sexta-feira, 21 de junho de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 390, 391, 392, 393 - Do Inadimplemento das Obrigações – VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 390, 391, 392, 393
- Do Inadimplemento das Obrigações
 – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título IV – DO INADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES
 (art. 389 a 420) Capítulo I – Disposições Gerais –
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 390. Nas obrigações negativas o devedor é havido por inadimplente desde o dia em que executou o ato que se devia abster.

Segundo a doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, no Código Civil de 1916 o dispositivo estava equivocadamente inserido na Seção VI do Capítulo II do Título II do Livro III, que tratava da mora. Não se confunde inadimplemento com mora. No primeiro caso a obrigação é descumprida; no segundo, ocorre apenas retardamento do cumprimento da obrigação.

Justificava Beviláqua a inserção desse dispositivo no regramento da mora, ao argumento de que nas obrigações negativas a mora confunde-se com a inexecução. Com todo respeito ao mestre, entendemos que andou bem o novo Código em procedendo ao reposicionamento do artigo, que trata de inadimplemento e não de mora, ainda que os efeitos de ambos se confundam no caso concreto (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 212, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/06/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo a esteira de Guimarães e Mezzalina, nas obrigações negativas, pode haver determinação judicial tanto para o desfazimento do ato, quanto permitir ao credor que o desfaça às expensas do devedor, com a cominação, em ambas as hipóteses, de multa para que o descumprimento não se repita. Não sendo possível o desfazimento, há a conversão em perdas e danos.

Jurisprudência apresentada por Guimarães e Mezzalina; “Revenda de automóveis (contrato de concessão comercial). Pretensão de resolver o contrato, devido ao seu descumprimento pela revendedora. Procedência. 1 – Interpelação Judicial (desnecessidade). Conforme acórdão estadual, era desnecessária a interpelação ou notificação, ‘porque de um lado a infração atinge a essência do contrato, não se tratando de infração leve que pode ser revelada se não mais praticada, de outro não envolve prestação de natureza econômica’. Segundo a sentença, ‘independentemente de notificação porquanto aqui ocorreram atos ilícitos oriundos de obrigações negativas, como por exemplo a abstenção do desvio de clientela’. Ora, na lição de Beviláqua, ‘Na obrigação negativa não há interpelação. Praticado o ato de que o devedor se devia abster, já foi a obrigação infringida’. Caso em que não se ofendeu o disposto no art. 119, parágrafo único, do CC” (RSTJ 140/251). (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 20.06.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Aponta o mestre Bdine Jr., que, se a obrigação for negativa – daquelas em que se exige do devedor um não fazer -, estará caracterizado o inadimplemento desde o momento em que o ato que não devia ser praticado se verificou. Observe-se que todos os comentários ao artigo anterior, a respeito do inadimplemento bem como da mora, valem para essa hipótese, pois nem sempre o inadimplemento das obrigações de não fazer é absoluto. É possível imaginar hipóteses em que a obrigação negativa seja continuada (não fazer concorrência, por exemplo) e, nesse caso, a prestação será do interesse do credor mesmo após um determinado inadimplemento. No exemplo mencionado, o inadimplemento contratual pode ser interrompido, o que interessa ao credor, sem necessidade de considerar-se o inadimplemento absoluto. No entanto, segundo o dispositivo em exame, aquele que não pode fazer concorrência ao fundo de comércio que alienou a terceiro está em mora e é inadimplente desde o dia em que vende produtos do mesmo ramo. Gustavo Bierambaum, porém, sustenta que somente a obrigação positiva admite a mora: “Classificação: obrigações de dar, fazer e não fazer”. Obrigações: estudos na perspectiva civilconstitucional, coord. Gustavo Tepedino. Rio de Janeiro, Renovar, 2005, p. 122. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 415 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 20/06/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 391. Pelo inadimplemento das obrigações respondem todos os bens do devedor.

Ora, no diapasão de Guimarães e Mezzalina, os bens do devedor são a garantia do crédito do credor, o que lhe permite promover sua expropriação judicial (penhora) e ulterior utilização para satisfação do seu direito, no caso de descumprimento da obrigação. Por se tratar de garantia do credor, eventual alienação irregular promovida pelo devedor será inquinada de defeito (fraude contra credores) e retornará à condição de garantia.

O credor pode ainda destacar bens específicos de seu patrimônio, dando-lhes em garantia do cumprimento de obrigações de sua titularidade ou de terceiro. Seriam os casos de penhor, hipoteca, anticrese, alienação fiduciária. Em caso de concurso de credores, aqueles detentores de garantias específicas serão privilegiados.

A garantia surge no momento em que a obrigação é constituída, mas não se limitam aos bens que lhe são contemporâneos, abrangendo também aqueles que venham a agregar-se, futuramente, ao patrimônio do devedor.

Guimarães e Mezzalina, ainda apresentam um comentário feito por Bdine Jr., onde não constituem garantia os bens de família puros, os de personalidade e, em regra, os taxados de impenhoráveis mencionando CPC/1973, art. 833, sem correspondência no CPC/2015. Relativamente a estes, Bdine Jr. destaca a tendência jurisprudencial a flexibilizar a regra, admitindo a penhora de vencimentos e salários, bem como imóveis rurais (incisos IV e VII do art. 833 do CPC/1973), desde que não haja prejuízos ao sustento e à vida digna do devedor e quando se destinarem ao pagamento de dívidas de maior valor social (exemplificativamente, alimentos devidos em razão de ato ilícito)(Bdine Jr., Hamid Charaf. Comentário ao artigo 391 do Código Civil, In Peluso, Cesar (coord.). Código Civil Comentado, Barueri: Manole, 2015). (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 20.06.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No desenvolvimento apresentado no Histórico de Ricardo Fiuza, aparece modificação do dispositivo por parte da Câmara dos Deputados, ainda no período inicial de tramitação do projeto. O texto apresentado pelo Prof. Agostinho de Arruda Alvim, no Anteprojeto, era o seguinte:

‘Pelo inadimplemento das obrigações respondem todos os bens, presentes e futuros, do devedor’. Emenda do Deputado Fernando cunha promoveu a supressão da expressão “presentes e futuros”, por considera-la desnecessária. Segundo o autor da emenda, “o descumprimento de obrigação onera os bens, pouco importando se presentes ou futuros. Claro é que se o devedor adquire outros, não se precisa dizer que os mesmos respondem pelas obrigações. Somente os possuídos antes, transferidos no tempo, ou antes da dívida ou da ação, por elas não respondem, mas isso também não precisa ficar dito porque tais bens já não são do devedor”. Corresponde ao art. 1.518 do Código Civil de 1916.

Segundo a doutrina, o art. 391 versa dobre o princípio da responsabilidade patrimonial do devedor, à semelhança do que já fizera, porém mais timidamente, o art. 1.518 do CC/1916.

O inadimplente terá de indenizar o credor pelo prejuízo que causou. Como a indenização por perdas e danos consiste sempre em soma de dinheiro, é natural que devem os bens do devedor ficar sujeitos à reparação do dano patrimonial ou oral causado (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 212, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/06/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

A responsabilidade patrimonial do inadimplente está consagrada neste artigo, conforme nos ensina o mestre Bdine Jr., segundo o qual todos os bens do devedor respondem pelas perdas e danos decorrentes do inadimplemento da obrigação. Este dispositivo, embora não contenha a ressalva final do art. 591 do CPC/1973, antes não Capítulo IV – Da Responsabilidade Patrimonial, com correspondência no CPC/2015, art. 789, Capítulo V, Da Responsabilidade Patrimonial, com a mesma redação, “salvo se as restrições estabelecidas em lei” – não revogou a legislação que declara impenhoráveis determinados bens do devedor, tal como ocorre com o art. 649 do CPC/1973, com correspondência no art. 833 do CPC/2015.

Embora haja incompatibilidade aparente com a regra ampla do artigo em exame – que estabelece a responsabilidade integral dos bens do devedor pelo inadimplemento -, o certo é que os bens constantes do mencionado artigo – assim como o bem de família (Lei n. 8.009;90) continuaria sendo impenhoráveis ainda que a regra não existisse. Os bens indicados no art. 649 do CPC/1973, ou do seu correspondente no 833 do CPC/2015 não podem ser penhorados; admiti-lo violaria o princípio de proteção à dignidade da pessoa humana consagrado no art. 1º, II, da Constituição Federal. Ora, tais bens são essenciais para assegurar ao devedor uma vida minimamente digna: alimentos, sustento próprio e de sua família e trabalho.

Vale observar, contudo, que os bens relacionados nos incisos IV e VIII do mencionado art. 649 do CPC, mantidos no art. 833 do CPC/2015, poderão ser penhorados, salvo se comprometerem o sustento digno do devedor e de sua família, como poderá ocorrer com os vencimentos e os salários e com o imóvel rural (IV e X) nova redação no mesmo sentido. Nesses dois últimos casos, se a penhora recair sobre parte de vencimentos ou salários expressivos, não comprometer o sustento e a vida digna do devedor (que perceba, por exemplo, rendimentos elevados), e, eventualmente, destinarem-se a quitar débito de maior valor social (alimentos devidos em razão de ato ilícito, por exemplo), não há por que manter a impenhorabilidade, ainda que parcial.

Aliás, a jurisprudência de nossos tribunais tem admitido a penhora de faturamento de empresas das quais, em muitos caso, são extraídos os rendimentos de manutenção das famílias dos sócios – cujas personalidade, é certo, não se confundem com a da sociedade -, de modo que as mesmas razões que justificam essa providência poderão autorizar a penhora de salários e vencimentos muito elevados.

Observe-se que a flexibilização da impenhorabilidade em alguns casos resulta da incidência do princípio da proporcionalidade à execução. Esse princípio constitucional permite que se afaste o rigor da regra quando desproporcional ao resultado a que se visa.

Dessa forma, se assegurar a impenhorabilidade integral de um salário expressivo comprometer a proporção a ser mantida entre a proteção à dignidade e o interesse social no cumprimento das obrigações, será possível flexibilizar a regra do art. 649 do CPC/1973, supra citado com correspondência no 833 do CPC/2015, e autorizar a penhora de parte dos rendimentos do devedor – tal como já se admite -, registre-se, na penhora do faturamento das empresas. Essa medida, certamente, também pode comprometer o sustento do pequeno empresário, sem que por isso se negue a penhorabilidade parcial.

Ora, já que a impenhorabilidade dos bens indicados no art. 649 do CPC/1973 e seu correspondente 833 no CPC/2015, continuaria sendo passível de reconhecimento ainda que o dispositivo não exista, não se pode considera-lo revogado pelo artigo que ora se examina sob o fundamento de que regra geral posterior é incompatível com a regra geral anterior (art. 2º, § 1º, Lei de Introdução ao Código Civil). Seria ilógico afirmar a revogação da lei anterior para mente a eficácia de seu conteúdo a partir da interpretação direita do art. 1º, III, da Constituição Federal.

O bem de família, como alerta Bdine Jr., permanece impenhorável, nos termos do disposto expressamente no art. 1.711. em relação aos bens que guarnecem a residência do devedor, não há ressalva expressa no presente Código, concluindo-se que sua impenhorabilidade decorrerá do disposto no parágrafo único do art. 1º da Lei 8.009/90 e da proteção decorrente do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, se for o caso (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 415-417 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 20/06/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 392. Nos contratos benéficos, responde por simples culpa o contratante, a quem o contrato aproveite, e por dolo aquele a quem não favoreça. Nos contratos onerosos, responde cada uma das partes por culpa, salvo as exceções previstas em lei.

Buscado no site Direito.com, tem-se que o dispositivo em questão distingue o comportamento doloso do culposo, ao impor o dever de indenizar apenas ao devedor que, dolosamente, descumpra contrato benéfico de que não seja favorecido (exemplificativamente, contrato de doação pura).

Apresentam, ainda, “Súmula STJ 145. No transporte desinteressado, de simples cortesia, o transportador só será civilmente responsável por danos causados ao transportado quando incorrer em dolo ou culpa grave”. Parte da doutrina rechaça o entendimento, compreendendo que se aplica a esse caso a regra do CC, 927. Direito.com, dá o crédito a Bdine Jr., Hamid Charaf, comentário ao CC, 392. In Peluso, Cesar (coord.) Código civil comentado, Barueri: Manole, 2015. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 21.06.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, tem-se que nos contratos benéficos ou não onerosos, a exemplo do comodato, só uma das partes se beneficia. Logo não seria justo, como bem coloca João Luiz Alves, que “a pane, a quem o contrato não aproveita, respondesse pela simples culpa. Em todo o caso deve responder pelo dolo, que se constitui pela violação proposital e deliberada daquilo a que se acha obrigado, pois que ninguém pode voluntária e deliberadamente fugir ao cumprimento do que contratou, ainda que sem intuito de lucro, porque do seu procedimento pode resultar dano a outra parte. O contratante a quem aproveita o contrato unilateral deve responder pela simples culpa, por isso mesmo que o contrato foi celebrado em seu benefício, como no caso do comodatário, responsável pela guarda e restituição da coisa emprestada” (Código Civil anotado, cit., p. 710).

Nos contratos onerosos, bilaterais ou sinalagmáticos, nos quais são estabelecidas obrigações para ambas as partes, a exemplo da compra e venta, é coerente que elas respondam não só por dolo, mas também por simples culpa (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 213, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/06/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo a esteira de Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência, encontra-se que, contratos benéficos ou gratuitos são aqueles em que apenas uma das partes obtém vantagens, enquanto para a outra há apenas sacrifício (doações puras, por exemplo). Não se confundem com contratos unilaterais ou bilaterais, expressões utilizadas no artigo correspondente do Código revogado. Nesses casos, o contrato se aperfeiçoa, mas apenas uma ou ambas as partes têm prestações a cumprir – razão pela qual serão unilaterais ou bilaterais. Já nos contratos gratuitos, a parte a quem o contrato aproveita responde por simples culpa, mas só responde por dolo aquela a quem o contrato impõe apenas sacrifício.

A culpa simples – mesmo levíssima – obriga aquele que se beneficia do contrato a indenizar. No entanto, aquele a quem o contrato não beneficia só responde por dolo – conduta deliberadamente destinada a produzir o resultado danoso. Vale observar que a culpa grave equipara-se ao dolo. A regra confere tratamento benéfico ao que celebra o contrato sem auferir vantagem. Essa regra tem aplicação, exemplificativamente, ao comodatário e ao motorista que dá carona a terceiro (a questão é objeto da Súmula n. 145 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça: “no transporte desinteressado, de simples cortesia, o transportador só será civilmente responsável por danos causados ao transportado quando incorrer em dolo ou culpa grave”). Contudo, em relação especificamente ao denominado transporte de cortesia, que motivou a edição da Súmula n. 145, convém fazer o registro de que parte da doutrina tem considerado que ela já não pode prevalecer, uma vez que o CC, 736 afastou sua natureza contratual, e, em razão disso, a responsabilidade do transportador é regida apenas pela regra geral do 927, CC (Vejam-se o comentário feito neste Código por Claudio Godoy ao art. 736, e o artigo de Ênio Santarelli Zuliani referido em nota específica indicada na sequência).

A segunda parte do CC 392 afirma que nos contratos onerosos – aqueles em que há vantagens e sacrifícios recíprocos – qualquer das partes responde por culpa, salvo as exceções previstas em lei. É preciso observar que o art. 392, CC, alterou expressões utilizadas no CC 1.057, substituindo os termos unilaterais e bilaterais por, respectivamente, benéficos e onerosos. De fato, o tratamento menos rigoroso para as consequências do inadimplemento só se justifica caso se leve em conta a inexistência de vantagem para uma das partes, e não a presença de obrigações recíprocas, que caracteriza distinção entre contatos bilaterais e unilaterais (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 418 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 21/06/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.

Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não eram possíveis evitar ou impedir.

Ora, acessado o site Direito.com em 21.06.2019, tem-se matéria credibilizada a Pereira, Caio Mario da Silva, Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, p. 346, onde, Bdine Jr., dá classificação oposta à de Pereira (Bdine Jr., Hamid Charaf. Comentário ao artigo 393 do Código Civil, In Peluso, Cezar (coord.). A matéria diz que a lei não distingue o caso fortuito (casus) da força maior (vis maior) em razão do extenso debate doutrinário existente em torno da diferença entre ambos. Tradicionalmente, diz-se que o caso fortuito é “acontecimento natural, ou evento derivado da força da natureza, ou o fato das coisas, como o raio do céu, a inundação, o terremoto” e a força maior consiste em “fato de outrem, como a invasão do território, a guerra, a revolução, o ato emanado da autoridade (factum principis), a desapropriação, o furto etc.” Pereira. Em termos gerais, para que se verifique a inimputabilidade do devedor, a falta de prestação deve decorrer de obstáculo intransponível ao cumprimento da obrigação, estranho ao poder do devedor e oriundo de acontecimento natural ou fato de terceiro. assim, o caso fortuito ou de foça maior representam excludentes de responsabilidade, vez que rompem com o nexo de causalidade.

Destaque-se quer tais excludentes de responsabilidade aplicam-se até mesmo aos casos de responsabilidade objetiva – nos quais, relembre-se, é, igualmente, imprescindível a presença do nexo de causalidade. Nas relações de consumo, entretanto, há, excepcionalmente, a responsabilidade pela ocorrência de determinados riscos assumidos pelo fornecedor para atingir determinado resultado (fortuitos internos). Nesse aspecto, pode-se mencionar, ilustrativamente, os riscos de delito para uma empresa de segurança.

A respeito da questão, Pereira destaca que “não se pode munir o julgador de um padrão abstrato a que ajustar o fato, para decretar a exoneração do devedor. ao contrário, cada hipótese terá de ser ponderada segundo as circunstâncias que lhe são peculiares, e em cada uma ter-se-á de examinar a ocorrência do obstáculo necessário e inevitável à execução do devido. Pode até acontecer que o mesmo evento, que facultou a um devedor o cumprimento, para outro já se erija com aquelas características de impedir a prestação”. (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, op. cit., p. 348).

Na sequência, Guimarães e Mezzalina, a despeito do caso fortuito e da força maior, pode subsistir responsabilidade ao devedor em casos de: (i) convenção expressa entre as partes nesse sentido; (ii) mora do devedor, exceto se este demonstrar que não teve culpa no atraso ou que o dano teria ocorrido ainda que a obrigação tivesse desempenhada tempestivamente; (iii) substabelecimento a terceiro, a despeito de vedação do mandante, exceto se provar-se que o dano teria acontecido, independentemente do substabelecimento; (iv) gestão de negócios, quando são firmadas operações arriscadas pelo gestor ou quando este preterir interesses do gerido em benefício seu; (v) tradição de coisas que se vendem marcando ou assinalando, quando as coisas já tiverem sido postos à disposição do credor; e (vi) nos casos de risco profissional, quando previstos em lei (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 21.06.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em relação à Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, o artigo em comento consagra o princípio da exoneração do devedor, sempre que o desenvolvimento da obrigação não decorrer de culpa ou dolo seus.

Caso fortuito ou força maior. Foram empregados pelo legislador como sinônimos, mas doutrinariamente não se confundem, muito embora os autores divirjam sobre as diferenças entre os dois eventos. Os conceitos, muitas vezes, chegam a ser diametralmente opostos. Optou-se aqui, por seguir a corrente dos que entendem ser o caso fortuito o acidente que não poderia ser razoavelmente previsto, decorrente de forças naturais ou ininteligentes, tais como um terremoto, um furacão etc. (Clóvis Beviláqua, João Luiz Alves, ‘fito Fulgêncio e Carvalho de Mendonça). A força maior, tomando por empréstimo a definição de Huc, seria “o fato de terceiro, que criou, para execução da obrigação, um obstáculo, que a boa vontade do devedor não pode vencer” (Comentiire théorique et pratique du Code Civil, v. ‘7, p. 143). Exemplo de força maior: a guerra, o embargo de autoridade pública que impede a saída do navio do porto etc.

Os efeitos do caso fortuito e da força maior são idênticos: isentar o devedor da responsabilidade pelo descumprimento da obrigação. Salvo se o devedor houver assumido por cláusula expressa a responsabilidade pelo descumprimento mesmo ocorrendo caso fortuito ou força maior.

Ressalta, no entanto, Beviláqua que “no caso de mora o caso fortuito ou de força maior não escusa, se aconteceu depois da mora, salvo se o devedor provar que não teve culpa no atraso da prestação, ou que o dano ocorreria, ainda quando a obrigação fosse desempenhada oportunamente” (Clóvis Beviláqua, Código civil comentado, cit., p. 222). Vide CC 399 (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 214, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/06/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo o diapasão de Bdine Jr., nas hipóteses de força maior ou caso fortuito, desaparece o nexo de causalidade entre o inadimplemento e o dano, de modo que não haverá obrigação de indenizar. Trata-se, portanto, de causa excludente da responsabilidade civil, contratual ou extracontratual.

Na impede, porém, que as partes estabeleçam que a indenização será devida em caso de inadimplemento, mesmo que provocado por caso fortuito ou força maior. Considera-se caso fortuito ou força maior o fato necessário, cujos efeitos eram imprevisíveis ou inevitáveis (parágrafo único deste artigo). Embora a lei não faça distinção entre estas figuras, o caso fortuito representa fato ou ato estranho à vontade das partes (greve, guerra etc.); enquanto força maior é a expressão destinada aos fenômenos naturais (raio, tempestade etc.).

A característica mais importante dessas excludentes é a inevitabilidade, i.é, a impossibilidade de serem evitadas pelas forças humanas. Os requisitos para a configuração do caso fortuito ou da força maior são os seguintes: o fato deve ser necessário e não determinado por culpa do devedor; o fato deve ser superveniente e inevitável.; o fato deve ser irresistível – fora do alcance do poder humano.

Entre as excludentes de responsabilidade previstas no Código de Defesa do Consumidor – CDC, arts. 12, § 3º, e 14, § 3º -, essas hipóteses não figuram como causas de exclusão de responsabilidade, o que levou alguns autores a afirmarem que elas não impedem a condenação dos fornecedores a pagar a indenização. Mas é preciso verificar que, se o caso fortuito ou a força maior eliminam o nexo de causalidade entre o defeito e o dano, não estarão presentes os requisitos dos arts. 12 e 14 do CDC, de modo que não será caso de excluir a responsabilidade, mas sim de não haver incidência da regra ao caso concreto. Registre-se que nem mesmo nos casos de responsabilidade objetiva se dispensa o nexo causal como um de seus elementos essenciais.

De todo modo, e finalmente, nas relações de consumo, convém registrar, há casos excepcionais que se inserem no risco assumido pelo fornecedor para obtenção do resultado prometido ao consumidor. Trata-se do chamado fortuito interno, compreendido na própria atividade empresarial – risco de delitos para uma empresa de segurança são previsíveis e assumidos pelo fornecedor -, de modo que sua ocorrência não será capaz de eliminar o nexo de causalidade, obrigando o fornecedor a indenizar (Martins-Costa, Judith. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. V, t. II, 2003, p. 201 e ss.) (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 420 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 21/06/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

terça-feira, 18 de junho de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 389 - Do Inadimplemento das Obrigações – VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 389
- Do Inadimplemento das Obrigações
 – VARGAS, Paulo S. R.


Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título IV – DO INADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES
 (art. 389 a 420) Capítulo I – Disposições Gerais –
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.

Importantíssimo abrir este título IV, em suas disposições gerais, com os comentários de Bdine Jr. em relação aos contratos – e as obrigações de modo geral – que devem ser cumpridos, porque são obrigatórios para as partes (pacta sunt servanda). Distingue-se a responsabilidade que tem origem no inadimplemento de contrato ou em declaração unilateral de vontade daquela em que não se tem presente qualquer vínculo obrigacional anterior. A primeira é denominada responsabilidade contratual e a segunda, extracontratual ou aquiliana.

Segundo os ensinamentos do mestre Bdine Jr., a responsabilidade contratual, ora examinada, está fundada na culpa em sentido amplo, i, a obrigação de indenizar resulta da intenção do inadimplente de descumprir o contrato e causar prejuízo, ou da negligência, da imprudência ou da imperícia com que se houve. A obrigação de indenizar resultante do inadimplemento contratual pressupõe culpa do inadimplente. Na hipótese do inadimplemento contratual, a culpa é presumida – ao contrário do que ocorre na responsabilidade aquiliana -, de maneira que o ônus de ilidir tal presunção é do inadimplente, que só se exonera se demonstrar a ocorrência de caso fortuito ou força maior (CC, 393). Nada impede que o devedor assuma expressamente a responsabilidade indenizatória mesmo nas hipóteses em que se verifique caso fortuito ou força maior.

Os requisitos necessários ao reconhecimento da obrigação do inadimplente de indenizar o credor, na lição de Maria Helena Diniz, são os seguintes: a) obrigação violada; b) nexo de causalidade entre o fato e o dano produzido; c) culpa; e d) prejuízo ao credor (Curso de direito civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2002, v. II, p. 359).

Em caso de não cumprimento, o inadimplente responde por perdas e danos, mais juros e atualização monetária, segundo índices oficiais, e honorários de advogado, de acordo com a regra do CC, 389. Segundo Renan Lotufo, tais verbas não dependem do pedido expresso para serem concedidas, porque previstas em lei (Curso de direito civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2003, v. III, p. 431).

A regra não se aplica apenas às obrigações decorrentes do contrato, pois as obrigações também podem decorrer do negócio unilateral e de ordem judicial (LOTUFO, Renan, Op. cit., p. 429). A mesma consequência impõe-se quando a obrigação não é cumprida de modo imperfeito, i.é, de modo distinto daquele que foi estabelecido ou de forma intempestiva (CC, 395).

O fato de o CC, 389, não haver reproduzido a expressão do art.1.056, CC/1916 (“ou deixando de cumpri-la pelo modo e no tempo devidos”) não significa que o cumprimento imperfeito da obrigação não gere perdas e danos, pois a primeira frase do dispositivo mencionado compreende essa hipótese. Ademais, a mora (cumprimento que não se faz no tempo, no lugar e na forma estabelecidos em lei ou em convenção) é disciplinada nos arts. 394 e 395 e também prevê obrigação de o inadimplente suportar perdas e danos.

O Código em vigor alterou o nome do presente capítulo. Denominou-o Do Inadimplemento das Obrigações em lugar de Das Consequências da Inexecução das Obrigações. A nova expressão é mais abrangente que a anterior e, como observa Renan Lotufo, “compreende, primeiramente, o estudo do inadimplemento da obrigação em si mesmo, e, depois, o das suas consequências” (op. cit., p. 425)

Seguindo no diapasão de Bdine Jr., o adimplemento da obrigação é o modo regular ela qual ela se extingue. Já o inadimplemento provoca rompimento na estrutura social, autorizando o credor a reagir e lançar mão de certos meios para satisfazer seu crédito. Verifica-se quando o devedor não cumpre a prestação devida de modo voluntário ou quando, involuntariamente, fica impedido de fazê-lo. Haverá inexecução voluntária se o inadimplemento resultar de fato imputável ao devedor. a infração ao dever de cumprir a obrigação assumida pode resultar de conduta dolosa ou culposa (negligência, imprudência ou imperícia).

A impossibilidade no cumprimento da prestação, porém, pode decorrer de fato não imputável ao devedor e, se tal ocorrer, não lhe serão exigíveis as verbas indenizatórias contempladas nesse artigo. Acrescente-se que haverá reconhecimento de impossibilidade não imputável ao devedor se o cumprimento da prestação exigir dele “um esforço extraordinário e injustificável” (SAVI, Sérgio, “Inadimplemento das obrigações, mora e perdas e danos”. Obrigações: estudos na perspectiva civilconstitucional. Rio de Janeiro, Renovar, 2005, p. 462).

Contudo, a expressão inadimplemento também tem um conteúdo objetivo, oriundo da constatação de que a prestação não foi conferida ao credor. Há uma tendência doutrinária, aliás, de identificar o inadimplemento com essa situação objetiva, independentemente de culpa (ROSENVALD, Nelson. Direito das obrigações. Niterói, Impetus, 2004, p. 242, e RIZZARDO, Arnaldo, Direito das obrigações, Rio de Janeiro, Forense, 2004, p. 507). De fato, nem sempre a culpa do devedor terá relevância para a identificação do inadimplemento. Nesse passo, vale invocar a observação de Renan Lotufo, que registra: “o interesse do credor merece proteção segura e adequada, inclusive nas hipóteses em que o adimplemento foi impedido por causas estranhas à “’imputabilidade’ do devedor” (op. cit., p. 246). Não se afasta, ainda, a hipóteses de o devedor responsabilizar-se expressamente por prejuízos que não lhe sejam imputáveis, como se extrai do art. 393 (RIZZARDO, Arnaldo, Direito das obrigações, Rio de Janeiro, Forense, 2004, p. 480).

No Código de Defesa do Consumidor, verificam-se diversas hipóteses em que o inadimplemento contratual legitimará a obrigação de indenizar independentemente da culpa do fornecedor, pois, também no aspecto contratual, a responsabilidade haverá de amparar-se na teoria do risco, ultrapassando, aliás, de alguma maneira a distinção entre responsabilidade contratual e extracontratual. Nesse sentido, segue Bdine Jr., com a citação à lição de Luiz Antonio Rizzato Nunes (Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo, Saraiva, 2.000, p. 151): “Poder-se-ia dizer que antes – por incrível que possa parecer – risco do negócio era do consumidor. Era ele quem corria o risco de adquirir um produto ou serviço, pagar seu preço (e, assim, ficar sem seu dinheiro) e não poder dele usufruir adequadamente, ou, pior, sofrer algum dano. É extraordinário, mas esse sistema teve vigência até 10 de março de 1991, em flagrante injustiça e inversão lógica e natural das coisas. Agora, com a Lei n. 8.078, o risco integral do negócio é do fornecedor”.

Se o descumprimento da obrigação for involuntário por resultar de caso fortuito ou força maior, não haverá responsabilidade indenizatória daquele que não cumpre a prestação. A despeito das hipóteses em que a culpa é dispensada para justificar a indenização, ela continua sendo necessária, como regra geral, para que se justifique impor-se a obrigação de reparar perdas e danos, não se distinguindo da responsabilidade extracontratual, nesse aspecto (LOTUFO, Renan. OP, cit., p. 428).

Observe-se que a impossibilidade de que se trata neste capítulo é a superveniente, ou seja, que não se verificava no momento do nascimento da obrigação, uma vez que a impossibilidade contemporânea à sua formação é tratada no plano da validade dos negócios jurídicos, disciplinada no art. 104 do CC/2002 (LOTUFO, Renan. Op, cit., p. 428).

A regra do presente dispositivo refere-se ao inadimplemento absoluto – aquele em que a obrigação não foi nem poderá ser cumprida de modo útil e satisfatório. É o que ocorre, por exemplo, como perecimento do objeto. Nesse caso, o inadimplemento absoluto poderá ser total ou parcial, caso a integralidade da prestação, ou parte dela, não puder ser cumprida.

O inadimplemento relativo é aquele em que a obrigação não é cumprida no tempo, no lugar e na forma devidos, mas poderá sê-lo, com um proveito para o credor. Nesse caso estará caracterizada a mora, disciplinada pela regra do art. 394. Nos arts. 389 e 394, o legislador distinguiu entre o inadimplemento total e parcial e a mora. Na primeira hipótese, a prestação não pode ser cumprida, integral ou parcialmente, e será substituída por indenização. Na segunda, ainda que de modo imperfeito, a prestação pode ser satisfeita, mas sua imperfeição autoriza o credor a postular indenização.

A distinção, portanto, decorre de remanescer a possibilidade de o credor satisfazer a obrigação. Enquanto ela existir, haverá inadimplemento relativo; se ela deixar de existir, será absoluto. Não se confundem inadimplemento parcial absoluto e mora, portanto, uma vez que, no primeiro, parte da obrigação não tem possibilidade de ser adimplida, na segunda, ela sempre remanesce.

Na última parte do art. 234, cuida-se do inadimplemento absoluto. O art. 236, conforme o interesse do credor, admite as duas hipóteses: aceitação com deterioração, ou indenização por perdas e danos. A primeira hipótese equivale a inadimplemento absoluto parcial. O direito à indenização corresponde a efeito da mora (LOTUFO, Renan. Op, cit., p. 429). Contudo, se a obrigação consiste na entrega de diversos bens e alguns são recebidos intactos pelo credor, enquanto outros perece, somente há mora em relação a estes, pois, quanto aos demais, o adimplemento aperfeiçoou-se.

A obrigação inadimplida pode ser de dar, fazer ou não fazer. O art. 389 apresenta regra geral, aplicável a todas essas modalidades. A indenização corresponderá, em qualquer caso, aos prejuízos que a mora ou o inadimplemento causarem ao credor. No primeiro caso, porém, o credor poderá, por um lado, perseguir a própria prestação, além da indenização pelos prejuízos que suportou. Por outro lado, em caso de inadimplemento, a indenização equivale à própria prestação não recebida, ou recebida em parte. As perdas e danos correspondem ao prejuízo patrimonial ou extrapatrimonial da parte prejudicada pelo inadimplemento. Sua satisfação equivale à própria prestação não recebida, ou recebida em parte. As perdas e danos correspondem ao prejuízo patrimonial ou extrapatrimonial da parte prejudicada pelo inadimplemento. Sua satisfação equivale à recomposição de sua situação patrimonial e devem, portanto, ser proporcionais ao prejuízo efetivamente sofrido. Dessa forma, a indenização equivalerá ao “valor do bem jurídico lesado, a fim de evitar enriquecimento ilícito por parte do credor” (DINIZ, Maria Helena DINIZ. Curso de direito civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2002, v. II, p. 359).

O legislador não distinguiu entre dolo e culpa no que se refere às consequências do inadimplemento, tratando de modo geral a culpa genérica como suficiente para gerar a obrigação indenizatória. A distinção entre conduta dolosa e culposa só foi havida como relevante para os contratos benéficos de que trata o art. 392, do CC. Nos contratos onerosos, as partes têm direitos e deveres recíprocos e estão em condições de igualdade para responder por culpa ou dolo.

Seguindo no entendimento de Bdine Jr., pode ser que ocorra a mora, mas não o inadimplemento, de modo que ainda seja proveitoso ao credor o cumprimento da obrigação. Nesse caso, será aplicável a regra do art. 395 do CC. O devedor em mora estará sujeito às mesmas perdas e danos previstas no CC, 389. Esse dispositivo consagrou, ao lado das perdas e danos, a obrigação do inadimplente de pagar juros, atualização monetária e horários de advogado. Os juros, como se verá nos comentários aos arts. 404, 405 e 406, destinam-se a remunerar, ou a indenizar, os prejuízos que o atraso no cumprimento da obrigação principal, ou do pagamento da indenização proveniente do inadimplemento, provoca ao credor. A atualização monetária destina-se a evitar que a desvalorização da moeda em decorrência do processo inflacionário avilte o valor monetário devido, acarretando sua insuficiência para repor o credor na situação em que ele se encontrava anteriormente ao inadimplemento.

A preocupação do legislador em fazer menção expressa à correção monetária decorre do período em que foi elaborado o texto. Nos anos de 1970 e 1980, o processo inflacionário no Brasil gerou inúmeras perplexidades para a compreensão da correção monetária – o que, de certo modo, foi superado pela edição da lei n. 6.899/81, que disciplinou sua incidência aos processos judiciais. A preocupação do legislador levou-o a consagrar no texto do Código Civil a incidência da correção monetária como imperativo ético e econômico para a composição das perdas e danos.

Para evitar enriquecimento sem causa, a correção monetária deve ser calculada sempre a partir do momento em que a dívida tiver seu valor real fixado, pois se evitará, dessa forma, que a inflação verificada a partir daí impeça o credor de receber, em valores reais, o montante que efetivamente lhe é devido. Em relação ao ato ilícito, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula n. 43, do seguinte teor: “Incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do efetivo prejuízo”. Explica-se: se alguém é credor de R$ 1.000,00 daquele que causou dano a seu veículo, essa importância é válida e atual na data da elaboração do orçamento (10.05.2000, hipoteticamente). Ao ser ajuizada a demanda e após decorrerem dois anos após o orçamento, a R$ 2.400,00. Para que o credor seja de fato indenizado, a correção monetária seguirá o índice que manterá atualizado o valor devido.

Não se confunde a correção monetária com os juros, nem se pode admitir que ela seja realizada por índice a que se agreguem juros, pois tal proceder implicaria desvirtuamento de seu objetivo: a correção monetária nada acresce ao valor – como fazem os juros -, limitando-se a mantê-lo atualizado. Anote-se, ainda, que o legislador não deixou em aberto a utilização de qualquer índice de correção monetária, afirmando que ele deve ser oficial.

Finalmente, conclui Bdine Jr., o dispositivo em exame acrescenta os honorários de advogado ao valor indenizatória. Ao acrescentar a verba honorária entre os valores devidos em decorrência das perdas e danos, parece que o legislador quis permitir que a parte prejudicada pelo inadimplemento possa cobrar o que despendeu com honorários, seja antes de ajuizar a ação, seja levando em conta a diferença entre aquilo que contratou com seu cliente e aquilo que foi arbitrado a título de sucumbência. Não se pode supor que tenha feito menção a essa verba apenas para os casos de ajuizamento da ação, quando houver a sucumbência, pois, nessa hipótese, a solução já existiria no art. 20 do Código de Processo Civil/1973, com correspondência no art. 85, do CPC/2015, e não é adequada a interpretação que conclui pela inutilidade do dispositivo. As dificuldades apontadas para a incidência deste dispositivo tampouco preocupam. Se o credor contratar um advogado que resolveu extrajudicialmente sua questão, ao obter indenização por perdas e danos sem necessidade de ingressar em juízo, haverá prejuízo para ele se da quantia obtida tiver que deduzir os honorários devidos ao profissional. Por isso é que a disposição se revela adequada: para que a indenização devida ao credor, vítima do inadimplemento, seja plena, sem necessidade de dedução dos honorários da atuação extrajudicial. Caso o valor dos honorários contratados pelo credor se revele exagerado, haverá abuso de direito (art. 187) e só se reconhecerá a ele o direito ao pagamento de honorários adequados ao que usualmente se paga por atividades daquela espécie – indicada, inclusive, pela Tabela de Honorários da OAB. Nem se imagine que o fato represente novidade no sistema indenizatório. Diariamente, condenam-se causadores de danos a indenizar o valor dos honorários médicos, que também se sujeitam à verificação de sua razoabilidade. Idêntico tratamento poderá incidir nos casos de competência do Juizado Especial nos quais a regra especial afasta a verba de sucumbência (arts. 54 4 55 da Lei m. 9.099/95). Com efeito, se aquele que se vale dos serviços do Juizado precisar constituir advogado em demanda sujeita ao disposto neste artigo, poderá postular a verba honorária como integrante de sua indenização, e o fará com amparo nos arts. 389 e 404 deste Código, pois não será honorários de sucumbência, mas da intervenção extrajudicial de seu procurador. Não seria lógico que a atuação extrajudicial do advogado fosse remunerada e que isso não fosse possível nos casos em que ele precisasse ajuizar a ação perante o Juizado Especial. Pondere-se que o art. 55 da Lei n. 9.099/95 não seria desrespeitado, porque se dirige à verba de sucumbência, não às perdas e danos. Nas ações ajuizadas perante a Justiça Comum, os honorários do art. 20 do Código de Processo Civil/1973, com correspondência no art. 85, do CPC/2015, não poderão substituir o valor contratado pelo vencedor da demanda com o advogado a que conferiu mandato judicial, legando-lhe o ônus de suportar a diferença entre este e a sucumbência fixada pelo julgador. Se assim for, o vencedor da demanda estará suportando prejuízo que lhe foi gerado pelo inadimplemento levado a efeito pela parte vencida, o que configura prejuízo que o presente dispositivo quer excluir (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 409-413 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 16/06/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo a doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, em relação ao CC, 389, as obrigações devem ser cumpridas – o adimplemento é a regra, e o inadimplemento, diz Maria Helena Diniz, citando Valverde, a exceção, por seu uma patologia no direito obrigacional, que representa um rompimento da harmonia social, capaz de provocar a reação do credor, que poderá lançar mão de certos meios para satisfazer o seu crédito” (Curso de direito civil brasileiro, cit., p. 296).

Ocorre inadimplemento quando o devedor não cumpre a obrigação (absoluto) ou quando a cumpre imperfeitamente (relativo). Em ambos os casos, o devedor responderá pelas perdas e danos, em face dos prejuízos causados ao credor.

O art. 389 inova o direito anterior ao deixar expresso que a indenização deve incluir juros, atualização monetária e ainda honorários advocatícios (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 211, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 16/06/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo a esteira de Guimarães e Mezzalina, o inadimplemento da obrigação é a falta da prestação resultante de ato de responsabilidade do devedor. o inadimplemento pode ser (i) absoluto, quando a prestação tiver faltado completamente e não houver mais a possibilidade de ser executada, ou (ii) relativo, nos casos em que, embora o devedor não tenha cumprido, oportunamente, a prestação, esta ainda possa ser realizada (mora). Em ambos os casos, o devedor responderá pelas perdas e danos acarretados ao credor pelo descumprimento. No inadimplemento, a obrigação não se extingue. Há apenas sua transformação, com a alteração da prestação (mutação objetiva), impondo ao devedor o dever de ressarcir os prejuízos gerados à contraparte. Atente-se que nem sempre há a conversão da prestação original em dever de indenizar, dado que, em diversos casos, tal prestação ainda é passível de ser executada, ainda que de modo compulsório ou coercitivo. Assim, em casos tais, subsistem, conjuntamente, a prestação original e o dever de indenizar pelos danos verificados.

Ainda seguindo com Guimarães e Mezzalina, nas obrigações de fazer, a execução da prestação original pode ser determinada, judicialmente, quando a obrigação tiver caráter fungível. Não sendo este o caso – e se tratando de obrigação personalíssima -, há a conversão da obrigação de fazer em perdas e danos, sob pena de se atentar contra a liberdade do devedor.

A prestação, segundo a explicação dos autores, pode ainda não se realizar por fato inimputável ao devedor. essa segunda situação, denominada de impossibilidade, diz-se (i) subjetiva, nos casos em que envolve circunstâncias pessoais ligadas ao credor ou ao devedor; ou (ii) objetiva, quando a própria prestação é atingida, seja por um acontecimento de ordem física (impossibilidade objetiva natural), seja por óbice imposto pelo ordenamento jurídico (impossibilidade objetiva jurídica). Vale destacar que a impossibilidade pode atingir a prestação de forma parcial.

A falta de prestação pode decorrer tanto de infração intencional e voluntária do devedor tencionada a causar mal (dolo), quanto de sua falta de cuidado (culpa).

Desenvolvendo a ideia dos autores, a culpa pelo descumprimento da obrigação pode ser, ontologicamente, classificada como (i) contratual, quando estiver prevista em contrato, ou (ii) aquiliana, na hipótese em que derivar de dever legal positivo de respeitar direito alheio ou de não causar dano a outrem. Embora não haja diferenças entre ambas no tocante a suas consequências (dever de indenizar), distingue-se a culpa aquiliana da contratual no que se refere ao ônus da prova. Isso porque, enquanto na culpa aquiliana é do queixoso o ônus de demonstrar a violação, o dano e a relação de causalidade entre ambos, na responsabilidade contratual a questão inverte-se e o devedor apenas se exonera da responsabilidade, se provar a existência de caso fortuito ou força maior (CC, 393). A distinção de tratamento reside no fato de que, com o contrato, há a violação de um dever específico e, logo, pressupõe-se o dano e a relação de causalidade. Na culpa aquiliana, é necessário que se demonstre que o descumprimento da norma jurídica, necessariamente, prejudicou o queixoso.

Como já foi comentado acima, Bdine Jr., defende a possibilidade de, em caso de inadimplemento, haver cobrança de honorários advocatícios convencionais fixados pela parte, inclusive, independentemente, de ajuizamento de ação judicial. Nesse sentido, comenta que “ao acrescentar a verba honorária entre os valores devidos em decorrência das perdas e danos, parece que o legislador quis permitir que a parte prejudicada pelo inadimplemento possa cobrar o que despendeu com honorários, seja antes de ajuizar a ação, seja levando em conta a diferença entre aquilo que contratou com seu cliente e aquilo que foi arbitrado a título de sucumbência. Não se pode supor que tenha feito menção a essa verba apenas para os casos de ajuizamento de ação, quando houver a sucumbência, pois, nessa hipótese, a solução já existiria no art. 20 do Código de Processo Civil/1973, com correspondência no art. 85, do CPC/2015, e não é adequada a interpretação que conclui pela inutilidade do dispositivo. As dificuldades apontadas para a incidência deste dispositivo tampouco preocupam. Se o credor contratar um advogado que resolveu extrajudicialmente sua questão, ao obter indenização por perdas e danos sem necessidade de ingressar em juízo, haverá prejuízo para ele se da quantia obtida tiver que deduzir os honorários da atuação extrajudicial. Por isso é que a disposição se revela adequada: para que a indenização devida ao credor, vítima do inadimplemento, seja plena, sem necessidade de dedução dos honorários da atuação extrajudicial” (Bdine Jr., Hamid Charaf apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 409, comentário ao art. 389 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 16/06/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Encerram Guimarães e Mezzalina, com uma jurisprudência: “Direito civil e processual civil. Prequestionamento, ausência. Súmula 211/STJ. Dissídio jurisprudencial. Cotejo analítico e similitude fática. Ausência. Violação da coisa julgada. Reclamação trabalhista. Honorários convencionais. Perdas e danos. Princípio da restituição integral. Aplicação subsidiária do Código Civil. 1. A ausência de decisão acerca dos dispositivos legais indicados como violados, não obstante a interposição de embargos de declaração, impede o conhecimento do recurso especial. 2. O dissídio jurisprudencial deve ser comprovado mediante o cotejo analítico entre acórdãos que versem sobre situações fáticas idênticas. 3. A quitação em instrumentos de transação tem de ser interpretada restritivamente. 4. Os honorários convencionais integram o valor devido a título de perdas e danos, nos termos dos arts. 389, 395 e 404 do CC/02. 5. O pagamento dos honorários extrajudiciais como parcela integrante das perdas e danos também é devido pelo inadimplemento de obrigações trabalhistas, diante da incidência dos contratos trabalhistas, nos termos do art. 8º, parágrafo único, da CLT. 6. Recurso especial ao qual se nega provido” (STJ, 3ª T., REsp n. 1037797 – MG, Rel. Des. Nancy Andrighi, j. 17.2.2011) (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 16.06.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).