quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

Direito Civil Comentado - 1.397, 1.398, 1.399 Dos Direitos do Usufrutuário – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - 1.397, 1.398, 1.399

Dos Direitos do Usufrutuário – VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro IIITítulo VI – Dos Direitos do Usufrutuário - Capítulo II – Disposições Gerais (Art. 1.394 a 1.399)

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Art. 1.397. As crias dos animais pertencem ao usufrutuário, deduzidas quantas bastem para inteirar as cabeças existentes ao começar o usufruto. 

O artigo em exame é idêntico ao art. 722 do Código Civil de 1916. Traduz para o usufruto de animais, essencialmente bens fungíveis, a regra geral de que o usufrutuário tem o proveito, enquanto o nu-proprietário tem a substância da coisa. É a direção que aponta os comentários de Francisco Eduardo Loureiro. São as crias frutos naturais e, como tais, pertencem ao usufrutuário. Ressalta o preceito, todavia, que os animais mortos, ou mesmo os improdutivos, devem ser repostos com as crias, para que o rebanho seja devolvido na íntegra, porque, como já dito, são bens fungíveis, e a substância pertence ao nu-proprietário. A reposição deve obedecer à mesma qualidade dos animais perdidos, no que se refere à raça e ao sexo, evitando o comprometimento da coisa coletiva. É indiferente que a perda de animais seja imputável ou não ao usufrutuário, segundo a melhor doutrina. Se as crias não bastarem para repor as perdas, cabe ao usufrutuário adquirir novas cabeças e fazer a substituição, ou o equivalente em dinheiro. Ao invés, se as crias excederem as perdas, o saldo de cabeças pertence ao usufrutuário.

Embora haja controvérsia na doutrina, o melhor entendimento é o de que a regra se aplica somente aos animais considerados formando um só todo, uti universitas, e não aos animais considerados de modo singular, como coisa infungível. A regra se aplica por analogia também às árvores frutíferas. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.467. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 16/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No entendimento de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo em curso destina ao usufrutuário a titularidade dos frutos naturais correspondentes às crias de animais existente no bem, deduzindo-se logicamente assim que, ao término do usufruto, deverá ser entregues ao nuproprietário somente os animais que ali havia quando do início, com a dedução das crias surgidas no período de gozo.

O usufruto de um rebanho diz respeito a uma universalidade, podendo o titular tirar proveito de tudo que é gerado pelo rebanho, assim como alienar as respectivas crias, mantendo a quantidade original do início do usufruto (Rodrigues, 1997, p. 286). Em caso de perda ou deterioração, incumbe-se ao usufrutuário o dever de repor a mesma quantidade e qualidade dos animais existente ao início do usufruto, considerando sua obrigação de zelo e vigilância em relação à coisa usufruída. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao art. 1.397 do CC/2002, acessado em 16.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em trabalho completo apresentado por Jéssica Ramos Farineli, publicado por infoescola.com, intitulado Usufruto, têm-se um mergulho profundo no tema. Segundo a autora, o Usufruto é um direito real que recai sobre coisa alheia, de caráter temporário, inalienável e impenhorável, concedido a outrem para que este possa usar e fruir coisa alheia como se fosse própria, sem alterar sua substância e zelando pela sua integridade e conservação.

O usufrutuário poderá utilizar e perceber os frutos naturais, industriais e civis da coisa, enquanto o nu-proprietário possui a faculdade de dispor da mesma.

Diz-se que este instituto possui caráter temporário porque não se prolonga além da vida do usufrutuário (conforme disposição do CC 1410). O usufruto pode admitir menor duração quando convencionado a termo ou condição resolutiva. Tal caráter temporário deriva de sua função intuito personae, dada sua finalidade de beneficiar pessoas determinadas.

Dada a vitaliciedade do usufruto, caso ocorra a morte do usufrutuário, se os herdeiros resistirem na restituição da coisa, poderá o nu-proprietário ajuizar ação de reintegração de posse, em função do esbulho pela precariedade.

A inalienabilidade é a impossibilidade de o usufrutuário transmitir a coisa a outrem, de forma onerosa ou gratuita, em função de seu caráter intuito personae. (CC 1393). Entretanto, o usufrutuário poderá ceder o exercício do direito, de forma gratuita ou onerosa, como no caso de arrendamento. (CC 1399). 

A impenhorabilidade é outra característica deste instituto, porém, não impede que o penhor recaia sobre seus frutos. O usufruto se constitui através de lei (usufruto legal), de negócio jurídico (usufruto convencional) ou de usucapião. No usufruto legal é instituído por lei, para a proteção de determinadas pessoas que se encontram em presumível estado de vulnerabilidade. A título de exemplo, o CC 1689 determina que os pais sejam usufrutuários em relação aos filhos menores, em virtude do poder familiar.

O usufruto convencional se constitui através de negócio jurídico bilateral ou unilateral, podendo ser inter vivos ou causa mortis. Ou seja, poderá constituir-se entre o nu-proprietário e o usufrutuário ou por testamento.

Na constituição inter vivos, o nu-proprietário mantém a nua-propriedade da coisa e transfere o direito real de usufruto a outra pessoa, através de contrato. Já na constituição causa mortis, o testamentário por meio de disposição de última vontade, transmite o usufruto aos seus herdeiros. 

O usufruto constituído por usucapião é reconhecido expressamente pelo Código Civil de 2002, em seu artigo 1391. Não se confunde a usucapião de usufruto com a usucapião da propriedade, pois sua posse não contou com o animus, mas sim a intenção de ser possuidor usufrutuário. Desta forma, a sentença de usucapião não privará o nu-proprietário da titularidade formal, mas apenas lhe limitará o domínio.

 

Existem cinco espécies de usufruto, estas se classificam em relação à origem, à duração, ao objeto, à extensão e aos titulares.

 

Quanto à origem, o usufruto poderá ser legal (instituído por lei) ou convencional (constituído por negócio jurídico).

 

Quanto à duração, o usufruto poderá ser temporário; quando estipulado com prazo estipulado para seu término ou condição resolutiva; ou vitalício; quando não há prazo estipulado para seu fim – durando até o fim da vida do usufrutuário. Deve-se ressaltar que a duração do usufruto para pessoa jurídica é de no máximo trinta anos.

 

Quanto ao objeto, o usufruto poderá ser próprio; quando recai sobre coisa inconsumível e infungível; e impróprio (ou quase-usufruto); quando recai sobre coisa consumível ou fungível. Neste caso, conforme dispõe o CC 1392, o usufrutuário deverá restituir o nu-proprietário o valor da coisa ou outra coisa com equivalente quantidade, gênero e qualidade.

Quanto à extensão, o usufruto poderá ser universal; quando recai sobre uma universalidade de bens (herança, patrimônio, fundo empresarial); particular; quando recai sobre apenas um bem; pleno; quando não há restrições no uso da coisa; e restrito; quando há restrições no uso da coisa.

Quanto aos titulares, este direito real poderá ser simultâneo; quando é estipulado simultaneamente em nome de mais de uma pessoa; ou sucessivo; quando é estabelecido por prazo certo em nome de duas ou mais pessoas sucessivamente.

O usufrutuário tem direito à posse, ao uso, à administração e à percepção dos frutos. (De acordo com o CC 1394). A transmissão da posse justa e direta ao usufrutuário é condição básica ao exercício do usufruto. Caso não ocorra a transmissão, o mesmo poderá se valer das ações possessórias.  O usufrutuário tem direito de perceber os frutos naturais, industriais e civis da coisa, sendo vedada a alteração da substância da coisa ou de sua destinação. 

Os artigos 1396 a 1398 do Código Civil determinam as regras de distribuição dos frutos entre o nu-proprietário e o usufrutuário. O CC 1396 determina que  ao iniciar o usufruto, os frutos pendentes pertencerão ao usufrutuário, entretanto, na data da extinção do usufruto, pertencerão ao nu- proprietário. O CC 1397 estabelece que as crias de animais geradas na constância do usufruto pertencerão ao usufrutuário, porém, incumbe ao mesmo a preservação dos animais que já viviam antes do usufruto se iniciar. O CC 1398 mantém a regra geral do vencimento diário dos frutos civis, sendo remetidos ao proprietário aqueles que se vençam ao início do usufruto e, do usufrutuário aqueles vencidos no termo, ad quem.

O usufrutuário tem o dever de inventariar os bens recebidos, ou seja, arrolar tudo que recebeu e o estado em que recebeu; de dar caução real ou fidejussória, caso o nu-proprietário reclame-a; de conservar a coisa; de realizar reparações normais; de pagar as contribuições do bem; de pagar o seguro (se a coisa já estava segurada antes da constituição do usufruto); de restituir a coisa no mesmo estado em que a recebeu. (Jéssica Ramos Farineli, publicado por infoescola.com, intitulado Usufruto, acessado em 16.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em visita à unifacs.br, edição de junho de 2006, tem-se visão completa, porém sem esgotar o tema, do artigos que sugerem esse estudo. Como aponta o artigo  o usufruto de um rebanho está disposto no CC 1397. O usufrutuário pode utilizar os frutos que o rebanho produza, tais como o leite e derivados, e também as crias, que ultrapassem o número original de cabeças. É uma universalidade de fato. Esse critério não será utilizado se as partes, ao celebrarem o contrato, priorizarem a individualização de cada membro do rebanho. Findo o usufruto, o beneficiário deverá devolver o mesmo número de cabeças ao dono, podendo supri-las com as crias.

Usufruto de florestas e minas: Existem autores, como o ilustre Sílvio Venosa, que acham que essa modalidade de usufruto não tem correspondente no novel CC. No entanto, o CC 1392, § 2º, dispõe que: “Se há no prédio em que recai o usufruto florestas e os recursos minerais...”. Entende-se, portanto, que esse instituto foi disciplinado pelo legislador de 2002. A lei determina, ainda, que a extensão e a maneira de exploração das florestas e minas devem ser pré-fixadas pelas partes. É vedado ao beneficiário utilizar abusivamente a coisa, pois assim estaria destruindo a sua substância, objeto do usufruto. 

Usufruto de pessoa jurídica: Antes de caracterizar essa espécie de usufruto, vale ressaltar que o limite máximo do usufruto é a vida do usufrutuário. No caso de pessoa jurídica, o prazo é de trinta anos, a contar da data do início do direito, se outro não for estipulado pelas partes. Se há quem ache esse prazo muito vasto, imagine o que pensaria a respeito dos cem anos previstos no código antigo. O beneficiário pode utilizar a pessoa jurídica como se dono fosse, recebendo os proventos e frutos. Apesar de agir como se fosse o proprietário da coisa, ao usufrutuário é vedado alterar o ramo ou a destinação da produção da empresa, sem a autorização do dono. O patrimônio também deve ser mantido na sua integralidade. Se antes do prazo legal supramencionado a pessoa jurídica for extinta, o mesmo ocorrerá com o direito real. Se houver cisão entre empresas, cabe a elas decidir quem ficará com o direito de usufruto.

Usufruto de patrimônio: O Código Civil, em seu CC 1405, determina que: “Se o usufruto recair num patrimônio, ou parte deste, será o usufrutuário obrigado aos juros da dívida que onerar o patrimônio ou parte dele”. Este tipo de usufruto pode resultar de negócio jurídico ou do direito de família, a exemplo das sucessões.

Inalienabilidade: Segundo determina o CC 1393, o direito do usufrutuário é intransmissível. Essa regra é confirmada no CC 1410, I, da mesma norma, quando dispõe que o usufruto se extingue com a morte do usufrutuário. Não obstante, cabe ressaltar que o exercício do direito de usufruto pode ser concedido a título gratuito ou oneroso; somente o direito de usar e gozar a coisa podem ser cedidos. O direito de usufruto só pode ser alienado ao nu-proprietário, havendo com isso a consolidação da propriedade e a extinção do direito real. É possível haver penhora do exercício do direito de usufruto, quando não restar outra alternativa ao credor. A jurisprudência pátria tem entendido, também, que, se o usufrutuário tiver auferindo rendimentos com o usufruto, o exercício do direito poderá ser penhorado. A penhora só não vai ocorrer se o usufrutuário estiver no gozo direto da coisa.

Direitos e obrigações do usufrutuário e do nu-proprietário: O estudo dos direitos e obrigações do usufrutuário está compreendido no CC/02, em seus artigos 1394 à 1409, os quais elencam todos os instrumentos de que esse dispõe para usar e fruir normalmente da coisa, bem como as limitações que encontra quando deste exercício. 

Em relação ao usufrutuário, estabelece o CC 1394 que compete a esse a posse, o uso, a administração e a percepção de frutos. A posse pode ser protegida inclusive pelos interditos e demais ações possessórias, tais com a imissão de posse, bem como a ação confessória, as quais podem ser utilizadas contra terceiros ou contra o proprietário.

Também poderá o usufrutuário usar pessoalmente a coisa ou ceder tal uso a terceiros gratuita ou onerosamente, sem a mudança em sua destinação, consoante dicção do CC 1399. Ressalte-se que sequer poderá o ato constitutivo do usufruto proibir a dita cessão, haja vista o princípio da tipicidade vigente para os direitos reais, diante do que, não havendo norma legal que assim o preveja, resta prejudicada tal possibilidade.

O outro direito que possui o usufrutuário é o de administrar a coisa sem a interferência do proprietário, o que pode não acontecer caso este não pague a caução exigida pelo segundo, ou, ainda, nos casos em que, em virtude de sua administração, vem a coisa a se deteriorar. O usufrutuário, por fim, tem o direito de fruir da coisa, o que implica na possibilidade de retirar os frutos naturais e civis, desde que não haja limitação no título constitutivo. (Usufruto - unifacs.br, edição de junho de 2006, Acessado 16/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 1.398. Os frutos civis, vencidos na data inicial do usufruto, pertencem ao proprietário e ao usufrutuário os vencidos na data em que cessa o usufruto.

Na extensão de Francisco Eduardo Loureiro, a regra diz respeito aos frutos civis, ou seja, ou seja, aos rendimentos que a coisa produz, tais como juros e aluguéis. Como é sabido, os frutos civis reputam-se vencidos dia a dia (CC 1.215), o que facilita a aplicação da regra. Os frutos vencidos na data do início do usufruto pertencem ao nu-proprietário, enquanto os frutos vencidos ao seu término pertencem ao usufrutuário. Tupinambá Miguel Castro do Nascimento adverte que o início do usufruto se dá com a tradição das coisas móveis e o registro das imóveis, enquanto o término somente ocorre com a ocorrência da causa extintiva, para os móveis, e o cancelamento do registro, para os imóveis. Tais datas são fundamentais para a contagem e a titularidade dos frutos civis (Usufruto, 2. ed. Rio de Janeiro, Aide, 1983, p. 102). A mesma regra do CC 1.396, anteriormente comentado, no que diz respeito aos direitos de terceiros, se estende aos frutos civis. Os frutos vencidos durante o usufruto somente pertencem ao usufrutuário se não houver anterior direito de terceiros sobre eles. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.467. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 16/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na exposição de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, Fruto civil é o proveito econômico recebido de um terceiro que faça uso do bem de sua titularidade, como se dá no caso de arrendamento ou de aluguel de determinado imóvel, assim como rendas auferidas em geral. No que respeita aos frutos civis, a norma especifica que se destinam ao nuproprietário aqueles que já estavam vencidos e não percebidos à época do início do usufruto, cabendo ao usufrutuário os frutos vencidos e não percebidos ao seu término.

Em caso de extinção do usufruto por morte do usufrutuário, o contrato de locação do imóvel firmado entre este e terceiro mantém sua vigência, passando o nuproprietário a ser o novo locador se a avença não for denunciada no prazo de 90 dias, à luz do art. 7º, da Lei 8.245/91 (locações), dispondo a norma que se presume, neste caso, a concordância do proprietário quanto à avença referida (TJ-SP, Ap. 1108803- 66.2014.8.26.0100). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao art. 1.398 do CC/2002, acessado em 16.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Corroborando com todo o exposto e sintetizando, a doutrina de Ricardo Fiuza: Os frutos civis entendem-se recebidos dia por dia; por isso, até o dia do início do usufruto, pertencem ao proprietário, e durante o tempo do usufruto até o dia de seu final, pertencem ao usufrutuário. O dispositivo é idêntico ao art. 723 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 714, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 16/12/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.399. O usufrutuário pode usufruir em pessoa, ou mediante arrendamento, o prédio, mas não mudar-lhe a destinação econômica, sem expressa autorização do proprietário. 

De acordo com o comentário exposto na Doutrina de Ricardo Fiuza, é vedada a modificação do gênero de cultura do prédio dado em usufruto. A modificação da destinação só será permitida com autorização expressa do dono, sendo facultado ao usufrutuário retornar o prédio locado, inclusive em favor de descendente do nu-proprietário (RT, 686/141). • Equipara-se o artigo ao de n. 724 do Código Civil de 1916, com considerável melhora de redação. No mais, deve ser aplicado à matéria o mesmo tratamento doutrinário dado ao dispositivo apontado. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 715, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 16/12/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Na mesma toada e se estendendo Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame corresponde ao art. 724 do Código Civil revogado, com diversas alterações. O preceito revogado mencionava alteração do tipo de cultura, ao invés de destinação econômica em geral. Aludia, ainda, à possibilidade de se fazer tal alteração, no caso de usufruto legal. Traduz o dispositivo a essência do usufruto, com entrega do proveito ao usufrutuário e manutenção da substância do bem com o nu-proprietário. A utilidade em poder do usufrutuário pode dar-se por exploração direta do bem - uso - ou mediante arrendamento a terceiro, com percepção de frutos. A regra, de resto, está afinada com o que contém o CC 1.393, anteriormente comentado, que veda a alienação do direito real de usufruto, mas admite a cessão de seu exercício - direito obrigacional - a título oneroso ou gratuito. 

Lembre-se que no caso de extinção do usufruto a locação do imóvel celebrada pelo usufrutuário poderá ser denunciada no prazo de noventa dias pelo proprietário, salvo se este tiver anuído à locação. Escoado o prazo sem denúncia, presume-se que o proprietário concorda com a locação, nos mesmos termos em que foi contratada (art. 7° da Lei n. 8.245/91). A redação do artigo é mais abrangente do que a do preceito correspondente do Código de 1916. Agora a vedação atinge a mudança não somente do gênero de cultura, que dizia respeito a atividades eminentemente rurais, mas de toda forma de destinação econômica. Tome-se como exemplo um imóvel de natureza residencial, que não poderá ser locado pelo usufrutuário para fins comerciais, ou vice-versa.

A regra deve ser interpretada com razoabilidade, admitindo-se destinação diversa da original, se não houver nenhum prejuízo ao nu-proprietário ou mudança substancial ou risco de depreciação ou deterioração do bem. Não se pode esquecer que a norma visa à preservação da substância e, se esta não for afetada, perde sentido a restrição, em homenagem ao princípio da boa-fé objetiva e da função social do negócio jurídico. A alteração da destinação, segundo consta do artigo, está subordinada a expressa autorização do proprietário, a qualquer tempo, inclusive constando desde logo do próprio título. 

Embora não mais mencione o artigo que o usufruto legal escapa de tal limitação, a regra está implícita no ordenamento. O usufruto legal dos pais sobre os bens dos filhos menores sujeitos ao poder familiar abrange a prerrogativa de dirigir a pessoa e os bens do menor, sempre em seu proveito. Não faz sentido, por isso, que esteja o pai proibido de dar destinação econômica diversa ao bem do filho, mesmo porque este somente pode concordar representado pelo próprio genitor. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.468. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 16/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na exposição de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o usufruto é um direito real de natureza personalíssima ou intuito personae, com finalidade altruística e por isso gratuita, objetivando favorecer a pessoa do usufrutuário, o que impede a disposição do direito real por este. Mas como visto, o possuidor direto poderá ceder o uso a terceiros, de forma gratuita ou não, auferindo os frutos civis respectivos.

O dispositivo explicita a faculdade que tem o usufrutuário de ceder o exercício do usufruto a terceiros em benefício próprio, desde que fique mantida a mesma destinação econômica constante do título de constituição, salvo quando a alteração desta destinação for autorizada pelo nu-proprietário. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao art. 1.399 do CC/2002, acessado em 16.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 15 de dezembro de 2020

Direito Civil Comentado - 1.394, 1.395, 1.396 Dos Direitos do Usufrutuário – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - 1.394, 1.395, 1.396

Dos Direitos do Usufrutuário – VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro IIITítulo VI – Dos Direitos do Usufrutuário - Capítulo II – Disposições Gerais (Art. 1.394 a 1.399)

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Art. 1.394. O usufrutuário tem direito à posse, uso, administração e percepção dos frutos. 

Focando no conhecimento de Francisco Eduardo Loureiro, este artigo inaugura o Capítulo “Dos Direitos do Usufrutuário”, traçando as suas principais prerrogativas. A regra é supletiva, porque nada impede que as partes, nos limites da autonomia privada, estabeleçam outros direitos, ou mesmo restrinjam alguns deles. Tem o usufrutuário direito à posse direta do bem - sem o que não poderá exercer as demais prerrogativas - que, caso não lhe seja entregue pelo nu-proprietário, enseja ação petitória, com base no ius possidendi. Caso, porém, receba a posse e depois a perca por ato ilícito de terceiro, ou mesmo do nu-proprietário, pode usar da autotutela e da tutela possessória, com base no ius possessionis. A posse do usufrutuário é justa e presumivelmente de boa-fé, porque dispõe de uma causa que a justifica. 

Tem também direito ao uso do bem, mediante exploração direta, para dele extrair o seu proveito, mas sem desfalcar a substância e respeitando sua destinação. A utilização, como vimos no comentário ao CC 1.392, abrange os acessórios e os acréscimos, mesmo que omisso o título, bem como as pertenças, se assim se convencionou. Sua utilização, porém, não se equipara à do dono, porque, embora deva proceder em conformidade com a função social, não pode converter o destino econômico, estético ou histórico da coisa, sob pena de comprometer a substância, ainda que possa potencializar a exploração, se o proprietário o fazia de modo incompleto. Pode, ainda, administrar o bem usufruído, escolhendo como pretende extrair-lhe o melhor proveito. Administrar envolve certa liberdade de escolha do usufrutuário, deliberando, por exemplo, se usará o bem, ou se o emprestará, ou se o locará, e a quem, tirando, assim, a máxima produtividade e potencializando o proveito, independentemente da anuência do nu-proprietário. 

Finalmente, pode o usufrutuário receber os frutos naturais e civis do bem, extrair o proveito e o rendimento que gera. Torna-se o usufrutuário proprietário dos frutos colhidos, podendo aliená-los e apropriar-se do respectivo preço, sem necessidade de prestar contas ao nu-proprietário. Em determinados casos, como veremos adiante, pode o usufrutuário ser privado da administração, mas nunca do direito à percepção dos frutos, que é da essência do instituto. O termo fruto não se interpreta aqui em sentido estrito, mas, segundo clássica doutrina, engloba também os produtos (Carvalho Santos, J. M. Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1953, v. IX ), desde que não exaure a substância da coisa. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.463-64. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 15/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Lembrando o relator Ricardo Fiuza que Usufrutuário é o que detém os poderes de usar e gozar a coisa mediante sua exploração econômica. Sobreleva notar que o imóvel adquirido durante relação concubinária, apesar de sua dissolução, não extingue a relação usufrutuária (JTACSP, 130/48). • A disposição é idêntica ao art. 718 do Código Civil de 1916, devendo a ela ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 713, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 15/12/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em defesa de tese, Khadyja Leilane Fraga, fala “Da proibição de alienação do usufruto”: Estabelecidos os aspectos gerais do usufruto objetos e características, faz-se a análise do instituto pelo seu lado prático. Os direitos do usufrutuário estão previstos nos artigos 1.394 a 1.299 do CC/2002. O direito básico assegurado pelo atual Código civil ao usufrutuário – posse, uso, administração e percepção dos frutos – enunciado no CC 1.394, guarda a sintonia com a índole do instituto, acompanhando a doutrina e o Direito Comparado. (Nader, 2006, p. 440). 

A não ser que se estabeleça relação contratual entre eles: o usufrutuário pode alugar o bem ao nuproprietário, por exemplo. Contudo, a relação obrigacional não se confunde com o direito real, nessa hipótese. Por consequência, o ato constitutivo do usufruto não pode estabelecer de início a fruição conjunta do bem por ambos, porque isso contraria a natureza do instituto. 

Conforme a previsão do CC 1.392, salvo disposição em contrário, ao usufrutuário estende-se aos acessórios da coisa e seus acrescidos. De modo que se for usufruto de prédio residencial, o usufrutuário terá direito de desfrutar de todas as suas utilidades, como jardins, piscina etc. Se for de imóvel agrícola, abrange os animais, águas etc. Se entre os acessórios e os acrescidos houver coisas consumíveis, o usufrutuário deverá restituir, findo o usufruto, as que ainda houver e, das outras, o equivalente em gênero, qualidade e quantidade, ou, não sendo possível, o seu valor estimado, ao tempo da devolução. (Diniz, 2013, p. 479-481). 

Distinção fundamental, ontológica, encontra-se em Pontes de Miranda, ao afirmar que a posse não é essencial ao direito de usufruto, mas ao seu exercício. De acordo com o eminente tratadista, “O usufruto é titular do direito real, desde que o usufruto se constituiu até que se extingue, ainda que nunca houvesse tido posse”. Embora constituído o seu direito, é possível que o usufrutuário tenha de lutar ainda para obter a posse da coisa, em relação à qual detém o jus possidendi (Nader, 2006, p. 441), 

O titular do usufruto pode administrar a coisa, como forma de melhor obter o seu valor econômico. O usufrutuário está autorizado à prática dos atos tendentes à conservação e reparação da coisa: alugará, habitará, cultivará, explorará a coisa, segundo sua vontade e interesse. A administração é elemento integrante e indispensável do usufruto. (Diniz, 2013, p. 481).

O usufrutuário é titular do direito de perceber os frutos da coisa, apropria-se, também de produtos, não sendo demais lembrar que o vocábulo fruto não foi empregado em sentido técnico (utilidades produzidas periodicamente pela coisa), abrangendo os produtos (as utilidades retiradas da coisa), que lhe diminuem a quantidade e não conhece reprodução periódica. O usufrutuário tem direito aos frutos civis e naturais, salvo disposição em contrário contida no título.

Sílvio Venosa entende como direitos do usufrutuário decorrentes do uso e gozo da coisa, posse direta, direito de utilização, administração e percepção de frutos (CC 1.394). Pode recair sobre móveis ou imóveis, ambos considerados direitos reais. A titulo constitutivo sobre imóveis deve ser devidamente registrado. Não há registro para o usufruto legal. (Venosa, 2013, p. 494). (Khadyja Leilane Fraga, fala “Da proibição de alienação do usufruto”, Trabalho de Conclusão apresentado ao Curso de Graduação em direito da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2013, site: repositorio.ufsc.br, acessado em 15.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.395. Quando o usufruto recai em títulos de crédito, O usufrutuário tem direito a perceber os frutos e a cobrar as respectivas dívidas. 

Parágrafo único. Cobradas as dívidas, o usufrutuário aplicará, de imediato, a importância em títulos da mesma natureza, ou em títulos da dívida pública federal, com cláusula de atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos. 

Historicamente, vê-se aqui, em relação ao projeto, tão-somente a modificação do parágrafo único do artigo em comento, que originariamente assim se apresentava: “Cobradas as dívidas, o usufrutuário aplicará, de imediato, a importância em títulos da mesma natureza, ou em títulos da dívida pública federal, com cláusula de correção monetária, se houver”. No Senado, o relator geral do projeto, Senador Josaphat Marinho, foi o responsável por sua nova roupagem. A emenda substituiu a expressão “cláusula de correção monetária” por “cláusula de atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos”, uma vez que não mais se pode falar em correção monetária. A fórmula substitutiva é, pois, mais consentânea com a realidade econômica em que se encontra a sociedade brasileira.

Como explica o relator Ricardo Fiuza em sua Doutrina, o artigo traz à colação os novos institutos de política econômica (atualização monetária). O usufrutuário de título de crédito pode receber os acréscimos legais e contratuais, ou cobrar a dívida. Se optar pela cobrança das dívidas, deverá aplicar de imediato o valor em títulos da mesma espécie ou em títulos da dívida pública federal. • Equipara-se aos arts. 719 e 720 do Código Civil de 1916, com considerável melhora redacional. No mais, deve ser aplicado à matéria o mesmo tratamento doutrinário dado aos dispositivos apontados. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 713, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 15/12/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Da mesma forma expande-se Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame corresponde ao art. 719 do Código Civil de 1916, com profundas alterações. Rezava o dispositivo revogado que o usufrutuário de títulos de crédito podia não só cobrar a respectiva dívida, como livremente empregar a quantia recebida, por sua própria conta e risco. Em contrapartida, o nu-proprietário, cessado o usufruto, podia recusar os novos títulos, exigindo a quantia em dinheiro.

Viu-se que o usufruto pode recair não somente sobre coisas, mas também sobre créditos. Na lição clássica de Carvalho Santos, o usufruto recai sobre o objeto da prestação devida ao credor, caracterizando-se um direito e gozo sobre a prestação (Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1953, v. IX). Há dois momentos distintos no usufruto sobre créditos. No primeiro, antes do vencimento, pode o usufrutuário apenas receber eventuais juros. Vencida a dívida, pode cobrar o capital, aplicá-lo e receber os rendimentos, até a extinção do usufruto. Nada impede, porém, que o nu-proprietário, em razão da inércia do usufrutuário, tome as medidas assecuratórias em face do devedor, para a preservação de seu credito, inclusive efetuando a cobrança, com o fito de impedir a prescrição. 

O usufrutuário deve notificar o devedor, para que lhe pague diretamente o crédito. O pagamento feito pelo devedor ao nu-proprietário será ineficaz frente ao usufrutuário. Sem notificação, o pagamento é eficaz, mas o credor nu-proprietário que receber diretamente o crédito do devedor deve entregá-lo ao usufrutuário, para que este possa aplicá-lo e receber os rendimentos. Se, ao invés, houve remissão ou compensação, a obrigação se extingue, mas o nu-proprietário deve pagar os juros que renderia o capital, até o prazo final do usufruto. 

Restringiu o Código Civil de 2002 a liberdade do usufrutuário, impondo-lhe, no parágrafo único, obrigação alternativa na aplicação imediata das dívidas recebidas: a) ou em títulos da mesma natureza, porque se presume que atenda ao desejo do nu-proprietário, que fez a aplicação original; b) ou em títulos da dívida pública federal com cláusula de atualização monetária, investimento que prima pela segurança do retorno. Forra-se o usufrutuário, assim, dos riscos com a perda do crédito, salvo conduta culposa. Embora não explicite o preceito, é da natureza do usufruto que o usufrutuário zele pela incolumidade da substância do bem alheio. Óbvio, portanto, que, dentre as alternativas postas pelo legislador, deverá optar por aquela que melhor preserve a incolumidade do crédito. Assim, por exemplo, se o investimento inicial feito pelo nu-proprietário era seguro, mas, por circunstâncias supervenientes, deixou de sê-lo, não poderá o usufrutuário renovar a aplicação, na busca exclusiva de melhores rendimentos, colocando em risco o capital alheio. De outro lado, a aplicação da dívida de modo diverso do previsto no parágrafo único, salvo convenção entre as partes, torna o usufrutuário inadimplente, abrindo ao nu-proprietário a possibilidade da adoção das medidas necessárias à preservação da incolumidade do crédito, ou mesmo a extinção do usufruto. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.465-66. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 15/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Khadyja Leilane Fraga, fala em “Da proibição de alienação do usufruto”, das obrigações do usufrutuário, p. 22, como bem mencionou Maria Helena Diniz, há uma série de obrigações que o usufrutuário deve cumprir, dentre elas: “Inventariar, às suas expensas, os bens móveis (a menos que sua descrição conste do título constitutivo) que receber, determinando o estado em que se acham e estimando o seu valor (CC.1.400, 1ª parte) embora essa aferição valorativa não tenha por escopo limitar o direito do nu proprietário a ela, pois, na hipótese em que houver conversão da restituição do bem frutuário ao seu equivalente pecuniário, levar-se-á em conta o seu preço à época dessa restituição. Quanto aos imóveis é dispensável o inventário, que consta do próprio título constitutivo do usufruto. (Diniz, 2013, p. 48). Deve conter no inventário, a descrição e individualização dos bens a serem usufruídos, indicando o estado em que se acham, para evitar problemas futuros e prevenir desavenças por ocasião da restituição da coisa, uma vez que tanto o usufrutuário como o nu-proprietário terão que prestar contas quando cessar o usufruto. Apesar disso, a ausência desse inventário não traz como consequência qualquer sanção, porém estabelece a presunção juris tantum, até prova em contrário, de que o usufrutuário recebeu os bens em bom estado de conservação (Diniz, 2013, p. 480, 481). (Khadyja Leilane Fraga, fala “Da proibição de alienação do usufruto”, Trabalho de Conclusão apresentado ao Curso de Graduação em direito da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2013, site: repositorio.ufsc.br, acessado em 15.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.396. Salvo direito adquirido por outrem, o usufrutuário faz seus os frutos naturais, pendentes ao começar o usufruto, sem encargo de pagar as despesas de produção. 

Parágrafo único. Os frutos naturais, pendentes ao tempo em que cessa o usufruto, pertencem ao dono, também sem compensação das despesas. 

O artigo em exame reproduz inteiramente o que continha o art. 721 do Código Civil de 1916. Traduz regra simples, que se restringe aos frutos naturais gerados pelo bem dado em usufruto. 

Na dicção de Francisco Eduardo Loureiro, “Frutos naturais são as riquezas ou utilidades periódicas e decorrentes do próprio desenvolvimento orgânico que gera a coisa, sem desfalque de sua substância. Nada impede que haja contribuição do homem para a melhoria da produtividade ou da qualidade dos frutos.” A regra alcança apenas os frutos naturais pendentes, ou seja, aqueles ainda vinculados ou unidos à coisa principal. Os frutos pendentes no início do usufruto pertencem ao usufrutuário, sem que despenda este o valor do custeio para produzi-los. Em contrapartida, os frutos pendentes ao final do usufruto pertencem ao nu-proprietário, também sem a obrigação de indenizar as despesas de custeio. As regras são parelhas e equânimes, razão pela qual se mostra acertada a posição de Carvalho Santos, para quem, se o usufrutuário colher os frutos por antecipação, quebra o equilíbrio do preceito, e por isso deve devolvê-los, ou o equivalente, ao nu-proprietário retomante (Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1953, v. IX).

Ressalva o legislador, corretamente, apenas eventual direito de terceiro em relação aos frutos, no momento da constituição do usufruto. Se um terceiro era arrendatário das terras e tinha frutos pendentes a colher, tal direito deve ser respeitado pelo usufrutuário, que se sub-roga em parcela dos poderes dominiais ao arrendante. O inverso, porém, não é verdadeiro. O terceiro que contrata com o usufrutuário tem conhecimento do direito real de usufruto, que produz efeitos erga omnes, assim como de seu termo ou condição. Logo, os frutos pendentes, produto de trabalho e de investimento de terceiro, se perdem a favor do nu-proprietário com a extinção do usufruto, mas há direito de indenização pelas despesas de custeio em face do usufrutuário. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.466-67. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 15/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Pontuando os autores Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, são frutos naturais aqueles originados da força da própria natureza (frutas, leite, animais, minérios) e os industriais aqueles gerados pela transformação humana, ou seja, pela atividade criadora do homem, como a fabricação de calçados. Frutos pendentes são aqueles que ainda não maduros para sua percepção e os colhidos (ou consumidos) são os que já podem ser consumidos. Frutos percipiendos são os que deixaram de ser percebidos, ou colhidos, ou então os que não chegaram a ser produzidos. 

Como trata o dispositivo, ressalvado o direito de outrem – que já poderia ter anteriormente penhorados os frutos em questão, por eventuais dívidas executadas – os frutos pendentes pertencem ao usufrutuário, quando iniciado o usufruto, e estes frutos pertencerão ao proprietário quando findar o término do direito de uso e fruição. Trata-se de regra temporal para reger a existência dos frutos ainda não colhidos (pendentes).  (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao art. 1.396 do CC/2002, acessado em 15.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na apresentação de sua Doutrina, o relator Ricardo Fiuza conclui: os frutos naturais pendentes pertencem: a) ao usufrutuário, quando for iniciado o usufruto, não sendo ele obrigado a pagar ao nu-proprietário as despesas de produção; b) ao dono, quando cessar o usufruto, não devendo, também ele, pagar as despesas de produção. • Esta norma é idêntica ao art. 721 do Código Civil de 1916, devendo a ela ser dispensado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 714, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 15/12/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

Direito Civil Comentado - 1.390, 1.391, 1.392, 1393 Do Usufruto – Disposições Gerais – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - 1.390, 1.391, 1.392, 1393

Do Usufruto – Disposições Gerais  – VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro IIITítulo VI – Do Usufruto - Capítulo I – Disposições Gerais (Art. 1.390 a 1.393) - digitadorvargas@outlook.com

   - vargasdigitador.blogpot.com

 

Art. 1.390.  0 usufruto pode recair em um ou mais bens, móveis ou imóveis, em um patrimônio inteiro, ou parte deste, abrangendo-me, no todo ou em parte, os frutos e utilidades.

Com Francisco Eduardo Loureiro, tem-se a:

Definição: Na lição de Caio Mário da Silva Pereira, “usufruto é o direito real de fruir as utilidades e frutos de uma coisa sem alterar-lhe a substância, enquanto temporariamente destacado da propriedade” (Instituições de direito civil - direitos reais, 18. ed. Rio de Janeiro, Forense, v. IV, 2003). A definição se aproxima do que continha o art. 713 do revogado Código Civil, que, apesar de não reproduzido no atual, se encontra implícito, porque inalteradas as características do instituto. Prossegue o autor, afirmando que o ponto de partida de sua configuração é a distinção de dois elementos na propriedade, proveito e substância (op. cit., p. 290). Há um desdobramento dos poderes do proprietário, que outorga o proveito em caráter temporário ao usufrutuário e permanece com a substância do bem, tornando-se nuproprietário. Convivem pacificamente os diversos poderes sobre o mesmo bem, sem se chocar ou anular, porque as titularidades se dão em planos qualitativos diferentes, ao contrário do condomínio, em que os direitos são os mesmos, apenas quantitativamente distintos. 

Características: Da definição tiramos suas principais características, a saber: a) é direito real sobre coisa alheia, gravando temporariamente um bem em favor de uma pessoa (por isso alguns autores, indevidamente, denominam-no servidão pessoal), com efeito erga omnes, distinguindo-se, portanto, da locação; b) é temporário, podendo ser a termo, ou sob condição resolutiva, quando muito vitalício, extinguindo-se com a morte do usufrutuário, porque constituído sobre sua cabeça; c) provoca o desdobramento da posse, atribuindo a posse direta ao usufrutuário e reservando a posse indireta ao nu-proprietário; d) é intransmissível, podendo apenas ser cedido o seu exercício, como veremos no comentário ao CC 1.393 adiante. 

Objeto: No que se refere ao objeto, tem o usufruto amplo espectro, ao contrário dos direitos reais de superfície e de servidão. Podem ser bens frutuários, ou usufruídos, todos aqueles passíveis de apropriação, quer sejam apenas úteis à exploração, quer sejam frugíferos. Devem ser alienáveis, para sobre eles recair o gravame real de uso e fruição, com transmissão parcial das faculdades reais, razão pela qual não se admite usufruto constituído sobre bens gravados com cláusula de inalienabilidade (CC 1.911) nem sobre bem de família. Também não o admitem os direitos intransmissíveis, por exemplo servidão, uso e habitação. Não podem constituir usufruto sobre a coisa aqueles titulares de direitos reais que não têm a prerrogativa de usar e de fruir, como o penhor, a hipoteca, ou mesmo a propriedade fiduciária. Em contrapartida, admite-se o gravame do usufruto instituído pelos titulares dos direitos reais de superfície, de anticrese, de promitente comprador imitido na posse, de enfiteuse e a propriedade resolúvel. Claro que em tais hipóteses o direito de usufruto não ultrapassa o direito real sobre o qual recai. Logo, extinta a superfície, extingue-se o usufruto, ou, resolvido o compromisso de compra e venda, com ele resolve-se o usufruto. 

Embora haja resistência da jurisprudência em admitir usufruto sobre direito real de promitente comprador, tal posição é hoje injustificável. É o compromisso de compra e venda contrato preliminar impróprio, que quase esgota a atividade negocial, convertendo a escritura definitiva em simples ato devido. Os poderes federados do domínio se reúnem nas mãos do compromissário comprador, restando ao promitente vendedor um mero domínio garantia do recebimento do preço (cf. Azevedo Junior , José Osório de. Compromisso de compra e venda, 2. ed. São Paulo, Saraiva, 1983). Por isso, se há o registro do compromisso irretratável e o promitente comprador já se encontra imitido na posse e, mais, sendo o direito de promitente comprador transmissível até por trespasse, nada justifica que não possa ser dado em usufruto, nem em hipoteca, nem que garanta ao adquirente direito à reivindicação.

Pode o usufruto recair sobre coisas (bens corpóreos) móveis ou imóveis, singulares ou coletivas, assim como sobre bens incorpóreos. Admite-se usufruto sobre créditos, desde que transmissíveis. Abrangem tal modalidade direito sobre valores, direitos de coparticipação, direitos intelectuais, sobre um patrimônio ou sobre uma empresa. Cabe, por exemplo, usufruto sobre quotas e ações de sociedade anônima, ou sobre títulos da dívida pública, ou sobre os direitos patrimoniais (não os morais) de autor e de invenção. Como diz Orlando Gomes, “o usufruto de direitos consiste na atribuição a outrem das utilidades de um direito, durante um certo período de tempo, resguardada a sua existência e integridade” (Gomes, Orlando. “Usufruto de direitos”. In: Revista Forense, v. 180, p. 36-41). Pode recair sobre crédito incorporado em um título, ou não, com ou sem garantia real. Intervém em tal modalidade de usufruto três protagonistas, o credor, o devedor e o usufrutuário, que exercerá os direitos de gozo, devendo, porém, preservar a substância do direito.

O atual Código Civil não reproduziu o art. 726 do Código Civil de 1916, que disciplinava o quase-usufruto, ou usufruto impróprio, incidente sobre as coisas consumíveis - às quais, para esse efeito, se equipararam às fungíveis - e que caíam no domínio do usufrutuário, que se obrigava a restituí-las no equivalente em gênero, qualidade e quantidade, regendo-se, no geral, pelas regras do mútuo. Note-se, porém, que o usufruto se extinguia pela morte do usufrutuário, ao contrário do mútuo, cuja obrigação e crédito se transmitem aos herdeiros.

As coisas consumíveis e fungíveis não mais podem ser dadas em usufruto, como objeto principal, porque concludente é o silêncio do legislador, que resgatou a pureza da garantia real, exigindo a preservação da substância. Ressalva-se apenas a exceção do CC 1.392, § 1º, que trata dos acessórios e acrescidos consumíveis e que será abordado mais adiante.

Classifica-se o usufruto, segundo diversos critérios, na lição de Washington de Barros Monteiro: a) quanto à causa, em usufruto legal e convencional. Decorre o convencional de negócio jurídico inter vivos ou causa mortis. Em relação ao usufruto decorrente de negócio inter vivos, o registro imobiliário para imóveis ou a tradição, para bens móveis, são constitutivos do direito real (v. CC 1.391). É solene, porque exige forma escrita, qualquer que seja o objeto. Se recair sobre coisa imóvel, exige-se outorga uxória, salvo o regime da separação total de bens, além de escritura pública, se de valor superior à taxa legal (CC 108). Em relação à aquisição causa mortis, em razão da saisina o registro tem efeito somente publicitário e regularizatório.

Já o usufruto legal é aquele estabelecido diretamente pela lei, em determinadas situações jurídicas, independentemente da vontade das partes. Há diversos casos de usufruto legal, previstos em nosso ordenamento: 1) o indígena do art. 231 da Constituição Federal, que atribui aos silvícolas o direito exclusivo de usufruto das riquezas naturais e utilidades das terras que ocupam; 2) o dos pais sobre os bens dos filhos menores sujeitos ao poder familiar (CC 1.689,1); 3) o dos cônjuges sobre os bens do outro, nos casos previstos em lei (1.652, I). Não contempla o Código Civil de 2002 a possibilidade de constituição de usufruto vidual dos cônjuges (art. 1.611, CC/1916) e companheiros supérstites (art. 2º, I e II, da Lei n. 8.971/94), sobre parte dos bens do falecido, porque atualmente concorrem eles em propriedade plena com os herdeiros de primeira e segunda classe. Claro que os usufrutos viduais constituídos antes da vigência do Código Civil de 2002 continuam a produzir os seus efeitos, até que sejam extintos. A questão crucial da necessidade - ou não - do registro do usufruto legal será examinada no comentário ao CC 1.391. Modalidade de usufruto legal é o usufruto judicial, previsto no art. 867 do Código de Processo Civil, que, a requerimento do credor, pode recair sobre imóvel ou empresa, segundo o objeto da penhora; b) quanto ao objeto, o usufruto é geral (universal) ou particular, conforme recaia sobre uma universalidade, ou parte ideal dela (patrimônio, herança), ou sobre objeto determinado; c) quanto à extensão, o usufruto é pleno, quando abrange todos os frutos e utilidades da coisa, ou restrito, quando se exclui parte desses poderes. Nada impede, assim, que constem do título certas limitações dos poderes transferidos para o usufrutuário; d) quanto à duração, pode ser a termo certo, sob condição ou vitalício, sendo este último extinto somente com a morte do usufrutuário. Não ultrapassa o usufruto a vida do usufrutuário, por isso se diz que é constituído sobre sua cabeça. Sua morte é causa automática de extinção do usufruto, mas a morte do nu-proprietário nenhuma consequência traz, porque os herdeiros recebem o bem onerado, salvo se o contrário foi expressamente convencionado entre as partes.

Discute-se a compatibilidade entre o usufruto e a cláusula de inalienabilidade nos seguintes termos, postos por Tupinambá Miguel Castro do Nascimento: “ Há uma doação com usufruto deducto, impondo ao doador a cláusula de inalienabilidade à nua-propriedade. Seria possível a manutenção dessa cláusula após a morte do doador, no caso, o usufrutuário?” (Usufruto, 2. ed. Rio de Janeiro, Aide, 1983). A questão é controversa. Afirma Washington de Barros Monteiro que a persistência da cláusula, após a extinção do usufruto, caracterizaria usufruto sucessivo, uma vez que não estariam os poderes federados do domínio reunidos na mão do dono, o que é vedado por norma cogente (Curso de direito civil - direito das coisas, 37. ed. São Paulo, Saraiva, 2003, v. III). A jurisprudência controverte a respeito, havendo julgados em ambos os sentidos. O melhor entendimento, porém, é no sentido de que a persistência do vínculo após a morte do usufrutuário não cria usufruto de segunda geração, porque os poderes do dono do imóvel gravado são mais amplos do que os do usufrutuário, podendo mudar sua destinação ou mesmo promover a sub-rogação em bem diverso. Além disso, é inviável cogitar de usufruto sem que haja nu-proprietário. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.454-56. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 14/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No entender dos autores Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o Código de 1916 definia o usufruto como o direito real de fruir as utilidades e frutos de uma coisa, enquanto temporariamente destacado da propriedade. Tal conceito não se encontra a atual codificação, uma vez que a restrição imposta não se dá em relação à propriedade propriamente dita, mas sim em relação ao seu exercício, ou seja, à posse direta.

Constitui-se o usufruto no direito de desfrutar temporariamente um bem alheio, pelo usufrutuário, sem alterar-lhe a substância, definição esta que tem assento no Código Civil francês (Code, art. 578). Como se vê, o usufruto pressupõe a existência simultânea de dois titulares de direito: o usufrutuário, possuindo direito real de gozo ou fruição sobre o bem e o nu-proprietário, o qual possui um direito sobre a substância da coisa, com a restrição imposta pela fruição, acometida a terceiro.

É personalíssimo: pois é instituído de forma intuitu personae, não sendo transmissível causa mortis. É temporário: é dirigido a uma determinada pessoa, extinguindo-se com a morte do usufrutuário, prazo máximo de sua duração. No entanto, pode ser instituído em prazo menor, e tem como objetivo a proteção e o benefício de um certo indivíduo, daí sua natureza altruística. É intransmissível: decorrente de seu caráter temporário e, muito embora seu exercício possa ser cedido (o usufrutuário poderá locar o bem), o direito real não admite transmissão, dado seu caráter personalíssimo (CC 1.393).

Podem ser objeto de usufruto quaisquer bens, corpóreos ou incorpóreos, como direitos de autor, quadros a óleo (obras de arte) e ações de sociedades anônimas (Diniz, 2011, p. 376).

Distingue-se o usufruto do fideicomisso, pois neste opera-se uma substituição, onde o testador deixa bens a uma pessoa (fiduciário) para que esta o transmita, por sua morte, sob determinada condição ou pela ocorrência de um termo temporal, a outra pessoa (fideicomissário). Vê-se que no caso são contempladas duas pessoas distintas. É quando o testador deixa uma casa para X fixando que, quando Y vier a casar, ou completar a maioridade, o bem deverá ser-lhe transmitido. A propriedade do fiduciário é resolúvel, pelo advento do termo ou condição; já no usufruto, as duas partes adquirem o título no mesmo instante de sua instituição, sendo simultâneos os direitos, não dependendo do advento de termo ou condição. Ainda, antes do termo ou condição, o fiduciário poderá alienar o bem na sua substância, o que é vedado ao usufrutuário, o qual não tem poderes de disposição em relação à propriedade. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com acessado em 14.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Usufruto: direito das coisas”, como ilustra Jonata Rosa Gonçalves Garnizé,  previsto nos CC 1.225, IV, 1.390 e ss., o usufruto é um direito real, no qual a propriedade se divide entre o nu-proprietário, que tem a posse indireta, e o usufrutuário, que tem a posse direta. Conforme ensina Arnaldo Rizzardo, “a ideia de usufruto emerge da consideração que se faz de um bem, no qual se destacam os poderes de usar, gozar ou usufruir, sendo entregues a uma pessoa distinta do proprietário, enquanto este remanesce apenas a substância da coisa”.

Diante do conceito trazido acima, percebe-se que há uma divisão no direito de propriedade, que se dá entre duas pessoas, o nu-proprietário e o usufrutuário, sendo o primeiro, o real proprietário do bem, todavia, os direitos de usar e gozar da coisa pertencem ao usufrutuário.  Dos elementos previstos no caput do CC 1.228, percebe-se que o nu-proprietário detém exclusivamente apenas um, dispor.  O usufrutuário por sua vez, tem o direito de usar, gozar e até mesmo reaver a coisa, visto que é possuidor direto da mesma, podendo usar dos meios legais para que seja protegida sua posse, inclusive frente ao nu-proprietário, isso significa que tal direito é oponível contra todos.

O objeto do usufruto é trazido com clareza pelo CC 1.390, que diz “o usufruto pode recair sobre um ou mais bens, moveis ou imóveis, em um patrimônio inteiro, ou parte deste, abrangendo-lhe, no todo ou em parte, os frutos e utilidades”. Tal dispositivo é bastante abrangente, podendo o usufruto recair desde coisa imóvel, até direitos autorais, por exemplo, tendo como formas de constituição,, através da lei, vontade das partes ou usucapião.

O direito de usufruto por determinação legal ocorre quando a lei concede o posto de usufrutuária a determinada pessoa. O CC 1.689, I, é um exemplo de constituição legal do usufruto, pois determina que os pais são usufrutuários dos bens dos filhos. No que tange a constituição do usufruto através da vontade das partes, esta se dá por contrato ou testamento, pelos quais as partes criam o direito de usufruto. Importante destacar que, quando tratar-se de bem imóvel, o ato de vontade deve ser registrado no Cartório de Registro de Imóveis, é o que determina o CC 1.391 do Código Civil. Por fim, a terceira hipótese de constituição do usufruto é a usucapião, que ocorre quando o usufrutuário obtém o direito através de sentença, desde que estejam presentes os requisitos legais. Ocorre quando, por exemplo, o usufruto não foi registrado no Registro de Imóveis, neste caso, pode-se buscar o reconhecimento através da usucapião.

Existem diversas espécies de usufruto. Carlos Roberto Gonçalves classifica da seguinte forma:  a – Quanto à origem ou modo de constituição: O usufruto pode ser voluntário ou legal; voluntário (convencional) quando é constituído através da vontade das partes; legal quando decorre da lei; b – Quanto à duração: Pode ser temporário ou vitalício, temporário quando há um termo estipulado, vitalício quando se encerra com a morte do usufrutuário;  c – Quanto ao objeto: Com relação ao objeto, o usufruto pode ser próprio ou impróprio. Será próprio quando recair sobre bens inconsumíveis e infungíveis, ou será impróprio, quando incidir sobre bens fungíveis e consumíveis; d – Quanto à extensão: Neste aspecto, o usufruto pode ser: (1) Universal, quando recai sobre uma universalidade de bens; (2) Particular, quando recai sobre determinado bem; (3) Pleno, quando engloba todas utilidades e frutos produzidos pela coisa; (4) Restrito, quando há restrição ao gozo sobre alguma (s) utilidade (s) da coisa; e – Quanto aos titulares: O usufruto pode ser simultâneo ou sucessivo. Simultâneo quando for em favor de duas ou mais pessoas, ao mesmo tempo; sucessivo quando for em favor de uma pessoa, sendo transferido a outro após sua morte. O usufruto sucessivo não é admitido pelo ordenamento jurídico brasileiro, conforme CC 1.410. (“Usufruto: direito das coisas”, ilustrado por Jonata Rosa Gonçalves Garnizé, com publicação no site Jus.com.br, publicado em julho de 2019, acessado em 14.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 1.391. O usufruto de imóveis, quando não resulte de usucapião, constituir-se-á mediante registro no Cartório de Registro de Imóveis.

 

No lecionar de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, adquire-se o usufruto por ato inter vivos ou causa mortis, pelos seguintes instrumentos: a) por contrato, negócio jurídico em que o proprietário transmite em favor do usufrutuário o poder de uso e gozo do bem, restando consigo a substância da propriedade, ou por meio de doação com reserva, o que é muito comum nas relações familiares, onde o doador contempla parentes seus para a transmissão do bem, garantindo para si o usufruto até a morte (vitalício); b) por testamento, onde o testador destina para alguém um determinado bem (legado) e também designa, neste ato, quem será o nu proprietário, podendo recair tal encargo, se assim o quiser, para um de seus parentes sucessíveis; c) pela usucapião, tratando-se de usucapião apenas sobre o direito de uso e gozo sobre o bem, uma vez que falta ao usufrutuário o animus domini em relação ao direito de propriedade. As formas estabelecidas para a prescrição aquisitiva do direito ao usufruto são as previstas em lei, seja a usucapião extraordinária ou ordinária (CC 1.238 ou 1.242, parágrafo único).

 

Não se aplica a regra da nulidade da doação – na hipótese em que o doador se desfaz da totalidade de seus bens (CC 548) – quando o proprietário realiza a doação do único bem a terceiros com reserva de usufruto, uma vez que nesta hipótese o doador ficará assegurado do necessário para sua sobrevivência (Bezerra, 2015, p. 379).

Quando se tratar de bens imóveis, opera a publicidade do usufruto por meio de seu regular registro no cartório de imóveis da localização da propriedade, à margem da respectiva matrícula. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com acessado em 14.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No parecer de Francisco Eduardo Loureiro, o art. 715 do Código revogado dispunha que “o usufruto de imóveis, quando não resulte do direito de família, dependerá de transcrição no respectivo registro”. É a usucapião, como viu-se no comentário ao CC 1.238, modo originário de aquisição da propriedade e de outros direitos reais, pela posse prolongada e qualificada pelos requisitos exigidos em lei. Se é modo originário e não derivado, a aquisição do direito real não se subordina ao registro, como previsto no CC 1.227, bastando a mera situação de fato da posse, a qual a lei empresta efeitos jurídicos, convertendo-a em direito real. Além disso, a sentença que julga procedente a ação de usucapião é meramente declaratória, retroagindo ao momento de consumação do prazo temporal previsto em lei, ou, segundo parte da doutrina, ao início da posse ad usucapionem. Consequência disso é que nem a sentença nem o registro são constitutivos do direito real. O registro tem efeito meramente publicitário e regularizador. Visa o preceito apenas a explicitar que se pode adquirir usufruto por usucapião, o que, na vigência do Código Civil de 1916, era admitido pela doutrina majoritária, embora negado por Pontes de Miranda.

 

Explica Lenine Nequete que se adquirem por usucapião os direitos reais que implicam posse dos objetos sobre os quais recaem, a saber: usufruto, uso, habitação e superfície. Reputam-se adquiridos pela usucapião “quando quem os constitui não é o verdadeiro proprietário, em consequência do que, consumada a prescrição, o direito do beneficiado subsiste em pleno vigor, com todos os seus efeitos, como se por ele mesmo houvesse sido estabelecido” (Nequete, Lenine. Da prescrição aquisitiva. Porto Alegre, Sulina, 1954). É o exemplo clássico da usucapião ordinária, de usufruto adquirido a non domino, após completado o prazo de dez ou cinco anos (CC1.242 CC).

 

O artigo em estudo contém certa imprecisão. Deve ser lido do seguinte modo: o usufruto adquirido a título derivado por negócio jurídico inter vivos, tendo por objeto coisa imóvel, somente se adquire com o registro imobiliário. Isso porque, como vimos no comentário ao artigo anterior, o usufruto adquirido por testamento se transmite ao herdeiro ou legatário com a morte do testador e não com o registro imobiliário, em razão do direito de saisina. O registro, em tal caso, tem efeito meramente publicitário e regularizatório, mas não constitutivo do direito real. De igual modo, o usufruto sobre coisa móvel se constitui pela tradição, sem previsão de registro constitutivo nos arts. 127 e 129 da Lei n. 6.015/73. Também não necessita do registro imobiliário o usufruto legal do direito de família, ainda que recaia sobre coisas imóveis, por força do que dispõe o art. 167, I, 7, da Lei n. 6.015/73, em plena vigência. Embora não tenha o atual Código Civil reproduzido o disposto no art. 715 do Código Civil revogado, o preceito acima transcrito da Lei de Registros Públicos faz explícita menção à dispensa do registro do usufruto do direito de família. A publicidade, em tal caso, decorre da própria lei, bastando, por exemplo, a terceiros interessados defrontarem com patrimônio de menor sujeito ao poder familiar, para desde logo saber que existe usufruto ex lege em favor dos pais.

Questão mais delicada é saber se o usufruto vidual do direito sucessório, previsto no art. 1.611 do Código Civil de 1916 e não renovado no atual, depende de registro para produzir efeitos contra terceiros de boa-fé. Embora no atual sistema o cônjuge e o companheiro supérstite não mais recebam usufruto vidual, porque podem concorrer com as classes de herdeiros que estão à sua frente, recebendo propriedade plena, a questão ainda é relevante, em relação aos óbitos ocorridos na vigência do Código Civil anterior. Há entendimento da doutrina e dos tribunais de que o usufruto vidual tem natureza de direito real (Tepedino, Gustavo. Usufruto legal do cônjuge viúvo. Rio de Janeiro, Forense, 1991 e REsp n. 209.706/SP, rel. Min. Nancy Andrighi). O entendimento majoritário é no sentido de que, reconhecida a comunhão de aquestos, não tem o viúvo meeiro direito ao usufruto vidual, porque a sua estabilidade financeira já se encontra garantida (REsp n. 34.714/SP, rel. Min. Barros Monteiro). Caso contrário, incide sobre parte de toda a herança, inclusive a legítima dos herdeiros necessários. Além disso, embora haja dissonância na doutrina, o entendimento majoritário dos tribunais é no sentido de que o usufruto vidual deva ser levado ao registro imobiliário, para efeito publicitário e segurança do tráfego jurídico, prevenindo terceiros adquirentes de boa-fé (RJTJERGS 106/388, rel. Des. Edson Alves de Souza; TJSP, Ap. cível n. 68.107-0/6, rel. Des. Luís de Macedo). (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.457-58. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 14/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na visão do unisalesiano.edu.com.br, artigo publicado sala de estudo/2019/pdf, expressa  o  CC 1.391  do  Código  Civil  que  o  usufruto  de  imóveis,  quando  não  resulte  de usucapião, constituir-se-á mediante registro no Cartório de Registro de Imóveis, regramento fundamental dos direitos reais de gozo. Ressalte-se que, – além do usufruto  decorrente  de  usucapião –,  em  havendo  usufruto  legal,  caso  dos decorrentes de Direito de Família, não há necessidade de tal registro, conforme consta expressamente do art. 167, I, n. 7, da Lei 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos).   Nos casos   de   usufruto   convencional, o   registro   imobiliário   é fundamental. No tocante à cessão do exercício do usufruto, sempre foi ela permitida.  A  título  de  ilustração, podem  ser  citadas  as possibilidades  de  se  ceder  o bem usufrutuário em comodato ou locação. (unisalesiano.edu.com.br, artigo publicado sala de estudo/2019/pdf, acessado 14/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 1.392. Salvo disposição em contrário, o usufruto estende-se aos acessórios da coisa e seus acrescidos.

 

§ 1º Se, entre os acessórios e os acrescidos, houver coisas consumíveis, terá o usufrutuário o dever de restituir, findo o usufruto, as que ainda houver e, das outras, o equivalente em gênero, qualidade e quantidade, ou, não sendo possível, o seu valor, estimado ao tempo da restituição.

 

§ 2º Se há no prédio em que recai o usufruto florestas ou os recursos minerais a que se refere o art. 1.230, devem o dono e o usufrutuário préfixar-lhe a extensão do gozo e a maneira de exploração.

 

§ 3º Se o usufruto recai sobre universalidade ou quota-parte de bens, o usufrutuário tem direito à parte do tesouro achado por outrem, e ao preço pago pelo vizinho do prédio usufruído, para obter meação em parede, cerca, muro, vala ou vaiado.

 

No clarear dos autores Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo inicia com a advertência de que as partes poderão, de comum acordo, estabelecer o inverso do texto. Assim, trata da possibilidade de o usufrutuário exercer a posse direta e fruição sobre quaisquer bens acessórios ou benfeitorias da propriedade e, havendo bens consumíveis, deverá restituir os remanescentes ou o seu valor correspondente.

 

Os recursos naturais previstos no § 3º do dispositivo são aqueles que pertencem à União, como os recursos naturais e potenciais de geração de energia elétrica, para efeito de exploração, previsto no art. 176 da CF, distinguindo-se o limite da propriedade do subsolo da propriedade dos elementos deste mesmo subsolo (CC. 1260).

Tratando-se de usufruto sobre a universalidade do bem, o legislador prestigiou o direito do usufrutuário, atribuindo-lhe a propriedade de parte do tesouro achado no imóvel e também do valor referente à indenização, pago pelo vizinho, por despesas de construção de muros divisórios, a qual não se destinará ao nu proprietário, já que não é este quem exerce a posse direita. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com acessado em 14.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Esclarecendo, para Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame condensa os arts. 716, 725, 726, 727 e 728 do Código Civil de 1916. Houve alteração significativa, especialmente no que se refere ao § 1" do artigo em foco, que substituiu o art. 726 do Código revogado.

 

A cabeça do artigo contém norma dispositiva, que somente se aplica no silêncio da convenção entre as partes. Diz que o usufruto se estende aos acessórios da coisa e aos seus acrescidos. Os acessórios, segundo Caio Mário da Silva Pereira, “pela sua própria existência subordinada, não têm, nesta qualidade, uma valoração autônoma, mas liga-se-lhes o objetivo de completar, como subsidiário, a finalidade econômica da coisa principal” (Instituições de direito civil, 18. ed. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. I, p. 435). Falta-lhes autonomia, seguindo o destino da coisa principal. Assim, salvo cláusula expressa em sentido contrário, o usufruto de um imóvel abrange as construções e plantações que sobre ele se encontram, bem como os frutos, os produtos, os rendimentos e as benfeitorias.

 

O problema está em saber se o termo “acessórios” inclui as pertenças, que, na forma do CC 94, são coisas que não constituem partes integrantes, mas que se destinam, de modo duradouro, ao uso, aformoseamento ou serviço de outra. São tudo o que o proprietário mantém no bem visando a servir à sua finalidade econômica, mas se distinguem da parte integrante, porque podem ser retiradas sem alterá-las. Conservam identidade própria e não se incorporam à coisa, à qual servem temporariamente. O CC 95 rompe o princípio da gravitação jurídica ao dispor que os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal não abrangem as pertenças, salvo se o contrário resultar da lei, das circunstâncias ou manifestação de vontade das partes. Via de consequência, para que as pertenças - implementos agrícolas, veículos, máquinas, objetos de decoração e utensílios de casa em geral - integrem o usufruto de um imóvel, deve haver expressa convenção a respeito entre as partes. No silêncio, as pertenças são entregues ao nu-proprietário, porque não mais são consideradas imóveis por acessão intelectual. O usufruto abrange os acrescidos, que dizem respeito às acessões, em especial avulsão, aluvião ou formação de ilhas, que aumentem a coisa usufruída.

 

O § 1º do artigo em exame consagra importante novidade, já mencionada no comentário ao CC 1.390 acima. O art. 726 do Código Civil de 1916, que disciplinava o usufruto impróprio sobre bens consumíveis, não encontrou eco no sistema vigente. Desaparece, assim, a possibilidade de se constituir direito real de usufruto sobre bens consumíveis e fungíveis, cuja substância era transferida ao usufrutuário, que a devolvia no mesmo gênero, qualidade e quantidade, quebrando a característica fundamental do instituto. Agora somente tolera o legislador o usufruto sobre coisas consumíveis - e acrescente-se, fungíveis - se consistirem elas de acessórios ou acrescidos de coisa principal infungível e inconsumível ao primeiro uso. Dizendo de outro modo, não mais se admite o gravame do usufruto sobre coisa principal consumível ou fungível.

 

O § 2º trata da existência de florestas e recursos minerais no imóvel usufruído, com expressa menção ao disposto no CC 1.230, comentado anteriormente. Claro que o usufruto não pode recair sobre minas, jazidas, demais recursos minerais, potenciais de energia elétrica, monumentos arqueológicos e outros bens referidos em lei especial, pela simples razão de que tais bens não são de propriedade do dono do solo, mas sim da União federal. Logo, não pode o proprietário transmitir ao usufrutuário o que não tem. A referência a recursos minerais se limita à hipótese do parágrafo único do CC 1.230, vale dizer, àqueles de emprego imediato na construção civil, desde que não submetidos à transformação industrial. No que se refere às florestas, o usufruto somente pode abranger aquelas destinadas à extração de madeira, uma vez que as matas nativas não podem ser destruídas em face da legislação ambiental. Quanto às florestas e recursos minerais passíveis de exploração, vigora a convenção entre as partes. No silêncio do título, somente se admite a extração, pelo usufrutuário, se as árvores já se destinavam pelo proprietário para o corte, ou se já havia atividade de exploração mineral no terreno (Viana , Marco Aurélio S. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. XVI, p. 628).

Finalmente, o § 3º do artigo em comento reza que, se o usufruto recair sobre universalidade ou quota-parte de bens, como o patrimônio ou a herança, o usufrutuário tem direito à parte do tesouro achado por outrem e ao preço pago pelo vizinho, para obter meação em parede, cerca, muro, vala ou vaiado. A contrário senso, se recair o usufruto sobre coisas singulares, não se confere tal direito ao usufrutuário. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.459-61. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 14/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No dizer de Leonardo Peixer, em seu artigo “O exercício do direito de voto do usufrutuário de ações da sociedade anônima”, publicado em fevereiro de 2015, no site da jus.com.br, “ainda, a regra de que os acessórios do bem objeto do usufruto sempre acompanharão o principal, conforme preceito estabelecido no artigo 1.392, do Código Civil, nesse sentido, extrai-se da doutrina de Monteiro (2010, p. 375-376): Segundo o disposto no art. 1.392 do Código Civil de 2002, “salvo disposição em contrário, o usufruto estende-se aos acessórios da coisa e seus acrescidos”. Assim, se trata do usufruto de prédio residencial, o usufrutuário tem direito a desfrutar amplamente de todas as suas utilidades, como parque, pomar e piscina; se se trata de imóvel agrícola, o usufruto abrange, além da sede, lavouras, animais, águas e outras serventias. Os acrescidos, a que se refere o texto, são os produtos da acessão, ressalvando-se a hipótese do tesouro, regulada pelo CC 1.392, §3°. 

A corroborar com a tese trazida acima, cite-se a doutrina de Diniz (2007, p. 413): Pelo art. 1.392 do Código Civil, esse usufruto, salvo disposição em contrário, estende-se aos acessórios da coisa e seus acrescidos. De modo que se for usufruto de prédio residencial, o usufrutuário terá direito de desfrutar de todas as suas utilidades, como jardins, piscina etc.; se for de imóvel agrícola, abrange os animais, lavoura, frutos de um pomar, águas etc. Se entre os acessórios e os acrescidos houver coisas consumíveis, o usufrutuário deverá restituir, findo o usufruto, as que ainda houver e, não sendo possível, o seu valor, estimado ao tempo da devolução (CC 1.392, §1°). Se houver, no prédio em que recai o usufruto, florestas ou recursos minerais, o nu-proprietário e o usufrutuário deverão prefixar-lhe a extensão do gozo e o modo de exploração. (CC 1.392, §2°). Os acrescidos são concernentes aos produtos da acessão (CC 1.248), ressalvando o tesouro, que está regulado nos CC 1.064 a 1.266. 

E não é só. Infere-se da doutrina de Venosa (2003, p. 431): Não havendo ressalva, “o usufruto estende-se aos acessórios da coisa e seus acrescidos” (CC 1.392). O usufruto é, em regra, instituído sobre uma unidade materialmente considerada. O usufruto estende-se também às acessões verificadas nos bens usufruídos, bem como aos acessórios e pertenças que o dono coloca na coisa antes de instituí-lo. O direito estende-se também às servidões ligadas ao prédio usufruído. (Leonardo Peixer, em seu artigo “O exercício do direito de voto do usufrutuário de ações da sociedade anônima”, publicado em fevereiro de 2015, no site da jus.com.br., acessado em 14.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.393. Não se pode transferir o usufruto por alienação; mas o seu exercício pode ceder-se por título gratuito ou oneroso. 

Conforme já referido anteriormente, conforme afirmam Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, não se pode transmitir o direito real de usufruto a terceiro, por seu caráter personalíssimo, sendo estabelecido intuitu personae. Entretanto, a cessão do direito de usufruto, ou posse direta, poderá ocorrer em favor de terceiros, quando aquele não puder ou não quiser exercer o gozo. O terceiro, neste caso, não substitui o usufrutuário direto e, por esta razão, não tem a seu favor o direito real que o acobertaria, restando-lhe apenas uma relação jurídica de direito pessoal ou obrigacional, dispensando registro do título no cartório de registro imobiliário.

O direto de usufruto é, por natureza, insuscetível de penhora; porém, os rendimentos e lucros obtidos com a cessão do exercício do usufruto poderão sofrer referida constrição legal. O nu proprietário poderá dispor do bem gravado de usufruto, assim como dar em garantia a propriedade na sua substância, sendo que eventual penhora recairá apenas sobre esta, não podendo prejudicar direitos do usufrutuário. O usufruto acompanha o bem, em relação ao novo adquirente, em função da característica de sequela. Assim, se o bem for alienado judicialmente por dívidas, o usufruto terá que ser respeitado pelo novo arrematante, que não fará jus à posse direta. 

A cessão de direitos do usufruto é admitida se o título constitutivo não o vetar expressamente, pela vontade de seu instituidor; de qualquer forma o usufrutuário sempre permanecerá vinculado aos termos estabelecidos no ato de sua constituição. Assim, caso o beneficiário por testamento de uma grande e antiga residência não tenha interesse em ocupa-la, poderá locá-la ou emprestá-la gratuitamente a terceiro, que a cuidará devidamente (direito pessoa), mantendo o originário usufrutuário, entretanto, sua relação jurídica com o nu proprietário (direito real). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao art. 1.393 do CC/2002, acessado em 14.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Em referência ao CC 1.393, como aponta Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame corresponde ao art. 717 do Código Civil de 1916, de conteúdo semelhante, mas com a ressalva de que a alienação somente poderia ser feita ao proprietário da coisa. No dizer de Carvalho Santos, justifica-se a vedação cogente à alienação do usufruto por duas razões: “a) por melhor corresponder aos fins da instituição, que, como se sabe, ordinariamente criada para beneficiar alguém, dando-lhe meios de prover a subsistência, falharia a seus fins, desrespeitado os intuitos do instituidor, se fosse possível ser alienado; b) porque o usufruto é sem dúvida uma servidão pessoal e, portanto, um direito vinculado à pessoa, sendo evidentemente contrário à sua essência torná-la alienável” (Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1953, v. IX, p. 366). 

A inalienabilidade do usufruto não tem nenhuma incompatibilidade com a extinção por consolidação. O que proíbe a norma cogente é que o direito real de usufruto sobreviva sob a titularidade de terceiro, porque é personalíssimo do usufrutuário. A transmissão, porém, se admite quando provocar a extinção do usufruto por consolidação. São os casos da aquisição do usufruto a título gratuito ou oneroso pelo nu-proprietário ou, então, de um terceiro que adquira simultaneamente a nua-propriedade e o usufruto, consolidando a propriedade em suas mãos. Não há aí propriamente alienação do direito real, mas sim modo de sua extinção por consolidação. 

Discute-se se a intransmissibilidade abrange também a partilha do direito real de usufruto pertencente ao casal. Washington de Barros Monteiro ensina que, “como servidão pessoal, vinculada à própria pessoa do usufrutuário, não admite adjudicação ao outro cônjuge, em partilha consequente a desquite do casal” (Curso de direito civil-direito das coisas, 37. ed. São Paulo, Saraiva, 2003, v. III. No mesmo sentido, PONTES de Miranda. Tratado de direito privado, 4. ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1977, t. XIX , p. 63). Há, porém, precedentes dos tribunais entendendo, com razão, que a partilha não tem natureza atributiva da propriedade, de modo que escaparia da proibição de alienação, até como meio de evitar a perpetuação de disputas e conflitos entre os ex-cônjuges (Fioranelli, Ademar. “ Direito real de usufruto”. In: Direito registral imobiliário. Porto Alegre, Sergio Antonio Fabris Editor, 2001, p. 394). 

Situação diversa, porém, é o caso do usufruto constituído a favor de um só dos cônjuges, ou anteriormente ao casamento. Não há comunicação do usufruto ao outro cônjuge em razão do regime de bens adotado, ainda que da comunhão universal, porque feriria o seu caráter personalíssimo e intransmissível. Como não pode ser o direito real de usufruto alienado, não pode também ser dado em garantia real, nem penhorado, porque não seria passível de arrematação por terceiro em hasta pública. Ressalte-se, porém, que inalienável é apenas o direito real, nada obstando que credores penhorem as utilidades do usufrutuário, por exemplo os rendimentos da coisa. Nada impede, de outro lado, que se penhore a nua-propriedade, apenas com a ressalva de que o direito real de usufruto gravará a coisa mesmo após a arrematação. Admite-se apenas a cessão do exercício do usufruto, ou seja, o terceiro favorecido será titular de um simples direito de crédito, podendo usar ou fruir a coisa, mas não de um direito real. Não se transmite usufruto, mas apenas os poderes derivados da relação jurídica de usufruto. Nada impede que o usufrutuário, eventualmente impedido de explorar pessoalmente a coisa, possa alugá-la ou emprestá-la a outrem. Disso decorre que, extinto o usufruto, por qualquer de suas causas, extingue-se o direito de exercício dele decorrente, não podendo o cessionário do exercício opor seus direitos frente ao nu-proprietário que consolidou a propriedade em suas mãos, salvo disposição em lei especial, como ocorre na locação predial urbana. Os deveres do usufrutuário continuam os mesmos e incólumes perante o nu-proprietário, admitindo-se, apenas, que por convenção o cessionário se torne devedor solidário.

No dizer de Pontes de Miranda, “se foi transferido o exercício, o usufrutuário continua com o direito real, as pretensões, ações e exceções ligadas a esse direito” (op. cit., t. XIX, p. 56). Pode ocorrer novo desmembramento da posse, passando o usufrutuário a ser possuidor indireto e o cessionário do exercício possuidor direto, o que permite a ambos usar da tutela possessória, por ofensas de terceiros, ou mesmo entre si (v. CC 1.197). Como não se transfere direito real, a cessão do exercício não ingressa no registro imobiliário. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.461-62. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 14/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Complementando o Capítulo I, Título VI – Do Usufruto, para Ricardo Fiuza, em sua doutrina, o usufruto é inalienável, mas pode ser cedido a título gratuito (comodato) ou até oneroso, como, por exemplo, o contrato de locação. Admite-se a penhora do usufruto, mesmo que o usufrutuário resida ou não no bem onerado (JTACSP, 126/18). • O dispositivo equipara-se ao art. 717 do Código Civil de 1916, com considerável melhora em sua redação. No mais, deve ser-lhe dado o mesmo tratamento doutrinário dispensado ao artigo apontado. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 711, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 14/12/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).