dispõe o CC1863, que: “é proibido o testamento conjuntivo, seja simultâneo, recíproco ou correspectivo”. É chamado de testamento conjuntivo aquele feito por duas ou mais pessoas, no mesmo ato.

É simultâneo se os dois testadores fazem disposições em favor de terceiro. Se um testador favorece o outro, e vice-versa é tido como recíproco. Por fim, o testamento conjuntivo correspectivo, que não será confundido com o recíproco; nesse caso, cada testador beneficia o outro na mesma proporção em que foi beneficiado, caso em que a interdependência, a relação causal entre as disposições, é mais intensa.

 

Destaca-se que essa vedação já constava no ordenamento desde o Código Civil de 1916, em seu art. 1.630. Inclusive, a maioria dos ordenamentos proíbe o testamento conjuntivo, com exceção da Alemanha, em se tratando de cônjuges. “Proíbem, também, o testamento conjuntivo os Códigos civis da Itália (art. 589), da Espanha (art. 669), de Portugal (art. 2.612), do Peru (art. 814), de Cuba (art. 477.2), de Québec (art. 704, al. 2) e do México (art. 1.296)” (Código Civil comentado. Coordenadora Regina Tavares da Silva; São Paulo: saraiva, 2012).

 

Essa vedação se justifica pela própria natureza do testamento de negócio jurídico de última vontade, unilateral, unipessoal, personalíssimo, inalienável, bem como pela própria vedação ao pacto sucessório (Art. 426: Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva).

 

A elaboração de testamento conjuntivo fere ainda a liberdade plena de testar e revogar o testamento pelos indivíduos (Art. 1.858: O testamento é ato personalíssimo, podendo ser mudado a qualquer tempo), ao permitir que o testamento esteja atrelado a terceiro “A proibição do testamento conjuntivo, em todas as suas modalidades, tem justificativa pela cláusula de quase absoluta irrevogabilidade que implicitamente o acompanha e, por conseguinte, não se concilia com a natureza dos atos de última vontade, motivo pelo qual tem sido banido na generalidade dos códigos, desde o velho direito português, como a Ord. L. 4, T. 80, que regulou a forma dos testamentos e dele não cogitou.” (disponível em http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao064/CarlosEduardo_Lenz.html; acesso em 18/11/2018). Nesse sentido:

 

Direito civil e processual civil. Apelação cível. Testamento conjuntivo. Nulidade. Jurisdição voluntária. Ausência de coisa julgada material. 1. O testamento é ato personalíssimo de manifestação de vontade, sendo nulo na forma conjuntiva, pois vedada, no mesmo ato, a existência de mais de um testador. 2. O procedimento de jurisdição voluntária não faz coisa julgada material devido à inexistência de lide. 3. Recurso desprovido. (TJ-DF 20160110216442 DF 0006654-72.2016.8.07.0001, Relator: MARIO-ZAM BELMIRO, Data de Julgamento: 21/09/2017, 8ª TURMA CÍVEL, Data de Publicação: Publicado no DJE: 29/09/2017. Pág.: 541/547)

 

Devido ao caráter personalíssimo do testamento, vedado está o testamento conjuntivo, ou seja, ninguém poderá, juntamente com outrem, mesmo sendo marido e mulher, dispor, num só instrumento de bens (RT, 134:111). Entretanto, “nada impede que duas pessoas, em atos separados, ainda que na mesma data, perante o mesmo tabelião, façam testamentos dispondo em favor de um terceiro, ou, mesmo, em proveito recíproco”, o que ocorre com certa frequência quando os testadores são marido e mulher. Muito importante distinguir que os testamentos tenham sido feitos em atos separados, sendo determinante para validade ou nulidade do negócio.


A interpretação mais adequada, então, é de que a vedação só atinge o testamento feito por duas ou mais pessoas no mesmo instrumentono mesmo documento, na mesma escritura, enfim, no mesmo ato. Sendo feitos testamentos - no plural, documentos distintos - em atos separados, ainda que na mesma data, no mesmo livro notarial, perante o mesmo tabelião, dispondo em favor de um terceiro ou em proveito recíproco, não representaria violação do dispositivo legal. [...] (Natanny Pignaton, artigo publicado em maio/2020, no site jus.com.br, intitulado “Sobre testamentos conjuntivo não simultâneos e a adequada interpretação do art. 1.863 do Código Civil, acessado em 10/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Na contribuição de Guimarães e Mezzalira, a lei brasileira não permite o testamento a quatro mãos. Se ele é um ato personalíssimo, revogável, somente ele faz seu testamento e sua esposa fará outro, cumprindo as formalidades legais. 

Pode acontecer que o marido determine, em disposição testamentária, que sua casa de campo fique para a esposa (legado) e, quando esta fizer seu testamento, estabeleça igual legado. Como são testamentos distintos, nada impede de um deles revogar seu testamento e dispor de forma diferente ou não mais testar. Raras são as legislações estrangeiras que admitem o testamento conjuntivo. Liberdade de testar é direito inalienável. 

Jurisprudência: Testamento. Requisitos. Bem que fora objeto de doação e já não era de propriedade das testadoras. – O art. 1.863 do CC proíbe o testamento conjuntivo, o que gera nulidade do ato. – Se o bem objeto das disposições testamentárias já fora anteriormente doado pelas testadoras a mesma pessoa contemplada no testamento, este último ato perdeu o objeto. (TJMG – AC 1.0568.06.001207-3/001, relator: Des. Belizário de Lacerda, 7ª CV, J 07.04.2009, PS 05.06.2009). 

Civil. Testamentos conjuntivos. Realização em atos distintos. CC. Art. 1.630. Não configuração. I. O testamento é consubstanciado por ato personalíssimo de manifestação de vontade quanto à disponibilização do patrimônio do testador, pelo que pressupõe, para sua validade, a espontaneidade, em que titular dos bens, em solenidade cartorária, unilateral, livremente se predispõe a destiná-los a outrem, sem interferência, ao menos sob o aspecto formal, de terceiros. II. O art. 1.630 da lei substantiva civil veda o testamento conjuntivo, em que há, no mesmo ato, a participação de mais alguém além do testador, a indicar que o ato, necessariamente unilateral na sua realização, assim não o foi, pela presença direta de outro testador, a descaracterizá-lo como o vício da nulidade. III. Não se configurando, na espécie, a última hipótese, já que o testamento do de cujus, deixando suas cotas para sua ex-sócia e concubina, e o outro por ela feito, constituíram atos distintos, em que cada um compareceu individualmente para expressar seu desejo sucessório, inaplicável, à espécie, a cominação prevista no referenciado dispositivo legal, corretamente interpretado pelo Tribunal a quo. IV. Recurso especial não conhecido. (STJ – REsp 88.388/SP, Re. MM Aldir Passarinho Junior, 4ª T, J 05.10.2000, DJ 27.11.2000, p. 164). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.863, acessado em 10/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 9 de agosto de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.860, 1.861 Da Capacidade de Testar - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.860, 1.861
Da Capacidade de Testar - VARGAS, Paulo S. R.
vargasdigitador.blogspot.com - digitadorvargas@outlook.com
– Whatsap: +55 22 98829-9130 Pho Number: +55 22 98847-3044
m.me/DireitoVargas – Parte Especial –Livro V – Do Direito das Sucessões -
Título III – Da Sucessão Testamentária – Capítulo II
– Da Capacidade de Testar - (Art. 1.860 a 1.861)

 

Art. 1.860. Além dos incapazes, não podem testar os que, no ato de fazê-lo, não tiverem pleno discernimento. 

Parágrafo único. Podem testar os maiores de dezesseis anos. 

Este mecanismo, na voz do relator, diz neste artigo que, além dos incapazes, não podem testar os que, no ato de fazê-lo, não tiverem pleno discernimento. No parágrafo único antecipa para os dezesseis anos o começo da capacidade especial para outorgar testamento. Note-se: o que completou dezesseis anos está autorizado a fazer testamento, e não precisa da assistência do representante legal. O menor, no caso, age direta e pessoalmente (cf. BGB, art. 2.029, Art. 2).

Mencionando os incapazes, sem distinguir, estão abrangidos os absolutamente incapazes (art. 32) e os relativamente incapazes (art. 42). Trata-se de um equívoco, que precisa ser corrigido, sabendo-se que o testamento outorgado por incapaz é nulo de pleno direito. Não há razão para afirmar que os ébrios habituais, os viciados em tóxicos e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido sejam proibidos de testar, se, apesar de reduzido, tenham entendimento ou compreensão suficiente para saber o que estão fazendo no momento em que outorgam a disposição de última vontade. É uma questão de fato, a ser apurada em cada caso concreto.

O mesmo se pode dizer dos excepcionais, sem desenvolvimento mental completo. A fortiori, não há motivo para que o pródigo não possa testar. Aliás, entre os atos que o pródigo interditado não pode praticar sem assistência do curador, enumerados no CC 1.782, não figura o testamento. Carlos Maximiliano aponta que, pelo direito anterior (Ordenações, liv. 42, tít. 81, 4), o pródigo estava inibido de fazer disposições causa mortis, e que o projeto de Clóvis Beviláqua “não manteve uma tal velharia, que a ciência moderna repele”, concluindo que, embora interdito o perdulário, pode fazer testamento (Direito das sucessões, 5. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1964. v. 1, n. 331, p. 376).

O CC 1.860 precisa ser revisto, para evitar graves inconvenientes. O Código Civil de 1916, art. 1.627, indica, claramente, em quatro incisos, os incapazes de testar. O BGB, art. 2.229, diz que o menor de dezesseis anos tem capacidade testamentária, e que não pode testar quem, por causa de doença ou deficiência mental, ou perturbação da consciência, não estiver em condições de compreender o significado da declaração de vontade por ele emitida, ou de proceder de acordo com essa compreensão. O art. 591, aI. 2, do Código Civil italiano considera incapazes de testar os que não completaram a maioridade (dezoito anos), os interditados por enfermidade mental e os que, embora não interditados, provar-se que estão, por qualquer causa, mesmo transitória, incapacitados de entender e de querer no momento em que fizeram o testamento. O art. 2.189 do Código Civil português expõe que são incapazes de testar os menores não emancipados e os interditos por anomalia psíquica, acrescentando o art. 2.199, sob a rubrica “incapacidade acidental”, que é anulável o testamento feito por quem se encontrava incapacitado de entender o sentido da sua declaração ou não tinha o livre exercício da sua vontade por qualquer causa, ainda que transitória (ver, ainda, art. 663 do Código Civil espanhol; arts. 3.614 e 3.615 do Código Civil argentino e art. 467 do Código Civil suíço).

Com base na longa tradição de nosso direito, e com respaldo no direito comparado, conclui-se, com toda a segurança, que o que se requer, fundamentalmente, em matéria de capacidade testamentária ativa, é que o indivíduo possa exprimir livremente a sua vontade, que tenha compreensão , discernimento, que saiba, enfim, o que está fazendo. Em consequência de enfermidade ou doença mental, ou de moléstia que repercuta no cérebro, a pessoa pode ficar com a razão comprometida, o espírito intensamente debilitado, sem possibilidade de querer autonomamente, de perceber as situações, de avaliar o que ocorre no mundo exterior, não tendo liberdade para deliberar, não exercendo espontaneamente o seu querer, e este é pressuposto essencial em sede de testamentos. 

Todavia, não é qualquer enfermidade mental que provoca tão devastador efeito. Não é qualquer anomalia cerebral, não é qualquer psicopatia que exclui do indivíduo a capacidade testamentária. Se não tiver ocorrido interdição (CC 1.767, §§ 1º e 2º ), que implica presunção juris et de jure da incapacidade, cada situação concreta precisa ser analisada, avaliada e comprovada, para se concluir se, no momento em que fez o testamento, era o outorgante capaz, ou não (CC 1.861).

As causas que determinam a incapacidade são permanentes (doença mental grave, surdo-mudez que obsta totalmente a manifestação da vontade, anomalia psíquica que exclui o discernimento) ou transitórias (embriaguez completa, efeito de drogas, estado hipnótico).

Sugestão legislativa: Pelas razões antes expostas, ofereceu-se ao Deputado Ricardo Fiuza a seguinte sugestão legislativa: Art 1.860. Além dos absolutamente incapazes, não podem testar os que, no ato de fazê-lo, não tiverem o necessário discernimento. Parágrafo único (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 967-968, CC 1.860, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 09/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Eduarda Sousa Ferreira, em artigo publicado em maio de 2021, intitulado “Tudo o que você precisa saber sobre Testamentos”, dá uma panorâmica em rápidas pinceladas apontando o artigo em comento, CC 1860, esclarecendo o assunto com questões evidentes.

Afinal o que é um testamento? Testamento é o instrumento pelo qual uma pessoa capaz pode dispor de seus bens, ou de parte deles para depois de sua forma, ou seja, é o ato de última vontade do "de cujus", porém como no direito nada é extremo, devem ser obedecidas algumas disposições legais para a realização de um testamento.

 

Segundo disposição legal do CC 1860 a capacidade para testar se inicia aos dezesseis anos completos, outras disposições legais que devem ser obedecidas para a elaboração de qualquer testamento são: a legítima dos herdeiros necessários deve ser preservada, o que isso que dizer? se o testador possuir herdeiros necessários (descendentes, ascendentes e cônjuge) só poderá dispor de 50% de seus bens em testamento, sendo o outros 50% obrigatoriamente herança de seus herdeiros necessários.

 

E se não houverem herdeiros necessários, neste caso sim, o testador poderá dispor da totalidade de seus bens em testamento. Ainda sobre a capacidade para testar é importante ressaltar que devem ser maiores de dezesseis anos relativamente capazes, se um indivíduo disser um testamento na véspera de completar dezesseis anos este será inválido, aqui trabalhamos com a teoria das nulidades onde aqueles que são absolutamente incapazes produzem atos nulos, e aqueles que são relativamente capazes produzem atos anuláveis.

 

E os deficientes, com a aprovação da Lei n 12.146 /15, que trata do estatuto da pessoa com deficiência, a pessoa com deficiência é completamente capaz, inclusive pode fazer testamento. Outro critério legal a ser observado é que o testamento é ato personalíssimo, ou seja, só pode ser praticado pelo próprio indivíduo que fará o testamento, sendo expressamente proibidos testamentos em conjunto, ou em benefício comum por exemplo. O testamento só produz efeitos se o testador (aquele que o fez) de fato morrer, caso contrário não produz efeitos jurídicos.

 

O testamento não é irrevogável. Ele pode ser revogado, tanto por estar em desconformidade com os critérios legais, ou pela elaboração de um novo testamento, que revoga o anterior, também pode ser revogado por ato de própria vontade do testador por meio de instrumento público.

Testamento também não tem prazo de validade. Enquanto não for revogado será considerado válido.

 

O testamento abrange somente disposições de caráter patrimonial. O testamento abrange todas as disposições de vontade para após a morte do testador, sejam elas de caráter patrimonial, disposições sobre seus bens, reconhecimento de filhos, doações, dentre outras. Mas só ressaltando, não se pode testar sobre matérias ilícitas e matérias que não respeitem a legítima dos herdeiros necessários.

 

Quanto às espécies de testamento, isso é matéria para outro artigo, mas já adianta-se existirem diversas formas de testamento: testamento público, testamento cerrado, testamento particular, testamento nucunputativo, codicilo e testamentos especiais como o testamento marítimo e aeronáutico.


O melhor testamento para se fazer e mais seguro, é o testamento público, feito em cartório, por um tabelião na presença de duas testemunhas que não podem ser amigos íntimos ou inimigos capitais do testador. (Eduarda Sousa Ferreira, em artigo publicado em maio de 2021, intitulado “Tudo o que você precisa saber sobre Testamentos”, dá uma panorâmica em rápidas pinceladas apontando o artigo em comento, CC 1860, acessado em 09/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Lecionando Guimarães e Mezzalira, toda e qualquer pessoa, que tenha pleno discernimento, com mais de 16 (dezesseis) anos, poderá fazer seu testamento. A incapacidade aqui enfocada é diferente da incapacidade geral do Direito Civil. O testador casado pode fazê-lo, sem aquiescência do cônjuge; o filho com mais de 16 anos pode redigir seu testamento, sem pedir autorização da mãe ou do pai; o ancião, com cem (100) anos, pode fazer seu testamento, desde que esteja em pleno discernimento na prática para os atos da vida civil.

Por segurança, repete-se, se o testador suspeitar que algum herdeiro pode vir a impugnar sua manifestação de vontade, deve consultar seu médico, pedir-lhe uma declaração de sua capacidade de discernir, antes da redação do testamento. Há costumeira disputa entre os sucessores pelo patrimônio e buscam, em juízo, ou meios fraudulentos, invalidar o testamento.

Jurisprudência: Ação anulatória. Testador pródigo. Interdição provisória decretada. Testamento. Nulidade caracterizada. Voto vencido. Não podem testar os que, no ato de fazê-lo, não dispuserem do pleno discernimento. Tendo sido decretada a interdição provisória do testador, não há como prevalecer o testamento por ele produzido, mormente à revelia do curador, nos termos da lei civil. Sujeita-se à interdição a pessoa que comprovadamente demonstre não possuir aptidão para gerir atos de sua vida civil. Ausentes provas suficientes acerca da suposta prodigalidade do testador, de rigor a manutenção da revogação da interdição provisória, mormente em face da inexistência de perícia e do fato de a cassação da providência acautelatória ter se dado após interrogatório com o interditando, procedimento previsto no art. 1.180 e ss. do CPC/1973, (correspondendo no CPC/2015 ao art. 749 e ss.). A sentença que declara a interdição gera efeitos a partir de sua publicação, sendo os atos anteriormente praticados, sujeitos à anulação desde que cabalmente demonstrada a incapacidade à época de sua realização. Havendo alegação de excesso nas disposições testamentárias, e diante da impossibilidade de se aferir se o adiantamento da legítima praticado anteriormente se refere ao quinhão reservado aos herdeiros necessários, haverá apuração em liquidação de sentença, consoante previsão ao artigo 475-C, do estatuto processualista. Caso comprovada, impõe-se a aplicação da redução das determinações, nos termos do CC 1.967. (TJMG – AC 1.0137.06.000436-3/001. Relator: des. Fernando Caldeira Brant, 11ª CV. J 16/04/2008. Publicação em 17/05/2008). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.860, acessado em 09/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.861. A incapacidade superveniente do testador não invalida o testamento, nem o testamento do incapaz se valida com a superveniência da capacidade.

Documentadamente, este  corresponde ao art. 1.912 do Projeto de Lei n. 634/75. Ver art. 1.628 do Código Civil de 1916.

No entendimento do Relator, a capacidade ou a incapacidade do testador deve ser verificada na data em que foi outorgado o testamento, aplicando-se a regra tempus regit actum. No caso do testamento cerrado, deve ser considerada a data da aprovação da cédula pelo tabelião e não a data em que foi escrita pelo testador (CC 1.868).

Se era capaz o testador no momento em que testou, se estava são de espírito, apresentando o discernimento necessário para saber e compreender o que fazia, o testamento não ficará prejudicado na sua validade se, depois, o testador vier a sofrer de uma doença mental, perdendo completamente a razão. Noutra hipótese, se o testador tinha apenas quinze anos quando fez o testamento, embora venha a falecer o seu autor dezenas de anos mais tarde, o testamento não vale. O Código Civil português adota a mesma solução — que é universal—, enunciando, no art. 2.191: “A capacidade do testador determina-se pela data do testamento”. (cf. Clóvis Beviláqua, Direito das sucessões, 5. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1964, v. 1.) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 968, CC 1.861, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 09/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Na defesa de Mirella Lins Bezerra, em 2019, intitulada “Diretrizes Antecipadas de vontade: Testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro”, publicada no site jusbrasil.com.br, pertinente, onde, segundo a autora, com a existência de novas biotecnologias permitindo o prolongamento da vida por meio artificial há uma reafirmação do princípio da autonomia da vontade. Como forma de efetivar os desejos do indivíduo sobre a sua vida e a sua saúde surgiram as DAVs, que correspondem a negócios biojurídicos nos quais a pessoa deixa expressa a sua vontade sobre tratamentos médicos. No Brasil há uma carência de regulamentação jurídica sobre o assunto, resultando na existência de demandas judiciais requerendo uma decisão sobre a possibilidade de respeitar ou não o disposto nas diretivas.

De acordo com Luciana Dadalto, o Testamento Vital é um documento por meio do qual um indivíduo capaz “manifesta seus desejos sobre suspensão de tratamentos, a ser utilizado quando o outorgante estiver em estado terminal, em estado vegetativo persistente - EVP ou com uma doença crônica incurável, impossibilitado de manifestar livre e conscientemente sua vontade”. Com base nesse conceito, diz-se que o Testamento Vital tem sua aplicação limitada a casos médicos específicos. Dá-se ao paciente a possibilidade de analisá-los de forma predecessora e de decidir sobre o seu destino.

O objetivo principal do Testamento Vital é a percepção do real desejo do paciente em relação à sua própria vida; da convicção com a qual o documento foi firmado. Trata-se de um subsídio importantíssimo para as decisões que recaiam sobre médicos ou familiares, no que se refere à recusa de tratamentos invasivos desproporcionais, considerados absolutamente inválidos em termos de recuperação do status quo ante do paciente. O limite estabelecido para a declaração do paciente é, como já referido, a comprovação da prescindibilidade do tratamento.

 

O testamento vital não possui forma prescrita pelo Conselho Federal de Medicina, não havendo um padrão a ser respeitado, e, sendo assim, seus requisitos e formalidades são avaliados com base na legislação estrangeira, e também pelo Código Civil nas exigências do testamento particular. Pontua-se, portanto, a maior necessidade para validade do testamento, sendo a capacidade – conforme critérios da lei civil –, ou seja, que o paciente tenha atingido 16 anos e que não se enquadre em nenhuma situação de incapacidade prevista no Código Civil. 

A eutanásia e o suicídio assistido são práticas proibidas pela legislação brasileira e previstas como crimes, conforme disposição do Código Penal. Contudo, admite-se a ortotanásia, que corresponde ao um direito à morte natural, sem intervenção de métodos extraordinários para o prolongamento da vida. Neste caso, o paciente não está optando em não receber nenhum medicamento, mas em morrer sem ser submetido a intervenções médicas que não lhe fazem mais sentido.

Neste contexto, a Resolução 1.995/12 do Conselho Federal de Medicina define a chamada “diretivas antecipadas de vontade” como o “conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente, sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade.

Desse modo, passou-se a utilizar no Brasil o chamado Testamento Vital, conferindo à pessoa de formalizar sua vontade como pretende ser tratada em caso de ficar incapacitada de se expressar livremente. É considerado um documento jurídico válido e eficaz, sendo uma declaração de vontade, sendo esta uma vontade última que deve ser atendida, respeitando sempre a legislação vigente e a ética médica. 

O Testamento Vital é o documento previamente elaborado pelo paciente, com as estipulações de sua vontade médica (métodos aos quais deseja ou não ser submetido quando em estado terminal de saúde, em estado vegetativo persistente ou afetado por doença crônica incurável), referentes a tratamentos considerados infrutíferos para a melhora do estado de saúde em que se encontra. É a manifestação explícita da vontade do paciente, que posiciona: “Quais as providências a serem tomadas para um paciente incapacitado de exercer a autonomia, mas que em estado anterior de lucidez manifestou-se a respeito por meio de documento escrito”.

 

A necessidade da inclusão do Testamento Vital em nosso ordenamento jurídico é o respeito à autonomia do paciente perante a possibilidade de suspensão dos tratamentos médicos. Ressaltando que a decisão não é do médico, ele tem a obrigação de informar ao paciente seu prognóstico, que lhe faculta procurar outras opiniões ou meios de tratamento. Ao médico cabe o dever de informar ao paciente, garantido na CF/88, em seu artigo 5º, inciso XIV, onde dispõe que: “É assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo de fonte, quando necessário ao exercício profissional.”.

 

O Testamento Civil é um negócio jurídico unilateral, personalíssimo e indelegável, pelo qual o testador expressa sua última vontade em relação ao seu patrimônio. Trata-se de um instrumento com funções acautelatórias, na medida em que, tendo o agente capacidade para fazê-lo, e fazendo-o dentro dos limites legais, considera-se perfeito independentemente da ocorrência do óbito. Admite-se tanto a revogação ad nutum do testamento, quanto a alteração das disposições nele contidas.

 

A validade do Testamento é condicionada à morte, evento que rompe o domínio dos bens do testador e transfere a outra pessoa os direitos que lhe pertenciam. É a prática representativa do significado real da palavra “suceder”, qual seja, “vir após; seguir-se; substituir”. Com a morte, extingue-se a personalidade do falecido, ao qual não mais serão atribuídos direitos e obrigações.

 

Não obstante a previsão taxativa das figuras testamentárias pelo Código Civil, a doutrina, com base no direito de autodeterminação da pessoa, defende a utilização de Diretivas Antecipadas de Vontade. Por efeito da tradução literal da expressão americana Living Will, foi adotada no Brasil a terminologia “Testamento Vital” para designar as disposições acerca da vida e da morte, em termos médicos, preexistentes ao momento de incapacidade do paciente/testador, gerando efeitos ainda em vida.

 

Em observância aos ditames constitucionais brasileiros, sua validade é defendida com base em princípios constitucionais que podem ser aplicados diante de casos concretos. Assim, tem-se na Constituição Federal a proteção a direitos fundamentais, com base nos princípios da Dignidade da Pessoa Humana e da Autonomia da Vontade.

 

É possível afirmar que uma pessoa, em pleno gozo de suas capacidades mentais, tem o direito de dispor de sua vida segundo a própria vontade. Também o tem aquele que se encontre em um momento de impossibilidade de manifestação e, para tanto, utilizam-se as Diretivas Antecipadas de Vontade.

 

Art. 1º, CF/88: A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...);  III - a dignidade da pessoa humana; (...). Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

 

Tratando-se especificamente do Testamento Vital, o objetivo é o registro da vontade do paciente para que prevaleça sobre toda e qualquer opinião contrária. Corresponde a um documento de efeitos erga omnes, cujas disposições devem preexistir à manifestação da patologia, vedada a referência a procedimentos terapêuticos contraindicados ao caso ou já superados pelos estudos da Medicina, bem como a contrariedade ao ordenamento jurídico vigente.

 

Usufrui-se, por analogia, dos arts. 1.858; 1.860, caput; 1.861, do Código Civil para o Testamento Vital, que se caracteriza como negócio jurídico existencial, unilateral, personalíssimo e gratuito. O CC 107, aduz que “a validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir”. Não havendo previsão legislativa própria ao tema, a forma com que o Testamento Vital for realizado não é passível de declaração de nulidade, sendo a incerteza acerca de sua forma superada apenas pela precaução do testador em conformá-las às regras aplicáveis aos negócios jurídicos (em que pese seja livre a sua escolha).

 

O Testamento Vital busca encontrar o equilíbrio entre a prática médica e as demandas bioéticas dos pacientes, alcançando, assim, efeitos lícitos. Se ao indivíduo é dada a possibilidade de disposição patrimonial, e há o reconhecimento de que a vida é o seu bem maior e condição essencial para todos os outros direitos, o entendimento aplicado ao Testamento Civil é extensível ao Testamento Vital, oportunizando ao paciente o direito de escolha sobre sua vida, ainda em vida.

 

As DAV nunca foram especificamente regulamentadas no âmbito jurídico, mas apesar da pouca atenção dada ao tema, há diversas referências ao direito à recusa de tratamento na nossa legislação.

 

O Código Civil ainda afirma, em seu artigo 15, que ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica. Este dispositivo traduz clara expressão da autonomia do paciente frente aos tratamentos a serem administrados. A interpretação destes conceitos pode embasar a defesa da validade das DAV no nosso ordenamento jurídico.

 

O tema específico das diretivas antecipadas de vontade ganhou visibilidade no país após a promulgação da Resolução CFM 1.995/2012, que dispõe sobre o assunto visando adequar a conduta médica. Consta no artigo 2º da citada resolução que nas decisões sobre cuidados e tratamentos de pacientes que se encontram incapazes de comunicar-se, ou de expressar de maneira livre e independente suas vontades, o médico levará em consideração suas diretivas antecipadas de vontade .


As diretivas antecipadas de vontade são realizadas com base no princípio da autonomia dos particulares, sendo realizadas na forma de negócios biojurídicos, nos quais o indivíduo deixa registrada a sua vontade no tocante ao seu corpo e sua saúde para que seja respeitada quando estiver impossibilitado de manifestar seus desejos. Então, por meio das diretivas há o conhecimento dos desejos da pessoa, podendo ser sobre negativa a determinado tratamento ou autorização. [...] (Defesa de Mirella Lins, em 2019, intitulada “Diretrizes Antecipadas de vontade: Testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro”, publicado no site jusbrasil.com.br, acessado em 09/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Na sequência, Guimarães e Mezzalira, se a pessoa faz seu testamento com 15 (quinze) anos, mesmo que se torne Presidente da República, o ato não convalidará; da mesma forma, estado capacitado para testar, sofrendo, em seguida ou tempos depois, um acidente que o torne inteiramente inválido, esse testamento continuará a vigorar e produzirá seus efeitos, com a morte do testador. 

Regra absoluta, deve o testador buscar opinião de quem entenda, desejoso de transmitir sua vontade depois de sua morte. O profissional capacitado poderá ajuda-lo, afastando os não beneficiados de sua maldade. O juiz deve fazer prevalecer a vontade do testador, porque repetir o ato não é mais possível.

Jurisprudência: Apelação cível. Ação de nulidade de testamento. Alegação de incapacidade civil. Ausência de prova. A posterior interdição da testadora, por si só, não demonstra a sua incapacidade, que deve ser identificada no momento do testamento, pois, “a incapacidade superveniente do testador não invalida o testamento” (CC 1.861). Nas hipóteses em que se pretende desconstituir um ato cuja validade é presumida por força da lei, deve restar demonstrado de forma cabal o vício alegado, especialmente porque a expressão da vontade, que é genérica por si só, é o que constitui a essência do ato. recurso conhecido mas não provido. (TJMG – AC 10342129967646001 MG, relator: Albergaria costa, DJ 14.09.2015, 3ª  CV, DP 18.09.2015). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.861, acessado em 09/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).