segunda-feira, 16 de novembro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.337, 1.338, 1.339 Do Condomínio Edilício – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - Art. 1.337, 1.338, 1.339

Do Condomínio Edilício – VARGAS, Paulo S. R. - Parte Especial –

 Livro IIITítulo III – Da Propriedade (Art. 1.331 a 1.358) Capítulo VII

– Do Condomínio Edilício – Seção I – Disposições Gerais–

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Art. 1.337. O condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com seus deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem.

Parágrafo único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento antissocial, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembleia.

No comentário ao artigo, escrevem Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo trata da figura do “condômino nocivo”, ou seja, aquele que não cumpre, de forma reiterada, com os seus deveres perante o condomínio, podendo ser convocada assembleia extraordinária que, mediante deliberação de três quartos dos condôminos restantes, poderá aplicar multa correspondente ao quíntuplo do valor da contribuição condominial. Se a reiteração do comportamento antissocial gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos a multa poderá corresponder ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais.

Enunciado 92 do Conselho da Justiça Federal: “As sanções do art. 1.227 do Código Civil não podem ser aplicadas sem que se garanta direito de defesa ao condômino nocivo”.

Enunciado 508 do Conselho da Justiça Federal: “Verificando-se que a sanção pecuniária mostrou-se ineficaz, a garantia fundamental da função social da propriedade (arts. 5º, XXIII, da CRFB e art. 1.228, § 1º, do CC) e a vedação ao abuso do direito (arts. 187 e 1.228, § 2º, do CC) justificam a exclusão do condômino antissocial, desde que a ulterior assembleia prevista na parte final do parágrafo único do CC 1,337 do Código Civil delibere a propositura de ação judicial com esse fim, asseguradas todas as garantias inerentes ao devido processo legal”. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com acesso em 16.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No comentário de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame não tem correspondência no Código Civil de 1916 nem na Lei n. 4.591/64. É mais amplo do que o § 2º do CC 1.336, anteriormente examinado, porque abrange todos os deveres do condômino perante o condomínio, previstos na lei, convenção ou regimento interno, inclusive o inadimplemento do pagamento da contribuição condominial do inciso I. De algum modo, foi o mecanismo compensatório criado pelo legislador, para coibir que a multa moratória de 2% estimule o inadimplemento dos condôminos.

Alcança o preceito não somente o condômino, como todas as pessoas a ele vinculadas, como o possuidor direto (locatário, comodatário etc.), empregados, familiares e visitantes. Serão condôminos e ocupantes devedores solidários da multa frente ao condomínio (STJ, REsp n. 254.520/PR, rel. Min. Barros Monteiro), embora haja entendimento de que certas condutas individuais vinculam apenas o ocupante infrator e não o proprietário (/27"794/315).

A imposição da multa independe de previsão na convenção de condomínio e exige apenas que a conduta ilícita seja “reiterada”, não bastando, portanto, ato isolado e pontual. O que se pune é a renitência do condômino em curvar-se a seus deveres perante o condomínio. Mesmo em relação ao inadimplemento da obrigação de pagar as despesas condominiais, a imposição da multa está subordinada a um certo lapso temporal, apurável caso a caso, ou ao sistemático pagamento em atraso, de certo modo aproveitando-se o condômino da reduzida sanção pecuniária prevista no CC 1.336, § 1º, acima comentado. Nada impede que mais de uma multa seja aplicada pela assembleia, desde que a prática ilícita persista por novo lapso temporal que configure a reiteração. O teto do valor da multa, de cinco contribuições, é cogente e não pode ser suplantado por previsão da convenção ou deliberação da assembleia, com a exceção do parágrafo único, abaixo comentado. A imposição da multa leva em conta dois fatores: a persistência e a gravidade da conduta ilícita do condômino. Deve o juiz, com fundamento no art. 413 do Código Civil, verificando o desprezo pelos vetores acima e a desproporção entre o valor da multa e a gravidade da infração, ou os danos infligidos aos condôminos, efetuar sua redução por equidade. Lembre-se de que a multa é devida independentemente das perdas e danos, podendo ser cobradas cumulativamente, sem qualquer abatimento ou compensação. A multa é sempre imposta em assembleia, com o quorum qualificadíssimo dos condôminos restantes. Conta-se o quorum com base nas frações ideais, salvo se outro critério for previsto na convenção, dos condôminos aptos a votar. Excluem-se, portanto, os condôminos cuja conduta ilícita será avaliada e os inadimplentes. Todos os condôminos são convocados, mas somente os aptos deliberam.

Questão controversa é a da necessidade da imposição da multa ser antecedida de oportunidade de defesa ao condômino. O Enunciado n. 92 da Comissão de Estudos Judiciários, que se reuniu no STJ (I Jornada de Direito Civil), é do seguinte teor: “As sanções do art. 1.337 do novo Código Civil não podem ser aplicadas sem que se garanta direito de defesa ao condômino nocivo”. Há, porém, boa jurisprudência no sentido oposto, qual seja, o de que a aplicação de multa ao condômino inadimplente não exige “obediência a normas do devido processo legal, próprias ao processo judicial” (£7807/310). Dos entendimentos opostos se extrai que o condômino deve ser previamente advertido e convidado a prestar esclarecimentos por escrito ou em assembleia, perante os demais condôminos. Não se exige, todavia, ampla dilação probatória nem precisa ser fundamentada a decisão que em assembleia aplica a multa.

O parágrafo único do CC 1.337 regula a aplicação de pena agravada, quando a conduta ilícita, além de grave e reiterada, de caráter antissocial, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos.

O comportamento antissocial, no dizer de Edson Luiz Fachin, está presente naquelas situações em que “a estabilidade das relações entre condôminos é gravemente ameaçada, inviabilizando a convivência social” (Comentários ao Código Civil. São Paulo, Saraiva, 2003, v. XV, p. 261). Os valores tutelados pela lei - salubridade, segurança, sossego e moral - são atingidos de modo severo e seguido, colocando em risco a viabilidade da vida condominial. A multa imposta tem o teto cogente de dez vezes o valor da contribuição condominial, sem prejuízo da obrigação de compor perdas e danos. O modo de imposição é obscuro, porque contém o artigo a expressão “até posterior deliberação da assembleia”. Duas interpretações são possíveis. A primeira é a de que a aplicação da multa é feita pelo síndico e referendada a posteriori pela assembleia. A segunda é a de que a própria assembleia impõe a multa que, face à gravidade da conduta do condômino, incidirá com periodicidade sobre o objeto da deliberação, até que ulterior decisão do mesmo órgão a faça cessar. Parece preferível a segunda corrente, porque seria um contrassenso que a multa de cinco contribuições exigisse decisão da assembleia, mas a multa superior e qualificada de dez contribuições pudesse ser aplicada diretamente pelo síndico.

Não diz a lei se as sanções pecuniárias do CC 1.337 esgotam as providências para fazer cessar a conduta ilícita do condômino. Parece claro que, a par da multa, podem ajuizar o condomínio, os condôminos ou mesmo possuidores prejudicados tanto ação indenizatória como de obrigação de fazer ou de não fazer, inclusive com pedido cominatório ou de tutela específica, na forma do art. 461 do Código de Processo Civil de 1973 (Atualmente no CPC/2015, na Seção IV – Do Julgamento das ações Relativas às Prestações de Fazer, de Não Fazer e de Entregar Coisa, art. 497 – Grifo VD). Entre as medidas assecuratórias do resultado prático equivalente ao adimplemento, que preferem as perdas e danos, estão a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e impedimento de atividades nocivas, se necessário com requisição de força policial. Cabe, assim, medida para retirar o condômino nocivo do edifício, para apreender objetos perigosos, que causem ruídos, ameacem a saúde ou o sossego dos demais condôminos ou a interdição de determinadas atividades ilícitas. Tais medidas certamente farão cessar o ilícito, na maioria dos casos. Note-se que em tais casos perde o condômino o direito de usar a unidade, permanecendo, todavia, com a posse indireta e a prerrogativa de fruição, entregando-a à exploração lícita de terceiros.

A dúvida está na possibilidade de compelir a alienação forçada da unidade autônoma, com exclusão definitiva do condômino que mantém grave e reiterada conduta antissocial, refratário a todas as punições acima previstas. Caso as medidas anteriores não se mostrem eficazes - o que dificilmente ocorrerá -, é possível, no silêncio da lei, a venda judicial do imóvel, sub-rogando-se o condômino no preço, abatidas as multas e indenizações exigíveis. A função social da propriedade não mais é limite, mas seu conteúdo, como visto no comentário ao CC 1.228, § 1°, do Código Civil. Não teria sentido, portanto, tutelar o direito de propriedade exercido com abuso e que fere a função social, com natureza de ato ilícito (art. 187 do CC), mantendo situação que compromete a vida social no condomínio (cf. Nehme, Jorge Elias. “Tutela de exclusão do condômino nocivo”. In: RT806/44; Moran, Maria Regina Pagetti. Exclusão do condômino nocivo nos condomínios em edifício. São Paulo, LED, 1996; Sartorelli, Renato Sandreschi. “A exclusão do condômino nocivo perante a legislação do condomínio”. In: Condomínio edilício, coord. F. A. Casconi & J. R. N. Amorim. São Paulo, Método, 2005). (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.364-65. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 16/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Historicamente, a redação original deste artigo era a seguinte: “O condômino, ou possuidor, que por causa do seu reiterado comportamento antissocial, tornar absolutamente insuportável a moradia dos demais possuidores, ou a convivência com eles, poderá, de igual modo, ser constrangido a pagar muita correspondente ao décuplo das suas contribuições, a qual vigorará até ulterior deliberação da assembleia”. Emenda da lavra do Senador Josaphat Marinho modificou o parágrafo único do artigo em comento, que inicialmente assim dispunha, com o intuito de aperfeiçoar a redação. A emenda foi justificada no Senado como sendo de mero aperfeiçoamento redacional.

Em sua doutrina, Ricardo Fiuza afirma que este dispositivo e seu parágrafo único estão embasados no art. 21 da Lei n. 4.591, de 16-12-1964, que regulamenta o condomínio em plano horizontal. Inova ao estabelecer um teto para a multa, que é o quíntuplo da cota condominial, na hipótese do caput. Cria, ainda, a possibilidade de ser deste jogo multado o condômino que tenha reiterado comportamento antissocial, dificultando a convivência em comum, em um décuplo, na hipótese do parágrafo único do artigo. No mais, deve ser dada à matéria o mesmo tratamento doutrinário dispensado ao dispositivo já apontado da Lei n. 4.591/64. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 686, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 16/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.338. Resolvendo o condômino alugar área no abrigo para veículos, preferir-se-á, em condições iguais, qualquer dos condôminos a estranhos, e, entre todos, os possuidores.

No histórico, o então Senador Itamar Franco visando dar preferência ao possuidor para a utilização das áreas comuns, foi o responsável pela modificação implementada no presente dispositivo, que inicialmente apresentava a seguinte redação: “Resolvendo o condômino alugar área no abrigo para veículo preferir-se-á, em condições iguais, qualquer dos condôminos ao estranho. Segundo a justificativa da emenda, de autoria do então Senador Itamar Franco, e com a qual anuiu o relator Fiuza, “é natural que na opção prevista se dê preferência aos possuidores. A presunção é que o possuidor, no edifício, concorre para melhor relacionamento nos espaços do condomínio”. Em sua doutrina, simples comentário do Relator, Ricardo Fiuza, inova este artigo ao trazer para as normas que regulam o condomínio em plano horizontal o exercício do direito de preferencia, que é salutar, evitando atritos no que concerne à locação de garagens. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 686, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 16/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame não tinha correspondente no Código Civil de 1916 ou na Lei n. 4.591/64. No regime anterior, a doutrina majoritária era no sentido de que podia a convenção impor restrição ou vedar a locação ou empréstimo de vagas, especialmente em relação a terceiros estranhos ao condomínio (JTJ-Lex 173/218).

A questão fundamental é saber se a norma é cogente ou dispositiva, se prevalece sobre a convenção condominial ou, ao contrário, se aplica em caráter supletivo, no silêncio desta. Ao contrário do que defende parte da doutrina (Viana, Marco Aurélio S. Comentários ao Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. XV I, p. 463), a norma é cogente, porque não teria sentido a lei atribuir nova prerrogativa ao condômino, alterando o sistema anterior, mas subordiná-la à autorização convencional. Não se discute que a norma pode gerar incômodos e perigos, especialmente na locação de garagens a terceiros estranhos ao condomínio, mas eventual interferência prejudicial deve ser corrigida pelos mecanismos dos arts. 1.336, § 2º, e 1.337, anteriormente comentados. Responde o condômino, assim, pelos maus atos do locatário, a quem locou seu espaço na garagem. Usa a norma a expressão “ locação de área no abrigo de veículos”, que abrange todas as modalidades de vagas, já examinadas no art. 1.331, quer sejam unidades autônomas, partes acessórias ou espaços indeterminados no subsolo. A locação isolada da vaga de garagem, sem correspondente locação de unidade autônoma como coisa principal, rege-se pelo Código Civil e comporta denúncia vazia, inaplicáveis as regras cogentes da Lei do Inquilinato (Lei n. 8.245/91). De outro lado, a alienação ou locação de garagem que constitui unidade autônoma de edifício-garagem é livre a terceiros, sem incidência do direito de preferência a que alude o artigo em estudo.

Estabelece a lei novo direito de preferência na locação de garagens. Os condôminos preferem estranhos. Entre diversos condôminos, o possuidor prefere o não possuidor. A expressão “possuidor” gera dúvida. Embora comporte o termo mais de uma interpretação, a melhor é no sentido de que, entre diversos condôminos, tem preferência aquele que já ocupa a vaga alheia, como comodatário ou locatário. Caso diversos condôminos sem “posse” da vaga posta em locação disputem a preferência, aplica-se por analogia a regra do CC 1.322. A primeira preferência será do condômino com maior fração ideal, ou, insuficiente o primeiro critério, abre-se licitação entre os diversos interessados.

Não disciplina o artigo a natureza do direito de preferência, nem detalha o modo de seu exercício. Na lição de Edson Luiz Fachin, trata-se de preferência decorrente de direito real, que acarreta a ineficácia do negócio jurídico, permitindo ao condômino preterido buscar a posse da coisa locada para si, em vez de pleitear simples perdas e danos (Comentários ao Código Civil. São Paulo, Saraiva, 2003, v. XV, p. 262). Quanto ao modo de exercício, o silêncio da lei dá espaço à convenção e ao regimento interno para estabelecer a forma de aviso aos interessados e o prazo para a manifestação da preferência. Na omissão da convenção, razoável que se admita que a intenção de locar a vaga seja manifestada ao síndico, para que este a transmita aos condôminos, ou, então, promova a fixação em local visível a todos os interessados, como quadros de avisos junto aos elevadores. Quanto ao prazo para exercício da preferência, no silêncio da convenção se aplica por analogia o disposto no CC 504. Não se confunde a locação com a prática, comum em edifícios, de o condômino autorizar o estacionamento ocasional em sua vaga a parentes ou visitantes, caso em que deverá acompanhá-lo e assumir a responsabilidade por eventuais danos causados aos demais condôminos. Lícito é a convenção, regimento ou deliberação em assembleia subordinar tal conduta a certas cautelas, como prévia identificação perante porteiros e vigias. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.366-67. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 16/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Os autores Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira limitam-se ao Enunciado 320 do Conselho da Justiça Federal: “O direito de preferência de que trata o art. 1.338 deve ser assegurado não apenas nos casos de locação, mas também na hipótese de venda da garagem”. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com acesso em 16.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.339. Os direitos de cada condômino às partes comuns são inseparáveis de sua propriedade exclusiva; são também inseparáveis das frações ideais correspondentes as unidades imobiliárias, com as suas partes acessórias.

§ 1º Nos casos deste artigo é proibido alienar ou gravar os bens em separado.

§ 2º É permitido ao condômino alienar parte acessória de sua unidade imobiliária a outro condômino, só podendo fazê-lo a terceiro se essa faculdade constar do ato constitutivo do condomínio, e se a ela não se opuser a respectiva assembleia geral.

Para os autores Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira o proprietário não pode alienar separadamente a fração ideal de suas partes acessórias, ressalvando-se a possibilidade de alienação destacada de parte acessória em favor de outro condômino, como nos casos de venda de garagem. Quando o adquirente for terceiro estranho ao prédio, a faculdade de alienação dependerá de previsão no ato constitutivo do condomínio, desde que não ocorra oposição da assembleia geral. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com acesso em 16.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo a lição de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em estudo não tem correspondente no Código Civil de 1916. Os arts. 2º e 3º da Lei n. 4.591/64 aludem à impossibilidade de alienação das parles comuns destacadas da unidade autônoma, bem como preveem a possibilidade de transferência a outro condômino do direito à guarda de veículos na garagem. A grande novidade do preceito está na possibilidade, prevista no § 2º, de o condômino alienar parte acessória de sua unidade a terceiro não condômino, se não o proibirem a convenção e a assembleia.

O caput do artigo atesta a natureza jurídica do condomínio edilício, que mescla propriedades individual e comum formando uma unidade orgânica e indissolúvel. Não se cogita unidade autônoma sem fração ideal nas coisas comuns, nem vice-versa. O § 1º explicita a consequência de tal conceito, vedando a alienação ou gravame da unidade sem a correspondente fração ideal, ou o inverso.

O § 2º admite a alienação das partes acessórias da unidade a outro condômino e a terceiros, se assim prever o ato constitutivo do condomínio e não houver oposição da assembleia geral. A parte acessória não se confunde com a parte comum. Está ligada à unidade autônoma por seu destino econômico e serve somente a seu titular. Tomem-se como exemplos as vagas de garagem e os depósitos de cada unidade, situados no pavimento térreo, no subsolo do edifício. No regime da Lei n. 4.591, afirma Caio Mário da Silva Pereira que “o proprietário de apartamento que tem direito a garagem pode cedê-lo a outro proprietário, tenha ou não este igual direito, pois nada impede que um que também é titular de utilização dela duplique o seu direito para abrigar dois carros” (Condomínio e incorporações, 10. ed. Rio de Janeiro, Forense, 2002, p. 160).

Na lição de Júlio dos Santos Vidal Júnior, o abrigo para veículos pode ser identificado como: a) garagem coletiva, com fração ideal incluída na área comum do prédio, b) garagem demarcada, com local certo para cada condômino estacionar seu veículo, com fração comum a todos os condôminos com direito a estacionar veículos; e c) vaga individual, individualizada e demarcada, com fração ideal de terreno específica, configurando uma unidade autônoma (“Locação e sorteio de vagas de garagem localizadas em prédio em condomínio”. In: Condomínio edilício, coord. F. A. Casconi & J. R. N. Amorim. São Paulo, Método, 2005).

No que se refere à alienação das partes acessórias a terceiro estranho ao condomínio, comporta a regra algumas observações. Somente é compatível a alienação se a parte acessória for objeto de matrícula própria, com atribuição de fração ideal de terreno, passível de se desvincular da unidade autônoma principal, caso em que ganha o direito de autonomia. Não se cogita, portanto, a alienação de vagas indeterminadas na garagem a terceiros estranhos ao condomínio ou de direito de estacionamento em subsolo comum, uma vez que não haveria como individualizar a propriedade do adquirente, em atenção ao princípio da especialidade. Em termos diversos, inviável a tradução do direito de utilização da garagem somente em fração ideal, se o terceiro não é proprietário de unidade autônoma do edifício. Ainda que tenha a garagem - ou outra parte acessória - matrícula, fração ideal de terreno e individualização própria, está a alienação a terceiros subordinada a duplo requisito, de natureza cumulativa: a previsão no ato constitutivo do condomínio e a não oposição da assembleia. Logo, ainda que exista previsão no ato constitutivo, pode a assembleia, sem necessidade de quorum qualificado, vetar tal alienação, por não atender o interesse do condomínio. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.368-69. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 16/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como reza o histórico, a redação deste artigo no projeto de Ebert Chamoun, era a seguinte: “E facultado, porém, ao condômino alienar parte acessória de sua unidade imobiliária a outro condômino, titular de unidade contígua, só podendo fazê-lo a terceiro se essa faculdade constar do ato constitutivo do condomínio , e se a ela não se opuser a assembleia geral dos condôminos.” O então Senador Itamar Franco, por considerar a cláusula “titular de unidade contígua?’ secundária, decidiu por suprimi-la, através da Emenda de n. 138, de sua autoria. A justificativa da emenda apresentada perante o Senado Federal, e com a qual anuiu o relator Fiuza, foi a seguinte: “O parágrafo do art. 1.339 faculta ao condômino ‘alienar parte acessória de sua unidade imobiliária a outro condômino, titular de unidade contígua, só podendo fazê-lo a terceiro se essa faculdade constar do ato constitutivo do condomínio, e se a ela não se opuser a assembleia geral dos condôminos’. A emenda quer suprimir a cláusula ‘titular de unidade contígua’ que é, evidentemente secundária no caso, sobretudo porque o texto admite a venda a terceiro, se o permitir ‘o ato constitutivo do condomínio’. Não deve haver distinção entre os condôminos para a alienação prevista, uma vez que todos estão igualmente obrigados à manutenção da ordem estabelecida”.

Claramente em sua Doutrina, afirma Ricardo Fiuza: Este artigo consagra o velho princípio de que o acessório segue o principal, estatuindo serem inseparáveis da propriedade exclusiva as partes comuns, bem como as frações ideais a ela correspondentes. O § 1º traz a proibição da venda ou gravame das partes em separado. O § 2º prevê a venda apenas quando autorizada pela convenção ou pela assembleia dos condôminos, tendo sempre preferência o condômino ao estranho. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 687, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 16/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 13 de novembro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.334, 1.335, 1.336 Do Condomínio Edilício - Disposições Gerais – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - Art. 1.334, 1.335, 1.336

Do Condomínio Edilício – VARGAS, Paulo S. R. - Parte Especial –

 Livro IIITítulo III – Da Propriedade (Art. 1.331 a 1.358) Capítulo VII

– Do Condomínio Edilício – Seção I – Disposições Gerais–

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Art. 1.334. Além das cláusulas referidas no art. 1.332 e das que os interessados houverem por bem estipular, a convenção determinara:

 I - a quota proporcional e o modo de pagamento das contribuições dos condôminos para atender às despesas ordinárias e extraordinárias do condomínio;

II — sua forma de administração;

III — a competência das assembleias, forma de sua convocação e quorum exigido para as deliberações;

IV — as sanções a que estão sujeitos os condôminos, ou possuidores;

V — o regimento interno.

§ 1º A convenção poderá ser feita por escritura pública ou por instrumento particular.

§ 2º São equiparados aos proprietárias, para os fins deste artigo, salvo disposição em contrário, os promitentes compradores e os cessionários de direitos relativos às unidades autônomas.

No comentário estendido de Francisco Eduardo Loureiro, o caput do artigo inicia dispondo que a convenção de condomínio deverá conter as cláusulas a que se refere o CC 1.332, anteriormente estudado, requisitos da instituição do condomínio edilício, a saber: a individualização e discriminação das unidades autônomas, a determinação da fração ideal correspondente a cada unidade e a finalidade das unidades. São o que Edson Luiz Fachin denomina disposições estruturantes do condomínio, sem as quais se está frente ao regime jurídico do condomínio tradicional, regido por regras diversas. O art. 9º da Lei n. 4.591/64, alíneas a e b do § 3º, explicitava requisitos semelhantes que, no dizer de Caio Mário da Silva Pereira, têm o escopo de permitir a cada condômino conhecer o que lhe pertence, individualmente, para que o possa defender e, ao mesmo tempo, respeitar a esfera jurídica alheia, e, no que tange às áreas comuns, usá-las sem exclusividade, a fim de não obstar o uso dos demais (Condomínio e incorporações, 10. ed. Rio de Janeiro, Forense, 2002, p. 137).

Prossegue o caput do artigo dizendo que os cinco incisos, adiante comentados, são o conteúdo mínimo da convenção, que pode também conter as cláusulas que os “ interessados houverem por bem estipular”. Abre-se espaço à autonomia privada, permitindo aos condôminos acrescentar outros dispositivos de seu interesse, desde que não afrontem norma cogente nem os princípios da função social do contrato e da propriedade, o equilíbrio contratual e a boa-fé objetiva. Não se admitem, também, cláusulas contrárias à própria natureza do condomínio edilício, que mescla as propriedades individual e comum. As normas da convenção têm natureza complementar, particularizando regras que a lei não poderia conter, dado seu casuísmo. Como lembra João Batista Lopes, são nulas “as cláusulas restritivas dos direitos dos condôminos, como as que impedem o direito de voto, limitam o direito de propriedade ou conferem exclusividade ao uso de áreas comuns” (Condomínio, 4. ed. atualizada e ampliada. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1993, p. 86). Os direitos básicos dos condôminos, previstos no CC 1.335, adiante comentado, não podem ser tolhidos ou suprimidos pela convenção. Tome-se como exemplo cláusula que imponha direito de preferência dos demais condôminos, no caso de alienação de unidade autônoma, que isente condômino do pagamento da contribuição condominial ou que imponha sanções excessivas ao inadimplente. As restrições aos direitos dos condôminos somente se justificam quando visam a coibir as interferências prejudiciais entre condôminos.

O inciso I trata do rateio das despesas e deve ser lido em consonância com o que dispõe o CC 1.336, I, adiante comentado, com a redação que lhe deu a Lei n. 10.931/2004. A princípio, o rateio se faz de modo proporcional às frações ideais das unidades autônomas. A regra, porém, é dispositiva, somente valendo no silêncio da convenção, que pode dispor em sentido diverso. Tome-se como exemplo a regra do CC 1.340, adiante comentado, que atribui as despesas das partes comuns de uso exclusivo a quem delas se aproveita. É o caso, por exemplo, de lojas no pavimento térreo de edifício, que não participam do rateio das despesas relativas à manutenção dos elevadores. Como lembra Caio Mário da Silva Pereira, “pode a convenção excluir da divisão das despesas ou de certas despesas determinadas unidades e incluir outras, bem como estabelecer o critério para que concorram uns e outros para as extraordinárias” (op. cit., p. 138). Deve, porém, haver razão objetiva que justifique o rateio de modo desproporcional às frações ideais, coibindo-se abusos, como de certos empreendedores que isentam ou criam critérios favoráveis às unidades reservadas para si, em detrimento dos demais consortes. Embora seja omisso o atual Código Civil, pode a convenção estabelecer a forma de contribuição para o fundo de reserva, a fim de fazer frente a despesas extraordinárias e urgentes.

O inciso II reza que a convenção disporá sobre a forma de administração do condomínio, em especial regras supletivas às previstas nos CC 1.347 e 1.348, adiante comentadas. Poderá, por exemplo, atribuir poderes ao síndico, além dos previstos no CC 1.347, estabelecer mandato inferior a dois anos, isentar o síndico das contribuições condominiais, prever a eleição de subsíndico ou, ainda, criar conselho fiscal ou conselhos e comissões auxiliares de administração.

O inciso III diz que a convenção deve disciplinar a competência das assembleias, sua forma de convocação e quorum exigido para deliberações. No que se refere à competência, as matérias previstas no CC 1.250 são objeto de assembleia ordinária. Nada impede que matérias outras, desde que não haja vedação legal, sejam também incluídas na assembleia ordinária, restando as demais para a assembleia extraordinária. No que se refere ao quorum, não pode a convenção suplantar a lei. Como diz Caio Mário da Silva Pereira, “para aquelas deliberações em que a lei estabelece quorum especial, não pode a convenção marcar outro diferente, nem para mais, nem para menos. Mas, onde se deixou o assunto para o alvedrio dos condôminos, poderão eles dizer se desejam maioria simples ou qualificada” (op. cit., p. 139). Tomem-se como exemplos os quorum já estabelecidos em lei para imposição de multa ao condômino renitente (CC 1.337), alteração da própria convenção (CC 1.351), destituição do síndico (CC 1.349), obras no edifício (CC 1.341 e 1.343) ou extinção do condomínio (CC 1.357), que não podem ser alterados pela convenção. O Código Civil é omisso quanto à forma e ao prazo de convocação dos condôminos para as assembleias, deixando amplo espaço para a convenção. Obrigatório, porém, que a convenção preveja a convocação de todos os condôminos e com prazo mínimo, aferível caso a caso, para que estes possam se informar e refletir sobre a ordem do dia. Em casos especiais, quando a deliberação afetar apenas alguns condôminos, é que os demais, estranhos à matéria em pauta, não precisarão ser convocados.

Dispõe o inciso IV que a convenção disporá sobre as sanções a que estão sujeitos os condôminos, ou possuidores, matéria mais bem analisada nos comentários aos CC 1.336 e 1.337. Basta lembrar que a convenção não pode ultrapassar os limites máximos cogentes das multas dos artigos mencionados, podendo, porém, estabelecer limites menores e a forma de sua imposição, como prazo de defesa do condômino ou necessidade de aprovação em assembleia.

O inciso V diz que a convenção determinará o regimento interno. Ao contrário do que afirma parte da doutrina, isso não quer dizer que no texto da convenção deva já constar obrigatoriamente o regimento interno. A convenção pode simplesmente determinar que se fará o regimento em momento posterior, dispondo sobre sua forma e quorum (Venosa, Sílvio de Salvo. Direito civil - direitos reais, 2. ed. São Paulo, Atlas, 2002, p. 293). O regimento, como se sabe, contém regras do dia-a-dia do condomínio, como regulamentação e horário de utilização da piscina, do salão de festas e do parque infantil. Não tem sentido que regras casuísticas, moldáveis pela necessidade dos condôminos, sejam estabelecidas no momento da criação do condomínio edilício. Note-se que o CC 1.351, com a redação que lhe deu a Lei n. 10.931/2004, dispõe que a alteração da convenção depende da aprovação de dois terços dos votos dos condôminos, o que, porém, não mais se aplica em relação ao regimento interno, que pode ser aprovado pelo quorum previsto na própria convenção e, em seu silenciar, por maioria simples.

No que se refere aos dois parágrafos do CC 1.334, o primeiro diz que a convenção pode ser feita por escritura pública ou particular. É negócio solene, porque a forma escrita é de sua substância, e sua eficácia, como visto no comentário ao artigo anterior, se dá em duas etapas, antes e depois do registro imobiliário. O § 2º também já foi objeto de menção no comentário ao CC 1.333, a que se remete o leitor, e diz que são equiparados aos proprietários os promitentes compradores e os cessionários de direitos relativos às unidades autônomas, salvo disposição em contrário. A novidade está na ressalva contratual, que retira dos compromissários compradores o direito de deliberar a convenção. Essa ressalva, porém, vai contra a própria natureza de contrato preliminar impróprio do compromisso de compra e venda, que transfere ao promissário comprador quase todos os poderes federados do domínio (utendi, fruendi e mesmo abutendi, pela cessão de direitos), remanescendo com o promitente vendedor apenas um domínio afetado à garantia do recebimento do preço. É por isso que o compromissário comprador, que responde pelas despesas condominiais e está adstrito às restrições da convenção, deve dela participar e deliberar. Em termos diversos, a ressalva negocial mencionada pela lei é incompatível com as relações de consumo e em determinados casos fere a boa-fé objetiva. Somente prevalece se houver justificativa plausível para a restrição (cf. NASCIMENTO FRANCO, João. Condomínio, 5. ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2005, p. 111). (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.350-52. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 13/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como sugere o relator do CC/2002, Ricardo Fiuza, este artigo e seus parágrafos e incisos estão embasados no § 3º do art. 9º da Lei n. 4.591, de 16-12-1964, que regulamenta o condomínio em plano horizontal. Apresenta inovações de redação e é de melhor técnica legislativa, modernizando as expressões, além de dar maior elastério aos proprietários e compromissários para a elaboração da convenção. Acaba com o excesso de pormenores existentes no § 3º do art. 9º da Lei n. 4.591/64, e possibilita, também, de modo explícito, que a convenção seja elaborada tanto por instrumento particular como por escritura pública. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 684, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 13/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo prevê cláusulas que deverão constar da convenção condominial, permitindo a sua elaboração por meio de instrumento particular ou escritura pública. Ressalvada disposição em sentido contrário, os promitentes compradores e os cessionários de direitos relativos às unidades autônomas são equiparados aos proprietários. A propósito, o enunciado 248 do Conselho da Justiça Federal: “O quorum para alteração do regimento interno do condomínio edilício pode ser livremente fixado na convenção”. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 13.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.335. São direitos do condômino:

I – usar, fruir e livremente dispor das suas unidades;

II – usar das partes comuns, conforme a sua destinação, e contato que não exclua a utilização dos demais compossuidores;

III -  votar nas deliberações da assembleia e delas participar, estando quite.

Como apontam Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o artigo disciplina os direitos do condômino sobre o que lhe pertence, bem como sobre aquilo que pertence indistintamente a todos os condôminos. O proprietário poderá usar, fruir e dispor da sua unidade. A utilização imediata, a fruição do bem com finalidade na exploração econômica e a disposição total (alienação) ou parcial (gravação de ônus real) do imóvel, inserem-se no âmbito da autonomia privada do proprietário, respeitados os direitos de vizinhança e observado o princípio da função social da propriedade (Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald, Direitos Reais, Ed. Lumen Juris, 4ª ed., p. 511).

Enunciado 566 do Conselho de Justiça Federal: “A cláusula convencional que restringe a permanência de animais em unidades autônomas residenciais deve ser valorada à luz dos parâmetros legais de sossego insalubridade e periculosidade”. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 13.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Sob o enfoque de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em estudo não tem similar no Código Civil de 1916. Corresponde, com inovações, ao art. 19 da Lei n. 4.591/64. Os três incisos não esgotam os direitos dos condôminos, constituindo um rol não exaustivo, mas de prerrogativas que não podem ser suprimidas ou comprimidas - salvo situações especiais - pela convenção ou regimento interno.

Direitos sobre a unidade autônoma: O inciso I, em consonância com o regime complexo do condomínio edilício, que mescla propriedade plena sobre a unidade autônoma com copropriedade sobre as partes comuns, assegura ao condômino os poderes federados do domínio - CC 1.228 - sobre a unidade, dispondo que pode usá-la, fruí-la e dela livremente dispor. Embora não mencione, está implícito o quarto poder do dono, qual seja, o de reivindicar a coisa que injustamente esteja sob posse ou detenção de terceiro. Note-se que o preceito apenas usa a qualificação “ livremente” para o direito de dispor, uma vez que os direitos de usar e de fruir estão conformados pelas restrições de vizinhança, sempre mais severas no regime do condomínio edilício e previstas no inciso IV do artigo seguinte. O direito de dispor envolve o de onerar a unidade autônoma e, com ela, a fração ideal que lhe é inerente e indissociável. Por isso, não pode norma convencional subordinar, por exemplo, tal direito à preferência dos demais condôminos.

No que se refere ao direito de usar e fruir a unidade autônoma, a regra deve ser lida em conjunto com o dever previsto no inciso IV do CC 1.336, adiante comentado, ou seja, deve o condômino dar a suas partes a mesma destinação da edificação e não as utilizar de modo prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes. Há farta casuística nos tribunais sobre a matéria, partindo de alguns pressupostos que podem ser delineados. O primeiro é que, pela própria natureza do condomínio edilício, as restrições de vizinhança são mais severas do que as gerais do próprio Código Civil, e complementadas por regras estatuídas na convenção de condomínio. O segundo é que o domínio sobre a unidade autônoma é pleno, de modo que somente se justificam as restrições convencionais se, no caso concreto, verificar que o comportamento do condômino agride os interesses eleitos pela lei - segurança, sossego, salubridade e bons costumes.

Quanto aos casos mais frequentes e às soluções majoritárias dadas pelos tribunais (cf. Nascimento Franco , João. Condomínio, 5. ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2005, p. 167- 214; v i a n a , Marco Aurélio da Silva. Comentários ao Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. XV I, p. 423-6):

• É direito do ocupante receber em sua unidade pessoas com quem mantenha amizade ou relações afetivas, do mesmo sexo ou do sexo oposto, cm homenagem aos direitos de personalidade, da liberdade sexual, intimidade e da vida privada. A conduta, porém, pode ser reprimida, quando desbordar para interferência prejudicial aos interesses dos demais condôminos, como segurança, salubridade e sossego; assim, reprime-se instalação na unidade de casa de prostituição, que, além de desviar a destinação, ofende os bons costumes, valor também tutelado pelo legislador.

• De igual modo, o barulho exagerado, desordens, festas frequentes até altas horas da noite ofendem a tranquilidade dos vizinhos e são reprimidos tanto pelas normas gerais do direito de vizinhança como pelas normas convencionais do condomínio; a regra abrange o barulho produzido por crianças, porém com margem maior de tolerabilidade, uma vez que algum ruído decorrente de brincadeiras, gritos ou choro constituem utilização normal da propriedade.

• Deve o condômino respeitar a destinação de sua unidade autônoma, não podendo usá-la para fins comerciais ou empresariais, se previsto o fim residencial, nem vice-versa. Tolera-se, porém, o uso misto, ainda que vedado pela convenção, desde que os valores tutelados pelo legislador - sossego, segurança, salubridade - não sejam atingidos nem os equipamentos comuns - elevadores, portaria, água -, sobrecarregados. São os casos de professores que ministram algumas aulas particulares, ou de advogados que recebem poucos clientes, ou costureiras que fazem algumas provas de roupas, ou prestadores de serviço em geral que usam a unidade para desenvolver suas atividades; por outro lado, não se admite a instalação de república de estudantes, quer pela provável ofensa ao sossego, quer pela sobrecarga aos equipamentos comuns.

• A manutenção de animais nas unidades gera entendimentos divergentes. Se a convenção for omissa, aplica-se a regra geral da preservação dos interesses tutelados pela lei, quais sejam, segurança, sossego e saúde. Caso, porém, a convenção proíba a permanência de animais, os tribunais se dividem. Há linha de interpretação mais rigorosa, de que deve a convenção ser seguida de modo estrito e quem vai habitar o condomínio tem ciência da restrição e a ela deve se amoldar. A linha majoritária, todavia, volta-se à prova da real nocividade do animal no caso concreto. Tolera-se a permanência do animal, se não for este prejudicial aos demais condôminos (RT 791/213, JTJ-Lex 167/32 e 248/34, JSTJ 49/176). Aquele que litiga contra a vedação convencional, porém, tem sobre seus ombros o ônus de demonstrar que os valores tutelados pela regra não foram vulnerados (cf. SOUZA, Sidney Roberto Rocha de. “Animais em apartamentos”. In: Condomínio edilício, coord. F. A. Casconi & J. R. N. Amorim. São Paulo, Método, 2005). Direito de usar as partes comuns: O inciso II garante ao condômino usar das partes comuns, desde que de acordo com sua finalidade e de modo a permitir igual direito aos demais condôminos. A primeira limitação diz respeito à finalidade. A garagem coletiva, por exemplo, não é local de recreação de crianças nem as quadras esportivas se prestam à guarda de veículos. A natureza da área e a previsão de seu destino são determinantes do uso. A segunda limitação se refere à preservação da mesma prerrogativa aos outros condôminos, permitindo a todos a utilização da área comum. Essa regra pode comportar algumas exceções. Tomem-se como exemplos as vagas de garagens indeterminadas, cujo uso exclusivo a cada um dos condôminos por certo tempo é determinado temporariamente em assembleia. Também é o caso do CC 1.340, que alude às partes comuns do edifício, de uso exclusivo de alguns condôminos, como corredores dos andares de edifício interditados aos condôminos da loja situada no térreo, que não participam do rateio das despesas. Questão polêmica é a da possibilidade da alteração da destinação da área comum do edifício, ou então da entrega de parte da área comum ao uso exclusivo de um dos condôminos. O entendimento majoritário é no sentido de que se admite a alteração da destinação de parte comum, ou a utilização exclusiva, se houver o consenso dos condôminos, por unanimidade (cf. Nascimento Franco, João. Op. cit., p. 220-1). Em determinados casos, a própria convenção ou instituição do condomínio já conterão a previsão, cabendo a análise de sua congruência com os princípios da boa-fé objetiva e do equilíbrio contratual, vulnerado no caso de empreendedores e incorporadores que fazem constar da convenção a possibilidade de uso exclusivo do teto do prédio, para colocação gratuita de placas de publicidade ou sinais da empresa, sem qualquer vantagem ou contraprestação aos condôminos. Note-se que embora a lei use o termo “condômino”, os direitos de usar e fruir a unidade autônoma e as partes comuns do edifício se estendem aos demais ocupantes, como o usufrutuário, o locatário e o comodatário. Direito de voto: Finalmente, o inciso III reza ser direito do condômino votar nas deliberações da assembleia e dela participar, estando quite. Mais uma vez o termo “condômino” abrange compromissários compradores e cessionários de direito, como mencionado no comentário ao CC 1.334, ao qual se remete o leitor. Cuida-se de direito fundamental do condômino, que não pode ser afastado por norma convencional. Certos condôminos, porém, podem ser excluídos da votação, quando a matéria em debate não lhes disser respeito nem tenham reflexos sobre seus direitos e obrigações. É o caso, por exemplo, do condômino de unidade situada no térreo, sobre a troca de elevadores, de cujo rateio não participará. O Código Civil de 2002 não reproduziu o disposto no art. 24, § 4º, da Lei n. 4.591/64, com a redação que lhe deu a Lei n. 9.267/96. O silêncio da nova lei é eloquente e traduz a revogação do anterior preceito. O locatário não mais participa e delibera em assembleias de condomínio, ainda no que se refere a despesas ordinárias ( Nascimento Franco, João. Op. cit., p. 113; Viana , Marco Aurélio da Silva. Op. cit., p. 433). A novidade está na subordinação do direito de voto à pontualidade do pagamento da contribuição condominial. Tomou a lei posição, afastando a anterior discussão sobre a legalidade da restrição ao direito de voto contida em convenção de condomínio. Todos os condôminos, porém, devem ser convocados, até porque o saldo devedor pode ser pago até o momento da assembleia. O condômino que houver ajuizado ação de consignação em pagamento para discutir parcela controversa da contribuição não deve ser considerado em débito, assim como aquele que houver depositado em juízo tal quantia. Diz a lei que o condômino em atraso não pode deliberar, o que não o impede de participar das discussões, embora sem direito a voto. A participação, porém, por não constituir direito garantido por norma cogente, pode ser afastada por norma convencional. Resta saber se deve ser levado em conta, para composição global do quorum, o condômino impedido de votar. Não teria sentido que os inadimplentes, em razão de seu impedimento, inviabilizassem diversas deliberações relevantes para a vida condominial, como a realização de obras no edifício (CC 1.341), a alteração da convenção de condomínio (CC 1.351), a destituição do síndico (CC 1.349) ou mesmo a imposição de multa aos condôminos renitentes no cumprimento de suas obrigações, inclusive a de ratear as despesas (CC 1.337). Haveria duplo prejuízo aos condôminos pontuais, tanto por terem de adiantar a parte dos inadimplentes como por não conseguirem quorum para deliberações relevantes para a vida condominial. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.353-55. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 13/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

A Doutrina de Ricardo Fiuza reza a respeito de este artigo e seus incisos estarem embasados no art. 19 da Lei n. 4.591, de 16-12-1964, que regulamenta o condomínio em plano horizontal. Elenca, de modo taxativo, os direitos dos condôminos, quais sejam, aqueles atinentes ao direito de propriedade, sendo ressalvada a regulamentação das partes comuns, as quais devem ser disciplinadas na convenção nunca extrapolando os direitos previstos nesse artigo. Garante, ainda, o direito ao voto de todos os compossuidores que estiverem em dia com suas contribuições condominiais. • Traz esse dispositivo inovações de redação e é de melhor técnica legislativa, modernizando as expressões. Deve ser-lhe dado, contudo, o mesmo tratamento doutrinário dispensado ao artigo já citado da Lei n. 4.591/64. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 684, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 13/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.336. São deveres do condômino:.

I -  contribuir para as despesas do condomínio, na proporção de suas frações ideais.

II - não realizar obras que comprometam a segurança da edificação;

III - não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas;

IV - dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.

§ 1º O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito.

§ 2º  O condômino, que não cumprir qualquer dos deveres estabelecidos nos incisos II a IV, pagará a multa prevista no ato constitutivo ou na convenção, não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de suas contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que se apurarem; não havendo disposição expressa, caberá à assembleia geral, por dois terços no mínimo dos condôminos restantes, deliberar sobre a cobrança da muita.

Historicamente, este dispositivo não tinha sido, originariamente, modificado pela Câmara. Durante o período de revisão no Senado, o então Senador Itamar Franco, através da Emenda a. 134, tentou, pois não houve aprovação, modificar-lhe o inciso 1, com o intuito de restabelecer a regra já prevista na Lei n. 4.591/64 (art. 12, § 1º ), propondo que passasse a figurar da seguinte maneira: “contribuir para as despesas do condomínio, na proporção de suas frações ideais ou na forma prescrita na convenção”.

Com relação ao § lº, o responsável pela alteração foi o Senador Josaphat Marinho, com a Emenda de n. 135. Originariamente, assim versava o referido § 12: “O condômino, que não pagar a sua contribuição, ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês, multa de dez por cento sobre o débito, acrescido de correção monetária, segundo os índices vigentes em matéria de locação predial”. Justificou-se afirmando que a multa se toma mais flexível de cinco a dez por cento e, portanto, variável segundo as circunstâncias. Suprimiu-se a parte final “acrescido de correção monetária, segundo os índices vigentes em matéria de locação predial”, porque essa forma já não vigora no direito brasileiro. A emenda, consoante a justificativa do Senador, “propôs acrescentar, mune, a alternativa: ‘ou na forma prescrita na convenção’. Restabelecendo, noutros termos, regra já prevista na Lei n. 4.591/64 (art. 12, § 12) e apontando a situação singular das lojas externas a sugestão é inegável procedência.

Para a Doutrina de Ricardo Fiuza, este dispositivo é a conjugação dos arts. 10, 12 e 21 da Lei a. 4.591, de 16-12-1964, que regulamenta o condomínio em plano horizontal. Enumera, de modo taxativo (numerus clausus) os deveres dos condôminos. Traz inovações de redação e é de melhor técnica legislativa, modernizando as expressões .

O Artigo inova ao reduzir a multa de vinte para dois por cento, medida que pode estimular a inadimplência, já bastante elevada, sobrecarregando os demais condôminos, que terão de ratear esse passivo. Isso tudo é a gravado pela não previsão de a atualização monetária dos haveres, ainda mais se considerarmos a morosidade da Justiça, beneficiando o mal pagador. Sobreleva notar que as despesas originadas pelo condomínio edilício , que devem ser suportadas pelos condôminos, não podem ser consideradas relações de consumo, mas pagamento de serviços prestados por terceiros ao condomínio . não se aplicando, por conseguinte, as regras do Código de Defesa do Consumidor.

Sugestão legislativa: Pelos fundamentos expostos, apresentou-se ao Deputado Ricardo Fiuza sugestão para alteração do § 1º deste artigo, que passaria a contar com a seguinte redação: “1º O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios e multa proporcional no valor do débito, fixado em assembleia com a aprovação de pelo menos dois terços dos condôminos , atendido o princípio da razoabilidade. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 685, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 13/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Como esclarece Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame não tinha correspondente no Código Civil de 1916. Condensa, com alterações e reduções, os arts. 10 e 12 da Lei n. 4.591/64. O inciso I do artigo foi alterado pela recente Lei n. 10.931/2004, que acrescentou a parte final: “salvo disposição em contrário na convenção”. Regula o artigo os deveres mínimos dos condôminos e as sanções decorrentes do inadimplemento. Note-se que outros deveres podem e frequentemente são criados pela convenção de condomínio, desde que não aniquilem os direitos fundamentais dos condôminos, como comentado no artigo antecedente.

Embora use o caput do CC 1.336 o termo “condômino”, os deveres, em especial os negativos ou de abstenção, alcançam todos os ocupantes das unidades autônomas, a qualquer título, inclusive possuidores diretos, visitantes ou meros detentores das unidades autônomas. Em relação ao inciso I, incumbe o pagamento das despesas condominiais não somente ao titular do domínio pleno da unidade como também ao compromissário comprador imitido na posse, como adiante se verá, no comentário ao CC 1.345 adiante.

O primeiro dever do condômino é o de contribuir para as despesas do condomínio. Na lição de Nascimento Franco, as despesas de condomínio podem ser ordinárias ou de custeio (CC 1.348, VI, e 1.350 do CC), extraordinárias (CC 1.341) e individualizadas (CC 1.331, § 5º, 1.340 e 1.344). As ordinárias, ainda segundo Nascimento Franco, se referem aos serviços rotineiros do condomínio, que abrangem, entre outras, manutenção de elevadores, salários de empregados e respectivos encargos, taxa de consumo de água e esgotos, nos casos em que o lançamen­to for comum, luz e força das áreas comuns, seguro do edifício, materiais de limpeza, fundo de reserva, se previsto na convenção, honorários do administrador ou do síndico (Nascimento Franco, João. Condomínio, 5. ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2005, p. 252), e devem ser orçadas e aprovadas em assembleia anual. Note-se que o Código Civil de 2002 não mais alude ao fundo de reserva, como fazia a Lei n. 4.591/64, mas nada impede que tal verba, fundamental para fazer frente a despesas e reparos imprevistos, possa ser disciplinada na convenção ou mesmo deliberada em assembleia. Já as despesas extraordinárias são as eventuais, dizem respeito a serviços ou reformas no edifício, com o objetivo de melhorá-lo, modernizá-lo, dotá-lo de novos equipamentos ou mesmo atender às determinações do poder público, devendo ser previamente aprovadas em assembleia, com quóruns específicos, salvo se urgentes, como adiante se verá no comentário ao CC 1.341. Finalmente, as despesas individualizadas são aquelas cujo benefício reverte exclusivamente em proveito de certo condômino ou grupo de condôminos, devendo ser deliberadas e pagas exclusivamente por eles (CC 1.340).

Como anteriormente dito, o inciso I do CC 1.336 foi alterado pela Lei n. 10.931/2004, que acrescentou a parte final do preceito, “salvo disposição em contrário na convenção”. Logo, o critério supletivo, no silêncio da convenção, é o rateio de modo proporcional às frações ideais. Nada impede, porém, que estabeleça a convenção critérios diversos, como o valor de cada unidade autônoma, ou mesmo a intensidade de utilização de certos equipamentos comuns. Tomem-se como exemplo escolas ou lavanderias instaladas em edifícios comerciais, que consomem e utilizam de modo excessivo elevadores e água, podendo a convenção criar regras especiais quanto ao rateio de tais despesas. O próprio CC 1.340, adiante comentado, positivando entendimento dos tribunais, determina que as despesas relativas às partes comuns que revertem em proveito de um ou de alguns condôminos incumbem a quem delas se serve, quebrando, portanto, o critério primário de rateio proporcional às frações ideais.

O inciso II do CC 1.336 impõe ao condômino obrigação negativa, de abstenção, qual seja, a de não realizar obras que comprometam a segurança da edificação. A contrário senso, podem ser realizadas no interior da unidade todas as obras que não atentem contra a segurança da construção. Alude Caio Mário da Silva Pereira à possibilidade de abertura de passagem de comunicação entre unidades vizinhas, ou superpostas, desde que, como é óbvio, fique preservada a segurança do edifício (Condomínio e incorporações, 10. ed. Rio de Janeiro, Forense, 2002, p. 127). Não se admite, por outro lado, a ligação com unidade autônoma de prédio vizinho, nem a abertura de portas ou janelas externas. Não se exige prévia autorização do síndico para a realização de reformas. Podem a convenção ou o regimento, todavia, impor horários e regras de admissão de trabalhadores que tenham acesso ao condomínio.

O inciso III do CC 1.336 impõe outra obrigação de não fazer ao condômino, qual seja, a de não alterar a forma e a cor das fachadas, das partes e esquadrias externas. A razão da regra é simples: as paredes externas do edifício constituem área comum e a unidade arquitetônica interessa a todos os condôminos, de modo que não podem ser mudadas a critério de um deles. De outro lado, prevalece o entendimento de que o limite da proibição é o interesse coletivo. Toleram-se, assim, pequenas alterações na fachada, desde que ditadas por necessidade, como a colocação de grades de proteção ou a substituição de esquadrias obsoletas, originalmente feitas de material não mais existente no mercado (RT 758/270). Também se admite a colocação de equipamentos que visem ao conforto dos moradores e compatíveis com a vida moderna, como exaustores e aparelhos de ar condicionado, desde que a agressão à fachada não seja gritante nem cause incômodo aos demais condôminos.

Alguns julgados entendem que as alterações modernizadoras exigem aprovação da assembleia, mas por maioria, não se exigindo a unanimidade. Há controvérsia nos tribunais sobre a possibilidade do fechamento de varandas com vidros, examinadas caso a caso, levando em conta a existência de anteriores modificações e o grau de lesividade à harmonia da fachada. A colocação de placas, luminosos e faixas pode ser vedada pela convenção de condomínio e, em seu silêncio, toleram-se apenas aquelas de pequeno porte, que não prejudicam a iluminação de outras unidades nem ofendem de modo significativo a unidade visual do prédio (conferir a respeito da fértil casuística sobre alteração de fachada, Nascimento Franco , João. Op. cit., p. 200- 5; l a c e r d a , César. “ Utilização das partes comuns do edifício para propaganda e instalação de antena” e Álvares, Vanderci. “Da alteração da fachada no condomínio horizontal”. In: Condomínio edilício, coord. F. A. Casconi & J. R. N. Amorim. São Paulo, Método, 2005).

O inciso IV do CC 1.336 impõe ao condômino novas obrigações negativas, quais sejam, as de não dar às unidades destinação diversa à da edificação, bem como utilizá-las de maneira a não prejudicar o sossego, a salubridade, a segurança ou os bons costumes. Tais deveres já foram comentados no inciso I do CC 1.335, pelo ângulo inverso do direito de o condômino usar sua unidade sem agredir os valores eleitos pelo legislador. Não custa acrescentar que os deveres impostos aos condôminos são mais severos do que as restrições gerais de vizinhança, diante da peculiar situação das unidades que confrontam nas laterais, acima e abaixo com outras. É por isso que os deveres previstos em lei podem ser ampliados ou detalhados pela convenção de condomínio ou regimento interno, desde que não elidam os direitos essenciais previstos no CC 1.335. A alteração da destinação da unidade autônoma está subordinada à prévia aprovação unânime dos demais condôminos, porque interfere nas demais unidades e fere as justas expectativas da manutenção da finalidade inicial da construção. Quanto a pequenos desvios de finalidade, manutenção de animais em apartamentos, realização de reuniões e festas, remete-se o leitor ao que foi comentado no artigo anterior.

Caso vulnerados os deveres de abstenção - obras ilícitas, alteração de fachada ou comportamento contrário aos valores tutelados pela lei -, cabe ao condomínio, representado pelo síndico, ou a qualquer condômino, individualmente, a legitimidade ativa para coibir a conduta ofensiva, mediante embargo da obra, sua demolição ou invocação de tutela específica, inclusive com a cominação de astreintes, na forma do art. 461 do Código de Processo Civil de 1973, (correspondendo este à Seção IV – Do Julgamento das Ações Relativas às Prestações de Fazer, de Não Fazer e de Entregar Coisa, no CPC/2015, art. 497 e ss. Grifo VD).

O § 1º do CC 1.336 disciplina as sanções aplicáveis ao condômino inadimplente no pagamento das despesas condominiais. É um dos preceitos mais polêmicos do Código Civil, introduzindo profundas alterações em relação ao que determinava o art. 12, § 3º, da Lei n. 4.591/64. Traça as regras sobre a cobrança dos juros moratórios e da multa moratória. As sanções ao condômino inadimplente à obrigação de pagar a contribuição condominial são as previstas em lei, de natureza estritamente pecuniária. Fere os direitos fundamentais dos condôminos a aplicação de sanções diversas, ainda que previstas na convenção, especialmente aquelas que vedam a utilização de áreas e equipamentos comuns, como elevadores, piscina e sauna.

A primeira questão que se apresenta é a da incidência da nova regra às convenções registradas anteriormente à vigência do Código Civil. Remete-se o leitor ao comentário do CC 1.333, em que se discutiu a natureza jurídica da convenção de condomínio, questão fundamental para saber de sua eficácia frente à nova lei. A corrente que defende sua natureza estritamente contratual sustenta que não pode a lei retroagir para alcançar o ato jurídico perfeito. A corrente que defende sua natureza de ato-regra, a meio caminho entre o contrato e a lei, geradora de direito estatutário de normas aplicáveis ao universo restrito dos que interagem com o condomínio, sustenta, ao contrário, a imediata incidência do Código Civil, em relação às prestações vencidas após sua vigência. O extinto II Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, hoje Seção de Direito Privado do Tribunal de Justiça, dividiu-se, com dezenas de decisões em ambos os sentidos (cf. Silva, Luiz Antônio Rodrigues da. “ Pequena reflexão a respeito da multa de até 2% sobre a contribuição condominial em atraso” e COELHO, Gil Ernesto Gomes. “A multa moratória da convenção de condomínio e o novo Código Civil - Questão de direito intertemporal”. In: Condomínio edilício, coord. F. A. Casconi & J. R. N. Amorim. Op. cit.). O primeiro precedente do STJ (REsp n. 663.285/SP, rel. Min. Aldir Passarinho Júnior) assentou que “a multa por atraso prevista na convenção de condomínio, que tinha por limite legal máximo o percentual de 20% previsto no art. 12, § 3º, da Lei n. 4.591/64, vale para as pres­tações vencidas na vigência do diploma que lhe dava respaldo, sofrendo automática modificação, no entanto, a partir da revogação daquele teto pelo CC 1.336, § 1º, em relação às cotas vencidas sob a égide do Código Civil atual”, inclinando-se, assim, no sentido da segunda corrente, embora sem acolher de modo explícito o argumento acima posto.

O § 1º do CC 1.336 disciplina tanto a incidência dos juros como a da multa moratória. Quanto aos juros, reza o preceito que ficará o condômino inadimplente sujeito aos “juros convencionados, ou, não sendo previstos, os de 1 % ao mês”. A regra é inversa à do art. 12 da Lei n. 4.591/64, que admitia juros moratórios de 1% a.m., desde que convencionados. Também é inversa à regra geral do regime de juros moratórios do polêmico CC 406 que, no silêncio das partes, determina a incidência da mesma taxa devida às dívidas ativas da Fazenda Nacional. No regime do condomínio edilício, no silêncio da convenção, os juros serão de 1% ao mês e a correção monetária incide independentemente de previsão convencional.

Pode a convenção, todavia, prever pagamento de juros convencionados, acima ou abaixo dos legais. A dúvida está em saber se existe limitação à cobrança dos juros convencionais moratórios, ou se escapam eles dos limites do CC 406, estando ao inteiro critério da autonomia privada. Parece claro que os juros pactuados estão sujeitos ao teto cogente do CC 406 do Código Civil vigente, não se podendo equiparar aos juros moratórios livres previstos na Lei de Mercado de Capitais (Lei n. 4.728/65), aplicáveis apenas às operações de crédito de instituições financeiras. A Lei da Usura, norma de ordem pública, aplica-se às prestações pecuniárias em geral, inclusive às relativas ao rateio das despesas condominiais. Em termos diversos, o teto máximo que a convenção pode estipular é o pagamento dos juros moratórios na mesma base daqueles que incidem sobre a dívida ativa da União Federal, ou seja, taxa Selic, que, por seu turno, já engloba as expectativas inflacionárias, de modo que não se cumula com a correção monetária, para evitar o bis in idem. Mesmo a incidência da taxa Selic é controversa, porque não refletiria propriamente os juros, como também expectativa inflacionária futura, de acordo com jurisprudência consolidada do STJ. Em suma, os juros moratórios estão sujeitos ao teto cogente de 12% ao ano, sendo considerada não escrita regra convencional em sentido contrário.

Como a obrigação é positiva, líquida e a termo, a mora é ex re e os juros incidem a contar do vencimento. Os juros incidem sobre o principal corrigido e acrescido da multa. O entendimento predominante é o de que a obrigação tem natureza portable, razão pela qual não há necessidade de se fazer prova da remessa do boleto, cabendo ao condômino procurar o condomínio para pagar o que deve. A competência para ação de cobrança das despesas condominiais é do foro da situação do imóvel, porque é o local onde deve ser cumprida a obrigação. A cobrança se faz pelo procedimento sumário e, embora haja controvérsia a respeito, no Estado de São Paulo não se processa perante o sistema do Juizado Especial, porque não é o credor pessoa natural. Quanto à prescrição, na falta de previsão específica, aplica-se a regra do art. 205 do Código Civil, com prazo de dez anos, e o conflito de direito intertemporal é resolvido pela regra do art. 2.028 do mesmo diploma (cf., a respeito das despesas de condomínio, Pimentel, Celso José. “Anotações sobre a ação de cobrança das despesas de condomínio”. In: Condomínio edilício, coord. F. A. Casconi & J. R. N. Amorim. Op. cit.).

No que se refere à multa moratória, embora haja controvérsia doutrinária a respeito, a limitação ao teto de 2% é de natureza cogente, prevalecendo sobre disposição convencional. Não se cogita, também, de cumulação da multa prevista na lei com a multa prevista na convenção, ambas com a mesma finalidade de sancionar a mora do condômino. Cumula-se a multa com os juros e com honorários advocatícios.

Não resta dúvida de que as taxas de juros e a nova multa moratória se mostram inadequadas para reprimir a inadimplência nos condomínios edilícios. Perdeu-se excelente oportunidade de alteração do preceito, por ocasião da sanção e publicação da Lei n. 10.931/2004. A regra que alterava a multa foi vetada pelo Presidente da República, sob o argumento falso de que os juros livres servem como elemento de compensação da multa baixa. Note-se, porém, que o próprio legislador criou mecanismo compensatório no CC 1.337, adiante comentado, para reprimir a conduta do condômino usualmente inadimplente.

Finalmente, o § 2º do CC 1.336 disciplina a multa aplicável aos condôminos que vulnerarem os deveres de abstenção previstos nos incisos II a IV, já comentados. Note-se que a multa ora analisada não se aplica ao condômino inadimplente na obrigação de pagar as despesas condominiais, matéria relegada ao CC 1.337. A multa em questão pode ou não estar prevista na convenção ou ato constitutivo. Caso não haja prévia estipulação, pode ser imposta em assembleia, com o quorum qualificado de aprovação de dois terços dos demais condôminos. Conta-se o quorum sobre o universo dos condôminos aptos a votar, ou seja, excluídos os infratores a serem apenados e os inadimplentes. Vota-se com a força das frações ideais de cada unidade, salvo disposição em contrário na convenção.

O teto imposto, de cinco vezes o valor da contribuição, é de natureza cogente e não pode ser aumentado por disposição convencional. A multa é devida, na dicção da lei, “ independentemente das perdas e danos que se apurarem”. O preceito deve ser lido em dois sentidos. Primeiro, de que não há correlação entre o valor da multa e o real dano causado ao condomínio. Segundo, de que o condômino infrator paga a multa moratória e as perdas e danos, sem compensação ou abatimento entre as duas verbas. Eventual desproporção entre a sanção e o dano deve sofrer a redução prevista no CC 413, que consagra o princípio do equilíbrio contratual, presente também nas relações entre condôminos. O modo e a frequência de imposição da multa serão analisados no comentário ao CC 1.337. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.357-61. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 13/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No escrutínio de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, entre os deveres do condômino, destaca-se o de efetuar o direito de preferência dos outros condôminos, quando pretender alugar sua vaga na garagem, só podendo alienar a parte acessória se assim constar na convenção. Também deverá efetuar o pagamento das despesas condominiais, sob pena de incidir em juros moratórios de 1% ao mês e multa de até 2% sobre o débito total. Cabe ao condômino contribuir na proporção de sua fração ideal, salvo disposição em contrário na convenção. Melhor dizendo, para estipular o valor, não será utilizada, necessariamente, a proporção da fração ideal da unidade. Assim, quem possui um apartamento de quatro quartos pagará, em princípio, a mesma despesa daquele que possui um de dois quartos.

Enunciado 505 do Conselho da Justiça Federal: “É nula a estipulação que, dissimulando ou embutindo multa acima de 2%, confere suposto desconto de pontualidade no pagamento da taxa condominial, pois configura fraude à lei (Código Civil, CC 1.336, § 1º), e não redução por merecimento”. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 13.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).